Em volta de Zizo, o tal poeta, magnificamente interpretado
por Irandhir Santos (o deputado inspirado em Marcelo Freixo de Tropa de Elite),
gravita uma fauna de maconheiros e vagabundos de todos os sexos e idades. Os
mais jovens costumam passar o dia fumando, bebendo e fazendo surubas (ou
“ménages”), as mais velhas são devidamente comidas por Zizo, que “não tem
fastio”, numa espécie de banheira improvisada em um tanque de madeira. Seus
amigos suspeitam que ele coma até sua mãe, uma senhora simpática e pra lá de
liberal que costuma ceder o quintal de sua casa para as farras do filho e seus
amigos. Lá eles ficam totalmente à vontade para exercitar os prazeres da carne
em meio ao delicioso linguajar popular pernambucano, “visse”? Todos “com a
febre do rato”, evidentemente.
A narrativa fragmentada, apesar de linear, ganha muito com a
excelente atuação do elenco e com a profundidade psicológica dos personagens,
especialmente o de Eneida, moça mais sossegada e menos sugestionável que se
torna objeto de desejo mas resiste às investidas do poeta. Comê-la parece se
tornar uma obsessão para ele, que acaba esquecendo de suas velhinhas, coitadas.
Eneida (Nanda Costa), ao resistir, demonstra personalidade e com isso acaba
conquistando, aos poucos, não apenas o tesão, mas a admiração de Zizo, que fica
totalmente envolvido em suas provocações – como na excelente cena em que ela xeroca
partes de seu corpo e as deixa para servir como matéria-prima para uma obra de
arte.
Críticos babacas e público bunda-mole que pensa que cinema é
lugar pra comer pipoca e assistir televisão travestida de grande arte em
comédias globais torceram o nariz para a nudez despudorada e a sacanagem quase
explícita, anticonvencional até (convenhamos que não é nada comum vermos na
tela grande cenas de sexo com senhoras de idade, por exemplo) e, supostamente,
gratuita. Mas de graça é melhor, porra! Não entenderam nada. Até aí tudo bem,
em também não entendi muita coisa. Mas entrei totalmente no “clima”. E gostei.
Muito.
Claudio Assis é foda! Sou fã desse filho da puta ...
Febre do rato (2011),
de Claudio Assis.
Muito bom.
Raul - O Início, o
Fim e o Meio (2011), de Walter Carvalho, Leonardo Gudel e Evaldo Mocarzel –
Corajosa e emocionante cinebiografia (em forma de documentário) sobre Raul
Seixas, maior e mais popular expoente do rock brasileiro. Corajosa porque
sincera ao extremo: não foge de nenhuma polêmica, da já batida sobre se ele
haveria sido ajudado ou explorado por Marcelo Nova no fim da vida a uma suposta
paixão secreta nutrida por sua secretária particular, passando por sua
inconstância amorosa e pelo relacionamento sempre conturbado com o egocêntrico parceiro
de composição Paulo Coelho. Algumas passagens são muito engraçadas, como a do
depoimento de militantes de uma suposta sociedade secreta que reivindica Coelho
como ainda integrante de suas fileiras, para a surpresa do hoje famosíssimo
escritor (“pensei que a simples desistência tivesse sido suficiente, não sabia
que tinha que dar baixa em nenhuma carteirinha não”). As cenas (algumas raras)
de perfomances ao vivo são ainda, no entanto, o ponto alto do filme. Raul
Seixas no palco, no auge de sua forma física e mental, era nada menos que
arrebatador.
Já a decadência e a morte solitária foram tristes, muito
embora fique claro que aquele foi um caminho que ele mesmo escolheu. Em todo
caso, não deixa de ser irônico notar que o “maluco beleza” entrou em contradição
com uma de suas melhores letras e ficou, no ocaso da vida, “sentado no trono de
um apartamento (a não ser quando Marcelo nova o arrastava para algum show) com
a boca escancarada cheia de dentes (ele os havia perdido, mas um dentista
admirador fez questão de restaurá-los) esperando a morte chegar”.
A lamentar, apenas, a desnecessária presença constante na
tela do xarope do Pedro Bial ...
Excelente.
