Fui na primeira noite do Abril pro rock basicamente pra ver
o
Sebadoh, e não me arrependi, apesar
do show curto no qual já entraram chutando o pau da barraca e mandando um rock
“low fi” totalmente isento de frescuras e firulas. A apresentação
foi dividido em três partes, com Lou Barlow tocando guitarra na primeira e na
última. Num estilo bem peculiar, com palhetadas rápidas e esparsas. Não teve
muito papo nem enrolação, nem quando o microfone caiu e Barlow teve que se
prostar para continuar cantando e tocando, já que também não havia roadie,
aparentemente – Bruno Montalvão saiu correndo de trás do palco para ajudar mas
já era tarde, o cara já tava lá no chão de joelhos feito um adorador de Allah.
Foi bonito.
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Autoramas |
Pena que o publico, pequeno, apático e disperso, não estava
nem aí pra eles. Foi o público menos “rock” que eu já vi no Abril pro
ROCK. A grande atração da noite
para eles, pelo que entendi, já tinha se apresentado, era Tulipa Ruiz – que
tocou cedo por conta de compromissos na agenda. Estavam ali apenas esperando,
para a minha surpresa, um tal de
Johnny
Hooker, a julgar pela comoção que foi quando o mancebo subiu ao palco na
seqüência. Foi uma cena peculiar: uma das mais fodidas e importantes bandas do
indie rock se apresentando e quase ninguém prestando atenção. O povo queria
molejo, malemolência, suingue, e teve: Johnny Hooker entrou com um figurino
bizarro, blusa de redinha transparente deixando os mamilos em chamas à mostra e
um cinto dourado breguééérrimo, fazendo um som dançante e romântico, totalmente
Sidney Magal meets Ney Matogrosso - e arrasou! A platéia foi ao delírio! Nem
sei o que dizer, já que não faz parte do meu show ...
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Kataklysm |
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Ainda tentei tirar um cochilo deitando no chão do Chevrolet
Hall pra esperar pelo
Autoramas com
Renato dos Blue Caps, mas desisti quando acordei ao som de um merengue
paraense. Era
Felipe Cordeiro, no
palco. Não vou dizer que era ruim, porque não era, mas não é a minha praia,
definitivamente.
Antes do Sebadoh tivemos uma tal de Orquestra Betodélica, que entrou alucinada, cheia de gente muito
animada, mas com uma proposta, no mínimo, confusa, misturando não sei o que com
não sei o que lá e alguns toques de psicodelia setentista regada a flauta doce.
Nos melhores momentos lembrava algo do rock brasileiro com pitadas de mpb dos
anos 70, tipo Secos e Molhados, mas de forma vaga, bem distante. Fiquei sabendo
através do meu camarada Rogério Big Brother que eram representantes da nova
cena independente do Recife, autodenominada “Movimento Manguebeto”. Ta serto
...
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Obituary |
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Gostei da versão de “Porque Brigamos”, de Diana, que
Bárbara Eugênia fez. Sou saudosista, me
amarro em ouvir essas musicas que eu ouvia no rádio quando era guri. Já do show
da
Tulipa Ruiz, não gostei. Um monte
de gente boa já me recomendou a moçoila, mas não entra, tem jeito não. Gostei
do
Trummer SSA, que estava tocando
num palco alternativo montado ao lado da rural de Rogê de Renô. É um projeto de
Fabio, do Eddie, com um pessoal do Vivendo do Ócio, de Salvador. Fabio Trummer
é foda, grande compositor. Adentrei o recinto com eles no palco, o que
significa que, lamentavelmente, perdi o
Jonathan
Richard, rockabilly de Caruaru ...
Pula pra noite das camisas pretas. Clima TOTALMENTE
diferente, a começar pela verdadeira multidão que se acumulava na frente do Chevrolet
Hall desde o início da verdadeira maratona que se estenderia até altas horas da
madrugada. Fila enorme pra comprar ingresso. Enfrentei a via crucis, como
qualquer mero mortal – sempre penso que poderia procurar um credenciamento via
programa de rock, já que todo ano vou lá e faço a cobertura do evento, mas
sempre deixo pra lá – e entrei com o
Krow
no palco. Meio “genérico”, mas é uma boa banda de death metal. Comprei a
camiseta deles na barraquinha do Big Brother. Muito bonita – e bem mais barata
que a do Obituary, meu sonho de consumo do momento ...
