Estava de bobeira numa livraria agora há pouco quando me deparo com um emocionante depoimento da presidente Dilma Roussef sobre as torturas que sofreu durante a Ditadura Militar. Está publicado na contracapa do livro "Não passarás o Jordão", de Luiz Fernando Emediato. Me comovo com relatos sobre a tortura. É algo que nem consigo imaginar acontecendo comigo, pois a dor deve ser indescritível. Não sei se suportaria. Considero cada um que tenha passado por isso e sobreviveu para contar a História de forma lúcida, sem perder a sanindade, um herói. Meu eterno respeito.
Na internet achei o interessante artigo abaixo que contém trechos do depoimento que li na contracapa do livro:
Reportagens publicadas nos jornais "Correio Braziliense" e "Estado de
Minas" deste domingo (17) e segunda-feira (18) mostram detalhes de
sessões de tortura pelas quais passou a presidente da República, Dilma
Rousseff, em Minas Gerais, durante a ditadura militar. Segundo os jornais, os detalhes foram revelados pela presidente em
outubro de 2001, durante depoimento ao Conselho Estadual de Direitos
Humanos (Conedh-MG), criado para indenizar presos políticos torturados
no estado.
Em 2002, ela foi indenizada em R$ 30 mil pela tortura sofrida. Em maio último, foi informado que a presidente seria indenizada também em R$ 20 mil
pela tortura sofrida no Rio. A Presidência informou que o valor seria
doado ao Grupo Tortura Nunca Mais. Também em maio, a presidente deu
posse aos integrantes da Comissão da Verdade, que vai apurar violações aos direitos humanos cometidas entre 1946 e 1988, período que inclui a ditadura militar.
No depoimento dado à comissão mineira, a presidente, que na época era
secretária de Minas e Energia no Rio Grande do Sul e filiada ao PDT,
contou que levou vários socos no maxilar durante as sessões de tortura
em Juiz de Fora no início dos anos 70. Os militares queriam saber
detalhes do funcionamento do Comando de Libertação Nacional (Colina),
grupo no qual Dilma militava.
"Minha arcada girou para o lado, me causando problemas até hoje,
problemas no osso do suporte do dente. Me deram um soco e o dente se
deslocou e apodreceu. [...] Só mais tarde, quando voltei para São Paulo,
o Albernaz (capitão Alberto Albernaz, do DOI-Codi de São Paulo)
completou o serviço com um soco, arrancando o dente", contou Dilma no
depoimento.
Àquela epoca, Dilma era conhecida como Estela - ela teve ainda outros
codinomes, como Vanda e Luíza. Ela narrou ainda que policiais tinham
interesse em saber qual seria o contato dela com Ângelo Pezzuti,
dirigente do Colina. "Eu comecei a ser procurada em Minas nos dias
seguintes à prisão de Ângelo Pezzuti. Eu morava no Edifício Solar, com
meu marido, Cláudio Galeno de Magalhães Linhares, e numa noite, no fim
de dezembro de 1968, o apartamento foi cercado e conseguimos fugir, na
madrugada. O porteiro disse aos policiais do Dops de Minas que não
estávamos em casa. Fugimos pela garagem que dá para a rua do fundo, a
Rua Goiás."
"Fui interrogada dentro da Operação Bandeirantes (Oban) por policiais
mineiros que interrogavam sobre processo na auditoria de Juiz de Fora e
estavam muito interessados em saber meus contatos com Ângelo Pezzuti,
que, segundo eles, já preso, mantinha comigo um conjunto de contatos
para que eu viabilizasse sua fuga. Eu não tinha a menor ideia do que se
tratava, pois tinha saído de BH no início de 69 e isso era no início de
70. Desconhecia as tentativas de fuga de Pezzuti, mas eles supuseram que
se tratava de uma mentira. Talvez uma das coisas mais difíceis de você
ser no interrogatório é inocente. Você não sabe nem do que se trata",
declarou a presidente ao conselho, de acordo com os jornais.
Dilma relatou ainda sessões de tortura com choque. "Não se distinguia
se era dia ou noite. O interrogatório começava. Geralmente, o básico era
choque. Se o interrogatório é de longa duração, com interrogador ‘experiente’,
ele te bota no pau de arara alguns momentos e depois leva para o
choque, uma dor que não deixa rastro, só te mina. Muitas vezes também
usava palmatória; usava em mim muita palmatória. Em São Paulo usaram
pouco esse ‘método’. No fim, quando estava para ir embora, começou uma
rotina. No início, não tinha hora. Era de dia e de noite. Emagreci
muito, pois não me alimentava direito", relatou.
Em outro momento, ela relata que sofreu hemorragia por conta da
tortura. "Quando eu tinha hemorragia, na primeira vez foi na Oban (…)
foi uma hemorragia de útero. Me deram uma injeção e disseram para não
bater naquele dia. Em Minas, quando comecei a ter hemorragia, chamaram
alguém que me deu comprimido e depois injeção. Mas me davam choque
elétrico e depois paravam. Acho que tem registros disso no final da
minha prisão, pois fiz um tratamento no Hospital das Clínicas."
De acordo com os documentos publicados pelos jornais, a presidente relatou momentos de solidão em que temia a morte. "O estresse é feroz, inimaginável. Descobri, pela primeira vez, que
estava sozinha. Encarei a morte e a solidão. Lembro-me do medo quando
minha pele tremeu. Tem um lado que marca a gente pelo resto da vida",
disse. "Tinha muito esquema de tortura psicológica, ameaças. Eles interrogavam
assim: ‘Me dá o contato da organização com a polícia?’ Eles queriam o
concreto. ‘Você fica aqui pensando, daqui a pouco eu volto e vamos
começar uma sessão de tortura.’ A pior coisa é esperar por tortura."
“Acho que nenhum de nós consegue explicar a sequela: a gente sempre
vai ser diferente. No caso específico da época, acho que ajudou o fato
de sermos mais novos; agora, ser mais novo tem uma desvantagem: o
impacto é muito grande. Mesmo que a gente consiga suportar a vida melhor
quando se é jovem, fisicamente, a médio prazo, o efeito na gente é
maior por sermos mais jovens. Quando se tem 20 anos o efeito é mais
profundo, no entanto, é mais fácil aguentar no imediato.”
"As marcas da tortura sou eu. Fazem parte de mim", relatou a presidente.
g1
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