Luz nas Trevas – A
Volta do Bandido da Luz Vermelha (2012), de Helena Ignez e Ícaro Martins –
Helena Ignez tenta aqui emular, com relativo sucesso, o estilo de seu falecido companheiro,
Rogério Sganzerla, diretor do clássico filme original, de 1968. Na pele do
bandido, agora, está Ney Matogrosso, que não é ator e deixa isso bem claro na
tela ao declamar, e não interpretar, suas falas. A fotografia é bonita,
colorida e saturada, e a narrativa, como não poderia deixar de ser, é
fragmentada e não linear, mas o roteiro é confuso (ok, o original também era) e
a maioria dos personagens é caricata. No final das contas, a impressão que fica
é a de que perdemos tempo vendo um pastiche modernizado do cinema novo. Valeu a
intenção de colocar em prática um projeto inacabado do ex-marido, mas de boas
intenções, todos sabemos, o inferno está cheio.
Fraco.
O Ditador (2012), de Sacha
Baron Cohen – Ele conseguiu de novo: “O Ditador” é bem superior a Bruno e
disputa pau a pau com “Borat” o título de “filme mais engraçado que eu já vi em
toda a minha vida” (que me perdoe o Monty Python e seus fenomenais “A vida de
Brian”, “O Cálice Sagrado” e “O Sentido da vida”, que me fizeram literalmente
passar mal de tanto rir nos anos 80). Além de ser divertidíssimo, “O Ditador”
faz também críticas certeiras às diferenças culurais, à frivolidade da
sociedade de consumo de massas e à política externa norte-americana – o
discurso final, supostamente “exaltando” a democracia do tipo ocidental (que
não passa, na maioria das vezes, de desculpa para a exploração econômica dos
países “libertados”), me lembrou o clássico de Chaplin, “O Grande ditador”.
Coisa de gênio.
Excelente.
Batman - O Cavaleiro
das trevas ressurge (2012), de Christopher Nolan - Não faço parte do time dos detratores do
diretor Christopher Nolan, mas reconheço que ele é, frequentemente,
pretensioso. Algumas vezes sua pretensão se justifica, como em “Amnésia” e “A
Origem” - muito embora neste último a insistência em tentar explicar a trama
durante o decorrer da projeção irrite. Noutros, não. É o caso de “Insônia”,
“thriller” morno estrelado por Al Pacino, e de sua suposta “trilogia” do
Batman. Aqui, fica claro que Nolan foi convocado para dar credibilidade a mais
um blockbuster acerebrado feito para distrair o público consumidor entre uma e
outra postagem em redes sociais via celular acompanhadas de doses cavalares de
pipoca e refrigerante – com embalagens personalizadas, evidentemente.
Na primeira metade do filme a história se arrasta sonolentamente
para quem não está a fim de tentar entender a trama artificialmente rebuscada
que os roteiristas tentam nos vender até que a ação comece pra valer quando
Bane, o vilão – que foi retratado de forma bem mais assustadora e convincente que
nos quadrinhos, admitamos - finalmente coloca seu plano em prática: uma espécie
de “rebelião popular” confusa que não se decide entre a justiça social e a
vilania pura e simples. Com esta
premissa, o filme poderia resvalar numa apologia conservadora à ordem (que
ordem?) vigente, mas na verdade fica em cima do muro: em certos momentos dá a
entender que os autores entendem e concordam com as motivações dos “rebeldes’,
mesmo que não aprovem seus métodos, mas ao mesmo tempo precisam demonstrar
simpatia pelo “mocinho”, um playboy bilionário semi-fascistóide e meio
esquizofrênico que aplaca a raiva pelo assassinato de seus pais com uma cruzada
contra o crime que, convenhamos, na “vida real” (ou num mundo sem
“supervilões”) teria poucos resultados práticos.
Dito isto, resta dizer que a mulher gato é realmente uma
gata e fica um tesão quando uniformizada e pilotando a moto emprestada pelo
Batman. Os veículos, por sinal, têm designs bonitos e estilosos, mas sua
aerodinâmica é um tanto quanto inverossímel – o que é um problema, já que a
idéia é produzir uma versão realista das Histórias em quadrinhos.
Chato.
