tag:blogger.com,1999:blog-47935366581091665602024-03-05T20:04:49.568-08:00escarro napalm escarro napalmAdelvan Kenobihttp://www.blogger.com/profile/06307759808605250885noreply@blogger.comBlogger621125tag:blogger.com,1999:blog-4793536658109166560.post-59396812269515004002023-03-27T15:50:00.001-07:002023-08-03T16:56:24.797-07:00Radio gaga<p><span style="font-size: 18pt;"></span></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: justify;"><span style="font-size: 18pt; text-align: left;"><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEidOFve5v4kxJDF0bRarTSeq-Z6xJQNbvDx5SACv2-O_uvfR87QltZRbTx5gC19UZyi0NrXA3IO7HxY417El08SxlVzJwFUYtGImhIgTZhsLFjGrmabRNCEbtoV0wmKmt7xuBU84muSUnRMYU0FwjV847Z86mAgD-fujAgrKoGytbMlJyciT4E3-F-OuEbA/s933/microfone.radio0709201436%20(2).jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" data-original-height="699" data-original-width="933" height="240" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEidOFve5v4kxJDF0bRarTSeq-Z6xJQNbvDx5SACv2-O_uvfR87QltZRbTx5gC19UZyi0NrXA3IO7HxY417El08SxlVzJwFUYtGImhIgTZhsLFjGrmabRNCEbtoV0wmKmt7xuBU84muSUnRMYU0FwjV847Z86mAgD-fujAgrKoGytbMlJyciT4E3-F-OuEbA/s320/microfone.radio0709201436%20(2).jpg" width="320" /></a></div>Minha
formação musical “primordial”, digamos assim, veio basicamente do rádio e das
fitas de musica “brega” que meu irmão, caminhoneiro, gravava em </span><i style="font-size: 18pt; text-align: left;">Gud Gud</i><span style="font-size: 18pt; text-align: left;">, de Itabaiana, uma loja que
funcionava num esquema de pirataria pré-internet: tinha um grande acervo de LPs
e lá você podia passar horas selecionando faixas para coletâneas em fitas k7.
Vem daí que curto, até hoje, o “brega” da década de 1970, principalmente –
Marcio Greick, Fernando Mendes, Odair José – e as baladas românticas dos
artistas brasileiros que se travestiam de “gringos” – quase chorei quando o
Mopho, num show no Che, tocou um cover de “We say goodbye”, de “Dave McLean”.</span></div><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;">Sempre
curto, também, quando rola algum hit de FM da década de 1980. Me remete a uma
época muito boa, de descoberta do mundo – nasci em 1971. Tipo “Captain of the
heart”, do Double(quem?). Era o que eu ouvia antes de virar “roqueiro”: radio
FM. E AM por tabela, via meu pai. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;">Porque virei
“roqueiro” praticamente parei de ouvir radio – voluntariamente, no caso – e
perdi de curtir quando tocava coisas que hoje curto, como Teas for fears e Pet
Shop Boys. Passei a levar uma “vida imbecil, zanzando atrás do que é bom” e
controlando o que vai no meu som – acredite, John, do pato Fu, dedicou essa
musica pra mim uma vez, num show. Tínhamos contato por carta, quando eu era
fanzineiro.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;">Em todo
caso, tocava rock no rádio na década de 1980. Muito, até. Eu diria inclusive
que comecei a virar “roqueiro” ouvindo U2, Dire Straits, Ira!, Camisa de Vênus,
Replicantes e Hojerizah na Atalaia FM, principalmente. Mas em 1986 eu ouvi os
acordes iniciais de “Caught somewhere in time” do iron Maiden – não no radio,
no caso, numa vitrola mesmo, direto dos sulcos de um LP <span style="mso-spacerun: yes;"> </span>– e fudeu: virei “metaleiro”. E, pelo menos em
Aracaju, metal não tocava no radio.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;">Assinei a
revista Rock Brigade, especializada em Heavy metal, mas lia também a Bizz, que
era mais “pop” e chegava em Itabaiana, na Livraria Cunha – que na verdade era
uma papelaria, mas funcionava também como banca de revistas. Sempre fui
“eclético”. E graças a um programa de rádio da mesma Atalaia FM produzido de
forma independente por Antonio Passos e Roberto Aquino, donos da primeira loja
especializada em rock e música independente do estado, a Disturbios Sonoros,
pude finalmente ampliar significativamente meus horizontes musicais ouvindo
coisas que eu só conhecia de ler a respeito na clássica publicação da Editora
Abril. Tipo Fellini, Harry, e clássicos como Mutantes e Casa das máquinas – da
primeira a primeira que ouvi, no programa de Passos e Roberto, foi “O meu
refrigerador não funciona”, e da segunda foi “vou morar no ar”. Lembro bem porque
sempre gravava tudo em fitas k7 para ouvir depois, “n” vezes. Pena que não
guardei essas fitas, hoje em dia seriam relíquias. Detalhe: acho que cheguei a
ligar para a radio umas duas ou três vezes pra reclamar porque eles não tocavam
Iron Maiden ...<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;">Muito por
conta dessa minha relação de afeto pelo <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Rock
Revolution</i> – era o nome do programa – sempre tive vontade de fazer também o
meu. Aconteceu, em parte, na década de 1990, lá em Itabaiana mesmo. Eu já
morava em Aracaju, mas despencava pra lá a cada 15 dias com a mala do carro
cheia de LPs para dar minha contribuição ao <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Guilhotina</i>,
o programa que um amigo, Ademir Pinto, tinha na Itabaiana FM. Ele era operador
e havia sugerido ao dono da radio ocupar um espaço ocioso aos sábados, depois
da Voz do Brasil, aproveitando os acervos de discos dos amigos, dentre eles eu.
<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;">Não tenho
idéia até hoje se tivemos alguma audiência – de vez em quando o telefone tocava
e nós ficávamos excitados achando que era algum ouvinte mas era sempre sobre
algum assunto que não tinha nada a ver com o que estávamos tocando – mas me
diverti fazendo. Também porque Ademir já queria ser demitido mesmo então
liberou para que os produtores chutassem o pau da barraca: uma vez ele me ligou
avisando que o programa ia rolar mas seria interrompido a qualquer momento por
chamadas direto de um povoado onde um poço artesiano ia ser inaugurado pelo
vice-governador do estado, que não por acaso era também o proprietário da
radio. Coloquei no ar, então, um especial “grindcore”, com Napalm Death,
Carcass, Extreme Noise Terror e afins. O vice governador ouviu, mas não o
demitiu, apenas reclamou porque a gente não tocava Raul Seixas.<span style="mso-spacerun: yes;"> </span><o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;">Quem tinha
audiência cativa era o programa “concorrente”, o <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Sabotage</i>, de Adelardinho Jr., que ia ao ar no mesmo horário por
outra emissora, a Princesa FM. Muito por conta do carisma e de algumas grandes
sacadas “sem noção” de seu produtor/apresentador: pra que se tenha uma idéia,
uma vez ele pegou em mercadorias o valor de dois patrocínios que uma sorveteria
e uma funerária deviam e sorteou entre os ouvintes um caixão de defuntos cheio
de picolés. O sucesso foi tanto que a promoção se tornou anual, com direito ao
caixão ser conduzido em cortejo até a casa do ganhador – em pelo menos uma ocasião
com o próprio dentro, para o horror de sua mãe, desavisada, que quase morreu de
enfarto.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;">Já no inicio
do século XXI o rádio seguia com algum prestigio, apesar da crescente concorrência
da internet, e um grupo de amigos conseguiu o feito de colocar no ar, também
pela Atalaia FM, um novo programa dedicado ao rock “indepentente”, o <i style="mso-bidi-font-style: normal;">playground </i><span style="mso-spacerun: yes;"> </span>– no caso mais “indie” mesmo, refletindo o
gosto musical dos mancebos, Rafael Jr, baterista da Snooze, Patrick Tor4, Bruno
Aragão e Augusto. Muito Weezer, Sonic Youth, Flaming Lips e afins, inclusive
com faixas raras e exclusivas baixadas da internet, a grande novidade da época.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;">Toda essa
história de guerrilha sonora escavando trincheiras nas ondas do radio converge,
na segunda metade da primeira década do novo século, para uma novíssima
programação da emissora pública do estado, a Aperipê FM, que caiu nas mãos,
graças às voltas que o mundo dá também na política, do DJ Patrick Tor4, o mesmo
da trupe que fazia o <i style="mso-bidi-font-style: normal;">playground</i>. Foram
tempos gloriosos, onde taxistas desavisados poderiam se deparar, ao mudar de
estação, com uma programação totalmente inesperada dividida em segmentos
antológicos como o <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Clube do jazz</i>, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Império periférico</i> – dedicado ao rap -, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Encruzilhada</i> – que tocava blues -,<i style="mso-bidi-font-style: normal;">Vanguarda</i> e o <i style="mso-bidi-font-style: normal;">programa de rock</i>. Os dois últimos eram os mais radicais. O
primeiro, produzido e apresentado por Alessandro “Cabelo”, tocava musica de ...
vanguarda. Mas de vanguarda MESMO, indo a extremos tais que passou a adotar o
aviso “seu rádio não está com defeito, você está ouvindo o Vanguarda”, depois
que um operador da radio achou que o sinal estava fora do ar. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;">Já o
programa de rock foi concebido e apresentado, nos seus dois primeiros anos no
ar, por Fabio “Snoozer” e por este que vos digita, que o levou até o final, 9
anos depois. Também flertava com extremismos – de Daminhão Experiença e
Incinerated Clitorial region, passando por Cocteau Twins, Motorhead, Pixies e
muito rock sergipano, cujos integrantes das bandas eram também, rotineiramente,
entrevistados. Durou até 2016, numa trajetória da qual muito me orgulho e que
teve alguns pontos culminantes, como o lançamento ao vivo, com a banda tocando
direto dos estúdios, do então novo LP da karne Krua, seminal banda punk local.
Foi meu momento “peel sessions”.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;">Há programas
de rádio antológicos dos quais sempre ouvi falar mas nunca tinha ouvido, até o
advento da internet. É o caso do “Garagem”, produzido e apresentado pelos
Andrés Barcinski e Forastieri com Alvaro Pereira Jr. e Paulo Cesar Martin desde
a década de 1990. Sobrevive até hoje em formatos variados, atualmente como
podcast sob o nome ABFP – Amigos, Barcinski, Forasta e Paulão. É dos meus favoritos.
