segunda-feira, 15 de março de 2010
Fé demais não cheira bem ...
Nunca imaginei que o Glauco, aquele malucão que criou o Geraldão, era místico ao ponto de ter fundado sua própria igreja ! Mas ok, não vou dar uma de dono da verdade ou ateu militante ao ponto de culpar a opção religiosa do cara numa hora dessas - apenas fiquei surpreso pois, como já disse num post anterior eu não era tão fã dele tanto quanto sou do Angeli e do Laerte, por isso acompanhei pouco sua carreira. Pra mim a religião é uma loucura em si, um delirio, mas malucos existem em todos os extratos da sociedade, não apenas entre os frequentadores das seitas religiosas. Por isso, a meu ver, não é justo creditar à ingestão do tal "Santo Daime" usado no culto fundado pelo Glauco a maluquice do cara que tirou a vida dele. É sempre a mesma coisa, nos jornais sensacionalistas - quando acontece uma tragédia ou um assassinato e o responsável é usuário de algum tipo de "substância ilícita", a tendência é sempre associar o vício ou a ingestão da substancia em questão pelo crime, quando existem tantos crimes bárbaros por aí cometidos por gente que não é viciada em nenhum tipo de droga nem apresenta disturbios mentais clinicamente catalogados como doença. Da mesma forma, existem inúmeros exemplos de pessoas que usam drogas numa boa, nunca fizeram nem dão sinal de terem a intenção de fazer mal a ninguém - no máximo, a si mesmos, afinal estão ingerindo substancias potencialmente perigosas para sua saude, mas isso é uma opção individual de cada um. Quem come prego sabe o cu que tem - ou pelo menos deveria saber.
Lamentável, mas é isso aí. Life goes on.
A.
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Acima, uma bonita homenagem de Adolfo do blog VIVA LA BRASA ao cartunista morto
Abaixo, os últimos desdobramentos do caso:
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Criminoso confessa à polícia e à TV que matou Glauco e seu filho
da Folha Online
A Polícia Federal em Foz do Iguaçu (PR) afirmou que Carlos Eduardo Sundfeld Nunes, o Cadu, 24, confessou nesta segunda-feira ter matado o cartunista, compositor e líder religioso Glauco Vilas Boas, 53, e seu filho Raoni, 25. Ele também confessou o crime ao jornal da GloboNews, quando uma repórter o questionou após a prisão. O acusado está preso desde a 0h de hoje, quando tentou fugir para o Paraguai.
Desde a prisão, Nunes está em uma cela individual da delegacia da Polícia Federal e agora é considerado réu confesso pelo assassinato de Glauco e seu filho. Com ele, a polícia apreendeu um carro, que havia sido roubado em São Paulo, uma arma e uma quantidade não determinada de maconha.
A polícia afirmou que Nunes foi interceptado por uma fiscalização de rotina, que o ordenou a parar. Houve tiroteio e um policial federal foi ferido. Os policiais, então, perseguiram Nunes na ponte, onde conseguiram pará-lo. Ele só foi identificado como o assassino do cartunista Glauco Vilas Boas quando seus documentos foram checados.
Segundo a Polícia Federal e a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, até as 10h30 desta segunda ainda não havia previsão para que Nunes fosse transferido para São Paulo.
Motorista
Após cerca de cinco horas de depoimento, neste domingo (14), na Delegacia Seccional de Osasco (na Grande São Paulo), Felipe Iasi, 23, foi liberado pela polícia por ter bons antecedentes e residência fixa. No entanto, o delegado Veras Júnior disse que o depoimento de Iasi não convenceu totalmente.
Iasi levou Cadu até a casa do Glauco na madrugada de sexta-feira (12). O carro de Iasi, um Gol cinza, foi encontrado na noite deste sábado (13).
Aos policiais, Iasi disse que foi sequestrado por Cadu e ameaçado com uma arma para ir até o local do crime. Cadu teria dito, segundo o amigo, que "precisava esclarecer que era Jesus Cristo". Conforme o advogado de Iasi, ele não chegou a ouvir os disparos, pois deixou o local antes.
Para o delegado, se Iasi era um refém como diz o advogado, ele deveria ter ligado para a polícia. No entanto, Veras Júnior disse não poder contradizer Iasi porque, até agora, nenhuma testemunha afirmou que viu Iasi levando Cadu embora. Outro motivo que fez com que o jovem fosse liberado foi que a localização dada por ele da família de Glauco dentro da casa durante o crime foi a mesma da versão da enteada do cartunista.
Em entrevista ao "Fantástico", na TV Globo, na noite deste domingo, a mulher de Glauco, Beatriz Galvão, contesta a versão de Iasi. Ela disse que o jovem ficou sentado no sofá enquanto Cadu torturava o cartunista. Beatriz também disse que chegou a pedir ajuda a Iasi, que aparentava estar drogado, mas que ele teria feito sinal negativo com a cabeça.
Na entrevista, Beatriz também disse que não sabe o que motivou o crime.
Caso
O cartunista Glauco Vilas Boas, 53, e de seu filho Raoni, 25, foram mortos a tiros na casa do cartunista, em Osasco (Grande São Paulo), na madrugada de sexta-feira (12).