O vingador do Futuro
(2012), de Len Wiseman – Visualmente bem cuidada refilmagem do clássico de
1990 que peca por apostar numa abordagem superficial excessivamente centrada na
ação ininterrupta. Algumas das principais premissas do original são mantidas e
servem como ponto de partida para uma nova aventura com algumas boas novas
idéias, como a do gigantesco elevador que transporta as pessoas de um ponto ao
outro do planeta através do centro da terra. Já o visual “retrô” do mundo
futurista, embora impressione, é demasiadamente decalcado de Blade Runner, e as
interpretações são fracas, seja por incompetência do elenco (no caso feminino),
seja pela pouca profundidade dos personagens, caso dos protagonistas
masculinos. Bryan Cranston, excepcional ator que estrela a cultuada série Breaking
Bad, está particularmente irreconhecível, desperdiçando talento como um vilão caricato.
Há duas homenagens à obra original: uma bem sacada, que faz
referência ao disfarce que Schwarzenneger usa para viajar para Marte, e outra
desnecessária e sem sentido, já que nesta nova versão não existem mutantes.
Em todo caso, funciona bem como diversão escapista, sem
maiores pretensões.
“Márromeno”
O vingador do Futuro
(1990), de Paul Verhoeven – Devo admitir que nunca fui exatamente fã deste
filme, muito embora o considere bastante divertido. A estética “kitsch” do
figurino e da maquiagem e as péssimas atuações de Schwarzenneger e Sharon Stone
incomodam, mas são compensadas pelas boas perfomances dos atores que
interpretam os vilões – especialmente o mutante que se revela um traidor. Além
disso, tem um bom ritmo, é bem dirigido e cheio de boas idéias (nem todas
originadas na mente do genial Phillip K. Dick, já que o filme é apenas
parcialmente inspirado em um de seus contos). Os efeitos especiais e a
imaginação do futuro são em geral caprichados, muito embora algumas idéias
estejam ultrapassadas e, aos olhos de hoje, acostumados à tecnologia digital,
pareçam um tanto quanto canhestas. Isto não é, no entanto, necessariamente um
defeito, muito pelo contrário: é sempre curioso notar como os produtores
acertam ou erram em algumas de suas previsões para o desenvolvimento da
tecnologia.
Bom.
Sombras da noite
(2012), de Tim Burton – Primeiro filme realmente ruim que eu vejo de
Tim Burton – antes deste, só não havia me divertido com “peixe grande”, que
achei bem chatinho. É uma adaptação de uma novela de TV com um Johnny Depp
pouco inspirado fazendo o papel de um vampiro deslocado no tempo e no espaço às
voltas com o “progresso” capitalista e uma família disfuncional. Nada funciona:
os diálogos não ajudam, os atores não rendem, a maioria das piadas não têm
graça, o argumento é fraco, o ritmo é lento e o roteiro é “truncado”. Mantenha
distância, mesmo que você seja fã .
Ruim.
Ed Wood (1994), de
Tim Burton – Para compensar a decepção com a nova produção, revi esta que
talvez seja sua obra-prima. Nem lembrava mais o quanto é divertida esta
cinebiografia de Edward D. Wood, Jr., considerado por muitos o pior diretor de
cinema de todos os tempos. Aqui, tudo funciona: a reconstituição dos cenários
das produções originais é primorosa, Depp está perfeito e a premiada
interpretação de Bela Lugosi por Martin Landau não é nada menos que fenomenal.
Até o elenco de apoio é soberbo, valorizado pela inusitada “fauna” que
gravitava em torno do sempre entusiasmado realizador.
Obrigatório.
Prometheus (2012), de Ridley Scott – A trajetória do
diretor Ridley Scott sempre foi cheia de altos e baixos – mas seus altos são
bem mais altos que os baixos: não
esqueçamos que se trata, aqui, do homem que trouxe ao mundo Blade Runner, uma
das maiores obras-primas da história da sétima arte. Seu passado o credencia,
especialmente, para a ficção científica, por isso foi grande a expectativa em
torno deste “prequel” da série Alien – ainda mais porque H.R. Giger estava de
volta à equipe criativa.
