quinta-feira, 21 de junho de 2012

Enver Hoxha

Esta semana a Deputada Federal Manuela d'Ávila, “musa do congresso” e uma das estrelas do PCdoB, atualmente à frente nas pesquisas relativas à disputa pela prefeitura de Porto Alegre, esteve no programa de Danilo Gentili, “Agora é tarde”. Num dado momento ele lhe faz uma pergunta recorrente: “Você se considera realmente comunista, ainda?”. Ela responde naquele jeito meigo de menina/mulher que lhe é característico e bastante útil no universo pantanoso e escorregadio da política partidária: “Sempre me perguntam isso tendo em mente os erros do passado. Tá, tudo bem, houveram práticas autoritárias, mas nós nos esforçamos para superá-las. Hoje nós somos um partido super moderno mas as pessoas insistem em nos enxergar sob uma ótica ultrapassada.” Na hora me veio à mente a absurda mensagem de condolências* que o PCdoB enviou à Coréia do Norte quando da morte do ditador Kin Jong Ill, enaltecendo o espírito democrático e os esforços pela paz empreendidos pelo defunto. Dá pra acreditar numa coisa destas? Tudo bem, um chefe de estado de um país comunista faleceu, é natural que um partido que se diz comunista se manifeste publicamente a respeito. Mas o bom senso indicaria que, neste caso, por se tratar de uma aberração histórica, um regime totalitários dos mais brutais que o mundo já viu, bastaria um texto protocolar que não implicasse numa aprovação explícita às práticas adotadas pela referida nação. Do jeito que foi redigido e divulgado o texto, conclui-se que o PCdoB talvez não seja um partido tão “moderno” e renovado quanto a nobre Deputada quer nos fazer crer. Velhos hábitos são difíceis de mudar – que o diga Oscar Niemeyer, até hoje um renhido stalinista.

O episódio me lembrou, também, que eu conheci o PCdoB, no final dos anos 80, como motivo de piada no movimento estudantil por ser um dos únicos partidos a ainda apoiar o regime implantado na Albânia pelo ditador Enver Hoxha. O país era, a exemplo da Coreia do Norte hoje, um dos mais fechados do mundo, preso a uma ortodoxia supostamente marxista (na verdade stalinista) inflexível que o mantinha submerso num ambiente de atraso econômico e cultural deprimente. Para que se tenha uma idéia, militantes que para lá se dirigissem nos anos 70 tinham que, ao passar pela fronteira, cortar os cabelos e raspar a barba pois, para eles, aquele aspecto visual, além de anti-higiêncio, era um sinal de decadência. Certamente tinham em mente os hippies ou os muçulmanos, não os comunistas barbudos de Cuba – ou, mais provável, não consideravam Cuba um país realmente comunista.

O “realismo socialista” imperava e tudo que, aos olhos dos líderes do Partido, lembrasse o ocidente capitalista, era proibido e perseguido. Na TV, no cinema, na música e na literatura, apenas obras insossas destinadas a propagar a ideologia do regime. Na política e na economia, práticas anacrônicas persistiam, como a excessiva centralização e planificação das decisões , sempre na mão de burocratas desligados da realidade das ruas – e do campo. O resultado, todos sabemos: desabastecimento, racionamento, filas para tudo, mediocridade cultural generalizada. Situação que perdurou por algum tempo mesmo depois da morte do Camarada Hoxha, mas que não resistiu aos ventos da mudança que varreram o mundo do chamado “socialismo real” no início dos anos 90. Hoje, a Albânia é uma “democracia” (ênfase nas aspas) parlamentarista ao estilo ocidental às voltas com os mesmos problemas que acometeram a maioria dos países do Bloco comunista depois da queda das ditaduras: desigualdade econômica crescente e crime organizado em expansão. Além disso, há o sério problema dos refugiados do Kosovo, região de maioria albanesa que faz parte da antiga Iugoslávia, atual Sérvia, na qual eclodiu uma brutal guerra civil no final da década de 1990.

Enver Hoxha (pronuncia-se Enver Hodza) chegou ao poder depois da saída dos Italianos, que haviam ocupado o país durante a segunda guerra mundial. Apesar da inexistência de ação por parte da União Soviética no processo de libertação, seu governo, desde o início, foi fortemente influenciado pelo modelo stalinista. Só que Stalin praticamente desconhecia a existência do minúsculo país, que na época contava com cerca de um milhão de habitantes. Por conta disto, os albaneses foram deixados, com sua bênção, sob a tutela do Marechal Tito, líder da vizinha Iugoslávia. 

