

Comecemos do principio – Onde e quando você nasceu, e onde mora ?
Nasci aos 12 de Fevereiro de 1966, em Timbó (SC)... e moro em Indaial (SC), que é uma cidade vizinha.

Mesmo antes de aprender a ler, eu ganhava muitos gibis de um tio-avô que era guarda-noturno ( ele tinha que fazer alguma coisa entre as rondas, né?), então sempre havia algum gibizinho novo , especialmente Disney, Fantasma e similares.Depois, aprendi a ler... e é que nem água morro abaixo até hoje.
Já o desenho, desde que aprendi a rabiscar alguma coisa. Coisa de moleque mesmo. Mas, com mais interesse, lá pelos 11 ou 12 anos, na escola. E a fazer quadrinhos propriamente, seqüências, colocar as coisas no papel e tal, em 1981.Os fanzines, comecei a contactar o pessoal lá por 86, pra conhecer e ver qual era o esquema e tal. A primeira colaboração de fato, foi no jornal de rock CONTRACORRENTE (Brusque/SC), com ilustrações a ver com rock , obviamente. Uma festa pra quem nunca tinha visto algo underground. Depois , publiquei ilustrações no MANY COMICS (Bagé/Pelotas – RS) e HQs no LEGENDA (São Luis/MA) e HIPERESPAÇO(Sto.André/SP), tudo em meados de 1987. E assim foi indo... em 89, fanzines argentinos, e na década de 90, Portugal, Espanha, Finlândia, Croácia, USA, Alemanha... sem falar nos intercâmbios de exemplares de zines e tal , já que eu sempre gostei muito do hábito da correspondência, troquei muita figurinha com pessoas de quase toda a

Mas, apesar dos pesares, tamos aí...
Você desenha profissionalmente ou, apesar da inegável qualidade de seu trabalho, sempre teve esta atividade apenas como um Hobby ?
Hobby, somente. Eu curto desenhar ... e até acho que se fosse querer explorar isso comercialmente, iria até sentir-me meio “vendido”, mercenário, sei lá. É uma opinião pessoal unicamente voltada pro meu trabalho – EU, Henry Jaepelt, não me sentiria legal.
A tal “qualidade”- discutível - talvez seja devido a esse desinteresse comercial – você faz porque gosta, porque se diverte com essa atividade. Você desenha porque gosta de desenhar, experimenta visuais porque gosta de experimentar visuais... e não porque é “pago pra isso”. “Não me desce”, como dizem....

Imagino que você seja contemporâneo de alguns ícones dos quadrinhos brasileiros, como Mozart Couto ou Watson Portela – com este ultimo sinto uma afinidade maior no seu trabalho, especialmente com a série “paralelas”, do Watson (muito embora as semelhanças possam advir de influencias em comum entre os dois, notadamente a Metal Hurlant e quadrinho Europeu em geral, me corrija se estiver errado) – De qualquer forma, o quadrinho nacional influenciou de alguma maneira no seu estilo de desenhar ?
Não exatamente. Eu tenho 43... eles , claro, têm bem mais... e eu vi o trabalho dos dois surgir nas bancas e tal. Mas, com certeza , pelo fato desses camaradas mostrarem que se podia fazer alguma coisa diferente, em termos de HQ que este modesto rabiscador está aqui. A revista Spektro que me apresentou ao trabalho de Watson foi algo único e “ponto”. Toda a linha da Vecchi, com o surgimento da cena “faroeste”, com Chet (cujo nome me parece , deveria ser “Lester”, mas, a Editora, etc,etc,etc) e as conseqüentes outras revistas, toda a linha de terror/fc ... onde mais se fez isso? Grafipar, claro... mas o pontapé inicial foi lá na Vecchi.

