sábado, 24 de dezembro de 2011
Dean Moriarty
Fui apresentado recentemente, através da leitura do clássico “on the road”, a Dean Moriarty, um daqueles personagens eternos e fascinantes que povoam a história da literatura mundial, digno de ocupar o mesmo panteão onde estão Ahab, de “Moby Dick”, Raskólnikov, de “crime e castigo” e a nossa Emilia, do “Sítio do Pica-pau amarelo”, dentre outros. Baseado na figura real de Neil Cassady, escritor "beat", ele é o rolo compressor incansável atrás do qual está sempre o autor da narrativa, Jack Kerouak, aqui atendendo pela alcunha de Sal Paradise.
Lendo o livro, uma pergunta não me saía da cabeça: Como diabos não fizeram ainda um filme adaptando esta história? O papel de Dean Moriarty já teria um dono certo, a meu ver: Dennis Hopper. Era a imagem dele que me vinha a mente sempre que o texto discorria sobre aquele maluco sedutor irresistível que todos sabiam ser um canalha mas quase ninguém conseguia odiar, ou mesmo evitar. Uma daquelas pessoas que possuem uma personalidade magnético em torno da qual gravita um séqüito de seguidores devotados, e o mais célebre e devotado deles era, justamente, Jack kerouak/Sal Paradise.
Tarde demais: Hopper já morreu. Mas os planos de uma adaptação para o cinema seguem vivos, desta vez num projeto confuso que está nas mãos do cineasta brasileiro Walter Salles. Reza a lenda que as filmagens já terminaram e o filme entrará em cartaz no ano que vem. No papel de Dean, um tal de Garrett Hedlund. Sua namorada (e amante de Sal), Marylou, será vivida por Kristen Stewart, a “Bela” da saga Crepúsculo. Seja lá o que Deus quiser ...
“On the road”, que recebou o subtítulo “pé na Estrada”, no Brasil, é um relato das viagens do alter ego de seu autor pelas rodovias norteamericanas no final dos anos 40 e início dos anos 50. Tudo gira em torno de Dean, pelo qual Sal, o narrador, é absolutamente fascinado. É Dean que o tira da letargia da vida pacata e monótona de classe média na costa leste para cair na estrada, sempre rumo ao oeste, do atlântico ao pacífico, à toda velocidade em carros possantes nem sempre adquiridos de forma legal – Dean é um ladrão habilidoso. É também um louco, que não hesita em abandonar seus amigos e companheiras nas piores situações quando lhe dá na telha, para reaparecer do nada algum tempo depois e voltar a seduzi-los com a promessa de novas aventuras. É assim durante toda a narrativa. Dean Moriarty parece incansável, e Sal Paradise está sempre na sua cola.
Não foi assim na vida real, evidentemente. Chegou uma hora em que Kerouac, aparentemente, cansou. Normal: (quase) todo mundo cansa. De tudo. Cansou da estrada e de tudo o que sua célebre obra-prima literária provocou: uma verdadeira revolução comportamental que culminou no verão do amor hippie e, posteriormente, no niilismo da “geração x”, aquela que não tinha futuro. Desiludido e solitário, foi morar com a mãe em Long Island. Sob a influência da matriarca, o vigor deu lugar ao cansaço e o escritor que inspirou os loucos e rebeldes de todo o mundo (ocidental, principalmente) revelou-se um católico conservador resmungão cuja vida resumia-se a sentar no sofá o dia inteiro assistindo a programas de auditório pela TV. Morreu cedo, aos 47 anos, na Florida, para onde se mudou com a última esposa e a mãe.
Já Neal Cassady eu não diria que "cansou", mas certamente tentou, em vários momentos, atender aos apelos de suas companheiras e levar uma vida mais sossegada, mais equilibrada, mais responsável, enfim - afinal ele tinha filhos para criar. Mas nele o apelo da estrada parecia ser mais forte, portanto continuou sua saga alucinada e chegou a se unir, nos anos 60, aos célebres Merry Pranksters, um grupo de amigos que percorria os Estados Unidos divulgando seus experimentos com LSD. Morreu em 1968, em decorrência de uma mistura fatal de drogas e álcool, logo após sair de uma festa de casamento.
por Adelvan
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Um comentário:
Bukowski o conheceu alguns dias ou semanas antes de sua morte e escreveu algo bem interessante sobre isso em "Notas de um velho safado"...
"Todas aquelas viagens, todas aquelas páginas de Kerouac, todas aquelas prisões, para morrer sozinho sob uma gélida lua mexicana, sozinho, vocês compreendem? Será que vocês não são capazes de ver os miseráveis e insignificantes cactos? o México não é um lugar terrível simplesmente porque ele é oprimido. será que vocês não são capazes de ver os animais do deserto observando? os sapos comuns e as intanhas?, as serpentes como nacos das mentes dos homens rastejando, parando, esperando, surdas sob surdas luas mexicanas. répteis, coisas se mexendo rapidamente, olhando para esse cara de camiseta branca na areia.
Neal, ele encontrou o seu lance, não machucou ninguém. o garoto durão que andou pelas prisões no chão ao longo de uma ferrovia mexicana.
a única noite que eu o encontrei eu disse “Kerouac escreveu todos teus outros capítulos. eu já escrevi teu último.”
“vai fundo,” disse ele, “escreva”"
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