Abaixo, alguns dos melhores textos que li até o momento sobre a questão - mais uma espécie de "manual dos indignados" (nas palavras de Marcelo Rubens Paiva) publicado nas redes sociais por um grupo auto-intitulado Occupy São Paulo.
######################################
“Estamos enfrentando o AI-5 do governador Geraldo Alckmin”
Guardo na memória alguns episódios do governo de Mário Covas, que considero um político importante na história, que fazia política com convicção e sangue nas veias. Líder mais autêntico da história do PSDB, Covas foi governador de São Paulo e sofreu uma pressão muito forte por conta do crescimento dos índices de violência.Era uma São Paulo saudosa de Malufs e Fleurys, que acabara de viver o Massacre do Carandiru, e cobrava medidas enérgicas contra o crime. Havia uma forte pressão, comparável à campanha em curso pela redução da maioridade penal. As cobranças eram para que o governador se manifestasse de forma dura contra os criminosos.
De lá para cá, muitas coisas mudaram. O PSDB já foi um partido preocupado com os direitos humanos, que tinha ainda memória da participação de seus dirigentes no processo de luta pela democracia na década de 80. A postura do governador Geraldo Alckmin não lembra em nada a postura responsável de Covas. As declarações do governador não só legitimam como estimulam e liberam as ações de violência da Polícia.
Aqui vai uma das declarações do governador, o responsável político pelas ações da PM: “Manifestação é legítima, natural. Outra coisa é fazer depredação de patrimônio público, deixar um rastro de destruição por onde passa, prejudicando o usuário do sistema”.
Esse discurso aparentemente democrático, de respeito às manifestações, entra nos ouvidos dos policiais como uma orientação de agir para impedir a realização desses protestos, ainda mais com o clima criado por uma cobertura criminalizadora da mídia. A mensagem entendida pelos policiais é a seguinte: essas manifestações são ilegítimas, violentas e devem ser reprimidas com toda a força.
E foi justamente o que os soldados da PM fizeram na noite desta quinta-feira. Prisões arbitrárias (de portadores de vinagre), espancamentos covardes, agressões a jornalistas, tiros e bombas jogadas em grupos de manifestantes que gritavam “sem violência, sem violência”.
A disposição da polícia era encerrar o ato o quanto antes, independente da postura dos manifestantes. A intolerância de uma polícia revanchista, que começou a fazer revistas e prisões de cidadãos na saída do metrô antes do ato, teve como resposta a ampliação da consciência dos manifestante de que a violência só joga água no moinho de quem está contra os protestos. A palavra de ordem “sem violência, sem violência” é uma demonstração dos objetivos dos manifestantes, que repetindo em coro a frase constrangem a polícia e envergonham uma minoria – aparentemente ainda menor – disposta a acirrar os ânimos.
Um país com a democracia consolidada, diante dessa situação de violência institucionalizada contra a população, faria um movimento pelo impeachment do responsável pela ação da PM, o governador Geraldo Alckmin. Se o prefeito Fernando Haddad comete um erro político ao sustentar a posição de manter o aumento da tarifa de ônibus, Alckmin ameaça com a sua polícia a democracia e as liberdades civis ao impedir a realização de uma manifestação que tem uma causa justa.
Diante disso, estamos enfrentando o AI-5 do governador Geraldo Alckmin, que suspende várias garantias constitucionais e consolida uma “linha dura” militar em pleno regime democrático. A generalização de ações ilegais pelo Estado, especialmente as arbitrariedades do seu braço armado portador do monopólio da força, obriga uma ação em defesa da democracia que passa pelo afastamento imediato do responsável por essa situação, o governador Alckmin, que não mostra condições de conduzir esse processo. Por outro lado, enquanto não der uma declaração firme contra a violência da polícia e a concreta ameaça à democracia, Haddad será considerado condescendente e pagará um preço político pela postura titubeante.
Os atos dos jovens, que versam sobre temas de fundo relacionados à questão urbana, ganham importância cada vez maior porque passaram a tocar em uma ferida que marca o nosso país. No processo de redemocratização da década de 80, setores da classe dominante evitaram que se levasse a cabo o potencial das transformações defendidas pelo movimento político que estava em luta.
