1. Agitação violenta; ímpeto de violência;
furor; 2. Exaltação de ânimo; raiva, ódio, ira; 3.Inspiração, estro,
entusiasmo, ímpeto… Essas são algumas das definições encontradas no
Aurélio para o substantivo fúria. Verdadeiras, naturalmente, as
sentenças não revelam quase nada, contudo, a respeito do intelectual
sergipano que o adotou como nome próprio e vem ampliando o seu significado no convívio cotidiano com os livros, as artes plásticas, a poesia e a música do cão.
Fúria possui um nome ridículo registrado na carteira de identidade, mas
ele não lhe pertence mais. Desde o início de suas andanças pelos
subterrâneos da cidade, uma verdadeira peregrinação à procura de algum
vestígio de vida inteligente no interior do buraco, seu nome é Fúria.
Ele prefere, e vai morrer conhecido assim.
O rapaz já foi
colaborador do rebelde Folha da Praia, mantém contato com jornalistas
respeitados no sul do país, e foi lembrado recentemente pelo músico
Rafael Jr, que o colocou em pé de igualdade com o talentoso Jamson
Madureira, ao conceder entrevista a um escritor paraibano que
radiografava a cena brasileira para a confecção de um livro. A despeito
de tantos predicados, no entanto, Fúria vive exclusivamente de emprestar
conhecimento e prestígio.
Já era assim quando o conheci. Ele
havia parado de fazer as experiências com colagens que o jogou no
universo das artes plásticas, e arranjou um jeito de ganhar dinheiro
aproveitando a intimidade que desfruta com os livros. Ali na saudosa
Poyesis, entre um chope e outro, Fúria tergiversava sobre Proust e James
Joyce, se gabava da edição limitada do LP Transas, de Caetano, uma das
pérolas de sua coleção, e achincalhava o gosto médio ostentado por
alguns fregueses. “Porra de Norah Jones! Coisinha mais sem sal!”,
arrotou sem piedade em minha cara embriagada, certa vez.
Depois,
empregado no Coquetel da Cultura, ali próximo à Praça da Imprensa, sua
função era quase a mesma. Tão logo o cliente se acomoda diante de um copo
de cerveja, Fúria desenhava um perfil e, orientado pela vista desperdiçada
em uma infinidade de páginas cobertas de letras, começava a despejar
toneladas de papel no colo do eleito. Foi assim que acabei adquirindo O
Segredo de Joe Gould, de Joseph Mitchel, um dos maiores clássicos do
jornalismo literário já redigidos, e um dos livros mais consultados de
minha estante.
“É o melhor emprego do mundo, no pior lugar
possível para o escolher”, ele resume a labuta, fingindo certo cansaço.
Eu, que o conheço de perto, sei que não é extamente esse o seu
pensamento. A televisão pode esfregar o que for em nossa cara. De Lady
Gaga a Concertos para hélices de helicópteros, o copo de cerveja
esquentando, abandonado entre seus dedos, Fúria terá sempre uma
observação a fazer.
por Rian Santos
jd
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