Não me decepcionei, muito embora não tenha vibrado a cada
frame. Me diverti com esta estilosa “sci-fi de horror sobre violações e
fecundações” (Marcelo Hessel, no Omelete), apesar das idéias recicladas – caso
do robô que todos pensam ser humano - e do visual derivativo - neste caso, previsível,
já que o filme se insere dentro de uma franquia.
Bom.
Na Estrada (2012), de
Walter Salles – Poucas vezes vi um filme vir à luz cercado de tanta
expectativa negativa quanto esta produção do brasileiro Walter Salles baseada
no clássico beat de Jack Kerouac. Era de se esperar, já que se trata da
adaptação de uma obra cultuada há décadas e tida como de difícil transposição.
Esperava pouco (ou nada), mas fui conferir. Talvez
justamente por esperar tão pouco, até que gostei. Não comecei gostando, mas fui
prazerosamente recordando dos trechos do livro representados na tela ao longo
da projeção, e isso foi bom. O fato de eu ter gostado mais de lembrar do livro
do que do filme em si, no entanto, diz muito sobre o resultado final:
burocrático. Mas não chato – pelo menos não da metade para o final – e até aí, na
verdade, a película foi fiel à escrita, já que acho os trechos da obra que se
passam entre os intelectuais de classe média de Denver chatíssimos. Mais importante:
gostei do cara que interpretou Dean Moriarty, o verdadeiro protagonista e fio
condutor da história. Não é nenhum Dennis Hopper (que eu acredito que teria sido
perfeito para o papel), mas deu para o gasto, digamos assim.
Já Marilou (Kirsten
Dunst, “safadénha”)apenas faz cara de paisagem e trepa com Dean e com o Sal
Paradise de Sam Riley, que é meio “banana”; mas Marilou, no livro, também
passava o tempo todo trepando - ou
masturbando – seus companheiros de viagem e Jack (os nomes são fictícios, mas
baseados nos personagens reais) ficava realmente meio apalermado diante da
presença magnética de Dean/Neal Cassady. Ele e quase todos os que “comiam na
mão” do adorável cafajeste, com uma notável exceção para o irrascível Old Bull
Lee (William S. Burroughs), muito bem incorporado por Viggo
Mortensen.
Vale notar, também, que o filme é mais baseado nos
manuscritos originais do que na redação final, o que o torna bem mais explícito
e libidinoso quando assunto são sexo e drogas, escancarando o fato de que o
comportamento daqueles caras era certamente “avançadinho” demais para os anos
50 pré-revolução sexual e comportamental. Estavam, sem sombra de dúvidas, à
frente do seu tempo – não por acaso influenciaram boa parte da cultura “pop”
que explodiria em sons e cores e sensações nas décadas seguintes.
Bom.
Valente (2012), de
Mark Andrews e Brenda Chapman – com “Valente”, infelizmente, a Pixar,
genial produtora de animação que renovou o gênero na década de 90 com ousadia e
inovação, se rendeu aos ditames de sua atual proprietária, a toda-poderosa
Disney. Não que seja ruim, é divertido, mas muito, muito convencional. De
impressionante, mesmo, só o resultado que os caras conseguiram com os cabelos
vermelhos cacheados da protagonista – todos sabem que a animação dos fios de
cabelos era (parece que não é mais) um dos principais desafios das equipes de
produção das animações digitais ...
Bom (pendendo para o razoável)
A Invenção de Hugo
Cabret (2012), de Martin Scorcese – Perdi de ver no cinema e em 3D esta
nova produção do mestre Scorcese. Me arrependi amargamente ao ver a reprodução
das filmagens dos clássicos de Georges Meliés – na sala escura, com a nova
tecnologia, aquilo ali deve ter sido de encher os olhos! Para além deste
aspecto visual, no entanto, o filme em si também é bom. Conta a história de um
garoto que perde os pais e fica sujeito à tirania de um tio bebum que o força a
trabalhar acertando os relógios de uma estação de trem. Sacha Baron Cohen está
no elenco como um personagem careteiro e caricato, mas se sai bem assim mesmo.
Bom.
