quinta-feira, 11 de novembro de 2010

20/11/2010 - Virada Cinematográfica

Cinemark do Shopping Jardins - 23H59 - 3 filmes, café da manhã para os sobreviventes

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Paris, 1913. O compositor russo Igor Stravinsky está na cidade para apresentar sua obra mais recente, “A Sagração da Primavera”, no Teatro Champs-Elysées. A dissonância rítmica da peça musical e da coreografia choca o público francês, que se divide entre aplaudir e se revoltar contra o grupo russo. A polícia é chamada ao teatro para acalmar os ânimos, mas ao menos uma pessoa na platéia está impressionada com a música: Gabrielle Chanell.

Chanell e Stravinsky não se encontram nesta noite, apenas sete anos depois, em 1920, quando o músico foge da Revolução Russa e se exila em Paris. Já com bastante fama e dinheiro, e de luto pela morte do amante, Coco convida a família Stravinsky para viver em sua casa nos arredores de Paris. Igor aceita o convite e leva sua mulher, Katia, e seus quatro filhos para a casa de campo de Coco. Logo na chegada, Katia estranha o ambiente: “Nunca vi isso: todas as janelas estão pintadas de preto!”.

Baseado em um romance de Chris Greenhalgh, “Coco Chanel & Igor Stravinsky”, de Jan Kounen, é extremamente sexual e deliciosamente escandaloso. O retrato destes dois personagens marcantes do século 20 corrobora a fama tempestuosa de ambos. Em certo momento, Coco provoca o músico: “Sou tão poderosa quando você, Igor. E mais bem sucedida”. Ele devolve a provocação: “Você não é uma artista, Coco. Você é uma lojista”. O romance arde, mas é ela – mais esperta – quem dá às cartas.

Coco devora Igor de forma arrebatadora. O romance acontece debaixo do mesmo teto em que a família do músico vive, e sua esposa, doente, não suporta a vergonha e parte para a Espanha com os filhos. Ao mesmo tempo, Coco troca o preto do luto pelo branco da leveza e investe todos os seus desejos na formulação de um perfume que a represente. “Quero cheirar como uma mulher e não como uma flor”, explica. Assim nasce o Chanel nº5.

Ao contrário do acomodado “Coco Antes de Chanell” (2009), que retrata os primeiros anos da futura estilista francesa com leveza e omissão de dados polêmicos, “Coco Chanel & Igor Stravinsky” exibe uma mulher forte, independente, fria, até cruel em certos momentos. E extremamente sexy. A escolha da modelo/atriz Anna Mouglalis não poderia ter sido mais acertada. Basta ela dar três passos para o espectador se ajeitar na cadeira do cinema impressionado com o ar poderoso e sensual da personagem.

Não existe prova de que o romance entre os dois tenha realmente acontecido. Na Paris da época, porém, boatos davam conta de que a estilista estava mais interessada no músico do que em sua música. Igor e família foram realmente viver sob o mesmo teto que Chanell, afamada colecionadora e manipuladora de homens. Para o escritor Chris Greenhalgh, esse encontro virou um livro. E agora um bom filme. Se Coco e Igor não viveram esse romance, o filme deixa apenas uma certeza: deveriam ter vivido.

por Marcelo Costa

Scream & Yell

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Esqueça a ideia de uma Ana Paula Arósio glamourosa, com personagens que ressaltam a sua beleza. Em “Como esquecer”, filme de Malu de Martino, que passa no Festival do Rio e estreia dia 15 de outubro em circuito comercial, ela interpreta Júlia, uma professora de literatura homossexual, que após ser abandonada pela companheira, sofre a dor da perda.

“Foi importante a naturalidade que esses personagens foram criados”, disse Ana Paula, sem medo da reação das pessoas em relação à sua Júlia e aos seus companheiros de cena interpretados por Murilo Rosa e Arieta Corrêa. “Se vier a crítica, tudo bem. Me deram um personagem muito diferente do que eu faria”.

Bem diferente, mesmo. Júlia é seca, dura, difícil de lidar. “Sem carisma”, diz a própria Ana Paula. O oposto do personagem de Murilo (Hugo), um ator feliz, otimista, mesmo sofrendo a morte do companheiro. Os dois, juntos com Lisa, interpretada por Natália Lage — que foi abandonada pelo namorado quando ele descobriu que estava grávida —, vão morar juntos numa casa em Guaratiba, bairro ermo da Zona Oeste carioca, ou “no subúrbio com praia”, como afirma Júlia. A casa, aos poucos, se transforma em uma espécie de personagem, que conforta todos que passam por lá, geralmente cheios de perdas.

Por mais que o filme tenha personagens homossexuais, seu tema é outro: é a perda, ou como lidar com a ausência de alguém que se quer junto. Como disse a diretora Malu de Martino, responsável também por “Ismael e Adalgisa” e “Mulheres do Brasil”, num debate logo após a projeção do filme dentro do Festival, se os personagens fossem todos heterossexuais não teria diferença, dramaticamente.

“Por que mudar?”, questiona a diretora, sobre o filme, que é uma adaptação do livro “Como esquecer – Anotações quase inglesas”, de Myriam Campello. “Acho que o cinema brasileiro carece um pouco de filmes que abordem esse universo.”

“O filme tenta quebrar o preconceito”, defende Ana Paula. “Todos os personagens já tinham outras relações, eles não se questionam sobre as suas sexualidades. Eles lidam bem com isso.”

“O filme é elegante”, acrescenta Murilo Rosa. “O filme não é para falar sobre opção sexual, mas sobre o vazio que você sente quando perde a pessoa que ama. Eu adorei. Mas sou suspeito”, brinca.

Se há outro aspecto que chama a atenção do longa é a maneira como ele retrata o corpo da mulher, com uma sensibilidade e uma sensualidade feminina, diferente do voyeurismo masculino, a que estamos acostumados. “É um olhar delicado, diferente, feito de admiração”, conta Ana Paula.

Após ser abandonado por Antônia, Júlia sofre e, diferentemente do que é esperado, não tenta sair do buraco, pelo contrário. Mergulha de cabeça na angústia, e tenta ainda mais se infringir mais dor.

“Ela tenta expurgar o sofrimento pela dor física”, revela a atriz de 35 anos, sobre Júlia, que tem certa tendência masoquista. “Como se ao cortar o braço, doesse tanto que ela esquecesse dos demais problemas.”

Homossexualidade, masoquismo, tudo de maneira muito natural. O filme não é exatamente fácil de se vender. A produtora Elisa Tolomelli lembrou que recebeu, durante a fase de captação, muitos “nãos”, mas que a primeira providência foi procurar uma distribuidora: a mesma que lançou “O segredo de Brokeback mountain”.

por Ronaldo Pelli

G1

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