Mozart Couto, conheci o trabalho um pouco depois. ]
De qualquer maneira, fui influenciado pelo quadrinho nacional , da ótima safra que tivemos naquela época, com Vecchi e Grafipar, principalmente. Foi o estopim, aquilo que me fez ver que tinha jogo ali, entendes?
E hoje, o que temos??????
Como e quando você entrou em contato pela primeira vez com o universo dos fanzines ? Você faz ou fez fanzines ou apenas colaborava com as publicações de terceiros ?
Está meio que respondido anteriormente a parte dos contatos e tal. Fanzines, fiz também... em 88 , Cidno da Silva Rego ( carioca radicado em São José/Floripa/SC) , Paulo César Will ( de São José/SC) e eu lançamos o primeiro CRAU!. Tinha 36 páginas. Em 89, acrescidos do Paulo Aloísio Priess ( Blumenau/SC) foi lançado o CRAU! II , com 80 páginas... o III saiu mais para colaboradores em 91, com 136 páginas. Tudo meio-ofício , hqs de humor, poéticas, protesto contra algumas babaquices da hq “nacional”, punk, heavy Metal, experimentações em geral, desde a primeira edição. A coisa começou meio que por acidente, Cidno quis fazer uma entrevista ao vivo, com gravador, numa das visitas minhas à casa dele, aí tava lá também o Will, o Daniel HDR (Porto Alegre/RS) entre outros aficcionados de hq de floripa e região... fizemos a entrevista e aí veio a idéia etc e tal.

As publicações “de terceiros”, como você deve se lembrar, colaborei com quase qualquer coisa que tenha sido lançada. Com o detalhe de ser sempre algum material inédito – sem replay de hqs e ilustrações. Os repetecos, me parece, jogam contra o investimento do editor do zine, que gasta uma puta grana e depois vê aquilo que ele lançou em dois ou três OUTROS zines... pô, meio besta , isso, não???
Cite alguns dos fanzines que, no seu ponto de vista, marcaram historia – aproveitando, faça um breve histórico de sua relação com o mundo dos fanzines, como você viu a evolução desse tipo de publicação através do tempo, e como ela se encontra hoje – os fanzines de papel tendem a desaparecer com o advento da internet ?
Citar zines? Rapaz, essa é fogo. Não posso preferir esse ou aquele. Eu gosto de quase tudo onde colaborei... fica bem sem graça esse lance, hein?Em geral, os zines que circulavam em finais dos anos 80 e até a metade da década de 90 eram mais especiais, e você fez parte dessa cena, sabe disso muito bem: todos foram importantes, pois contribuíram para uma cena que era FORTE e tinha PERSONALIDADE. Vou citar um sobrevivente, o TCHÊ, que está na ativa desde 1987, eu fiz a capa do número 1 e ainda hoje o Denílson lança alguma coisa.

É uma opinião meio negativista, mas, eu acho que não perdemos... ganhamos! Ganhamos em comodismo, em falta de garra, em desânimo... e a mediocridade cuidou do resto. Como diz aquela frase “Os idiotas ainda dominarão o mundo...por uma simples questão de superioridade numérica”. Não tenho respostas, mas um monte de perguntas que incomodam....
Talvez as coisas como nós as conhecemos naquela época, realmente desapareçam por completo dentro de mais alguns anos ( ou meses). Zine na Internet? Pode até ser... quem sabe?
Você se lembra do cheiro dos gibis da RGE... ou o cheiro dos dos gibis da Epopéia Tri, da EBAL? Eu lembro... mas, a internet e internautas em geral sequer desconfiam do que diabos eu esteja falando...
Realmente, eu não sei o que virá.... algo há de vir... mas, não sei o que é...nem se gostará de nós...

Há quem diga que é inexistente. Se existisse algo mais nos moldes da Grafipar, talvez eu até fizesse alguma coisa. Mas, “pra ganhar dinheiro”, dificilmente. Tenho uma complicação com essas coisas. Fazer imitações de modelos ianques consagrados, não mesmo. Publiquei três adaptações de letras de Heavy Metal na Rock Brigade, em 1991. A primeira aparição foi a de “CAN I PLAY WITH MADNESS” do Iron, que fiz em 88 pra um zine lá de Três Coroas/RS, cuja capa anterior lembrava o Piece of Mind ...e aproveitei o gancho pra inventar alguma coisa a respeito. Veio a idéia de adaptar ao meu modo aquela letra. Então, em 91 por acaso enviei aquela hq pra revista, só por enviar. Quiseram publicar, e assim, fiz ALTERED STATE ( Sepultura) e BLOOD RED (Slayer)... e não recebi nada por isso, já que envolvia uma puta burocracia de direitos autorais etc. Mas, ficar meio que eternamente atrelado a “adaptações” e pegar carona numa banda conhecida etc e tal... optei por não dar continuidade e esses trabalhos. E a revista , na pessoa do FSF, com quem conversei, troquei cartas e etc, sempre se mostrou muito cordial e tal, apoiou o lance dos quadrinhos e assim por diante. Eu que preferi não continuar.
Aproveitando o gancho da Rock Brigade, sinto que seu trabalho é muito ligado à musica. Que tipo de musica você ouve ? quais suas bandas favoritas ? Toca algum instrumento ? Já tentou enveredar pelo campo da musica ou fez parte de alguma banda ?