Segundo as testemunhas, o suspeito chegou ao local e rendeu a enteada de 30 anos, que mora em uma casa no mesmo terreno. Glauco e a mulher Bia ouviram gritos, foram ao quintal, e começaram a conversar com Nunes.
Ele era conhecido da família por já ter frequentado a igreja Céu de Maria, que segue os princípios do Santo Daime e foi fundada por Glauco.
Segundo o relato das testemunhas, Cadu, como era conhecido o estudante, delirava e queria levar todos para a casa de sua mãe, em São Paulo, com o objetivo de afirmarem à mulher que ele era Jesus Cristo. Ele estava armado com uma pistola automática e uma faca.
Glauco tentou negociar com Nunes para ir sozinho, e chegou a ser agredido. De acordo com o delegado Archimedes Veras Júnior, responsável pela investigação, Glauco não reagiu.
No meio da discussão, porém, Raoni chegou ao local de carro. Em seguida, Cadu atirou contra pai e filho, mas os motivos ainda não foram esclarecidos. Os dois chegaram a ser atendidos no hospital, mas não resistiram e morreram.
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Do VIVA LA BRASA:
"A primeira pessoa que recebeu ele em São Paulo fui eu. Ele dormiu na minha casa, comeu da minha comida, paquerou a minha mulher (risos), ele teve uma participação intensa na minha vida. Perdi uma boa parte da minha história com a morte do Glauco. Éramos amigos muitos íntimos e tínhamos uma relação forte. Apesar de distante nos últimos tempos, o nosso elo não havia se quebrado. Tinha algo que se encaixava entre mim, Laerte e Glauco.” ANGELI
“O Glauco costumava faltar bastante aos encontros de Los 3 Amigos, pelo menos na época em que eu participei do bando. Mas quando ele aparecia dava conta do recado em segundos e logo sumia novamente. Ele tinha um dos traços mais difíceis de imitar. Era muito caligráfico, quase uma assinatura. O Laerte era o único que conseguia fazer o boneco do Glauquito quando o Glauco não estava. Numa entrevista com Los 3 Amigos, o Glauco faltou a sessão de fotos e nós tivemos a idéia de fazer uma caricatura dele pra preencher sua falta. Que notícia de merda, essa, hein?” ADÃO ITURRUSGARAI
“Foi na revista dele que eu publiquei meus primeiros desenhos, que mandava pra sessão de cartas. Ele tinha aquela coisa de responder, agradecer o envio dos desenhos. Glauco, Angeli e Laerte são os responsáveis por fazer no Brasil essa coisa do quadrinho adulto. Eles vêm com esse humor que fala mais de comportamento, que mostra tipos de pessoas mais próximas do real.” WEAVER LIMA
“A trajetória dele na época da censura foi um divisor de águas. Ele fazia um humor mais ácido e muito engraçado. A atuação dele como chargista foi algo fantástico, e depois, como quadrinista, ele criou um estilo de personagens completamente fora dos padrões. É o fim de uma proposta de humor que moldou as novas gerações. O Angeli, o Glauco e o Laerte eram os três mosqueteiros. Agora ficam só dois.” CAMILO RAINI
“Meu traço não é bom para retratar o futuro. Corro o risco de não falar a língua da moçada.”A notícia do assassinato de Glauco Villas Boas e seu filho Raoni na madrugada de sexta deixou não só os fãs de quadrinhos, mas todo o Brasil triste. C/ seu traço limpo e anguloso e humor inusitado e ligeiro, Glauco marcou os anos 80 c/ a revista do Geraldão – o solteirão donzelo tarado pela mãe que passa o dia se drogando – e toda uma galeria de personagens desajustados e cômicos: Doy Jorge, Casal Neuras, Dona Marta, Zé do Apocalipse... Nos anos 90 fez roteiros p/ o TV Pirata e a TV Colosso na Globo e fundou a própria igreja, Céu de Maria, seguindo o Santo Daime.
“O Angeli sempre tirou muito sarro de mim porque eu sou muito místico”, disse em 2001 numa entrevista: “Sou pisciano. Sempre gostei da linha espiritual, de estudar. Depois que eu comecei a freqüentar o Santo Daime – que é uma bebida que vem lá da Amazônia, que os índios consagram – Angeli e Laerte tiraram muito sarro dessa minha nova jornada. Chegaram a fazer história sobre o Glauquito, que encontrou suas raízes, montou uma seita e fez um chá com as suas raízes.”
Hahaha! Até quando falava sério o cara era engraçado.
“Eu sou daimista. Criamos um grupo de estudo e passamos a receber o Daime lá da floresta. É um centro de pesquisa espiritual. O Daime tem um potencial de cura muito grande. Eu coordeno o ritual, que é bastante musical. São vários hinos, recebidos pelos caboclos lá da mata, que a gente executa depois de ter ingerido o Daime. A gente faz um trabalho musical e as pessoas vão estudando, dentro da força do Daime, porque ele é um expansor de consciência. Me trouxe muita disciplina, principalmente com meu trabalho de cartunista, do traço. Também relacionado à saúde, porque eu era muito exagerado, boêmio, e isso atrapalhava o meu dia-a-dia. O traço é uma coisa que você precisa estar harmonizado com você mesmo. Senti uma evolução muito grande no meu trabalho e em todos os aspectos da minha vida.”
