quarta-feira, 20 de julho de 2011

loudQUIETloud

"Kim vive num mundinho em separado. É o mundo da Kim e da Kelley", fala Charles (Black Francis/Frank Black) numa determinada altura do filme. Não dá pra saber se em tom de crítica ou apenas a título de informação, já que havia sido perguntado a respeito do relacionamento entre ele e a baixista numa entrevista. E é assim durante toda a projeção: longos silêncios intercalados por alguma conversa jogada fora entre uma brincadeira e outra. Os eventuais problemas (e eles devem existir, já que a banda se separou no auge criativo e, mesmo com esta volta, não conseguiu produzir nada inédito até agora) são, claramente, varridos para baixo do tapete. Não espere obter alguma resposta definitiva para a grande pergunta. Há versões, no entanto: uma resposta vaga, dada por Black Francis em outra entrevista (apenas ele responde às entrevistas, ao que parece), e uma mais direta, saída da boca de alguém que também estava lá. Para Joey Santiago, foi uma resposta do ego do líder ao fato de que a popularidade de Kim aumentava a cada dia. Há ainda a versão do público quando, num dos momentos mais divertidos, Kelley sai pela fila da entrada de um show perguntando ao público porque, na opinião deles, a banda acabou. A resposta mais recorrente é "porque eles são bons demais", para ambas as perguntas. Explicando a presença de Kelley: a irmã gêmea de Kim acompanhou a banda durante a turnê. É dela, aliás, a sentença que define tudo: “Vocês são os piores comunicadores do mundo”. Os quatro parecem concordar, resignados.

A resposta mais provável, no entanto, é mesmo a financeira. Frank Black nunca se esquivou dela, muito pelo contrário: declarou, certa vez, que eles já tinham feito música suficiente com os Pixies, agora era a hora de fazer dinheiro. E fizeram, pelo que se vê no filme: shows totalmente "sold out" por onde passaram - claro que num nível infinitamente distante de um U2 ou de um Guns and Roses, mas provavelmente suficiente para aliviar a situação de David, que conseguia trocados fazendo mágica e vivia de favor na casa de amigos; de Joey, que sustentava a família fazendo trilhas e tocando para meia dúzia de pessoas ao lado da mulher; de Kim, cujo Breders fez relativo sucesso mas que entrou numa roda-viva de abuso de álcool e drogas e estava em recuperação durante a tour; e do próprio Frank Black, cuja carreira solo, convenhamos, seguia (e segue) ladeira abaixo, em termos de popularidade.

No palco há a música, e a música, todos sabemos, é a forma de comunicação mais perfeita que existe, porque dispensa a palavra, esta maravilhosa porém limitada invenção humana. Mas o foco é mesmo nos bastidores, o que leva à pergunta: vale a pena assitir a este filme? A resposta é sim, caso você seja fã da banda. Eu sou. Mas para mim, particularmente, valeria a pena apenas pelo prazer de passar 1 hora e alguns minutos vendo o sorriso de Kim Deal, o mais bonito do universo. Por isso e pela sucessão de momentos antológicos, como quando eles recebem uma homenagem por ter feito o show com os ingressos esgotados mais rapidamente da história da Bixton Academy, lendária casa de shows inglesa. Ou pelo registro da ida do pai do baterista David Lovering, então doente terminal, com câncer, a Londres, para ver o filho se apresentar (como baterista E mágico/ilusionista). Por Kelley ajudando Kim na composição do então novo disco das Breeders ("Montain Battles", imagino). Ou pelo emocionante registro da presença de uma fã cuja vida foi mudada depois dela encontrar, por acaso, um livro no qual a personagem principal era fanática pelos Pixies. Há um rápido encontro dela com Kim no final do show em que a moça, visivelmente emocionada, lhe dá o livro de presente. Na sequencia seguinte o filme registra a reação de Kim ao folheá-lo. Sem palavras (literalmente). No final do filme, entre os créditos, imagens de um ensaio da banda cover da fã são intercalados com uma execução de "Monkey gone to heaven" pelos Pixies.

