E é realmente gostoso abrir a capa, tirar de lá a bolachinha, apreciar o selinho com o já clássico logo “zoado”, pousar suavemente a agulha, ouvir o barulhinho da poeira nos sulcos e sentir, finalmente, o som explodir nos auto-falantes. E aí sim, vamos ao que interessa: o som!
Continua muito bom. A primeira faixa é bem minimalista: quando parece que a música vai começar, ela termina. E dá lugar a uma um pouco mais elaborada, no sentido “No Sense” do termo: “Spilling the holy shit”. Boa letra, muito bem encaixada na melodia. E, acompanhando pelo encarte, dá pra notar que Marly pronuncia perfeitamente as palavras, por trás do vocal “gutural”. Marly que, diga-se de passagem, está ainda melhor, como vocalista, que na primeira fase da banda, do início dos anos 1990.
Não se pode dizer o mesmo da faixa título, “Burying my dreams”, que vem a seguir: eu, pelo menos, não consegui acompanhar a letra pelo encarte. Ok, tá na tradição do estilo: até hoje me lembro que precisei de umas três audições pra sacar que Lee Dorian não pronuncia praticamente nada do que está escrito no encarte de “From slavement to obliteration”.
O lado B é ainda mais “enxuto”: começa com outro som curtinho e minimalista e prossegue com outra mais elaborada, só que desta vez com uma novidade: a letra é em português! E ficou bacana. Deu um toque mais “brasileiro”, realmente, à banda, lembrando os primórdios do metal em terras tupiniquins. E acaba por enfatizar o fato de que o No Sense é, realmente, uma espécie de “protótipo” de banda grind por aqui, ao unir o “sotaque” metálico, presente principalmente nos riffs e na afinação da guitarra, à estrutura das musicas em si, sempre enxutas, sem “gorduras”. Punk.
Encerrando o disco, outra tradição: uma “musiquinha” vapt vupt, “ignorance and death”, onde só a frase é pronunciada sobre um “papôco” instrumental. Pode soar meio clichê, mas acaba reforçando ainda mais o caráter “tradicional”, “old school”, da bolachinha.
Vida de vocalista de grindcore é difícil como o que ... |
Acabei virando amigo dos caras – principalmente de Marly e de Ângelo, então guitarrista - , porque no underground é assim: “no gods, no masters, only friends”. Bom, nem sempre – friends. O fato é que eu sempre dava uma descida a Santos quando ia a São Paulo para vê-los. Não esqueço um fim de semana que passei na casa do Ângelo onde experimentei pela primeira vez as delícias da comida vegetariana. Despedi-me dele num domingo: eu ia voltar pra casa de minha tia em São Paulo, ele ia ajudar a organizar um protesto em frente ao Mcdonalds.
Inesquecível também o dia em que perdi o show do Nirvana porque me desencontrei da garota que havia comprado meus ingressos devido a um engarrafamento que peguei na subida da serra – havia descido pra ver um ensaio do No Sense. Não me arrependo, foi excelente o ensaio, tenho as fotos até hoje. Mas perder o show do Nirvana foi traumático ...
A banda acabou logo depois mas, para surpresa geral, voltou com força total, já no século XXI, e segue firme fazendo shows e lançando discos – antes deste compacto lançaram o EP “Obey”, em CD. Seu próximo lançamento será a reedição da primeira demo-tape em vinil, num split dividido com os cearences do Obskure.
Imperdível!
A
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