<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;">Pela
internet pude acompanhar também os últimos anos da carreira de Kid Vinil,
sempre uma grande referência, como radialista. E também a antológica Ipanema
FM, de Porto Alegre, que tocava “marquee moon” do Television e “Pau no seu cu
menina” dos Devotos de Nossa Senhora Aparecida na programação normal, no meio da
tarde!<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;">Sigo ouvindo
radio até hoje. As “de fora”, como a Kiss de SP e a Saudade FM de Santos, pela
internet. Mas principalmente na madrugada, quando a programação costuma ser
mais musical e menos pasteurizada, em emissoras especificas que tocam musica
que não ofende os ouvidos, como a Fan, Nova Brasil e a Transamérica FM, que
vieram salvar minhas noites insones da falta que me faziam as finadas Atalaia e
Liberdade FM.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;"><br /></span></p><p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;">A.</span></p><p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;"><br /></span></p><p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;">#</span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;"><o:p> </o:p></span></p>Adelvan Kenobihttp://www.blogger.com/profile/06307759808605250885noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4793536658109166560.post-27358705118396126022021-10-11T16:20:00.008-07:002021-10-11T17:00:10.699-07:00Distopia: eu não queria uma pra viver ...<p></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiJ8NspbYFOX2LnnVpiFRZCc8L9ZBAnA8C6BsL_QfSG9C3HTbfa3fSsNW4st0GaTpwLm17ZOHyTP2bYr3RkUsqstM-1JppFaiVaRu8S_AI3qt1niI6XJ1XiZRZTMvGuIDMEVMkrV5-rjznp/s1536/1984+edmond-o-brien--jan-sterling-in--1984--2350872-5c57ead146e0fb00013a2c32.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" data-original-height="1024" data-original-width="1536" height="213" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiJ8NspbYFOX2LnnVpiFRZCc8L9ZBAnA8C6BsL_QfSG9C3HTbfa3fSsNW4st0GaTpwLm17ZOHyTP2bYr3RkUsqstM-1JppFaiVaRu8S_AI3qt1niI6XJ1XiZRZTMvGuIDMEVMkrV5-rjznp/s320/1984+edmond-o-brien--jan-sterling-in--1984--2350872-5c57ead146e0fb00013a2c32.jpg" width="320" /></a></div>Comecei a me interessar por distopias no início da década de
1980, quando só se falava da data fatídica que se aproximava: 1984. Fui atrás,
claro, do livro, escrito por George Orwell em 1948(para o título ele apenas trocou
os números das datas) e foi amor à primeira leitura.<p></p>
<p class="MsoNormal"><o:p> </o:p></p>
<p class="MsoNormal">“1984” é objeto de controvérsias até hoje, por ser
claramente inspirado na ditadura de Stalin <span style="mso-spacerun: yes;"> </span>e ter, obviamente, servido como poderosa arma
de propaganda anticomunista durante todo o período da guerra fria. O que nem
todo mundo sabe, no entanto, é que ele também é diretamente inspirado em outro
romance distópico mais antigo, “Nós”, do russo Ievgeny Zamiátin. </p>
<p class="MsoNormal"><o:p> </o:p></p>
<p class="MsoNormal"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEibDbcDHuq4IbVFvCzqS4awBEZw5cO2iHPQtcAl3Plc_5KaNDSTBTqPrRyK6_2d_p3xLCXo5z3caH0B-wWHPj0_PsqM5dbG6PMbHVjV2C3b8anqWwcdiZ0VOz-8LzgR8BPet3HBqcvreAhG/s2000/N%25C3%25B3s+Alp_5BoxDistopia_2Cadstro_2Nos7.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="2000" data-original-width="2000" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEibDbcDHuq4IbVFvCzqS4awBEZw5cO2iHPQtcAl3Plc_5KaNDSTBTqPrRyK6_2d_p3xLCXo5z3caH0B-wWHPj0_PsqM5dbG6PMbHVjV2C3b8anqWwcdiZ0VOz-8LzgR8BPet3HBqcvreAhG/s320/N%25C3%25B3s+Alp_5BoxDistopia_2Cadstro_2Nos7.png" width="320" /></a></div>O livro de Zamiátin foi escrito entre 1920 e 1921, antes,
portanto, da ascensão do “grande irmão” propriamente dito – Stalin só tomou as
rédeas do destino dos soviéticos após a morte de Lenin, em 1924 -, o que torna
ainda mais impressionante seu dom premonitório.<span style="mso-spacerun: yes;">
</span>A história é narrada em primeira pessoa por um dos cientistas
encarregados da construção do “Integral”, uma nave espacial destinada a
espalhar a ideologia do Estado Unificado, no qual vive, pelo cosmos. Uma
sociedade guiada pelo “Benfeitor” a partir de regras rígidas de conduta
matematicamente programadas onde a abolição da individualidade, necessária ao
perfeito funcionamento das engrenagens, é garantida por artifícios como a
adoção de números no lugar dos nomes próprios e a construção de casas de vidro
transparente. D-503, o protagonista, passa a questionar o sistema a partir de
seu envolvimento amoroso com uma misteriosa mulher que faz parte de uma
organização subversiva, obviamente clandestina. Como se vê, as similaridades
com a obra máxima de Orwell são muitas, mas isso não tira do inglês o mérito de
ter pensado em conceitos originais e brilhantes, como o “duplipensar”(2+2 pode
ser igual a 5, caso o partido queira que assim seja) e a “novalingua”,
resultado de uma simplificação radical e progressiva da linguagem destinada a
ajudar na supressão do pensamento crítico e criativo – pensou no twitter e nos
memes da internet de hoje em dia? Pensou certo.<p></p>
<p class="MsoNormal"><o:p> </o:p></p>
<p class="MsoNormal"><table cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="float: right;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEixl-mkC0BkTToVO9r4ZxC6_1I9XSPU12DopQK1BwqS_pX-76WwBDGfyHsfDL9-sYEsBqhmZuS-Vxbw___Vfw52oyqoCYgjrdFjZX3jlHY-jEzPrhfNzhyPuBh-8gepo0344-sTVA-2RNQZ/s1500/Fahrenheit+de5aa56657e6bc566cc568a36a3374dd.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; margin-bottom: 1em; margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="1500" data-original-width="1004" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEixl-mkC0BkTToVO9r4ZxC6_1I9XSPU12DopQK1BwqS_pX-76WwBDGfyHsfDL9-sYEsBqhmZuS-Vxbw___Vfw52oyqoCYgjrdFjZX3jlHY-jEzPrhfNzhyPuBh-8gepo0344-sTVA-2RNQZ/s320/Fahrenheit+de5aa56657e6bc566cc568a36a3374dd.jpg" width="214" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;"></td></tr></tbody></table>Se “1984” foi inspirado nos regimes totalitários,
notadamente o soviético, “Admirável Mundo Novo”, de Aldous Huxley, é basicamente
uma crítica à alienação pelo consumo – inclusive de drogas entorpecentes –
típica dos regimes capitalistas. Nele Ford(ele mesmo, Henry) é tratado como uma
espécie de Deus, ou messias, por ser o fundador das bases nas quais a sociedade
é estruturada, a partir de linhas de produção.</p>
<p class="MsoNormal"><o:p> </o:p></p>
<p class="MsoNormal">Já “Fahrenheit 451”, de Ray Bradbury, que forma uma espécie
de “santíssima trindade distópica” com os livros de Orwell e Huxley, é uma
declaração de amor à literatura e seu poder transformador, criador de espíritos
livres. Foi adaptado com maestria para o cinema por François Truffaut em 1966.</p>
<p class="MsoNormal"><o:p> </o:p></p>
<p class="MsoNormal">De Philip K. Dick já li “Andróides sonham com ovelhas
elétricas?”, que foi adaptado para o cinema como “Blade Runner”, e “O Homem do
castelo alto”, que recentemente virou uma série da Amazon prime. Como já se tornou praxe com as obras de Dick, as adaptações têm pouco a ver com os originais,
muito embora a do “Castelo Alto” esteja entre as mais fiéis, limitando-se basicamente
a fazer algumas adaptações e criar novos personagens, além de expandir
consideravelmente o universo alternativo imaginado pelo escritor, no qual os
países do eixo venceram a segunda guerra mundial e ocuparam os Estados Unidos.
Há um ponto em comum entre os dois livros: à medida que vão se aproximando do
final a narrativa vai se tornando cada vez mais hermética ao explorar uma das
obsessões do autor, a confusão entre fantasia e realidade. “O Homem do castelo
alto” venceu o prestigiado prêmio Hugo no ano de 1963.</p>
<p class="MsoNormal"><o:p> </o:p></p>
<p class="MsoNormal" style="background: rgb(254, 253, 250); line-height: normal; margin-bottom: 0cm;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiiZz9upU9T0eDPzCpTnFoDjDktacjB3iW0ck7gRN8Cpe53GCNALFaMNCzB5xCSH-8qU2iAprvzVi-U2f1MPZ4gATRpyr2vR-DKR7aMjwF9qNSQH4cmn_cHt8nFoZotL0z1GyLiJxa3F7k-/s1600/cantico+miller-1959-a-canticle-for-leibowitz.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1600" data-original-width="972" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiiZz9upU9T0eDPzCpTnFoDjDktacjB3iW0ck7gRN8Cpe53GCNALFaMNCzB5xCSH-8qU2iAprvzVi-U2f1MPZ4gATRpyr2vR-DKR7aMjwF9qNSQH4cmn_cHt8nFoZotL0z1GyLiJxa3F7k-/w242-h400/cantico+miller-1959-a-canticle-for-leibowitz.jpg" width="242" /></a></div>Outra obra aclamada e vencedora do Hugo mas pouco
conhecida por aqui, “Um Cântico para Leibowitz”, <span face=""Arial","sans-serif"" style="color: #333333; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">do norte-americano Walter M. Miller Jr,</span> foi resgatada
recentemente do limbo pela editora Aleph. <span face=""Arial","sans-serif"" style="color: #333333; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">Publicada originalmente em 1959, no auge da guerra-fria, nos transporta
para um futuro pós-apocalíptico onde a humanidade passa a rejeitar o progresso
científico que supostamente a levou à autodestruição. Rejeição que a faz
regredir a uma nova idade das trevas, mas que não impede o renascimento –
porque o novo sempre vem, já dizia Belchior. O renascimento, no entanto, nos
conduz, novamente, à beira da aniquilação, num círculo vicioso ilustrativo do
ditame segundo o qual aqueles que falham em aprender com a história estão
condenados a repeti-la.<o:p></o:p></span><p></p>
<p class="MsoNormal" style="background: rgb(254, 253, 250); line-height: normal; margin-bottom: 0cm;"><span face=""Arial","sans-serif"" style="color: #333333; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="background: rgb(254, 253, 250); line-height: normal; margin-bottom: 0cm;"><span face=""Arial","sans-serif"" style="color: #333333; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">“Um Cântico para Leibowitz” entrou numa lista dos dez melhores livros do
gênero que a mundialmente prestigiada revista Time publicou em 2010. Graças, em
grande parte, à originalidade de sua trama, que tem início seiscentos anos
depois do chamado Dilúvio de Fogo, no qual a maior parte da população mundial
foi dizimada. São, na verdade, três histórias distintas que giram em torno de
uma abadia na qual monges se dedicam a preservar a “memorabília”, o que restou
da devastação nuclear e da “simplificação”, a caça às bruxas que veio a seguir.
“Bruxas” encarnadas, no caso, nos doutores detentores do saber, como
professores e cientistas. A ordem que ocupa a abadia é, por sinal, consagrada a
um destes “doutores”, um tal Leibowitz, que se tornou um mártir – e santo da
igreja católica! – ao dar sua vida pela preservação do conhecimento.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="background: rgb(254, 253, 250); line-height: normal; margin-bottom: 0cm;"><span face=""Arial","sans-serif"" style="color: #333333; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="background: rgb(254, 253, 250); line-height: normal; margin-bottom: 0cm;"><span face=""Arial","sans-serif"" style="color: #333333; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">Foi o único livro publicado em vida por Walter M. Miller Jr. Reflete sua
visão de mundo, marcada por um forte componente religioso – converteu-se ao
catolicismo em 1947, aos 25 anos de idade, depois de uma passagem traumática
pelo exército durante a Segunda guerra mundial na qual esteve presente em cerca
de 53 bombardeios sobre a Itália e os Bálcãs. Num desses ataques foi destruído
o Mosteiro Beneditino de Monte Cassino, o mais antigo do mundo ocidental. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="background: rgb(254, 253, 250); line-height: normal; margin-bottom: 0cm;"><span style="color: #333333;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="background: rgb(254, 253, 250); line-height: normal; margin-bottom: 0cm;"><span style="color: #333333;"></span></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgZJMDeofOKoRjVNPWamNqqXk9WjWbJWs1Dso9rxKYz4wf2cauJE6gz_PYQKoSbyRCuQHKkwqiFjLIbLkSOheN0GflxBm5yvfZ3m2B7Cie2Nan2rh86gzD4WrzRRCkJHBR7shEViI6pRbon/s1047/Margareth++7f8b95ff1d0f8cff56d70353410a67a9.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" data-original-height="1047" data-original-width="677" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgZJMDeofOKoRjVNPWamNqqXk9WjWbJWs1Dso9rxKYz4wf2cauJE6gz_PYQKoSbyRCuQHKkwqiFjLIbLkSOheN0GflxBm5yvfZ3m2B7Cie2Nan2rh86gzD4WrzRRCkJHBR7shEViI6pRbon/w259-h400/Margareth++7f8b95ff1d0f8cff56d70353410a67a9.jpg" width="259" /></a></div>Recentemente uma autora até então desconhecida por mim, a canadense
Margareth Atwood, ganhou notoriedade ao ter um de seus romances distópicos, “O
Conto da Aia”, adaptado para uma série de TV de grande sucesso. Fui conferir e
virei fã! Trata-se de um libelo feminista e antifascista que se passa em
Gilead, uma país imaginário que é, na verdade, uma parte dos Estados Unidos
dominada por um governo cristão fundamentalista e totalitário que usou uma
crise de fertilidade provocado por um colapso climático para impor uma
interpretação da Bilblia relativamente semelhante à que os Talebans fazem do
Alcorão.<p></p><p class="MsoNormal" style="background: rgb(254, 253, 250); line-height: normal; margin-bottom: 0cm;"><span face=""Arial","sans-serif"" style="color: #333333; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;"><o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="background: rgb(254, 253, 250); line-height: normal; margin-bottom: 0cm;"><span face=""Arial","sans-serif"" style="color: #333333; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="background: rgb(254, 253, 250); line-height: normal; margin-bottom: 0cm;"><span face=""Arial","sans-serif"" style="color: #333333; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">Em Giléad as mulheres férteis têm que se tornar, obrigatoriamente,
“aias”, numa nova ordem em que não são mais </span><span face=""Arial","sans-serif"" style="background: white; color: #202124; font-size: 10.5pt;">preceptoras
encarregadas da educação doméstica das crianças de famílias nobres ou ricas</span>,
mas verdadeiras escravas sexuais a serviço não do prazer, mas da reprodução.