A banda também tocou pela primeira vez no Brasil neste ano de 2004, mas o documentário, infelizmente, não registra isso. A única referência ao nosso país é uma touca usada pelo guitarrista Joey Santiago durante uma conversa via internet com sua família. Uma pena: pelo visto o "Bananão" continua sendo encarado por muitos, lá fora, como uma terra inópsita e distante, indigna de um enfoque mais detalhado.

O Filme foi lançado em edição nacional recentemente, pela Coqueiro Verde. Você pode adquirir uma cópia aqui.

Ou BAIXE AQUI, em AVI c/ legendas.

por Adelvan

Não sei se já aconteceu com você, mas comigo, várias vezes: você passa um tempo danado sem falar com uma pessoa (as coisas talvez não tenham terminado bem da última vez ou algo assim), e acha que tudo bem, a vida segue, mas chega um determinado momento em que você a reencontra, e todas as coisas se encaixam – como se o tempo não tivesse passado.
Acredite, acontece. Particularmente, sou um cara super estranho com as amizades. O motivo, olhando para mim mesmo, talvez seja porque eu necessite muito da solidão (ou eu necessito, ou eu acho que necessito), e as amizades existem exatamente para impedir que você fique sozinho. Lógico, para muitas outras coisas, mas fazemos amigos essencialmente para termos alguém com quem conversar e trocar idéias.
Risos. Engraçado como falar de uma banda que a gente ama pode entregar mais do que aquilo que a gente imagina. Ok, tenho meus amigos, mais até que do mereço, e eles são uma parte especial da vida. Existem aqueles que estão vivendo o aqui agora, aqueles que já viveram e vira e mexe aparecem para uma cerveja ou para um email carinhoso bissexto, e, alguns, que por algum motivo ficaram pelo caminho.
Existem também os amigos invisíveis, como diria Edgard Scandurra. As bandas, as músicas que sempre nos acompanharam, mas que por algum motivo desaparecem de nossas vidas. Não me lembro o motivo, mas eu tinha brigado com o Pixies. Eles continuaram na minha vida, não tinha como esquecê-los (imagina: toda vez que não ouço algo lembro que fiquei quase surdo por causa de “Doolittle”), mas algo nos distanciava.
Tentei ir vê-los quando eles tocaram em Curitiba, mas não rolou. Quando o Danilo e o Ricardo, da Mojo Books, me pediram uma história sobre um disco, não pensei duas vezes: Pixies (acho que o livro ainda está esgotado aqui). As músicas iam e vinham, mas a volta da banda me deixou com um pé atrás, não sei o motivo. Os vi, depois, no Primavera Sound, e também no SWU, e algo em mim esperava mais, não sei o que.
Hoje assisti “loudQUIETloud: a film about the Pixies”, e parece que tudo se encaixou. As estranhezas das letras do Frank Black, os sorrisos chapados de cerveja sem álcool da Kim Deal, o olhar suspeito de Joey Santiago, a alegria nonsense de David Lovering, quatro pessoas que por algum motivo estiveram na mesma banda, fizeram grandes discos, brigaram e não tinham percebido o valor do que fizeram.
“loudQUIETloud: a film about the Pixies” mostra por a+b que ter uma banda é praticamente como viver em família, você cercado por pessoas estranhas cuja união é o sobrenome e o sangue – e muitos gens que fazem você reproduzir gestos e parecer com seus familiares. Tire os gens e você tem uma banda: pessoas estranhas que se juntam para fazer música.
A juventude preenche as lacunas dos espaços vazios quando você é jovem, mas quando se passa dos 30 e acumula tristezas (lembre-se: viver é acumular tristezas), as pessoas tendem a ficarem mais frias, cínicas e receosas sobre o mundo. Daí o silêncio. “loudQUIETloud: a film about the Pixies” é lotado de SILÊNCIOS, mas abre importantes clareiras para se entender uma banda tão estranha e genial como o Pixies.
E, por que não, nós mesmos?
por Marcelo Costa
Scream & Yeall

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