Por volta de 1947, no entanto, a relação entre os dois países começou a estremecer, no bojo da dissidência de Tito com o bloco soviético, culminando com o rompimento em julho de 1948, quando Tirana exigiu que todos os conselheiros técnicos iugoslavos deixassem o país e anulou unilateralmente todos os tratados e acordos entre os dois países. A razão do conflito foi a desconfiança, insuflada pelos soviéticos, de que os Iugoslavos planejavam uma anexação da Albânia ao seu territória, já que Tito, dizia-se, achava o país muito fraco para permanecer independente.

A morte de Stalin, em 1953, foi recebida com luto nacional na Albânia. Sua influência sobre o governo de Hoxha era muito forte. Foi por idéia dele, por exemplo, que o Partido Comunista mudou de nome para Partido do Trabalho da Albânia. De 1948 a 1960, US$200 milhões em auxílio soviético seriam cedidos para a expansão técnica e aumento da infra-estrutura. Como gesto de gratidão, Hoxha reuniu toda a população na maior praça da capital, Tirana, pediu para que se ajoelhassem e fez com que recitassem um juramento de duas mil palavras de “fidelidade eterna” e “gratidão” ao seu “amado pai” e “grande libertador”, a quem o povo devia “tudo”.

Kruschev assumiu o poder e, com sua denuncia do “culto à personalidade” e dos crimes de Stalin, em 1956, as relações entre os dois países, que já vinha declinando desde a morte do antigo líder, chegaram a um ponto de ruptura, oficializada em 1960, durante o Quarto Congresso do Partido do Trabalho da Albânia. No dia 11 de novembro de 1961, a URSS e todos os outros países do Pacto de Varsóvia romperam relações com a Albânia. Hoxha passou, então, a flertar abertamente com a China de Mao Tse Tung, desafeto de Kruschev. Chegou, inclusive, a promover uma Revolução Cultural e Ideológica nos moldes da chinesa, entre 1967 e 1968. O “namoro” durou até 15 de julho de 1971, dia em que o então presidente dos Estados unidos, Richard Nixon, um “anticomunista delirante”, segundo Hoxha, visitou a China. No dia 30 de agosto de 1977, quando Tito visitou Beijing, o Partido Trabalhista da Albânia declarou que a China era agora um país revisionista, assim como a União Soviética e a Iugoslávia, e que a Albânia era o único estado marxista-leninista no planeta – ele também condenava o regime de Kin Il Sung, da coréia do Norte. Pela primeira vez na história moderna, a Albânia não possuía um único aliado.

Não há como negar que houve avanços durante o governo de Hoxha: uma Lei de Reforma Agrária foi aprovada em agosto de 1945, autorizando o confisco de  terras e sua  distribuição, sem compensação, aos camponeses. Antes, 52% de toda a terra estava nas mãos de latifundiários. Depois da lei, o percentual caiu para 16%. A taxa de analfabetismo, que em 1939 era de 90-95% nas áreas rurais, caiu para 30% em 1950 e em 1985 era igual à dos Estados Unidos da América. A Universidade Estatal de Tirana foi estabelecida em 1957 - era a primeira de sua espécie no país. O costume medieval da Gjakmarrja (rixa de sangue) foi banido. Os direitos das mulheres foram ampliados. A malária, a doença mais comum, foi combatida com sucesso através de avanços na área da saúde e da drenagem dos pântanos. Em 1985, ano da morte do líder, nenhum caso havia sido registrado nos últimos vinte anos - a Albânia possuía o maior número de pacientes infectados na Europa. Um caso de sífilis não era registrado há 30 anos. 

O preço pago pelo isolamento e pela inflexibilidade ideológica, no entanto, foi muito alto: certas cláusulas na Constituição de 1976 restringiam efetivamente o exercício das liberdades políticas que o partido interpretava como sendo contrárias à ordem estabelecida. Além disso, o governo negava à população o acesso a qualquer informação que não fosse aquela disseminada pela mídia controlada pelo estado. A Sigurimi (polícia secreta albanesa) rotineiramente violava a privacidade de pessoas, lares e meios de comunicação e efetuava prisões arbitrárias. Suas atividades permeavam a sociedade albanesa ao ponto de que um em cada três cidadãos ou já havia cumprido pena em campos de trabalho forçado ou já havia sido interrogado por seus oficiais. Há relatos bárbaros de tortura durante estes interrogatórios.