Apesar de ter um ouvido mais ou menos treinado pra algumas coisas, nunca tentei aprender nenhum instrumento, logo também nunca tive banda, nem nada. Mas, talvez até tivesse feito isso, se o desenho não fosse mais prático ( e barato) naquela época...
Recentemente vimos mais uma vez mais uma editora (Pixel Media) se propor a publicar material mais adulto e de qualidade no Brasil e, mais uma vez, morrer na praia deixando séries importantes incompletas. Você vê alguma possibilidade de, um dia, haver uma consolidação do mercado de quadrinhos mais direcionado ao publico adulto no Brasil ?
Possibilidades.... bom, o mercado e o consumidor desse mercado (HQ) em nosso país é extremamente focado. A grana que esse mercado sugere seduz muita gente – e é uma boa grana – então, a praticidade envolvida é decisiva. Gosto muito do material publicado pela Pixel... são autores que enxergam outras possibilidades, outras formas, vêem um mundo mais complexo e rico...e tentam enveredar por ele. Por isso, a gente gosta. Mas, é algo restrito a alguns poucos teimosos e obstinados apreciadores do gênero... não somos “consumidores” propriamente, não no sentido mais faminto do termo. Consumimos essa linha editorial, com toda certeza... mas, somos minoria. Isso até nos distingue na multidão, com certeza.... somos aqueles malditos sujeitos que perguntam “por que?” , “não tem outro jeito?”... incômodos pra cacete.
Essa consolidação é também uma revolução. Principalmente, porque não há alternativas. O cara quer se dar bem com HQ, vai desenhar pra fora... nunca pensaram , por exemplo, em investir numa linha editorial brasileira, com temas da nossa realidade ... e VENDER esse material lá fora, se não der aqui dentro. O jogo inverso. Fazer hq nacional pra vender aqui dentro, dá pra ver que é arriscado... o jogo dos gringos é fazer, vender no mercado interno deles e EXPORTAR. É óbvio o que nós temos que fazer....
Mas, temos algum PRODUTO? Analisando do ponto de vista “empresa”... temos que ter um produto, qualidades, matéria-prima, exportar, atender outros mercados.... expandir horizontes, ver outras possibilidades...
Só que não se pensa dessa maneira.... então, continuam as dificuldades...
A única saída para o quadrinista brasileiro é o aeroporto ? – No caso não especificamente o aeroporto, mas buscar o reconhecimento no exterior, já que com o desenvolvimento das novas ferramentas de comunicação o profissional pode produzir em casa e enviar seu trabalho para fora tranquilamente e a baixo custo.
Esse mercado que nós temos sugere bem isso mesmo.
O que você anda fazendo, relacionado à sua arte, no momento ? Colabora com alguma publicação ou site ?
Bem pouca coisa. Faço mesmo o que me dá vontade e quando tenho um tempo legal pra fazer a coisa com capricho. Colaboro com quem queira que eu colabore e que respeite o meu trabalho... ontem, hoje... enquanto der. Basta entrar em contato.
Você se arrisca ou já se arriscou alguma vez por outros ramos das artes plásticas, como pintura a óleo, em tela, escultura ou coisas do tipo ?
Só uns trabalhos com aquarela... bem pouca coisa. Penso em desenvolver isso... preciso ter algo pra fazer na aposentadoria, não? O único problema é o tamanho das telas... teriam que ser meio grandinhas e teriam esses temas que você já sabe... talvez até fosse algo legal, tipo pôsters, camisetas... sei lá. Mas, você sabe: pintores só ficam valorizados depois que morrem... quem sabe?
Planos para o Futuro ?
Nada muito ambicioso. Estou organizando umas coisinhas pra fazer... voltando a trocar idéias com muita gente, inclusive pessoas que não tinha contato há uns 15/20 anos... reciclando. E jogando conversa fora com essa turma.
Muito obrigado por sua atenção e fique a vontade para suas considerações finais.
Valeu... sempre é bom falar alguma coisa. Corremos o risco de alguém ler /ouvir e passar a ter novas idéias, quem sabe até salvar a lavoura do mercado de hq.... hehheheheheh
pr Adelvan Kenobi