Assim, não houve uma ruptura com o regime militar para a instauração de uma democracia que levasse até as últimas consequências a participação do povo na política e a destruição da estrutura de repressão criada na ditadura. Por isso, a polícia que agora reprime jovens manifestantes é a mesma que prendia, espancava e torturava aqueles que lutavam contra a ditadura. Com isso, a questão central não é mais o aumento de 20 centavos nas tarifas (embora esse seja o problema motivador). Estão em jogo os limites da democracia, cada vez mais estreitos ao não tolerarem a realização de manifestações, a ocupação de espaços públicos e a participação popular na política.
Cada vez mais jovens saem às ruas para protestar e os atos estão ficando maiores. Cresce o sentimento de que é necessário lutar e, mesmo com o clima de terror e medo criados pela violência da PM, esses jovens se somam às manifestações de cara aberta e com um brilho especial no olhar. Muitos vivem pela primeira vez, com seus 16 ou 17 anos, a experiência de participar de protestos de massas.
Esse processo pode contribuir na construção de uma força social no futuro, se for conduzido de forma responsável, estiver colado nos anseios mais sinceros da sociedade e criar condições de converter o ativismo de animados e corajosos jovens em uma organização política capaz de enfrentar os problemas estruturais, que necessariamente fará a ruptura adiada na década de 80 e, enfim, consolidará a democracia no país.
por Igor Fellipe
Viomundo
###############################################
Tarifa zero é possível? Conheça cidades que oferecem opções de transporte de graça organizadas por órgãos públicos e sem a participação de empresas privadas
Os protestos relacionados ao aumento da tarifa do transporte coletivo em São Paulo levantam, novamente, a discussão sobre o modelo de “Tarifa Zero”. A ideia é que os custos das passagens sejam inteiramente subsidiados por governos e prefeituras, sem que o cidadão precise pagar nada para usar o ônibus, metrô ou outros veículos incluídos na rede.A ideia já foi considerada em São Paulo em 1990, na gestão de Luiza Erundina (PT) como prefeita. Para custear o sistema, seria implantado o “Fundo de Transporte”, que reservaria parte do dinheiro coletado no IPTU. Dessa forma, o custo do transporte coletivo para os cidadãos seriam proporcionais a seus ganhos salariais. Por apresentar um aumento no IPTU, o projeto sofreu resistência e não foi aplicado. Atualmente, o Movimento Passe Livre luta pela gratuidade no transporte coletivo, encarando a mobilidade dentro da cidade como inerente ao direito humano de acesso à cultura e a serviços públicos.
Mas será viável aplicar um modelo como esse? Confira alguns exemplos de municípios no exterior (e dois brasileiros) que conseguiram implantar a gratuidade do trasnporte coletivo:
LEIA TAMBÉM: TRANSPORTE PÚBLICO GRATUITO EXISTE E NÃO É COISA DE MALUCO
Talinn, Estônia
Em 2013 a
cidade de Talinn, capital da Estônia, implementou o esquema de transporte
coletivo gratuito para habitantes, se tornando a primeira grande cidade
europeia a adotar o esquema. Para fazer uso da rede completa, que inclui trens,
ônibus e bondes, basta que o usuário apresente um cartão registrado na prefeitura
(pode ser obtido com uma taxa de 2 euros). Internamente, o programa foi
apelidado de “13o. salário”, já que usuários poderão economizar o equivalente a
um salário mínimo anualmente – que, por políticos da oposição, foi visto como
uma jogada populista para agradar eleitores.
A tarifa ‘gratuita’ custará aos cofres públicos o
equivalente a 16 milhões de dólares, custos que devem ser cobertos com o
estímulo à economia – de acordo com a prefeitura, foi registrada uma maior
mobilidade nos fins de semana, indicando que pessoas saem de casa e gastam mais
dinheiro no comércio e em atividades culturais. Já nos três primeiros meses de
implementação, estima-se que o uso de carros na capital foi reduzido em 15%,
enquanto o número de passageiros do sistema de transporte coletivo subiu 10%.
Para suportar a maior quantidade de usuários, Talinn comprou 70 novos ônibus e
15 novas linhas de bonde. O objetivo é ser conhecida como “A Capital Verde” da
Europa em 2018.
A cidade chinesa de Chengdu já sinalizou interesse em estudar
o modelo de Talinn para oferecer transporte gratuito para seus próprios
habitantes – a ideia seria diminuir a quantidade de veículos em suas ruas e
amenizar seu trânsito caótico.