Para isso são obrigadas a participar, no período fértil, de um ritual de
estupro em que são colocadas no colo das esposas estéreis dos “comandantes”
para serem inseminadas por estes. São cenas fortes, que uma amiga, em
particular, me disse que não conseguiu assistir – também porque lhe pareceu, a
meu ver acertadamente, que aquela distopia estava especial e perturbadoramente
próxima de nossa realidade, A adaptação do livro se limita à primeira
temporada, mas a série segue adiante, desdobrando a trama de modo bastante
satisfatório.</p>
<p class="MsoNormal" style="background: rgb(254, 253, 250); line-height: normal; margin-bottom: 0cm;"><span face=""Arial","sans-serif"" style="background: white; color: #202124; font-size: 10.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="background: rgb(254, 253, 250); line-height: normal; margin-bottom: 0cm;"><span face=""Arial","sans-serif"" style="background: white; color: #202124; font-size: 10.5pt;">O que pouca gente sabe – eu, pelo menos, não
sabia – é que “The Handmaids Tale” já havia sido adaptado anteriormente para o
cinema num filme de 1990 dirigido pelo alemão </span><span class="normaltextrun"><span face=""klavika-r","serif"" style="background: white; border: 1pt none windowtext; color: #222222; mso-border-alt: none windowtext 0cm; padding: 0cm;">Volker</span> Schlöndorff,
ganhador de uma Palma de Ouro e um Oscar de filme estrangeiro por sua adaptação
do romance </span><span class="normaltextrun"><span face=""klavika-r","serif"" lang="EN-US" style="background: white; border: 1pt none windowtext; color: #222222; mso-ansi-language: EN-US; mso-border-alt: none windowtext 0cm; padding: 0cm;">“</span></span><span class="normaltextrun"><span face=""klavika-r","serif"" style="background: white; border: 1pt none windowtext; color: #222222; mso-border-alt: none windowtext 0cm; padding: 0cm;">O Tambor</span></span><span class="normaltextrun"><span face=""klavika-r","serif"" lang="EN-US" style="background: white; border: 1pt none windowtext; color: #222222; mso-ansi-language: EN-US; mso-border-alt: none windowtext 0cm; padding: 0cm;">”</span></span><span class="normaltextrun"><span face=""klavika-r","serif"" style="background: white; border: 1pt none windowtext; color: #222222; mso-border-alt: none windowtext 0cm; padding: 0cm;">, do também alemão Gunter Grass. Apesar de contar
com uma trilha sonora assinada por Ryuichi Sakamoto e de ter no elenco nomes
como os de Robert Duvall e Faye Dunaway, fazendo o casal encarregado de
inseminar a personagem principal, rebatizada Offred (no filme ela se
chama Kate, na série virou </span>June e no livro a sua identidade
pregressa não existe), fracassou nas bilheterias, em parte pelo tom equivocado,
excessivamente erotizado, a meu ver. No Brasil atende por </span><span face=""klavika-r","serif"" style="background: white; color: #222222;">“A
Decadência de uma Espécie”</span> e está disponível em DVD como parte da
sensacional coleção de películas Sci-fi da Versátil Home vídeo. Recomendo, no
mínimo como curiosidade.<span face=""Arial","sans-serif"" style="background: white; color: #202124; font-size: 10.5pt;"><o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="background: rgb(254, 253, 250); line-height: normal; margin-bottom: 0cm;"><span face=""Arial","sans-serif"" style="color: #333333; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="background: rgb(254, 253, 250); line-height: normal; margin-bottom: 0cm;"><span face=""Arial","sans-serif"" style="color: #333333; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;"></span></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><span face=""Arial","sans-serif"" style="color: #333333; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj0Dja0H4Ut83HThK2twCny38gMAj5S1GaipFObXeK7NxXdCXKucuap-lKfBnLEhGeWf5lj9OFK1pKbdNhvzEAVu1f8UBoIlRJgE8bggqdpXtS2LRWSxqbhlsr49OCwQFYERCiX-ktNSAwj/s1361/Oryx+81LvFCdwHDL.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1361" data-original-width="868" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj0Dja0H4Ut83HThK2twCny38gMAj5S1GaipFObXeK7NxXdCXKucuap-lKfBnLEhGeWf5lj9OFK1pKbdNhvzEAVu1f8UBoIlRJgE8bggqdpXtS2LRWSxqbhlsr49OCwQFYERCiX-ktNSAwj/w255-h400/Oryx+81LvFCdwHDL.jpg" width="255" /></a></span></div><span face=""Arial","sans-serif"" style="color: #333333; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">Meu interesse pela obra de Atwood, como era de se esperar, se estendeu
para sua literatura, mas como se trata de alguém com uma vasta bibliografia a
ser explorada – tem 81 anos de idade, 52 de carreira e 18 romances publicadas,
além de obras poéticas, infantis e de não-ficção – resolvi não começar pelo
mais óbvio e, seguindo uma recomendação de Bruno Torturra num de seus “boletins
do fim do mundo”, li a trilogia composta por “Oryx e Crake”, “O Ano do dilúvio”
e “Maddadão”. <o:p></o:p></span><p></p>
<p class="MsoNormal" style="background: rgb(254, 253, 250); line-height: normal; margin-bottom: 0cm;"><span face=""Arial","sans-serif"" style="color: #333333; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="background: rgb(254, 253, 250); line-height: normal; margin-bottom: 0cm;"><span face=""Arial","sans-serif"" style="color: #333333; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">No primeiro livro somos apresentados ao “Homem das neves”, o provável
último sobrevivente de uma catástrofe provocada por uma pandemia(!!!!). Ele
convive com os “Filhos de Crake”, humanóides de uma nova espécie criados
artificialmente no mesmo laboratório de onde saiu o vírus letal. Aos poucos
vamos entendendo o que aconteceu a partir de suas reminiscências, enquanto
acompanhamos sua luta pela sobrevivência em um mundo devastado e povoado por
assustadoras criaturas hibridas. O livro termina num momento crucial, o que me
fez ter até pena de quem leu na época do lançamento e teve que esperar quatro
anos pela continuação ...<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="background: rgb(254, 253, 250); line-height: normal; margin-bottom: 0cm;"><span face=""Arial","sans-serif"" style="color: #333333; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="background: rgb(254, 253, 250); line-height: normal; margin-bottom: 0cm;"><span face=""Arial","sans-serif"" style="color: #333333; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">... que nem é exatamente uma continuação: “O Ano do dilúvio” começa uma
nova história, com novos personagens, mas que se passa no mesmo universo de
“Oryx e Crake” e vai aos poucos estabelecendo as devidas conexões com a
primeira narrativa até terminar no mesmo ponto onde paramos no primeiro volume,
só que sob um ponto de vista diferente. É brilhante! “Maddadão”, a parte final,
retoma finalmente o fio condutor e conclui essa impressionante epopéia distópica
repleta de reflexões sobre a destruição ambiental provocada pela
superexploração capitalista. Há boatos de que será, também, adaptada para a
televisão. Essa eu poderei dizer que já conhecia.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><o:p> </o:p></p>
<p class="MsoNormal"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjeqJCAD3xv3I79fft9bAEOhEPCctERQHmX7OTtnz5IP17Tb0oQGegNCZzw5CBXuktkoSarG-sdNsfWdx4EPCb3OUj07jsmSAoe4OCapm7hnZcr2OTvalJPIYb2BRExAwSW1ZQowrOn-Ue8/s1600/mad-max-vintage-classic-movie-art-silk-poster.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" data-original-height="1600" data-original-width="1046" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjeqJCAD3xv3I79fft9bAEOhEPCctERQHmX7OTtnz5IP17Tb0oQGegNCZzw5CBXuktkoSarG-sdNsfWdx4EPCb3OUj07jsmSAoe4OCapm7hnZcr2OTvalJPIYb2BRExAwSW1ZQowrOn-Ue8/w261-h400/mad-max-vintage-classic-movie-art-silk-poster.jpg" width="261" /></a></div>Resumindo: acho que já deu pra entender que eu gosto muito de fantasias distópicas.
Na literatura, no cinema – veja “Metropolis”, “Planeta dos macacos”(toda a
série, incluindo os mais novos, sou fã), “soylent Green”, “Logan´s run”, “Rollerball”,
“Laranja Mecânica” (li o livro também, mas prefiro o filme), “THX-1138” de
George Lucas, “Brazil” de Terry Gillian – esse é genial -,“Terminator”, “Total
Recall”, “Bacurau”, “Mad Max”, “Matrix”, “Her”, “Ensaio sobre a cegueira”, “Filhos
da esperança”, até de “Jogos vorazes”, o primeiro, eu gosto. <p></p>
<p class="MsoNormal"><o:p> </o:p></p>
<p class="MsoNormal">Na vida real não. Não queria e não estou curtindo. Não
pensei que fosse viver pra isso.</p><p class="MsoNormal"><br /></p><p class="MsoNormal">A</p><p class="MsoNormal">#</p>Adelvan Kenobihttp://www.blogger.com/profile/06307759808605250885noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-4793536658109166560.post-78648786952396064662021-07-24T11:07:00.001-07:002021-07-24T11:07:51.463-07:00"Suicídio", da Karne Krua<p></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjSx4RSQMt0S40BC_kwt4oKOzo05cxV9f4kNWY6d4s8UC_5LOChgaZjjIvwleiDY_Hbs8L12K5cCFcUuzTA0wNv6R4Za2aQ6_zmZHvPLf8u46p9jAoHRglLqLMNoIy1T_N3oZaXA9bJmczU/s621/karne+suicidio.webp" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="400" data-original-width="621" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjSx4RSQMt0S40BC_kwt4oKOzo05cxV9f4kNWY6d4s8UC_5LOChgaZjjIvwleiDY_Hbs8L12K5cCFcUuzTA0wNv6R4Za2aQ6_zmZHvPLf8u46p9jAoHRglLqLMNoIy1T_N3oZaXA9bJmczU/s320/karne+suicidio.webp" width="320" /></a></div>Karne Krua é uma banda pioneira do punk rock hard core do
nordeste do Brasil. Surgiu em Aracaju, capital de Sergipe, o menor estado da
região , em 1985. Depois de um breve período inicial instável estabilizou-se
com Silvio “suburbano” no vocal, Marcelo “Inseto” na guitarra, Marlio no baixo
e Antonio “Almada” na bateria - uma formação considerada “clássica” por ter
composto e gravado musicas que definiram sua identidade sonora e são tocadas
até hoje em shows. Essa primeira fase está registrada nas três primeiras
demo-tapes, todas gravadas de forma tosca e absolutamente improvisada: “As
merdas do sistema”, de 1987, “Cenas de ódio e revolta”, de 1988 e “Labor
operário”, de 1990.<p></p>
<p class="MsoNormal"><o:p> </o:p></p>
<p class="MsoNormal"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjU5EywPqh7btbcd4Y87cjBPB_UkyyJ0ukcUatmwhUCzocgvah9Awx2SmyaR3lI2H49Ds-vg-V4_JystGcKX87xbeaxxIQ6HDskCUBzETbIBDS6PoO_7-uUWk-XAQ7YublGltRnId3kNKO9/s720/Karne+Krua+-+Suic%25C3%25ADdio+-+encarte.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" data-original-height="720" data-original-width="478" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjU5EywPqh7btbcd4Y87cjBPB_UkyyJ0ukcUatmwhUCzocgvah9Awx2SmyaR3lI2H49Ds-vg-V4_JystGcKX87xbeaxxIQ6HDskCUBzETbIBDS6PoO_7-uUWk-XAQ7YublGltRnId3kNKO9/s320/Karne+Krua+-+Suic%25C3%25ADdio+-+encarte.jpg" /></a></div>Na virada da década bateu um cansaço e dois integrantes, Marcelo
e Almada, resolveram sair, mas a banda acabou se renovando com a entrada de
Fabio na guitarra e Valdeleno na bateria. Por essa época Silvio, um incansável
agitador cultural “underground”, estava às voltas com o projeto “Cooperativa do
caos”, que visava à produção de uma LP em vinil reunindo algumas das principais
bandas do estilo das regiões norte e nordeste: Discarga Violenta, de Natal(RN);
<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>Delinquentes, de Belém do Pará;
C.U.S.P.E, de Campina Grande(PB) e Devotos do ódio, de Recife – além da própria
Karne Krua. O projeto, infelizmente, acabou não vingando, mas o que foi gravado
acabou sendo aproveitado no clássico primeiro EP/compacto em vinil de 7
polegadas “Cosmopolita”, da Discarga Violenta, e na primeira demo-tape com
gravação profissional da Karne Krua, “suicídio”. <span style="mso-spacerun: yes;"> </span><p></p>
<p class="MsoNormal"><o:p> </o:p></p>
<p class="MsoNormal">“Suicidio” foi gravada em janeiro de 1991 no Estudio DB-3,
de Recife, com mixagem dos amigos Nino e Pesado, da banda pernambucana Câmbio
Negro HC. O repertório é composto basicamente de musicas já lançadas
anteriormente, como “Rumores de guerra” e “America Latina now”(aqui com a
participação de Pesado no refrão), ou já conhecidas de quem freqüentava os
shows. A grande novidade, que surpreendeu a todos, foi a faixa título, que
fugia um pouco da ortodoxia punk anarquista então em voga com uma letra de
temática mais intimista e arranjos com solos de guitarra melódicos e
minimalistas. Com suas 8 faixas distribuídas em menos de 10 minutos, na demo a