Iron Sky (2012), de
Timo Vuorensola – Conheci esta interessante película que trata de uma
invasão futurista da terra por nazistas alojados desde o final da segunda
grande guerra no lado escuro da lua através do Facebook da bandas eslovena
Laibach, responsável pela trilha sonora. Que eu saiba, não foi lançada nem tem
previsão de lançamento no Brasil, mas existe uma coisa maravilhosa chamada
internet na qual pessoas com inteligência e paciência suficiente para decifrar
seus caminhos encontra praticamente tudo aquilo que quiser. Tenho uma pessoa
assim morando lá em minha casa, por isso pude assistir, em boa qualidade,
legendado e no conforto do meu lar, esta co-produção finlandesa, alemã e
australiana.
Confesso que me decepcionei. Começa muito bem, com astronautas
norteamericanos a serviço da reeleição da presidente Sarah Palin (???!!!) sendo
atacados pelos chucrutes do espaço em pleno satélite terrestre, mas evolui para
um pastelão digno das mais fanfarronas produções hollywoodianas. Nem a trilha
sonora do Laibach, do qual sou fã, impressiona.
Razoável.
Contra o tempo (2011),
de Duncan Jones – Segundo filme do talentoso diretor que muito
provavelmente será conhecido para sempre como “o filho de David Bowie”. Não é
tão bom quanto “Lunar”, seu projeto anterior, mas é bastante divertido – e
movimentado. Para além de alguns problemas de coerência um tanto quanto
primários (que a mim, no entanto, muito pouco incomodaram), é muito bem
dirigido e mantém o suspense até o final, mesmo que se passe basicamente em
apenas três ambientes. Acompanha as idas e vindas de um soldado que faz parte
de um programa experimental do governo para investigar um atentado terrorista,
numa trama complexa envolvendo viagens no tempo e incorporações em mentes
mantidas em animação suspensa.
Bom.
Lena (2011), de
Christophe Van Rompaey – Lena é uma adolescente gordinha e solitária que,
surpreendentemente, passa a se relacionar amorosamente com um rapaz bonito e
popular – mas de comportamento suspeito. Para fugir de sua mãe neurótica e
repressora, ela vai morar com o namorado, que divide a casa com seu pai, um
homem de meia-idade recluso e apático. Aos poucos, ela consegue inclusive
corrigir os desvios de caráter de seu jovem amante, mas a vida é injusta: algo
de muito errado vai acontecer naquela casa! Suas tentativas desesperadas de
contornar o problema só fazem piorar a situação, num efeito “bola-de-neve” que
vai passar por cima de todos feito um moedor de carne e culminar num final
surpreendente e devastador.
Dramático, apesar da narrativa um tanto quanto fria e
distante.
Bom.
Eu Matei a minha mãe
(2009), de Xavier Dolan – Como eu disse lá atrás, tenho em casa uma pessoa
que, quando dá na telha, vasculha a internet em busca de filmes e sempre
encontra algo diferente e interessante pra gente assistir. É o caso desta
produção canadense cometida pelo jovem e talentoso Xavier Dolan, de quem eu,
confesso, nunca havia ouvido falar! Mostra os conflitos de um adolescente gay
histérico com sua mãe que, ora bolas, é apenas uma mãe convencional, nada
demais – não é, no entanto, como a mãe de seu namorado, liberal ao ponto de
trazer namorados da idade do filho para casa, além de deixá-los se trancar no
quarto sozinhos e fumar maconha à vontade. Não é nenhum supra-sumo da sétima
arte, mas é estiloso, engraçado e dramático – neste último caso, às vezes, até
demais ...
“Com um enredo simples, o diretor Jens Lien consegue fazer
uma feroz crítica à nossa sociedade consumista e desalmada. As normas sociais
seguem padrões que devem ser seguidas por todos. Quem tentar uma abordagem
diferente, andar com suas próprias pernas e segundo suas próprias crenças, é
instantaneamente deletado da comunidade. (...) Vivemos numa época de
aparências, do falso-sentir, muito bem demonstrado em diversas cenas, inclusive
a que abre o filme, excelente e impactante. É a geração Micareta-Facebook. “
“A fotografia, escura e banhada com tons de cinza e azul,
trabalha em conjunto com a falta de expressão das faces dos moradores da cidade
para mostrar o quão triste e sem sentido pode ser uma existência como esta.