Sydney, Austrália
Algumas linhas centrais da cidade são gratuitas – entre elas
dois exemplos de importância crucial para a movimentação de habitantes. A
primeira percorre um trajeto no Central Business District, o coração da cidade,
que conta com uma grande concentração comercial, assim como opções de programas
culturais. Outra linha cruza a região de Kogarah, região que possui
muitos hospitais e escolas. Esses percursos são financiados, também, com o
dinheiro público – direto dos cofres da prefeitura.
Changning, China
Desde 2008, tanto visitantes quanto habitantes de Changning,
cidade da província de Hunan, na China, podem usar gratuitamente as três linhas
de transporte coletivo. A iniciativa, que custou US$ 1 milhão aos cofres
públicos, foi a primeira no país – em outros municípios, o transporte é
controlado por empresas privadas que recebem um subsídio das prefeituras. Os
custos de manutenção das linhas seriam cobertos por publicidade dentro dos
ônibus e subsídios do governo. Logo de início, o uso de ônibus aumentou em dois
terços.
Seguindo o modelo de Changning, a cidade industrial de
Changzhi também adotou o de transporte coletivo gratuito em 2009.
Baltimore, EUA
Em Baltimore, cidade de cerca de 600 mil habitantes
localizada no estado de Maryland, os ônibus são gratuitos e, além de tudo,
híbridos – o que significa que o impacto ambiental é reduzido (não há emissões
de gases em 40% do tempo de seu funcionamento). São três linhas conectadas a
outras opções de transporte, como metrôs e trens.
E no Brasil?
Já existem cidades pequenas que usam os cofres públicos para
financiar completamente seu sistema de transporte. Porto Real, no Rio de
Janeiro, não apenas aboliu a tarifa de R$ 0,50 por trajeto, em 2011, como
aumentou as linhas de ônibus que atendem o município. Com uma população
pequena, de 16 mil habitantes, estima-se que 3 mil deles façam o uso do sistema
diariamente. Outra cidade brasileira a adotar o sistema é Agudos, no interior
de São Paulo, próxima a Bauru. A gratuidade também foi implantada em 2011,
quando se extinguiu a tarifa de R$ 2,40 e, desde então, o uso dos ônibus aumentou
em mais de 60%.
Para conhecer outras cidades que aderiram ao transporte
coletivo gratuito (completamente ou em algumas linhas), confira o site Free
Public Transport.
por Luciana Galastri
Galileu
#########################################
O PT paga o preço pelo abandono de bandeiras históricas
O PT paga o preço pelo abandono de bandeiras históricas
Por que tantos jovens aderiram à campanha contra o aumento de tarifas de ônibus e não às manifestações convocadas, com o apoio maciço da mídia, contra a corrupção e os réus do mensalão? A resposta é simples: porque esse é um protesto de esquerda, com reivindicações caras à esquerda. A direita não está nem aí para o aumento das tarifas do transporte público, até porque ela anda de SUV. “São só 20 centavos”, foi a reação mais comum que vi deles nas redes sociais. Condenaram o movimento desde a primeira hora, e vão condenar ainda mais daqui para a frente, porque, em minha opinião, o aumento da tarifa em São Paulo foi apenas o detonador de uma insatisfação crescente nos últimos anos e que agora parece prestes a explodir. E que diz respeito não à direita, mas ao PT.
É uma indignação já antiga, que começou a brotar quando o PT chegou ao poder, em 2002, e passou a substituir o verbo “lutar” de suas origens por “acochambrar” –em nome da tal governabilidade, uma palavra cada vez mais suja. Em 2010, a esquerda brasileira se uniu em torno de Dilma Rousseff porque não queria que chegasse ao poder a corja de fundamentalistas que apoiava o outro candidato. Mas, para nosso espanto e asco, eles estão hoje do lado do PT, influindo nos destinos da Nação. Pior ainda, junto com os ruralistas que sempre abominamos. Imaginem, quando poderíamos pensar que a direita ficaria feliz com o PT no poder, e a esquerda, contrariada? Parece um pesadelo.
