quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

VERÃO SERGIPE 2013 - VERSÃO "VIDA REAL"

Aracaju, 27 de janeiro de 2013. Uma gigantesca e belíssima lua cheia se ergue do mar sobre uma cena inusitada: na praia, iluminados apenas pela luz de um refletor alimentado por um gerador, um punhado de jovens – em idade e em espírito – se reúne em torno de um grupo de garotas vindas do planalto central do país para participar de mais uma celebração do espírito livre e independente, transmitindo aos presentes sua mensagem de esperança através de uma musica simples e tribal, porém densa, angustiada e repleta de significados.

Sim, esperança. Porque aquelas palavras de dor emolduradas por acordes soturnos, toscos e dissonantes têm como objetivo maior, na verdade, sublimar o sofrimento oriundo da opressão orquestrada pelas estruturas arcaicas que ainda nos regem, como sociedade. Sofrimento que se manifesta na forma de gritos primais emitidos por indivíduos que se recusam a ser escravos da ignorância, vitimas de todo tipo de violência física e psicológica. Se recusam a ser gado conduzido docilmente ao abate, a cair nas armadilhas das convenções sociais. Todos os que estavam ali naquela noite eram, de alguma forma, ovelhas negras. Todos almejavam, de alguma forma, se libertar.

A apresentação era da Soror, banda brasiliense com uma interessante proposta musical que em essência é punk, mas que flerta com a estética gótica e se utiliza de acordes e andamentos tão lentos e climáticos que resvala no “doom” – sem o metal. Nada de virtuosismo, aqui. Tudo começa com notas primárias tiradas de um contrabaixo distorcido em um andamento lento, muito lento, numa espécie de introdução fantasmagórica interminável que vai, aos poucos, se desdobrando em novos elementos acrescentados aos poucos, sem pressa, até culminar em vocalizações desesperadas que desencadeiam uma barulhenta explosão de angustia. Conduzindo a sinfonia macabra e minimalista, 4 jovens mascaradas que se revezam em seus instrumentos, esnobando a técnica e esbanjando criatividade.

Foi um desfecho perfeito para algo havia começado com o sol ainda brilhando, por volta das 17h00. Era a quarta edição do “Clandestino”, evento inspirado na atitude punk do “faça você mesmo” que coloca bandas dispostas e despojadas diante de um público curioso e participativo convocado pelas redes sociais. Tudo planejado e executado de maneira informal, espontânea, colaborativa. Rock sem edital, sem muros, sem portas. Libertário, como deve ser. Sempre.

Os organizadores aproveitaram a passagem de duas bandas brasilienses por Salvador para participar do Festival Vulva La Vida para as convidar para uma esticada até a cidade vizinha e tocar na praia, ao ar livre, de graça – um convite irrecusável para quem vive no centro-oeste, tão longe do mar. Elas vieram, e se depararam com um bom público reunido em torno de uma estrutura básica montada ali mesmo, na areia, em frente ao mar. E trouxeram algumas amigas a reboque, dentre elas uma espécie de poetisa ativista que se apresentou como “Formiga”, de São Paulo, e declamou, no intervalo entre a Dança da Vingança e a Soror, um poema de protesto adaptado de uma letra de rap. Foi ouvida com atenção e efusivamente aplaudida.

A Dança da Vingança se apresentou exatamente na transição entre a tarde e a noite e teve a sorte de ser presenteada com a aparição da lua no instante em que pisavam o palco improvisado – uma lona preta sobre a areia. Foi um momento mágico. Sua musica é simples e primaria, mas as deficiências técnicas são amplamente superadas pela energia e verdade com que é apresentada. Tanto que atraiu ao palco uma criança, filha de um dos casais presentes, que parecia querer, a todo custo, participar daquilo. As crianças sentem quando a coisa é verdadeira. As meninas, com os olhos brilhando, pareciam não acreditar no que estava acontecendo. Nós também não. Repito: foi mágico.

Os trabalhos foram abertos por volta das 17h15 pela local Renegades of Punk que, mais uma vez, no presenteou com uma apresentação precisa e energética comandada por Dani, com seu sorriso cativante, sua tiara de oncinha e sua glamorosa Danelectro refletindo o brilho do sol, acompanhada pela cozinha nervosa de João Mário e Ivo Delmondes – este último servindo de obstáculo para os acrobáticos saltos ornamentais de Alex e sua invejável saúde de ferro. Na platéia, representantes de todas as gerações, com destaque para as promessas do futuro: Nico, filho de Marcelo Larrosa, o bebê mais babado e adorado do Facebook, e a garotinha que interagiu com a Dança da Vingança, filha do casal “rocker” Nani e Kakau. Do reino animal, destaque para a presença de Denzel, o pinscher, mascote da Todys Trouble Band.

Valeu muito a pena, tudo. Até mesmo para quem vai precisar de dias, semanas, quiçá meses, para limpar toda a areia acumulada nos equipamentos. Tenho certeza disso.

O rock me emociona. Catarina e Rodrigo, faltaram vocês ...

Fotos por Snapic e Marcelinho Hora.

Texto de Adelvan k.

4 comentários:

kakau disse...

Com suas proprias palavras, meu velho: 'o rock emociona'. E esse foi mais um desses momentos. Belo texto. Llinha por linha. Inspiraçao da lua ne nao? He he he ps: o. Nome da minha mulher é nani. So pra retificar. Flw kakau

Adelvan Kenobi disse...

Opa Kakau, valeu a correção. Desculpas à Nani aí por ter me atrapalhado. E que bom que gostou do texto, obrigado pelo feedback. Que venham mais noites de rock, mar e lua cheia ...

kakau disse...

Blz. E que venham as noites felizes de rock

A Wild Garden disse...

Isso é que é nascer virado pra lua: além de estar num lugar em que as pessoas trabalham anos para poder visitar, ainda com som! Eita nóiz!
Ah, tive que mudar o domínio por causa de hackers:
vidavegetando.blogspot.com