banda ainda soava punk, mas com uma nítida preocupação em expandir seus horizontes. Este material está sendo agora, 30 anos depois de seu lançamento original, relançado em vinil, num EP/Compacto de 7 polegadas, pela <a href="https://nogods-nomasters.com/nogodsnomasters/" target="_blank">No Gods No Masters Distro.</a></p>
<p class="MsoNormal"><o:p> </o:p></p>
<p class="MsoNormal">Essa nova fase se consolidou com o lançamento, em 1994, do
primeiro LP, auto intitulado, já com Marcelo e Almada de volta a seus postos. A
semente lançada em “Suicidio” frutificou num repertório impecável, que incluía
dois poemas musicados de autoria do poeta, fanzineiro e capoeirista Nagir
Macaô, “O vinho da história” e “A noite do deus morto”, e letras enigmáticas,
beirando a abstração, como “Mancha de sangue”, além de uma notável evolução
lírica e musical mesmo em faixas mais panfletárias, como “Hienas na carcaça”,
“Brasil Heróico”(com seu tom épico), “Filhos do medo” e “Política da seca” –
que tem frases dignas da melhor literatura, a meu ver (“pessoas castigadas pelo
sol e pela fome lamentam a dor de mais um ano que passou”). </p>
<p class="MsoNormal"><o:p> </o:p></p>
<p class="MsoNormal">Karne Krua passou por várias outras fases, com trocas de
integrantes e influências as mais diversas, do hard Core novaiorquino à musica
regional do sertão nordestino, mas sempre preservando sua identidade,
capitaneada pela figura de Silvio, único membro fundador remanescente. Segue viva
e ativa até hoje! São 35 anos de atividade ininterrupta, fazendo shows e
lançando novas demos, EPs e álbuns nos mais diversos formatos, em CD, k7, vinil
e streaming, sempre fazendo musica radical e independente em um ambiente inóspito,
periférico. Um feito e tanto! </p>
<p class="MsoNormal"><o:p> </o:p></p>
<p class="MsoNormal">por Adelvan Kenobi</p>
<p class="MsoNormal"><o:p> </o:p></p>
<p class="MsoNormal">#</p>Adelvan Kenobihttp://www.blogger.com/profile/06307759808605250885noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4793536658109166560.post-71752043257134027752021-07-10T11:10:00.012-07:002021-07-10T11:17:01.393-07:00Algumas dicas de quadrinhos produzidos por mulheres<p><span face="Barlow, sans-serif" style="background-color: white; font-size: large;">Aproveito a pandemia para colocar a leitura em dia e tenho algumas dicas de quadrinhos escritos, desenhados e publicados por mulheres para apresentar aos poucos e bons leitores deste humilde blog que se recusa a deixar de existir ...</span></p><p style="background-color: white; border: 0px; box-sizing: inherit; font-family: Barlow, sans-serif; font-size: 20px; margin: 0px 0px 1.6em; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjrAh-Um2n2ZYlWPsok7ILqaF-HfrXFyp5OlCYv-P7mL5Qh10fvgUDSjesJaMpJc7aYP6xQsZqp_6YC4wSgib6Ti29uQvipe-51XpXWsAclViqs9BQ1HzyfVlX3RBP4nouJzZRqmmU-hcXP/s400/fun+home.jpg" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" data-original-height="384" data-original-width="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjrAh-Um2n2ZYlWPsok7ILqaF-HfrXFyp5OlCYv-P7mL5Qh10fvgUDSjesJaMpJc7aYP6xQsZqp_6YC4wSgib6Ti29uQvipe-51XpXWsAclViqs9BQ1HzyfVlX3RBP4nouJzZRqmmU-hcXP/s320/fun+home.jpg" width="320" /></a></div><p style="text-align: left;"><span style="font-size: large;">Começo com Alisson Bechdel e seu <em style="border: 0px; box-sizing: inherit; font-weight: inherit; margin: 0px; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">Fun Home: uma tragicomédia em família</em>. Obra-prima! Sucesso de público e crítica. Ficou duas semanas na lista dos mais vendidos do New York Times. Um livro de memórias centrado numa controvertida figura paterna e em questões de identidade e repressão sexual. Ao contar a história de sua infância e adolescência, vivida na zona rural da Pensilvânia da década de 1970, marcada pelo mistério que ronda a verdadeira natureza da personalidade complexa e contraditória de seu pai, ela fala também do momento de transição entre o final de um período marcado pela revolução sexual e pela liberalização dos costumes e o revés provocado pelo surgimento da AIDS. A narrativa é fluida, sem tropeços, ilustrada por um traço elegante e rebuscado, todo desenhado a partir do estudo de fotos de referencia tiradas por ela mesmo. Brilhante.</span></p><p></p><p style="background-color: white; border: 0px; box-sizing: inherit; font-family: Barlow, sans-serif; font-size: 20px; margin: 0px 0px 1.6em; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">Dela, li também <em style="border: 0px; box-sizing: inherit; font-weight: inherit; margin: 0px; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">Você é minha mãe?</em>, uma espécie de continuação de <em style="border: 0px; box-sizing: inherit; font-weight: inherit; margin: 0px; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">Fun Home</em> que avança por sua idade adulta e discute, de forma bastante profunda e analítica, sua relação com a mãe, ao mesmo tempo em que vai narrando o desabrochar de sua sexualidade. É uma leitura bem mais densa e auto centrada que a anterior. Tive bastante dificuldade com alguns trechos longos que discorrem detalhadamente sobre questões teóricas ligadas à psicologia, mas recomendo a leitura mesmo assim.</p><p style="background-color: white; border: 0px; box-sizing: inherit; font-family: Barlow, sans-serif; font-size: 20px; margin: 0px 0px 1.6em; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEicvlL9v2YUpLs8rK0rLA5Uap79URiSB0055usPDLyXeizOcYt-OSKY7u9_OF_cckD_pMTLowvVIwpvHRqp-F6wuzFex85vnTbwfc2CCu1PYwrf_MuzeLNYN1qB2WgBldIPzdp5TpT8JqZa/s2048/RedRosa_extract_TheNation_Page_06_img.jpg" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="2048" data-original-width="1388" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEicvlL9v2YUpLs8rK0rLA5Uap79URiSB0055usPDLyXeizOcYt-OSKY7u9_OF_cckD_pMTLowvVIwpvHRqp-F6wuzFex85vnTbwfc2CCu1PYwrf_MuzeLNYN1qB2WgBldIPzdp5TpT8JqZa/s320/RedRosa_extract_TheNation_Page_06_img.jpg" /></a></div><div style="text-align: left;"><span style="font-size: large;">Rosa Luxemburgo é uma das personagens mais fascinantes da história do movimento socialista. Teórica brilhante e contestadora, mulher à frente de seu tempo, inclusive na vida pessoal e amorosa, além de pensadora independente e ousada. Teve embates antológicos com verdadeiros ícones do marxismo, como Lenin e Kautski. Sua vida é contada de forma poética e vibrante pela cartunista e ativista britânica Kate Evans em <em style="border: 0px; box-sizing: inherit; font-weight: inherit; margin: 0px; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">Rosa Vermelha</em>, lançado aqui pela editora Martins Fontes.</span></div><p></p><p style="background-color: white; border: 0px; box-sizing: inherit; font-family: Barlow, sans-serif; font-size: 20px; margin: 0px 0px 1.6em; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">Apesar de ter sido produzida a convite da Fundação Rosa Luxemburgo, essa biografia quadrinizada passa longe do <em style="border: 0px; box-sizing: inherit; font-weight: inherit; margin: 0px; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">chapabranquismo</em> e oferece um panorama bastante amplo de sua obra e de seu tempo a partir da escolha acertada de reproduzir integralmente diversos trechos de seus livros e cartas, sem descuidar do ritmo narrativo. Dá ao leitor menos apressado, inclusive, a oportunidade de se aprofundar ainda mais sobre o assunto ao disponibilizar um rico apêndice, em que diversas situações são melhor explicadas e contextualizadas e os trechos reproduzidos na história são novamente apresentados de forma ampliada.</p><p style="background-color: white; border: 0px; box-sizing: inherit; font-family: Barlow, sans-serif; font-size: 20px; margin: 0px 0px 1.6em; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh817fRAIuG4PRVabtCjrNFrArS1y0TEhQvhdLI7C8I5GXT4mWNCqV3m_8NvqBChVikd7p-CaXZ5GGS-ReYIi0ziS7r2ER_MbDNOpko_YS4objF44Vk3zxjSuUpBRARomhhVIJA3ldYj8DS/s500/refugiados.jpg" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" data-original-height="500" data-original-width="384" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh817fRAIuG4PRVabtCjrNFrArS1y0TEhQvhdLI7C8I5GXT4mWNCqV3m_8NvqBChVikd7p-CaXZ5GGS-ReYIi0ziS7r2ER_MbDNOpko_YS4objF44Vk3zxjSuUpBRARomhhVIJA3ldYj8DS/s320/refugiados.jpg" /></a></div><span style="font-size: large;">De Kate Evans li também <em style="border: 0px; box-sizing: inherit; font-weight: inherit; margin: 0px; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">Refugiados: a última fronteira</em>, editado com o capricho típico da editora Darkside – com direito a um marcador de páginas de tecido feito de renda, referência ao principal produto fabricado na cidade de Calais, na França, onde se passa a trama. Uma trama real e dramática, reproduzida a partir da experiência pessoal da autora com as ONGS que se dedicam a tentar aliviar a via crucis dos que ficam ilhados por lá, à espera de uma oportunidade de cruzar o canal da mancha. É uma história dura e revoltante, repleta de injustiça, que nos faz lembrar, inevitavelmente, os relatos de Joe Sacco sobre a Palestina e a guerra na Bósnia. O traço aqui é mais rabiscado e cartunesco, bem diferente do da biografia de Rosa, mas igualmente competente.</span><p></p><p style="background-color: white; border: 0px; box-sizing: inherit; font-family: Barlow, sans-serif; font-size: 20px; margin: 0px 0px 1.6em; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">Por fim, recomendo <em style="border: 0px; box-sizing: inherit; font-weight: inherit; margin: 0px; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">Hoje é o último dia do resto de sua vida</em>, um calhamaço de 464 páginas também lançado pela Martins Fontes e escrito pela austríaca Ulli Lust a partir das memórias que guardou de uma viagem punk e clandestina que fez à Itália na adolescência, na década de 1980. Literalmente punk, já que a autora freqüentava o submundo do movimento na época e foi com aquele espírito radical, arrojado e libertário que encarou a empreitada, acompanhada de uma nova melhor amiga que encontrou pelo caminho. Edi, a amiga, é uma daquelas figuras perigosamente sem noção que todo mundo que não se fecha no casulo falsamente protetor de uma vida regrada e careta acaba conhecendo, e que pode te meter em algumas roubadas caso você não esteja atento às armadilhas que fatalmente se armarão pelo caminho. Principalmente se for desenvolvido entre vocês o tipo de fidelidade e camaradagem que só a vida na estrada, sem eira nem beira, sem lenço e sem documento, pode proporcionar.</p><p style="background-color: white; border: 0px; box-sizing: inherit; font-family: Barlow, sans-serif; font-size: 20px; margin: 0px 0px 1.6em; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhfTysXoVJRo0IerV6hR8iTwcqcID-LJ2h5ZKmTO4vMwQRg9-NwNOYkRRvL9sTm26MFe6D3LTXjsYwsXHtIFvDZKD6IKf_d3yIfs5kPGUzZhUDOLOi94Y7LYY5TfgTzExSspmZbgr3BtFvJ/s499/Hoje+%25C3%25A9.jpg" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="499" data-original-width="369" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhfTysXoVJRo0IerV6hR8iTwcqcID-LJ2h5ZKmTO4vMwQRg9-NwNOYkRRvL9sTm26MFe6D3LTXjsYwsXHtIFvDZKD6IKf_d3yIfs5kPGUzZhUDOLOi94Y7LYY5TfgTzExSspmZbgr3BtFvJ/s320/Hoje+%25C3%25A9.jpg" /></a></div><span style="font-size: large;">É o que acontece com Ulli, que é levada por Edi a enfrentar situações dignas de um filme de máfia dirigido por Martin Scorcese ou Quentin Tarantino. Máfia, aqui, também no sentido literal: elas vão parar na Sicilia, terra da organização “cujo nome você não deve mencionar”, e sentem na pele o preço pago por garotas que não conseguem se por no seu lugar: são repetidamente abusadas e violentadas. Edi, porra louca ao extremo, não tem muita noção disso, mas Ulli passa a ter, principalmente, a partir de um evento pra lá de traumático. A obra adquire, então, um tom mais sombrio, retratando uma certa perda de inocência da autora. Na verdade, uma ingenuidade bruta, inconseqüente, típica de quem está amadurecendo e não sabe ainda o preço que terá que pagar pela liberdade que já pensa ter, mas que na verdade precisa ser conquistada. O evento, divisor de águas da trama, a faz repensar suas atitudes frente a um mundo que é, com muito mais frequência e intensidade do que ela parecia pensar, hostil e implacável com quem não se enquadra nos moldes desejados por sociedades quase sempre são, em maior ou menor grau, machistas, violentas e castradoras. Ela, enfim, amadurece. Mas da melhor forma, a meu ver: sem se render aos que querem domar seu espírito.