segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Soylent Green

Houve uma fase estranha em minha vida, no início da adolescência, por volta dos 13, 14 anos, em que eu me descobri com algum tipo de distúrbio nervoso, ou numa crise existencial, não sei ao certo. Só sei que passei a ter medo, muito medo – de situações imaginárias mas, principalmente, de perigos reais, embora nem sempre imediatos. Um certo medo da vida, e do futuro, pode-se dizer. Tudo começou, pelo que me lembro, quando assisti a um filme de terror na Globo (curtia muito a Sessão “Casa do Terror”, que ia ao ar tarde da noite) que me deixou estranhamente aterrorizado. No filme o protagonista era devorado por ratos e, quando fui me recolher aos braços de Morpheus, comecei a ter verdadeiras alucinações com a situação. Me acalmava com água com açúcar, mas passei a ter medo de dormir e de ter pesadelos. 

Vale lembrar que eram os anos 80, a guerra fria e a corrida armamentista estavam a todo vapor e a ameaça de uma aniquilação total da raça humana não parecia uma coisa tão distante e inverossímil quanto hoje, quando os recursos para tal ainda existem, mas a geopolítica e a correlação de forças entre as potências nucleares é totalmente diferente. Talvez por conta desta conjuntura, passei também a desenvolver uma certa consciência social meio estranha à idade, o que me deixou um tanto quanto distante de meus amigos, mais interessados em se divertir e pouco se lixando para os perigos de uma hecatombe em escala global ou coisa do tipo. Lembro que fiquei em pânico, por exemplo, com o filme “O Dia seguinte”, que descrevia os horrores de um hipotético ataque atômico, e com uma reportagem do globo repórter que mostrava os níveis alarmantes de contaminação em Cubatão, então a cidade mais poluída do mundo. A impressão que tinha é que tudo estava se deteriorando ao nosso redor e que o futuro era uma coisa assustadora. Isso antes da “Eco 92” e dos alarmes em relação ao efeito estufa e à destruição da camada de ozônio.

“As mulheres bonitas foram transformadas em mobílias, a contenção das aglomerações humanas passou a desprezar os direitos individuais, os campos se tornaram propriedade de poucos ricos e os alimentos mais banais só poderiam ser consumidos pelos poucos que podiam pagar por eles” – Isso soa familiar? Pois o que este trecho da wikipédia descreve não é a situação do mundo em que vivemos. É o argumento de um filme de 1973 que assisti pela primeira vez na televisão nos anos 80 e, justamente por ter sido na época à qual me referi no primeiro parágrafo, me marcou bastante. Trata-se de “Soylent Green”, de Richard Fleisher, batizado no Brasil como “No Mundo de 2020” - uma distopia ambientalista que tinha como mote a superpopulação, que consumiu os recursos naturais do mundo e deixou a humanidade à beira de um colapso. 

Na fita, Charlton Heston vive Robert Thorn, um investigador às voltas com o assassinato de um magnata das Industrias soylent, responsável pela produção e distribuição do alimento de mesmo nome, supostamente produzido a partir de plânctons marítmos, que era a única alternativa economicamente viável para saciar a fome de uma megapopulação que só na cidade de Nova York chegava a 40 milhões de habitantes. Através dos perigos enfrentados por Thorn somos apresentados a um mundo aterrorizante, onde a esmagadora maioria das pessoas vive à beira da miséria e amontoada, enquanto alguns pouquíssimos privilegiados continuam a ter acesso ao que restou das benesses da praticamente extinta “sociedade de consumo” - coisas que antes eram comuns, como residências espaçosas, belas mulheres, carne de vaca ou legumes frescos adquirem o status de especiarias raríssimas e cobiçadas. 

Aos poucos, a investigação de Thorn vai levá-lo a descobrir que há algo de muito sórdido por trás deste novo produto vendido ao povo a preços acessíveis, o soylent verde. A aterrorizante verdade é primeiramente revelada a seu parceiro Sol, um homem já idoso e saudoso dos bons tempos que não voltariam mais, interpretado por Edward G. Robinson. Sol auxilia Thorn em sua investigação e, através de um relatório secreto surrupiado pelo último da cena do crime, toma conhecimento da real extensão da catástrofe ambiental que toma conta do planeta, o que inclui a extinção dos plânctons a partir dos quais o soylent verde seria, supostamente, fabricado. A revelação do segredo que esconde a verdadeira matéria prima da qual é feito o produto é impactante e assustadora.

A década de 70 foi pródiga em filmes de Ficção Científica de cunho pessimista (vide "THX 1138", de 1970, "Westworld - Onde ninguém tem alma", de 1973, "Rollerbal - os gladiadores do futuro", de 1975, "Logans Run", de 1976, e "Demon Seed"/A Geração de Proteus, de 1977, para ficar apenas nos mais célebres), e "Soylent Green" é um dos mais interessantes exemplares dessa tendencia. A direção de Fleisher é segura e o desempenho do elenco de atores é muito bom. O mesmo pode ser dito da excelente direção de arte, elegante e sem os excessos tão comuns ao gênero. É baseado no romance "Make Room! Make Room!", de Harry Harrison, e tem cenas memoráveis - um dos pontos altos é a sequencia do suicídio assistido, um serviço disponível a qualquer cidadão que queira partir “desta para melhor” e, com isso, aliviar um pouco o peso de sua presença naquela sociedade aparentemente em ordem mas na verdade em frangalhos. A “ordem”, por sinal, é mostrada em toda a sua brutalidade em outra sequencia marcante, a do “controle de distúrbios”, na qual a policia utiliza caçambas para dispersar a multidão de forma absolutamente brutal e desumana.

“Soylent Green” foi o último filme de Edward G. Robinson - ele morreu logo após as filmagens, em 26 de janeiro de 1973. É uma fita “cult”, conhecida por poucos e nunca lançada em DVD no Brasil, mas é possível encontrá-la em diversos formatos em cantos perdido da internet. Para minha sorte, tive alguém que fizesse isso pra mim e agora possuo uma cópia de excelente qualidade em AVI legendado dessa pequena pérola da ficção científica.

Recomendo muito.

por Adelvan k

Informações Técnicas:

Título no Brasil: No Mundo de 2020
Título Original: Soylent Green
País de Origem: EUA
Gênero: Drama / Ficção
Tempo de Duração: 97 minutos
Ano de Lançamento: 1973
Direção: Richard Fleischer

Elenco principal:

* Charlton Heston.... Robert Thorn
* Edward G. Robinson.... Sol Roth
* Joseph Cotten.... William R. Simonson
* Chuck Connors.... Tab Fielding
* Leigh Taylor-Young.... Shirl
* Brock Peters.... Tenente Hatcher

2 comentários:

Maicon disse...

O___O

Olha só GARERA... quem quiser baixar o filme vai no link logo abaixo.

http://www.megaupload.com/?d=M95TAJ97

Abraço.

Anônimo disse...

Filmaço!