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Olho Sêco |
Desalma, que tocou
na seqüência, faz aquele thrash mais “moderno”, meio Pantera, meio “nu metal”.
Curto não. Parte do show foi com uma banda percussiva chamada Bongar. Continuei
não gostando. Gostei do
Conquest for
Death, dos Estados Unidos. Hard Core altamente energético e perfomático.
Aeróbico, até. Som na velociade da luz, flertando com o grindcore ...
Do
Olho Seco nem
há muito o que falar, a não ser que foi um show histórico. É o Fabião velho de
guerra com uma galera mais nova escudando, dentre eles um baixista meio
metaleiro, cabeludo e com uma camiseta do Sepultura. O guitarrista tem a mão
pesada e reproduziu com fidelidade os riffs básicos daquela seqüência de
músicas clássicas do punk rock mundial. Foi emocionante ver a galera cantando
“Isto é olho seco” ao som da marcação do bumbo. Dá até pra perdoar o trecho
infeliz de “Nada” em que ele sugere que se deveria proibir a imigração para São
Paulo ...
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Mukeka di rato |
Agora um desabafo:
Eu
não agüento mais o Mukeka Di Rato ao vivo! O ultimo disco de estúdio,
“Atletas de Fristo”, até que é bom, mas no palco eles parecem uma banda que já
passou do ponto de acabar. E o principal culpado parece ser Sandro, vocalista:
desde sua volta sinto-o apático, destoando do resto da banda, que continua no
gás de sempre. Ele não berra mais as letras, limita-se a recitá-las ao
microfone de forma hesitante, insegura. A impressão que dá é que ele está
sempre pensando algo do tipo “que que eu to fazendo aqui, já velho, barrigudo,
cantando essas musicas de moleque revoltado”. Teria sido bem mais interessante
a escalação da Gangrena Gasosa, que lançou recentemente um DVD sensacional,
contando sua história, mas não foi desta vez que vimos os mestres do “sarava
metal” no nordeste. Conversei sobre isso com Rogério Big Brother e ele acha que
é o tipo de banda com a qual Paulo André não se arrisca – “já pensou o prejuízo
se eles jogam uma bacia de farofa na mesa de som digital?”. Mas esta é uma
idéia equivocada, pois eles há tempos vêm trabalhando de forma mais profissional,
sem os arroubos de insanidade e falta de noção que marcaram sua trajetória. É,
no entanto, compreensível que se pense assim, dado o próprio histórico dos
cariocas, e o fato de que eles ainda usam esta “má fama” como marketing. Nem
poderia ser diferente, porque é ótimo. Mas tem seu preço.
A seqüência punk/HC foi interrompida pelo
Hibria, banda de Heavy Metal do Rio
Grande do Sul. Aproveitei para descansar, comer algo – ruim, caro, e com poucas
opções, infelizmente. O Abril já foi bem melhor nesse quesito – e circular
pelas banquinhas de material, que, depois de um longo período de vacas magras,
parecem estar se recuperando. Graças, principalmente, à renovação do interesse
pelos discos de vinil, disponíveis para venda em grande quantidade. No lado
direito havia também um espaço dedicado à moda, que eu visitei apenas na sexta
e não me despertou grandes interesses.
Voltei a prestar atenção no palco quando Vladimir Korg
apresentou o Chakal como “uma banda
de metal do mal lá de Minas Gerais”. Bom show, boa presença de palco. O metal
mineiro é bem peculiar, com uma sonoridade própria, crua, beirando o punk, e
isso é bom. Mas devo confessar que nunca fui muito fã das bandas de lá não.
Sempre admirei bastante a cena, mas a verdade é que acompanhava de longe, nunca
parei pra ouvir de verdade a maioria dos grupos. E continuei com a mesma
impressão depois deste show do Chakal: é legal, mas falta algo. Composição,
talvez. Acho tudo muito tosco, sem definição. Vale mais pela atitude e pela
persistência dos caras. Mas esta é uma opinião bem pessoal, há uma verdadeira
legião de seguidores desse estilo “cogumelo” de ser, e eles estavam todos lá,
emocionadíssimos, cantando juntos. Isso foi bonito de ver. O rock me emociona.