</span><p></p><p style="background-color: white; border: 0px; box-sizing: inherit; font-family: Barlow, sans-serif; font-size: 20px; margin: 0px 0px 1.6em; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">Ao contrário do que se possa imaginar, no entanto, a narrativa passa longe do panfletarismo. É apenas a história honesta – de uma honestidade muitas vezes desconcertante, aliás – de uma viagem com momentos tensos e tragicômicos, mas também cheia de diversão regada a muito sexo, muita droga e algum rock and roll – há o registro de um megashow do The Clash ao qual elas têm acesso de forma clandestina, evidentemente. Uma história que valeu a pena ser vivida, com certeza. Tanto que rendeu um delicioso relato para ser degustado tanto tempo depois.</p><p style="background-color: white; border: 0px; box-sizing: inherit; font-family: Barlow, sans-serif; font-size: 20px; margin: 0px 0px 1.6em; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">A</p><p style="background-color: white; border: 0px; box-sizing: inherit; font-family: Barlow, sans-serif; font-size: 20px; margin: 0px 0px 1.6em; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">#</p><p style="background-color: white; border: 0px; box-sizing: inherit; font-family: Barlow, sans-serif; font-size: 20px; margin: 0px 0px 1.6em; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;"><br /></p>Adelvan Kenobihttp://www.blogger.com/profile/06307759808605250885noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4793536658109166560.post-33839968393215162622021-06-25T15:45:00.005-07:002021-06-25T15:45:40.326-07:00DESDE 1985<p><span style="background-color: white; font-family: Barlow, sans-serif; font-size: 20px;"></span></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh5c9j0ql7NejEeUKyRV3P1nQsFFOE6YAsKve5SDwWMe4AlHpLuzmLOhenYSqskSjw0d8bWLQ5-0_HjYalVWxrAqOs5wbC_od0XyJxRJayisGXEZ0eBi8zU1ToiufdygPa_0FXPUfq32hcn/s640/kk+primitiva.jpeg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="640" data-original-width="640" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh5c9j0ql7NejEeUKyRV3P1nQsFFOE6YAsKve5SDwWMe4AlHpLuzmLOhenYSqskSjw0d8bWLQ5-0_HjYalVWxrAqOs5wbC_od0XyJxRJayisGXEZ0eBi8zU1ToiufdygPa_0FXPUfq32hcn/s320/kk+primitiva.jpeg" /></a></div>Em 1988 fui ao meu primeiro show de rock <em style="border: 0px; box-sizing: inherit; font-family: Barlow, sans-serif; font-size: 20px; font-weight: inherit; margin: 0px; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">underground</em><span style="background-color: white; font-family: Barlow, sans-serif; font-size: 20px;">, a segunda edição do Festcore de Aracaju, um encontro de bandas punk do norte e nordeste promovido por Silvio, vocalista da Karne Krua. Foi lá que os vi ao vivo pela primeira vez. Lembro de ter pensado “caralho, essa banda é tão boa quanto o cólera” – a minha principal referencia quando se fala em punk rock brasileiro.</span><p></p><p style="background-color: white; border: 0px; box-sizing: inherit; font-family: Barlow, sans-serif; font-size: 20px; margin: 0px 0px 1.6em; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">Dizem que a primeira impressão é a que fica. Essa ficou. Até hoje, acho que se bandas como a Karne Krua, o Câmbio Negro HC, de Recife, ou a Dever de Classe, de Salvador, não tivessem surgido “longe demais das capitais” seriam tão lembradas e incensadas quanto seus pares paulistanos da década de 1980.</p><p style="background-color: white; border: 0px; box-sizing: inherit; font-family: Barlow, sans-serif; font-size: 20px; margin: 0px 0px 1.6em; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">A primeira gravação de estúdio da Karne Krua só foi acontecer em 1991, com a demo tape <em style="border: 0px; box-sizing: inherit; font-weight: inherit; margin: 0px; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">Suicídio</em>. Antes, a banda lançou apenas fitas demo caseiras, a partir gravações pra lá de precárias, como a primeira, <em style="border: 0px; box-sizing: inherit; font-weight: inherit; margin: 0px; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">As merdas do sistema</em>, e a já clássica <em style="border: 0px; box-sizing: inherit; font-weight: inherit; margin: 0px; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">Labor Operário</em>. Boa parte do repertório desses primeiros espasmos de vida foi regravado nos discos e demos posteriores, mas haviam lacunas a serem preenchidas.</p><p style="background-color: white; border: 0px; box-sizing: inherit; font-family: Barlow, sans-serif; font-size: 20px; margin: 0px 0px 1.6em; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">Não há mais. Neste ano da desgraça de 2021, ano 2 da pandemia, veio à luz, em meio às trevas, um projeto ao qual a banda se dedicava há pelo menos 5 anos: <em style="border: 0px; box-sizing: inherit; font-weight: inherit; margin: 0px; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">Primitiva 1985</em>, um disco de regravações com algumas das composições mais obscuras da banda, boa parte delas composta nos primeiros anos de atividade e que nunca haviam sido registradas com uma qualidade minimamente decente. É um verdadeiro testamento para a posteridade, evidenciando mais uma vez o talento de Silvio “Suburbano” e sua trupe de desajustados. </p><p style="background-color: white; border: 0px; box-sizing: inherit; font-family: Barlow, sans-serif; font-size: 20px; margin: 0px 0px 1.6em; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">Há desde crônicas urbanas locais – como <em style="border: 0px; box-sizing: inherit; font-weight: inherit; margin: 0px; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">Cirurgia</em>, sobre o então principal hospital público do estado; <em style="border: 0px; box-sizing: inherit; font-weight: inherit; margin: 0px; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">Cidade Asilo</em>, sobre o marasmo de Aracaju na década de 1980; e <em style="border: 0px; box-sizing: inherit; font-weight: inherit; margin: 0px; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">Fábrica de doenças</em>, sobre uma fábrica de cimento que havia no bairro Siqueira Campos, à época –, até libelos revolucionários de apelo universal como <em style="border: 0px; box-sizing: inherit; font-weight: inherit; margin: 0px; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">Dia A</em> e seu refrão pegajoso, que pede morte aos opressores, patrões e senhores.</p><p style="background-color: white; border: 0px; box-sizing: inherit; font-family: Barlow, sans-serif; font-size: 20px; margin: 0px 0px 1.6em; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">Uma de minhas favoritas desde sempre é <em style="border: 0px; box-sizing: inherit; font-weight: inherit; margin: 0px; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">Punk rock</em>, que faz uma pertinente ligação entre aquela música rebelde e barulhenta surgida em meados de 1976, 77, e os primórdios do <em style="border: 0px; box-sizing: inherit; font-weight: inherit; margin: 0px; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">rock and roll</em>, cuja fúria primal havia se transformado, diz a letra, em “protesto dos conscientes”. “Consciente” era um jargão bastante utilizado pelos punks para se destacar da malta imbecilizada e lobotomizada pelos veículos de comunicação de massa, mesmo que a formação política da maioria deles se restringisse a alguns panfletos anarquistas toscos recebidos em cópias apagadas pelo correio. Algo parecido com os memes de Whataspp de hoje. </p><p style="background-color: white; border: 0px; box-sizing: inherit; font-family: Barlow, sans-serif; font-size: 20px; margin: 0px 0px 1.6em; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">Algumas composições, como <em style="border: 0px; box-sizing: inherit; font-weight: inherit; margin: 0px; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">Vote nulo</em>, soam realmente pueris em seu panfletarismo raso anarquista, mas já nos primórdios se notava um certo esforço intelectual e poético mais profundo, especialmente quando vislumbravam possibilidades utópicas para um futuro que não se imaginava, então, tão distante – 35 anos depois, o que temos é uma distopia, com essa pandemia sem fim e um candidato patético a <em style="border: 0px; box-sizing: inherit; font-weight: inherit; margin: 0px; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">fuhrer</em> tupiniquim alojado no palácio do planalto. É o caso da já citada <em style="border: 0px; box-sizing: inherit; font-weight: inherit; margin: 0px; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">Dia A</em>, de <em style="border: 0px; box-sizing: inherit; font-weight: inherit; margin: 0px; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">Projeto futuro</em> e das clássicas <em style="border: 0px; box-sizing: inherit; font-weight: inherit; margin: 0px; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">Auge revolucionário</em> e <em style="border: 0px; box-sizing: inherit; font-weight: inherit; margin: 0px; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">Revolta social futura</em>, que provavelmente não estão aqui porque já haviam sido regravadas no álbum <em style="border: 0px; box-sizing: inherit; font-weight: inherit; margin: 0px; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">Em carne viva</em> (2002).</p><p style="background-color: white; border: 0px; box-sizing: inherit; font-family: Barlow, sans-serif; font-size: 20px; margin: 0px 0px 1.6em; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;"><em style="border: 0px; box-sizing: inherit; font-weight: inherit; margin: 0px; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">Primitiva 1985</em> se beneficiou do fato de ter sido gravado por uma das melhores formações da banda, infelizmente já desfeita: Silvio no vocal, Alexandre Gandhi na guitarra, Ivo Delmondes no baixo e Oitchi, discípulo de Babalu, na bateria. Isso reflete nos arranjos, em geral fiéis aos originais, mas com um molho a mais, e na execução precisa, afiada. Além da qualidade técnica oriunda do natural avanço tecnológico, evidentemente.</p><p style="background-color: white; border: 0px; box-sizing: inherit; font-family: Barlow, sans-serif; font-size: 20px; margin: 0px 0px 1.6em; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">Periga ser o melhor disco da banda. A lamentar, somente, a ausência da frase antológica que havia na gravação original de <em style="border: 0px; box-sizing: inherit; font-weight: inherit; margin: 0px; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">PMs espancadores</em>: “vão espancar o cu das suas mães”.</p><p style="background-color: white; border: 0px; box-sizing: inherit; font-family: Barlow, sans-serif; font-size: 20px; margin: 0px 0px 1.6em; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">A..</p><p style="background-color: white; border: 0px; box-sizing: inherit; font-family: Barlow, sans-serif; font-size: 20px; margin: 0px 0px 1.6em; outline: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;">#</p>Adelvan Kenobihttp://www.blogger.com/profile/06307759808605250885noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4793536658109166560.post-70597058656319371422021-06-23T16:17:00.007-07:002021-06-25T15:30:22.880-07:00PODRÃO ANIQUILAÇÃO<p><span style="font-size: 18pt;"></span></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjaB_nGQSDM6AmzoF109rHk_2MGhxmWfDJ2U81peXL_ZuGzYzOq3CfO7KHuvqla7S6s8wqaIvcGlfbX2lw2BzWDt3aJn1Vu1wvPK8ponOZuNUfUJiu8iNb3tMeaV50a_ujQbxQ1MAXUMjGE/s1023/podr%25C3%25A3o+VHS-2.jpg" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1023" data-original-width="1023" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjaB_nGQSDM6AmzoF109rHk_2MGhxmWfDJ2U81peXL_ZuGzYzOq3CfO7KHuvqla7S6s8wqaIvcGlfbX2lw2BzWDt3aJn1Vu1wvPK8ponOZuNUfUJiu8iNb3tMeaV50a_ujQbxQ1MAXUMjGE/s320/podr%25C3%25A3o+VHS-2.jpg" /></a></div><p style="text-align: left;"><span style="font-size: large;">Pablo
Carranza nasceu em Aracaju em 1986, portanto não tinha idade para viver o tempo
do auge das videolocadoras. Seu “gibizão” PODRÃO ANIQUILAÇÃO, no entanto,
reproduz com perfeição o espírito das sessões de filmes “trash” compartilhadas
com os amigos em finais de semana modorrentos da década de 1980, cujas fitas
eram invariavelmente alugadas na locadora do bairro usando o cadastro dos pais.
