Nenhuma surpresa. O filme, pelo menos pra mim, não trás nenhuma surpresa. Não sou nenhum especialista em economia, muito pelo contrário, tive inclusive muita dificuldade para acompanhar com a devida atenção o rosário de explicações técnicas jogado na tela, mas posso dizer com orgulho que nunca acreditei nesse papo furado de que a “mão invisível” do mercado era suficiente para regular nossas vidas. Reagan não é, no entanto, o único vilão desta mais do que realista história de horror: o que assistimos durante a projeção é um impressionante desfile de mentiras saídas da boca de um infindável séquito de caras de pau, alguns atrapalhados e hesitantes, outros bastante seguros do que dizem, mesmo diante da obviedade do fato de que estão, pura e simplesmente, mentindo – ou, no mínimo, redondamente enganados. Alguns porque querem se enganar, como Alan Greesnpan, que admite em vários momentos não ter tomado as providencias necessárias para evitar o desastre por pura convicção ideológica.
O filme começa com belas imagens da terra de Bjork, a Islandia, outrora uma nação próspera, segura e feliz. Mas um dia seu governo resolve “se abrir para o mundo”, aderir ao “consenso de Washington”, e o resultado foi absolutamente desastroso. Em todos os sentidos, inclusive para o meio ambiente, já que belas paisagens naturais foram simplesmente destruídas para dar lugar a gigantescas fábricas. A partir deste ponto inicial, somos convidados a tentar entender porque isto (que é apenas a “ponta do iceberg”, talvez por isso tenham escolhido a “terra do gelo” – Iceland) aconteceu e para isso o filme se divide em 5 partes numa tentativa, a meu ver frustrada, de ser o mais didático possível. A verdade é que é difícil para leigos acompanhar todo aquele emaranhado de termos técnicos envolvendo siglas e números e gráficos, e este é, justamente, o grande trunfo dos criminosos, que se utilizam da alienação geral para tentar justificar o injustificável e se manter encastelados em suas posições privilegiadas. É fácil perceber, no entanto, o jogo de interesses entre governantes, agentes reguladores do sistema financeiro e o mundo acadêmico com o único intuito de acumular riqueza e poder às custas da esmagadora maioria da população que, muito provavelmente, não vai assistir a este filme – estarão entretidos demais com Harry Potter, Transformers, Piratas do Caribe ...
Uma pena, pois ao final de tudo a conclusão é óbvia: são estes caras que mandam no mundo, e é muito difícil que o cenário mude a curto ou médio prazo, já que eles estiveram e continuam lá, encastelados, em todos os últimos governos norte-americanos, sejam eles republicanos ou democratas, desde o início da “Era Reagan”. E continuam mesmo com Barack Obama! Não é, portanto, um filme com um final feliz. Termina mostrando a vitória eleitoral do primeiro negro a assumir o cargo máximo da mais poderosa nação do mundo, vitória construída justamente em cima de uma promessa de mudança, para logo em seguida sucumbir às pressões do mercado, dos verdadeiros donos do mundo, e manter nos mesmos cargos de chefia os criminosos que deveriam estar, no mínimo, na cadeia – ou com uma bala devidamente alojada em seus cérebros, o que seria mais do que merecido. Deprimente. Nem dá para se empolgar muito com o chamamento à luta da frase de efeito que encerra a projeção, “esta é uma batalha que vale a pena ser lutada”. Os otimistas que me perdoem, mas esta é uma batalha que me parece irremediavelmente perdida ...
por Adelvan
- Os Estados unidos são uma ditadura de partido único disfarçada de democracia: democratas e republicanos se revezam no poder sem dar a mínima chance a partidos que representem alguma alternativa política, e ficam mais parecidos a cada ano que passa. Parecem mais facções de uma mesma sigla partidária – muito embora esteja havendo um distanciamento à direita entre os republicanos, um movimento cuja maior expressão é o chamado “Tea party”. A principal diferença para as ditaduras totalitárias clássicas é que neste caso o poder é sustentado não pela força do aparelho repressivo do estado, mas por uma espécie de consenso em torno de um “pensamento único” construído ao longo do tempo por uma nem sempre sutil lavagem cerebral levada a cabo 24 horas por dia pela mídia de massas, evidentemente controlada pelas megacorporações multinacionais.
- “Trabalho Interno” está (finalmente!) em cartaz em Aracaju na Sessão Cine Cult do Cinemark do Shopping Riomar, todos os dias, às 11:00H da manhã.
- O filme é, por si só, um produto de uma megacorporação, a Sony Pictures, e é exibido mundo afora principalmente em salas de exibição pertencentes a outras megacorporações, como o próprio Cinemark. “Resistir é inútil”.
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