No poder, o PT abandonou praticamente todas suas bandeiras históricas –a única que se mantém verdadeiramente de pé é a diminuição da pobreza, da desigualdade social e étnica. Todos aplaudimos as conquistas inegáveis neste setor. Mas a gente não quer só comida, lembram? Queremos todas as outras bandeiras de volta, também. Abandoná-las tem um custo eleitoral e, se o partido não resolver fazer algo a respeito, a fatura será cobrada em 2014.
As bandeiras que o PT abandonou:
– A moralidade. Não importa que seja caixa 2 ou outra coisa, o mensalão representou uma mancha num partido que se construiu em cima de um discurso ético e não para fazer “o que os outros também fazem”. Não houve mea culpa por parte do PT até hoje, e nem sequer uma reflexão conjunta sobre o ocorrido, apenas críticas à mídia e ao Supremo.
– Os direitos humanos. Este ano, o PT, ao optar pela presidência de outras comissões “mais importantes”, deixou de estar à frente de uma comissão que tradicionalmente sempre prezou, a Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara. Isso deu espaço para que se instalasse na presidência da Comissão, para horror da sociedade civilizada, um pastor fundamentalista com histórico de homofobia e racismo, Marco Feliciano. Esta semana, diante da selvageria da PM nas manifestações de quarta-feira em São Paulo, o governo federal, em vez de denunciar a violência policial, fazendo jus à história do PT, ofereceu “ajuda” a Geraldo Alckmin, do PSDB, contra um protesto de jovens. O prefeito petista da capital, Fernando Haddad, em lugar de se portar ao lado dos manifestantes como seria digno de um membro do partido que tem greves no DNA, se colocou ao lado do governador tucano e da truculenta polícia.
– A reforma agrária. Dilma Rousseff conseguiu ser pior que o governo neoliberal de Fernando Henrique Cardoso em famílias assentadas: apenas 21,9 mil, o menor número desde 1995. São dados do MST (Movimento dos Sem-Terra), velho parceiro de lutas do PT, não do “PIG”. É o MST quem diz que o governo de Dilma é um dos piores nos últimos 20 anos em desapropriação de terras para assentamentos. Não é à toa que a líder ruralista e senadora Kátia Abreu chegou a declarar que se sente próxima à presidenta “pela concordância de ideias” e por sua “compreensão da agropecuária brasileira”. Por favor, respondam: quem, na esquerda, votou no PT esperando ver uma ruralista contente?
– Os direitos LGBTs. A bandeira da diversidade, tão cara ao PT desde os seus princípios, inexiste hoje em dia no partido, que cedeu inteiramente à pressão dos pastores evangélicos. Os petistas se encontram tão reféns do fundamentalismo em nome da “realpolitik” –surrealpolitik, melhor dizendo–, que o ministro da Saúde telefonou ao pastor-deputado Marco Feliciano antes de decidir suspender uma campanha pelo uso de camisinhas entre prostitutas. E quem vai esquecer que o governo Dilma voltou atrás em lançar uma campanha anti-homofobia nas escolas só para atender ao obscurantismo dos políticos evangélicos? O apego ao poder deixou o valente PT medroso.
– Os índios. Dilma Rousseff, ao contrário de seus antecessores, nunca recebeu no Palácio do Planalto as lideranças indígenas. Só recentemente, após um índio ser morto pela Polícia Federal no Mato Grosso do Sul é que o secretário-geral da presidência, Gilberto Carvalho, recebeu lideranças (em um anexo do Palácio) e admitiu erros na condução da política indígena e na discussão em torno da usina de Belo Monte. A presidente Dilma é, até agora, a governante que menos concedeu terras a índios desde o governo FHC. Enquanto isso, no Mato Grosso do Sul, prosseguem os conflitos: na segunda-feira 12 outro índio foi morto em uma emboscada. É ou não é para um cidadão de esquerda ficar indignado?
– Transporte público barato e de qualidade. Sim, o PT já acreditou nisso. Quando Luiza Erundina se tornou a primeira mulher prefeita de São Paulo, em 1988, o partido defendia a mesma tarifa zero que os meninos do MPL (Movimento Passe Livre) que estão nas ruas protestando, defendem (leia mais aqui). Por aí fica claro quem foi que mudou.
P.S.: Não deixe de ir à manifestação PACÍFICA programada para segunda-feira em São Paulo, às 17h, no Largo da Batata.
por Cynara Menezes
Socialista Morena
#############################################
Nenhum comentário:
Postar um comentário