</span><span style="font-size: 18pt;"> </span></p><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: large; line-height: 115%;"></span></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><span style="font-size: large; line-height: 115%;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEipGU7ejhKr6yJKsaWPm6auzlzwKo77hhteBvV5lk9gLnBH53Sxt-fnPAUpzlKY-ZHL35xg69VKin6JRLci8ntgn8u8BecwOKZMStaYVezQw9h5-mQlmq60bNUIdF3NcNDCTlDALs4RPreE/s1200/podr%25C3%25A3o+Et4Ig1kXMAkXh4l.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" data-original-height="1200" data-original-width="1200" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEipGU7ejhKr6yJKsaWPm6auzlzwKo77hhteBvV5lk9gLnBH53Sxt-fnPAUpzlKY-ZHL35xg69VKin6JRLci8ntgn8u8BecwOKZMStaYVezQw9h5-mQlmq60bNUIdF3NcNDCTlDALs4RPreE/s320/podr%25C3%25A3o+Et4Ig1kXMAkXh4l.jpg" /></a></span></div><span style="font-size: large; line-height: 115%;">O próprio
formato do livro foi pensado para reproduzir o de uma fita VHS, inclusive no
volume: são 288 páginas de ação, violência, escatologia e até sexo explícito!
Uma delícia! É sério: esse quadrinho é uma obra-prima do gênero. A narrativa,
fluida, descomplicada e enxuta, a despeito do volume de páginas, gira em torno
dos perrengues vividos pelos quiosques de lanches populares com a concorrência
das hamburguerias “gourmet”, que têm se reproduzido feito mosca pela cidade e
abocanham uma boa fatia da clientela, aquela mais afeita a modismos.<o:p></o:p></span><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: large; line-height: 115%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: large;"><span style="line-height: 115%;">A cidade, no
caso, é Aracaju mesmo! Os sergipanos têm vários motivos a mais para degustar
essa iguaria, pois reconhecerão<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>diversos
personagens, lugares e situações, como o delegado Bareta e seu assistente
Torroio, sempre às voltas com as confusões envolvendo uma maionese radioativa
que se tornou um sucesso absoluto de vendas no Galego´s lanches e cuja fórmula,
depois de roubada, acaba<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>servindo de
base também para a fritura dos pastéis “shing ling” da concorrência – a essa
altura ninguém nem lembra mais da hamburgueria hypada, cujo dono acaba se tornando
vítima e principal suspeito, ao mesmo tempo, de misteriosos desaparecimentos.
Só lendo pra crer. Leia! PODRÃO ANIQUILAÇÃO é um lançamento em parceria da MAU
GOSTO PRODUÇÕES, do autor, com a ESCÓRIA COMIX, e está a venda nas piores lojas
do ramo. Na loja do autor, </span><a href="http://maugosto.iluria.com/"><span style="line-height: 115%;">http://maugosto.iluria.com</span></a><span style="line-height: 115%;"> , você encontra também diversos
outros produtos personalizados, como camisetas, posters, adesivos, bonés,
chaveiros , carteiras de despachante (!!!!!)<span style="mso-spacerun: yes;">
</span>e as sensacionais figurihnas dos “xingamentos literais”.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: large; line-height: 115%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: large; line-height: 115%;">XINGAMENTOS
LITERAIS é uma das melhores publicações do Pablo, um livrinho minúsculo com
representações iconográficas de impropérios como “casa do caralho”, “gordo
escroto”, “puta merda”, “putaria da porra” e outras do mesmo “naipe”. De novo:
Só vendo pra crer. Tempo desses encontrei vários espalhados entre os exemplares
de publicações, digamos, convencionais, expostas nas prateleiras de uma
respeitável cadeia de livrarias da cidade, num evidente ato de sabotagem
cometido por algum guerrilheiro underground. Essa rede costuma vender as
publicações do Pablo: “podrão aniquilação” está lá, na mesma prateleira dos
mangás e publicações juvenis da Marcel e dc comics. Garanta o seu enquanto o
gerente não resolve dar uma folheada e toma um susto com o conteúdo.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: large; line-height: 115%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: large; line-height: 115%;">Pablo
Carranza começou a desenhar sob a influência do que lia quando era criança, que
era o que toda criança lia: Turma da Mônica, Disney, Marvel e DC. Até que, aos
20 anos, conheceu Marcatti, Harvey Pekar, Robert Crumb e Chiclete com Banana. Descobriu
ali que nunca mais iria ganhar dinheiro fazendo quadrinhos, mas iria fazer os
tipos de quadrinhos que passou a gostar de ler.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: large; line-height: 115%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: large; line-height: 115%;">Apesar dessa
opção radical ele tem uma carreira relativamente bem sucedida como ilustrador:
publicou por mais de um ano num conhecido jornal semanal de classificados local
e chegou a ficar em segundo lugar no tradicional e conceituado salão de
humor<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>de Piracicaba – os apresentadores
tomaram um susto ao vê-lo subir ao palco para pegar o troféu pois não imaginavam
que ele estaria presente, já que era de Aracaju. Mas foi morar em São Paulo,
onde publicou, com financiamento do PROAC, programa de ação cultural do governo
do estado , o divertido livro<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>“Se a vida
fosse como a internet”. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: large; line-height: 115%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: large; line-height: 115%;">“Se a vida
fosse como a internet” era divertido mas light, inofensivo. Não fosse assim não
teria sido publicado com o apoio de uma lei de incentivo à cultura. Serviu para
projetá-lo, pois ganhou o troféu “HQ Mix”, o mais conceituado dos quadrinhos
brasileiros, na categoria “melhor publicação de humor gráfico”. Muito
provavelmente por isso apareceu em matérias da grande imprensa e nas
prateleiras da rede de livrarias local já citada, onde eu o conheci. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: large; line-height: 115%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: large; line-height: 115%;">Serviu
também para que ele entrasse no “cast” da Editora “Beleléu”, do Rio de Janeiro,
para onde ele se mudou e onde pôde publicar com muito mais independência e sem
amarras “morais”, digamos assim. Foi lá que criou a revista SMEGMA, onde pôde por
pra fora todo o seu arsenal de infâmias em personagens antológicos como Rivalino
e o “Playboy de Nazaré” – uma versão mimada e bombada de quem você está
pensando mesmo. Publicou também sátiras implacáveis de sucessos do cinema, como
Mad Max 2, e de alguns de seus pares mais bem sucedidos, como Fabio Moon e
Gabriel Bá, Mauricio de Souza, Vitor Caffagi, Armandinho e Laerte que,
curiosamente, foi a única a reclamar, via e-mail. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: large; line-height: 115%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: large; line-height: 115%;">Carranza
voltou a morar em Aracaju. Sua intenção era fugir do alto custo de vida da
metrópole, para onde viajaria apenas para exposições em convenções e feiras de
quadrinhos. Acabou ficando ilhado pela pandemia, como todos nós – os que têm
bom senso, pelo menos. Mas como há males que vêm para o bem – ou não – isso
deve ter ajudado na finalização de sua obra prima, o “podrão aniquilação”.
Perguntei aqui a ele se foi isso mesmo, via whatsapp, mas ele ainda não me
respondeu – provavelmente porque tem coisa melhor pra fazer do que ficar vendo
mensagens desse aplicativo maldito. Fala aí você com ele, o número é +55 21
96900-6688 – não estou cometendo nenhuma indiscrição, o contato é publico, ta
lá no site da loja. Só não coloque ele em nenhum grupo, por favor. Ele não
quer. Faz muito bem. Fale somente o necessário e deixe o cara quieto pra ver se
ele comete outra insanidade do mesmo calibre do “podrão”.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal"><span style="font-size: large; line-height: 115%;"><br /></span></p><p class="MsoNormal"><span style="font-size: large;">A.</span></p><p class="MsoNormal"><span style="font-size: large;">#</span></p>Adelvan Kenobihttp://www.blogger.com/profile/06307759808605250885noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4793536658109166560.post-5510281609722828772020-12-05T10:40:00.006-08:002020-12-05T10:48:34.205-08:00Itabaiana calling<p><span style="font-size: 18pt;"></span></p><span style="font-size: large;"><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgrttuZu9KizGYQ4K2lDF4QPzUbrGdS8O0DZtbYMItsmrXYjFusUDhW3_R-JAWtRy29DtypJUdrurqUnKXgQVQ3_t1558aro-1KpUopvZNQ02JdvlvK9FB8156Bq3BIxBl5BSr_1BuPeI_0/s720/itabaiana_calling_poca_olho.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="484" data-original-width="720" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgrttuZu9KizGYQ4K2lDF4QPzUbrGdS8O0DZtbYMItsmrXYjFusUDhW3_R-JAWtRy29DtypJUdrurqUnKXgQVQ3_t1558aro-1KpUopvZNQ02JdvlvK9FB8156Bq3BIxBl5BSr_1BuPeI_0/s320/itabaiana_calling_poca_olho.png" width="320" /></a></div>Nasci em
Itabaiana, interior de Sergipe, em 1971. Sou “nascido e criado” lá, já que só
me mudei definitivamente para a capital, Aracaju, aos 18 anos. Lá desenvolvi o
hábito da leitura, através dos quadrinhos, principalmente de “Tex”, que meu
irmão mais velho colecionava, e também o gosto pelo jornalismo, provavelmente a
partir das revistas “Manchete” que um tio, que tinha um bar, tinha sempre a
disposição para os clientes. Eram revistas sem capa – na época as
distribuidoras, para baratear o frete, devolviam apenas as capas para as
editoras, para comprovar que o exemplar não havia sido vendido.</span><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: large; line-height: 115%;"> </span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: large; line-height: 115%;">Com o rock
“underground” devo ter tido meu primeiro contato vendo a já célebre matéria
sobre os punks paulistanos no<i> Fantástico,
</i>sempre citada até hoje em documentários e entrevistas<i>. </i>Lembro que, a partir dali, o termo, antes desconhecido, virou uma
espécie de xingamento no meu circulo de amigos: “Vôte, fulano parece que é punk,
só vive fazendo ‘Indiagem”(termo evidentemente pejorativo e politicamente
incorreto que era usado como sinônimo de bagunça na época). <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: large; line-height: 115%;"> </span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: large; line-height: 115%;">Comecei a
conhecer melhor e a me identificar com aquele novo universo quando a rede globo
transmitiu ao vivo a primeira edição do rock in rio. Tinha um povo muito doido
e diversificado ali, uns fazendo musica festiva e dançante com umas perucas
estranhas, outros falando do diabo no palco ao som de guitarras distorcidas!
Tinha até um coroa maluco que arrancou a cabeça de um morcego com a boca e
cuspiu! Impossível ignorar. E tinha a Nina Hagen! Caralho, ela era bem louca,
uma espécie de Cindy Lauper levada às ultimas conseqüências ...<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: large; line-height: 115%;"> </span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: large; line-height: 115%;">Na Livraria
Cunha – que na verdade era uma papelaria, mas funcionava também como banca de
revistas – chegavam os quadrinhos de super heróis que eu tanto amava e também
as revistas Bizz e Chiclete com banana. Em novembro de 1986 resolvi comprar
minha primeira Bizz, a de numero 16, que tinha Matt Dillon, o ator, na capa .