Viajar para o exterior foi proibido após 1968 para todas as pessoas, exceto aqueles que o faziam a negócios oficiais. A cultura da Europa Ocidental foi vista com profunda suspeita, resultando em prisões e na proibição de material estrangeiro não-autorizado. A arte foi remodelada para refletir o estilo do realismo socialista. Expurgos, com execução sumária de membros do partido e do governo, eram freqüentes. Um forte culto à personalidade foi implantado, com uma intensidade similar ao que ocorria em torno do ditador coreano Kim Il-sung. Hoxha era retratado como um gênio que comentava sobre virtualmente todos os aspectos da vida, indo desde a cultura até assuntos militares. Cada livro escolar deveria ter uma ou mais citações dele sobre as matérias que seriam estudadas, e o partido o homenageou com títulos como “Supremo Camarada”, “Força Solitária” e “Grande Professor.”

Em 1985, quando o líder morreu, a economia estava estagnada – a Albânia foi o país mais pobre da Europa durante grande parte do período da Guerra Fria. O Partido do Trabalho, no entanto, continuou no poder até 1991, quando o regime foi finalmente derrubado por uma revolta popular. Mas a “redemocratização”, ocorrida durante o auge do neoliberalismo, foi problemática: uma grave crise econômica eclodiu por volta de 1995, provocando uma forte perda de confiança pública no governo. Somente em 1997, com a vitória de uma coalizão de partidos liderados por socialistas, a situação começou a se normalizar.

Uma excelente pedida para quem se interessa pela História moderna do país é o documentário “Albânia”, produzido na Itália e atualmente em exibição na grade da TV Escola. Nele, vemos imagens históricas como a de uma parada de primeiro de maio ocorrida durante a visita de Stalin ao país, Kruschev plantando uma “árvore da amizade" que seria retirada pouco tempo depois do solo albanês, trechos de festivais musicais e programas de televisão, bem como dos bastidores da célebre “Radio Tirana”, além de imagens de filmes onde os italianos eram satirizados. Há, ainda, o hilário depoimento de um cartunista de esquerda, também italiano, que morou lá durante os “anos de chumbo”. 

por Adelvan (com trechos da Wikipedia)

* PCdoB se solidariza com o povo coreano pela morte de Kim Jong il 

Em nota divulgada nesta segunda-feira (19) o Partido Comunista do Brasil (PCdoB) se solidariza com o povo coreano e com o Partido do Trabalho da Coreia pela morte do líder da República Popular Democrática de Corea (RPDC), Kim Jong il.
 
A nota - assinada pelo presidente nacional do PCdoB, Renato Rabelo, e pelo secretário de Relações Internacionais do Partido, Ricardo Abreu Alemão - destaca a dedicação de Kim Jong il pela independência da RPDC, pela luta anti-imperialista e pela construção de um Estado e de uma economia prósperos e socialistas - baseados nos interesses e necessidades das massas populares.  Leia abaixo a íntegra da nota:



Estimado camarada Kim Jong Un
Estimados camaradas do Comitê Central do Partido do Trabalho da Coreia


Recebemos com profundo pesar a notícia do falecimento do camarada Kim Jong il, secretário-geral do Partido do Trabalho da Coreia, presidente do Comitê de Defesa Nacional da República Popular Democrática da Coreia e comandante supremo do Exército Popular da Coreia.


Durante toda a sua vida de destacado revolucionário, o camarada Kim Jong il manteve bem altas as bandeiras da independência da República Popular Democrática da Coreia, da luta anti-imperialista, da construção de um Estado e de uma economia prósperos e socialistas, e baseados nos interesses e necessidades das massas populares.


O camarada Kim Jong il deu continuidade ao desenvolvimento da revolução coreana, inicialmente liderada pelo camarada Kim Il Sung, defendendo com dignidade as conquistas do socialismo em sua pátria. Patriota e internacionalista promoveu as causas da reunificação coreana, da paz e da amizade e da solidariedade entre os povos.


Em nome dos militantes e do Comitê Central do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) expressamos nossas sentidas condolências e nossa homenagem à memória do camarada Kim Jong il.


Temos a confiança de que o povo coreano e o Partido do Trabalho da Coreia irão superar este momento de dor e seguirão unidos para continuar a defender a independência da nação coreana frente às ameaças e ataques covardes do imperialismo, e ao mesmo tempo seguir impulsionando as inovações necessárias para avançar na construção socialista e na melhoria da vida do povo coreano.


Renato Rabelo, presidente nacional do PCdoB e Ricaro Abreu Alemão secretário de Relações Internacionais do PCdoB


19 de dezembro de 2011

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