Ironia maldita, Glauco e seu filho morreram após serem baleados 4 vezes cada por um ex-frequentador do culto, Carlos Eduardo Sundfeld Nunes, playboy junkie que invadiu o sítio do cartunista dizendo ser Jesus Cristo. “É uma tragédia”, lamenta Adão Iturrusgarai, o ‘4º amigo’ dos 3 Amigos. “Ele era muito rápido pra descobrir os seus pontos fracos e detonar com você. Era muito divertido”, Adão diz, referindo-se a Glauco, não ao demente do ‘Cadu’, que até o fechamento deste post continuava foragido: “É muito triste ver isso acontecendo. Não é ler que o Glauco morreu. É ler que ele foi assassinado. E junto a um filho. Não existe mais ética ou moral no ser humano.”
O que deixou todo mundo de cara, mais do que a perda prematura, foi a brutalidade do ato gratuito. “Como eu disse no primeiro momento, no Twitter, o fato é tão chocante que nossa reação não pode ser medida em palavras, mas em um sentimento de dor, luto e desesperança”, disse o tuiteiro Mauricio de Souza: “Apesar disso, nós sairemos do choque. E vamos encontrar caminhos, mesmo que sejam longos, demorados, para contermos essa onda de irracionalidade e desumanidade.”
Até o Presidente mandou uma nota: “Glauco foi um grande cronista da sociedade brasileira, entendia os usos e costumes da nossa gente e expressava isso com inteligência e humor”, escreveu Lula: “Foi uma perda tremenda. Diante dessa verdadeira tragédia, quero expressar meu sentimento de pesar a familiares, amigos e admiradores.”
GERALDÃO Surfistão! Gravidão! foi um dos gibis mais marcantes da minha vida. Eu começava a pegar onda e já sacava a Chiclete com Banana do Angeli, e só dei um tempo de desenhar o Bob Cuspe no meu caderno da escola quando conheci os quadrinhos do Glauco – a partir daí passei a copiar o Geraldão também. “A gente trabalhou juntos na Circo por quase 10 anos”, diz o editor Toninho Mendes: “Eu não consigo acreditar no que está acontecendo.”
“O Glauco era o batedor que ia na frente testando os limites pra todo mundo que vinha atrás”, fala Arnaldo Branco, outro da minha geração, parceiro da revista Tarja Preta: “Sempre ficava impressionado como o cara falava abertamente de sexo e drogas ainda na vigência da censura (velada, que fosse). Fazia humor urgente, em estado bruto.”
“Era o único que não conheci pessoalmente da turma dos Los 3 Amigos”, diz Allan Sieber: “Mas segundo os chegados, era um gênio da resposta imediata, muito rápido no gatilho mesmo.” Pra Fernando Gonsales, Glauco foi “um dos grandes revolucionários do humor brasileiro: ele deu uma escrachada que revolucionou.”
Em poucas palavras, Caco Galhardo resumiu o sentimento geral: “Para todos os cartunistas foi uma grande referência. O Geraldão é uma grande referência e o Glauco era um cara pacífico. Como alguém pode fazer uma coisa dessas? O atirador não tem noção”, comentou na sexta-feira: “O Glauco era um gigante. Ele tinha o dom de repetir a mesma piada e ser engraçada dez mil vezes. O mundo acordou mais xarope hoje.”
“Comecei a desenhar no 2º grau. Sempre desenhei na turma do fundão, que eu fui freqüentador assíduo. Desenvolvi essa linguagem e vi que era uma ferramenta muito poderosa: o humor aliado com caricatura. Também tive contato com o pessoal do Pasquim, todos aqueles desenhistas, o Ziraldo. Aquilo foi me inspirando.”
Glauco tinha acabado de completar 53 anos. Publicava tiras e charges na Folha de S.Paulo desde 1984. À sua galeria original de personagens, agregou nas últimas décadas Edmar Bregmam, Geraldinho, Faquinha, Ficadinha, Zé Malária, Nojinski e Netão, um tipo que “surgiu com essa nova moda da internet” – disse em 2001 numa entrevista p/ o UOL: “O Netão tem uns 30 anos, é metropolitano, casado, vive internado num apartamento e viaja pelo mundo afora pelo computador.” Glauquito, que tinha medo de ficar ultrapassado, não teve nem a chance de envelhecer. Mas sua verve sobreviverá.
“Eu desenho a nanquim com papel e depois escaneio. Eu uso o computador quando é pra aplicar cor. Tentei usar computador pra desenhar, mas meu desenho sai como se fosse uma criança. Não tenho o domínio ainda. Mesmo aquela canetinha que tem uma tela. Pra meu tipo de traço, estou acostumado com a pena, que dá um toque todo peculiar.”
GLAUCO [1957-2010]
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