Foi nela que li pela primeira vez a respeito de bandas clássicas das quais nunca
tinha ouvido falar, como The Doors e Velvet Underground, e do universo musical
alternativo, notadamente o pós punk e a vanguarda paulistana. Notei que havia
muito mais coisas entre o céu e a terra do que supunha a minha vã filosofia
alimentada pelo radio e a televisão ...<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: large; line-height: 115%;"> </span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: large; line-height: 115%;">O fascínio
só aumentou quando conheci também o universo radical do metal, a partir da
audição do álbum “Somewhere in time”, do Iron Maiden. Virei “metaleiro”, membro
de uma “tribo” que em Itabaiana tinha pouquíssimos adeptos, só eu e mais dois
ou três amigos – sendo que um se revelou um “poser” ao ficar com dor de cabeça
durante a primeira audição do recém-lançado <i>reign
in blood</i> do slayer, e foi devidamente enxotado da confraria. A necessidade
de aumentar esse séquito fez com que eu tivesse a brilhante idéia de fazer uma
“apostilha” com pequenas biografias de minhas bandas preferidas para distribuir
pela cidade. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: large; line-height: 115%;"> </span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: large; line-height: 115%;">A primeira
edição do NAPALM, a tal “apostilha” – que na verdade eu pensei como uma revistinha
artesanal, portanto precisava de um nome – saiu em abril de 1988, com uma capa
desenhada por mim mesmo a partir de uma arte de Libero Malavoglia para a banda
Chave do Sol, de São Paulo. Eram cerca de 15 folhas de papel A4 datilografadas,
xerocadas e grampeadas, frente e verso. O nome eu tirei de uma foto da
apresentação da Legião Urbana na célebre casa noturna paulistana do início da
década de 1980 que eu havia visto na Bizz, depois de descobrir que se tratava
de uma bomba incendiária que havia sido usada no Vietnã. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: large; line-height: 115%;"> </span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: large; line-height: 115%;">Deu certo:
começou a circular pelos corredores do colégio onde eu estudava e além - a
noticia de que havia um fanzine – era esse o nome da criatura, soube depois - circulando pelo interior do estado chegou à
loja de discos Disturbios Sonoros, de Aracaju. Um dos sócios, Antonio Passos,
ofereceu-se para conseguir uma tiragem maior, de cem cópias – nem sei mais
quantas eram no inicio, mas acho que não
chegavam a dez – e passou a vender exemplares, o que fez com que Silvio
“Suburbano”, vocalista da pioneira banda punk Karne Krua, me mandasse um
pacotão recheado com publicações semelhantes vindas de todos os cantos do
Brasil. Só ali percebi que havia toda uma rede de comunicação subterrânea
circulando mundo afora divulgando uma vasta gama de assuntos que não chegavam à
grande mídia. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-size: large; line-height: 115%;"> </span></p>
<span face=""Calibri","sans-serif"" style="font-size: large; line-height: 115%; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-theme-font: minor-latin; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-bidi-language: AR-SA; mso-bidi-theme-font: minor-bidi; mso-fareast-font-family: Calibri; mso-fareast-language: EN-US; mso-fareast-theme-font: minor-latin; mso-hansi-theme-font: minor-latin;">Cheguei a entrar em contato timidamente com essa
rede através dos endereços que constavam no pacotão de Silvio e na sessão de
cartas da revista Rock Brigade, que começou como um fanzine mas a essa altura
já chegava nas bancas de Aracaju – era a célebre <i>Headbanger´s voice</i>, imortalizada inclusive numa música da Gangrena
Gasosa, banda do Rio de Janeiro. Mas a brincadeira foi interrompida pelas
necessidades da vida: passei no vestibular e fui sugado pelo mundo acadêmico,
me restando pouco tempo e dinheiro, principalmente, para dedicar ao <i>Napalm, </i>que teve ao todo seis edições.</span><div><span face=""Calibri","sans-serif"" style="font-size: large; line-height: 115%; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-theme-font: minor-latin; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-bidi-language: AR-SA; mso-bidi-theme-font: minor-bidi; mso-fareast-font-family: Calibri; mso-fareast-language: EN-US; mso-fareast-theme-font: minor-latin; mso-hansi-theme-font: minor-latin;"><br /></span></div><div><span face=""Calibri","sans-serif"" style="font-size: large; line-height: 115%; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-theme-font: minor-latin; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-bidi-language: AR-SA; mso-bidi-theme-font: minor-bidi; mso-fareast-font-family: Calibri; mso-fareast-language: EN-US; mso-fareast-theme-font: minor-latin; mso-hansi-theme-font: minor-latin;">por Adelvan</span></div><div><span face=""Calibri","sans-serif"" style="font-size: large; line-height: 115%; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-theme-font: minor-latin; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-bidi-language: AR-SA; mso-bidi-theme-font: minor-bidi; mso-fareast-font-family: Calibri; mso-fareast-language: EN-US; mso-fareast-theme-font: minor-latin; mso-hansi-theme-font: minor-latin;"><br /></span></div><div><span face=""Calibri","sans-serif"" style="font-size: large; line-height: 115%; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-theme-font: minor-latin; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-bidi-language: AR-SA; mso-bidi-theme-font: minor-bidi; mso-fareast-font-family: Calibri; mso-fareast-language: EN-US; mso-fareast-theme-font: minor-latin; mso-hansi-theme-font: minor-latin;"><a href="https://pocaolho.com.br/" target="_blank">@pocaolho</a></span></div><div><span face=""Calibri","sans-serif"" style="font-size: large; line-height: 115%; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-theme-font: minor-latin; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-bidi-language: AR-SA; mso-bidi-theme-font: minor-bidi; mso-fareast-font-family: Calibri; mso-fareast-language: EN-US; mso-fareast-theme-font: minor-latin; mso-hansi-theme-font: minor-latin;"><br /></span></div><div><span face=""Calibri","sans-serif"" style="font-size: large; line-height: 115%; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-theme-font: minor-latin; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-bidi-language: AR-SA; mso-bidi-theme-font: minor-bidi; mso-fareast-font-family: Calibri; mso-fareast-language: EN-US; mso-fareast-theme-font: minor-latin; mso-hansi-theme-font: minor-latin;"># </span></div>Adelvan Kenobihttp://www.blogger.com/profile/06307759808605250885noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4793536658109166560.post-953451846515010292020-12-05T09:31:00.005-08:002020-12-05T09:35:41.665-08:00Horrores Humanos<p></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj6mCA8PuAGd6Bqboa1H8dpYezIItSZuvHPyRh0euZL7otiW9T9xSqnPN0hrdcpjSZzFYnBvKmnqm8NKJoCu6O-QixW4OfZ8O6h8u5Zyv5IXGb4h-RunwlRKzzNGYjt6aEEDz3Z1uC5F610/s960/kk+D_NQ_NP_2X_855167-MLB26414497796_112017-F.webp" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="960" data-original-width="960" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj6mCA8PuAGd6Bqboa1H8dpYezIItSZuvHPyRh0euZL7otiW9T9xSqnPN0hrdcpjSZzFYnBvKmnqm8NKJoCu6O-QixW4OfZ8O6h8u5Zyv5IXGb4h-RunwlRKzzNGYjt6aEEDz3Z1uC5F610/s320/kk+D_NQ_NP_2X_855167-MLB26414497796_112017-F.webp" /></a></div>Conheci a Karne Krua no II Festcore de Aracaju, o primeiro
festival de rock que fui em minha vida, em 1987, aos 16 anos. Eu morava no
interior do estado, em Itabaiana, e estava começando a mergulhar nesse universo
totalmente novo pra mim. Fiquei impressionado! Lembro de ter pensado “caralho, essa
banda é tão boa quanto o Cólera” – era minha principal referencia, pois tinha
comprado o disco ao vivo na Europa através do CIC, Centro Informativo Cólera, e
ouvia sem parar. Também porque tinha pouquíssimos outros discos para ouvir na
época.<p></p><p></p>
<p class="MsoNormal">Fiquei amigo de Silvio, o vocalista, e cliente da loja de
discos dele, a Lokaos. E fã da Karne Krua. De lá pra cá acompanhei todas as
fases, fui a incontáveis shows e ensaios. E foram muitas, fases e shows e
ensaios. Karne Krua tem 35 anos de existência ininterrupta! Nunca parou!</p>
<p class="MsoNormal">Conheci o rock, também, graças ao radio. Primeiro através
dos hits de bandas como Legião, Titãs e Ultraje, que tocavam na programação
normal. Depois por um programa específico, o “Rock Revolution”, que era
produzido pelos caras da loja Disturbios Sonoros, de Aracaju, na radio Atalaia
FM. Me marcou bastante. Sempre tive vontade de ter um programa de rádio. Ajudei
a produzir um na Itabaiana FM já na década de 1990. Foi divertido, tocamos
Napalm Death e Carcass no intervalo da transmissão da inauguração de um poço
artesiano pelo então vice-governador do estado, que era o dono da emissora! Mas
tinha pouquíssima audiência, evidentemente. Era uma excentricidade, quase uma
molecagem. Em todo caso, cheguei a entrevistar a Karne Krua numa das raras
ocasiões em que eles se apresentaram por lá.</p>
<p class="MsoNormal">Em 2007, 20 anos após a noite em que fui ao meu primeiro
show de rock da vida, consegui finalmente um espaço no radio em Aracaju, na
emissora publica do estado, a Aperipê FM. E em 2012 a Karne Krua se apresentou
no meu programa de radio! A apresentação foi transmitida ao vivo, direto do
estúdio. Foi meu “momento John Peel”. Memorável.</p>
<p class="MsoNormal">A apresentação foi também gravada e posteriormente lançada no
CD Demo “Horrores Humanos”, que chega agora ao formato de streaming. São várias
sessões de gravação registradas em diversos estúdios ao longo dos anos de 2011,
2012 e 2015. Um registro poderoso de uma formação marcante para a banda, com
Ivo no Baixo, Alexandre Gandhi na guitarra e Adriano na bateria. Foi nessa fase
que a lançaram seus excelentes dois últimos álbuns, “Inanição” e “Bem vindos ao
fim do mundo”, em CD e LP de vinil, respectivamente, além do EP “split” com a
banda brasiliense Besthoven, lançado em compacto de vinil de sete polegadas.</p>
<p class="MsoNormal">As duas ultimas
faixas de “Horrores Humanos”, gravadas ao vivo no Bateras Beat, em 2015, já
previam as novas mudanças pelas quais a banda passaria depois de um longo e
produtivo período de estabilização na formação: Já contam com Oitchi, que
substituiu Adriano, na bateria. Pouco tempo depois a banda perderia não somente
Oitchi, mas também o guitarrista, Alexandre Gandhi. Seguem firmes, no entanto:
os substitutos, Afonso, na bateria, e Lilo, na guitarra, já estão perfeitamente
entrosados, com diversos shows no “currículo”, inclusive. Estão parados por
conta da pandemia, mas prometem para breve um novo lançamento, “primitiva”, uma
volta às raízes, com algumas musicas inéditas e outras antigas mas nunca editadas
em álbuns ou demos.</p><p class="MsoNormal">por Adelvan Kenobi</p><p class="MsoNormal">Ouça <a href="https://brechodiscos.bandcamp.com/album/horrores-humanos-ao-vivo" target="_blank">AQUI</a></p><p class="MsoNormal">#</p>Adelvan Kenobihttp://www.blogger.com/profile/06307759808605250885noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4793536658109166560.post-74863851114303813552020-12-05T09:13:00.002-08:002020-12-05T09:41:45.959-08:00o rock alivia<p></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgaAE0kBwqWQBkrahTJzKIIc87C561QqoFEbCv9TaCQr3xHkCXu2rdE5RBFDZdFwMb9UDwiL8RUPdt2LYdH-MK5-jQP1AsmHQRLVBjQKt0isi_GlGrGQtPN_hW2SY6f6FHI4A6lwivakjgC/s1280/Nordeste-em-Chamas-2.jpg" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1280" data-original-width="1280" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgaAE0kBwqWQBkrahTJzKIIc87C561QqoFEbCv9TaCQr3xHkCXu2rdE5RBFDZdFwMb9UDwiL8RUPdt2LYdH-MK5-jQP1AsmHQRLVBjQKt0isi_GlGrGQtPN_hW2SY6f6FHI4A6lwivakjgC/s320/Nordeste-em-Chamas-2.jpg" /></a></div>No último mês de julho, em plena pandemia, os perfis de
redes sociais mais ligadas ao “underground” roqueiro foram tomados pela imagem
de divulgação de uma megacoletânea que se propunha a mapear o momento atual da
cena punk hardcore nordestina. São 101 bandas de todos os estados da região,
organizadas em ordem alfabética – começando com o Autopse, de Alagoas, e
terminando com a Olho por olho, de Sergipe. Uma verdadeira “tour de force”
concebida a partir de Itabuna, no sul da Bahia, através do selo “Tocaia”, mas
que chamou mesmo a atenção pela capa, uma recriação da icônica ilustração de HR
Giger para o álbum “To Mega Therion”, da banda pioneiora do death metal suíço
Celtic Frost. “Satan”, a obra do eterno criador do Alien, mostra o demônio
usando uma imagem de Jesus crucificado como estilingue. Na coletânea da Tocaia
vemos Lampião fazendo o mesmo com Bolsonaro.