Impossível, nem que seja por um minuto, repensar suas atitudes e sua forma de
levar a vida. Será que vale a pena ser neurótico com a decoração de sua casa,
assim como a mulher de Andreas? Será que os sorrisos forçados do dia-a-dia são
realmente necessários? Até que ponto você está sendo feliz apenas para os
outros?”
Excelente
Garotas do ABC
(2003), de Carlos Reichenbach – “samba do crioulo doido” pessimamente
dirigido pela lenda do cinema marginal brasileiro Carlos Reichenbach,
recentemente falecido. Nunca tinha visto nenhum filme dele e tentei começar a
tirar este atraso no calor da emoção por seu passamento, mas parece que comecei
com o pé esquerdo ...
O filme conta a história de operárias de uma indústria
têxtil do ABC paulista, dentre elas uma mulata pra lá de gostosa (que aparece
fazendo um streap tease logo na cena inicial, muito bem filmada, diga-se de
passagem) que se envolve com um neonazista retardado (olha a redundância) que
se dedica a praticar atentados contra negros e nordestinos. As interpretações
são péssimas, os personagens psicologicamente vazios e/ou confusos e o filme se
perde em cenas que retratam situações ora ridículas, ora com algum potencial
inovador que, no entanto, não se concretiza (por aparente incompetência do
diretor, muito preso a maneirismos ultrapassados), como as que mostram uma das
trabalhadoras da fábrica que parece sentir prazer com os pequenos acidentes de
trabalho que sofre e deixam marcas em seu corpo, pois estes, além de garantir
um bom dinheiro a título de indenização, a deixam mais próxima do patrão, por
quem é secretamente apaixonada.
Bom mesmo, como sempre, só Selton Melo, que tenta - sem
sucesso - tirar leite de pedra na pele do mentor intelectual da gangue
neonazista.
Curiosamente, é bem mais interessante assistir ao filme com
o áudio de comentários do diretor, no qual ele esmiúça alguns detalhes técnicos
e conceituais que dão uma boa idéia de sua erudição e gênio criativo – claro,
não gostei nem um pouco deste “Garotas do ABC”, mas boto fé que esta é uma obra
menor do Carlão, tido por muitos como mestre do “cinema de autor” da Boca do
lixo. Preciso ver seus outros filmes, urgentemente ...
Ruim.
Reino de fogo (2002),
de Rob Bowman – Curioso como nossa percepção das coisas depende, em grande
parte, de nosso estado de espírito no momento: lembro que me diverti bastante
ao ver este filme no cinema na época do lançamento, tanto que, ao ver o DVD a
um preço camarada numa loja de departamento, o adquiri para tê-lo em casa.
Demorou 10 anos até que eu finalmente “descabaçasse” o disquinho, e eis que a
tão empolgante aventura futurista que mostra o mundo dominado por dragões cuspidores
de fogo se revela não mais que uma boa sessão da tarde. Os efeitos especiais
são bons, a premissa é interessante e os monstros são convincentes, mas o
roteiro, as interpretações e o desenvolvimento psicológico dos personagens
deixam muito a desejar. Boa, mesmo, só a cena que mostra “Star Wars” como um
mitológico conto de fadas encenado de forma mambembe num teatro improvisado e,
ainda assim, deixa a garotada fascinada.
Fraco.
Um Plano simples
(1998), de Sam Raimi – Pequena obra-prima magnificamente dirigida por Sam
Raimi antes de seu mergulho no mundo das adaptações arrasa-quarteirão
hollywoodianas de quadrinhos de super-heróis. Conta a história de três caipiras
norte-americanos que se deparam com 4 milhões de dólares num avião caído no
meio de uma floresta congelada cheia de corvos. A discórdia, evidentemente, se
instala, já que entre os 3 não há uma idéia clara do que fazer com o dinheiro,
a princípio, ou de como se apoderar da fortuna sem levantar suspeitas,
posteriormente. O personagem de Bill Paxton é o mais “certinho” e o que mais
tem a perder (tem um emprego estável e sua mulher está grávida do primeiro
filho), mas aos poucos vai cedendo a uma
espiral de ambição que o levará a tomar atitudes drásticas impensáveis para um
pacato cidadão de uma pequena cidade do Minnesota.
Excelente.
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