Havoc, gringa, já
navega mais pela praia do revival thrash capitaneado por Violator e Municipal
Waste, e é muito boa. Nada de novo, como sempre, já que tradição aqui é a
tônica da proposta, mas os caras são bons compositores, para além de excelentes
músicos e “performers”, o que faz toda a diferença. Um grata surpresa pra mim,
que não conhecia.
A esta altura dos acontecimentos o cansaço já batia pesado
em todos, mas a barulheira teria um “grand finale” à altura da noite com um
encontro de duas gerações do “Metal da morte” protagonizada pelo Kataclysm, do Canadá, e o Obituary, mestres da cena de Death Metal
da Florida que causou furor no final dos anos 80 e início dos 90 em torno do
Morrisound Studios de Scott Burns – que hoje trabalha com informática. Se
afastou do ramo da musica com uma triste constatação: “Eu acho que terminou,
está acabado. Não há boas bandas novas, as cópias são vergonhosas, quatro ou
cinco bandas irão sobreviver, o resto irá desaparecer.” Seu último trabalho
como produtor foi justamente para o Obituary, no álbum “Frozen in time”, de
2005.
Não deu pra prestar atenção no Kataclysm, sorry. Tive que
descansar para o que viria a seguir, que foi catártico, apoteótico, destruidor!
Bateu aquele tradicional arrepio na espinha ao ver John Tardy se posicionar na
frente do palco e emitir o primeiro de seus berros guturais super
característicos. O que se viu a partir dali foi uma reprodução exata do que se
ouve nos discos, acrescida, evidentemente, da energia emanada pela presença
física de uma lenda da música viva e ativa, ao vivo, na frente de todos.
Repertório clássico pontuado aqui e ali por faixas novas de um disco anunciado
para julho próximo, e pronto: cumprida mais uma missão de peregrinação à Meca
do rock no nordeste. Ano que vem estaremos de volta, atravessando as mesmas
obras inacabadas e inacreditavelmente estagnadas no mesmo ponto da BR 101 e
ouvindo as incríveis histórias de Itabaiana, a “Macondo sergipana”, contadas
pelo meu camarada Lenaldo.
Dentre elas a de “Zé de Nedina”, o “capotador”, que costuma
encher a cara e dar carona ao máximo de gente possível para no meio do caminho
avisar aos passageiros de seu expresso da morte que se segurem, porque ele vai
capotar o carro. E o faz, por pura diversão. Ou do “Bar do Descamisado”, que
fica no povoado Pé do Viado e tem esse nome porque seu proprietário se recusa a
vestir camisa. Ele costuma servir os clientes assim, de peito aberto, o que
causou indignação num digníssimo juiz de comarca que foi lá almoçar e pediu a
um dos garçons para falar com o dono e denunciar aquela falta de respeito.
Intenção que foi, evidentemente, frustrada, já que era o próprio dono que
cometia a “indignidade”. Consta também que quando o Descamisado está “azuado”,
nervoso com alguma coisa, solta uns “valei-me Nossa Senhora” e sai distribuindo
carne extra de brinde para os surpresos fregueses. Lenaldo destacou também a
simpatia da filha do cara, que, respondendo a um pedido seu por mais uma
garrafa de cerveja, perguntou se ele não era aleijado pra se levantar e ir
pegar no frigobar. De fazer inveja ao “Heavy Duty”, que é célebre por se
orgulha em ter o pior atendimento do Rio de Janeiro ...
Tem também o “Bar da Morte”, em cujas paredes se encontram
“santinhos” de todos os falecidos do sexo masculino – não me pergunte
exatamente porque, nem Lenaldo soube explicar – nos últimos anos na cidade. Para
a frustração do proprietário, ninguém nunca morreu na mesa do bar. E o puteiro
que pretendia funcionar discretamente na casa do agenciador, mas que você podia
ver de longe, devido à enorme quantidade de motos estacionadas na porta ...
Clique nos links abaixo para ler as resenhas das edições
passadas do Abril pro rock.
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