O desenho é de Adilson Lima, ilustrador itabaianense que vem se
destacando como um “capista” de mão cheia, a cada dia mais requisitado por
bandas de rock “pauleira”.<p></p>
<p class="MsoNormal">A provocação serviu como uma luva para os que ainda têm
fôlego para o “debate” político polarizado e nivelado por baixo que vemos se
arrastar há pelo menos 10 anos e acabou se tornado mais uma evidencia de algo
que eu sempre digo: se engana quem acha que o mundo do rock está tomado por
hostes reacionárias de extrema direita. É certo que há os que comungam desse anacronismo,
tanto no “mainstrean” – Lobão e Roger, do Ultraje a rigor, são os nomes que
logo vêm à mente – quanto nos guetos do punk e do metal: Fabio,. Vocalista da
icônica Olho Seco, de São Paulo, Digão, do Raimundos, Roosevelt “Bala”, do
Stress, de Belém do Pará – a banda que lançou o primeiro disco de Heavy metal
brasileiro – foram apenas alguns dos que “saíram do armário” recentemente. Mas
isso faz parte de um fenômeno que estamos vendo se espalhar por todo o mundo,
impulsionado em grande parte pelas redes sociais. Não é exclusividade do rock,
definitivamente.</p>
<p class="MsoNormal">A mim causa estranheza este tipo de posicionamento, tendo em
vista que o rock foi, em sua origem, a música que fez cair as barreiras entre
pretos e brancos em plena América ainda dominada pela segragação racial
legalizada. Mas a verdade é que sempre existiram roqueiros “de direita”: há,
por exemplo, o episódio célebre em que Elvis, “The pelvis”, apareceu de
surpresa na Casa Branca ocupada por Richard Nixon oferecendo-se como delator
“infiltrado” a serviço do FBI. Temos também Ted Nugent, Dave Mustaine, e mais
recentemente John Lydon e Krist Novoselic apoiando atitudes tresloucadas de
Donald Trump. Mas eu, particularmente, sempre achei e continuo achando que são
exceções. O rock na minha cabeça sempre foi uma subcultura de cunho libertário
e progressista. Teve um impacto muito grande na minha vida e na de muita gente
que eu conheço: eu tive uma formação católica tradicional e repressora, da qual
me libertei, em grande parte, a partir da descoberta de todo aquele universo
musical e cultural barulhento e contestador no qual passei a mergulhar a partir
da transmissão do primeiro rock in rio pele TV aberta e pela leitura da revista
Bizz, que chegava em minha cidade, Itabaiana.</p>
<p class="MsoNormal">Apesar de reconhecer que o gênero está estagnado, sem
produzir nada de realmente novo e arrebatador há pelo menos vinte anos, ainda
defendo o rock porque o rock, se não me salvou – porque quem salva é Deus, o
rock só alivia, como dizia o Made in Brazil – aliviou bastante boa parte de
minhas angustias ao longo dos últimos 35 anos.</p>
<p class="MsoNormal">Adelvan Kenobi</p><p class="MsoNormal"><a href="https://pocaolho.com.br/" target="_blank">@pocaolho</a></p><p class="MsoNormal">#</p>Adelvan Kenobihttp://www.blogger.com/profile/06307759808605250885noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-4793536658109166560.post-49786790463770429282020-07-07T18:29:00.002-07:002020-07-07T18:29:22.810-07:00Amaral CavalcanteNa década de 1980 minha familia costumava "descer a serra" de Itabaiana ruma a Aracaju para se esparramar nas areias da Atalaia ou da praia dos artistas. Foi nessa época que tive meus primeiros contatos com o "pasquim sergipano", o jornal alternativo Folha da praia, distribuído farta e gratuitamente entre os que tostavam ao sol entre banhos de mar, farofa e cerveja gelada. Mais tarde, já universitário - e "fanzineiro" - fui convidado por um amigo, Antonio Passos, a escrever meu primeiro artigo para aquele mesmo jornal. Dois, na verdade: um sobre a chegada das TVs por assinatura a nosso país e outro sobre, veja só, perversão sexual!<br />
<br />
Só fui conhecer seu editor, Amaral Cavalcante, cerca de 20 anos depois, quando participamos juntos de algumas edições do programa de debates "Contraponto" da TV Aperipê, a emissora pública do estado de Sergipe. Ele então me ofereceu uma coluna fixa sobre cultura naquele mesmo Folha da praia, que continuava circulando gratuitamente pela cidade. Aceitei, claro, e foi graças a Amaral, que quando eu menos esperava me ligava pedindo um novo texto longo ou notas para a coluna, que eu não parei completamente de escrever - quem um dia acompanhou esse blog e o visita esporadicamente certamente já notou isso: as poucas matérias publicadas com a minha assinatura nos últimos tempos foram reproduções de textos publicados originalmente no Folha da praia ou na revista Cumbuca, que ele também editava.<br />
<br />
Amaral morreu hoje, aos 73 anos. Com a morte de Amaral é possível que este blog morra de vez, ou entre num longo períordo de hibernação. o tempo dirá. Segue <a href="http://jlpolitica.com.br/colunas/aparte/posts/amaral-cavalcante-se-foi-mas-e-um-que-se-fica" target="_blank">um texto que o jornalista e poeta Jozailto Lima publicou hoje em seu site</a> que faz jus à sua memória, muito mais que essas mal traçadas linhas que teclei de forma hesitante e atabalhoada até aqui.<br />
<br />
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #333333; font-family: Overpass, sans-serif; font-size: 14px; margin-bottom: 10px;">
Um beat. Um poeta. Um iconoclasta. Um lúdico. Um lírico. Um memorialista. Um passional. Um jornalista. Um arregimentador de desiguais e de diferentes. Um boêmio. Um que marcou.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #333333; font-family: Overpass, sans-serif; font-size: 14px; margin-bottom: 10px;">
Em diversas categorias de definições bem se encaixava o velho Antonio Amaral Cavalcante, que na madrugada deste dia 7 de julho juntou uma bota noutra com o bico pra cima e bateu às portas de São Pedro. </div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #333333; font-family: Overpass, sans-serif; font-size: 14px; margin-bottom: 10px;">
Amaral Cavalcante lutou bravamente, entre uns e vinhos, contra um diabetes indelicado, um câncer de próstata, mas não quis prosa com a Covid-19 que Jair Bolsonaro batizara de uma gripinha. </div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #333333; font-family: Overpass, sans-serif; font-size: 14px; margin-bottom: 10px;">
Amaral Cavalcante morreu nesta madrugada na Urgência do Hospital do Ipes e vai ser cremado na Caueira ainda durante esta terça-feira numa solenidade nada solene: só ele com seu fogo final. No atestado de óbito está contida a inscrição da Covid.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #333333; font-family: Overpass, sans-serif; font-size: 14px; margin-bottom: 10px;">
Antonio Amaral Cavalcante nasceu no dia 11 de julho de 1946 em Simão Dias - estava, portanto, a quatro dias de emplacar 74 anos. Foi avexado, e partiu sem arredondar a conta.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #333333; font-family: Overpass, sans-serif; font-size: 14px; margin-bottom: 10px;">
Impossível pensar a cena da memória, da cultura beat e do jornalismo sergipano sem que se puxe uma cadeira cativa e fornida para Amaral Cavalcante. Nos anos 70 e 80 ele deu dois tiros certeiros nos agitos culturais do lugar.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #333333; font-family: Overpass, sans-serif; font-size: 14px; margin-bottom: 10px;">
Com um, funda o irreverente Folha da Praia, que foi laboratório jornalístico e da contracultura de muitos malucos sergipanos e aqui aportados. A Folha da Praia foi, em versão serigyzada, um Pasquim. Um monumento ao jornalismo destabacado, lírico, chutador de paus de barraca. Contestador.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #333333; font-family: Overpass, sans-serif; font-size: 14px; margin-bottom: 10px;">
Era um inferninho contra botas e quepes de milicos e adesistas da nada branda ditadura militar, hoje irresponsavelmente tão evocada com suspiros de saudade por alguns insanos. A Folha fez história e garantiu a existência e os vinhos de Amaral.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #333333; font-family: Overpass, sans-serif; font-size: 14px; margin-bottom: 10px;">
Ainda na mesma década, Amaral Cavalcante causou com "Instante Amarelo", seu único livro de poemas publicado em vida - bom livro, por sinal. Ele era, ao modo arrebentador, signatário da poesia marginal dos 70, que tinha uma visão dos beats bem ativada. </div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #333333; font-family: Overpass, sans-serif; font-size: 14px; margin-bottom: 10px;">
Há em "Instante Amarelo" ecos de Cacaso, Leducha, Leminisk e de muitos dos seus contemporâneos, como Mário Jorge Menezes e Ilma Fontes, que reverberam a poesia dos 70 com dignidade na terra dos cajueiros e papagaios.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #333333; font-family: Overpass, sans-serif; font-size: 14px; margin-bottom: 10px;">
Neste milênio, convidado por mim a ser um cronista do falecido Cinform, Amaral Cavalcante surpreendeu com um jorro portentoso de escritos na esfera memorialista.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #333333; font-family: Overpass, sans-serif; font-size: 14px; margin-bottom: 10px;">
Destilou textos fantásticos, onde a linha do afeto memoralístico deu o ritmo, o compasso e a formação do livro "A vida me quer bem", uma reunião do melhor desta fase, que ele lançou dia 7 de novembro do ano passado.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #333333; font-family: Overpass, sans-serif; font-size: 14px; margin-bottom: 10px;">
Sim, a vida quis bem a Amaral Cavalcante e ele, inegavelmente, quis bem a ela. Uma pena que ambos tenham levantado o crachá do adeus assim tão cedomente. Tão precocemente.</div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEja-cbrLstiCEooH7qJz1JUuTp_3Q7omWZxxRA9ayIKbiorVlCFK42H0TWVPV8CiIwp0ZAFdQesR2-jsrWOS24i0fZ2V1bF_BtSaXtWKQNZD5KubERCBcDMqJLiT5Yvv6-PfY8QzzLlc8S6/s1600/Amaral_por_C_zar_de_Oliveira.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" data-original-height="500" data-original-width="331" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEja-cbrLstiCEooH7qJz1JUuTp_3Q7omWZxxRA9ayIKbiorVlCFK42H0TWVPV8CiIwp0ZAFdQesR2-jsrWOS24i0fZ2V1bF_BtSaXtWKQNZD5KubERCBcDMqJLiT5Yvv6-PfY8QzzLlc8S6/s400/Amaral_por_C_zar_de_Oliveira.jpg" width="263" /></a></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #333333; font-family: Overpass, sans-serif; font-size: 14px; margin-bottom: 10px;">
E, ainda mais, em tempo de pandemia de Covid-19, que nos veda de afagar os cabelos ou beijar a testa dos que partem.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #333333; font-family: Overpass, sans-serif; font-size: 14px; margin-bottom: 10px;">
Mas incomode-se não, Amaral velho de guerra, e se sinta afagado. Que a terra - ou melhor -, o fogo lhe seja leve.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #333333; font-family: Overpass, sans-serif; font-size: 14px; margin-bottom: 10px;">
#</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #333333; font-family: Overpass, sans-serif; font-size: 14px; margin-bottom: 10px;">
<br /></div>
<br />
<br />Adelvan Kenobihttp://www.blogger.com/profile/06307759808605250885noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4793536658109166560.post-75949098743217617982020-05-16T17:35:00.003-07:002020-05-16T17:40:30.237-07:00DENTRO DO PESADELO<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
</div>
<span style="color: red; font-size: large;"><b>Raskólnikov ficou de cama no hospital todo o fim da</b> <em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">Quaresma e também na Semana Santa. Quando já estava se re</em><em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">cu</em><em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">perando, recordou seus sonhos da fase de febre e delírio. Doente, sonhou que o mundo todo parecia condenado ao sacrifício por uma peste terrível, desconhecida e nunca vista, que provinha das profundezas da Ásia para a Europa. Todos tinham de morrer, exceto alguns escolhidos, muito poucos. Apareceram novos parasitas, criaturas microscópicas que se instalavam no corpo das pessoas. Só que tais criaturas eram espíritos, dotados de inteligência e vontade. As pessoas contaminadas por eles se tornavam imediatamente endemoniadas e loucas. Mas nunca, nunca as pessoas se consideravam tão inteligentes e tão inabaláveis na verdade como ocorria com os infectados. Jamais consideravam que houvesse algo mais inabalável do que suas sentenças, suas conclusões científicas, suas convicções morais e suas crenças. Povoados inteiros, cidades e populações inteiras se infectaram e enlouqueceram. Todos ficaram perturbados, ninguém se entendia, cada um achava que a verdade se encerrava só nele e sofria ao olhar para os demais, cada um batia no peito, chorava e retorcia as mãos. Não sabiam quem nem como julgar, não conseguiam entrar em acordo sobre o que era bom e o que era mau. Não sabiam quem deviam culpar e quem deviam inocentar. As pessoas se matavam umas às outras numa espécie de raiva insana. Uniam-se em exércitos inteiros, mas as tropas já em marcha começavam de repente a se dilacerar, as fileiras se dispersavam, os militares se atracavam entre si, furavam e cortavam, mordiam e comiam uns aos outros. Nas cidades, o sino de alerta tocava o dia inteiro: reuniam todos, mas ninguém sabia quem estava convocando nem para quê, e todos ficavam perturbados. Os ofícios mais corriqueiros foram abandonados, porque cada um propunha suas ideias, suas correções, e não conseguiam entrar num acordo; a agricultura parou. Aqui e ali, as pessoas se juntavam em bandos, concordavam em alguma coisa, juravam não se separar – mas logo começavam algo muito diferente daquilo que elas mesmas tinham acabado de propor, passavam a acusar uns aos outros, brigavam e se dilaceravam. Irromperam incêndios, começou a fome. Tudo e todos pereciam. A peste crescia e se alastrava cada vez mais. No mundo todo, só algumas pessoas conseguiram salvar-se, eram os </em><em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">puros e os eleitos, destinados a originar uma</em> <em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">nova espécie de pessoas e uma nova vida, a </em><em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">renovar e purificar a terra, mas ninguém via tais pessoas, em nenhum lugar, ninguém ouvia suas palavras nem sua voz</em>.</span><br />
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<br /></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<span class="capitalize" style="box-sizing: border-box; display: inline-block; float: left; font-family: "piaui" , "tahoma" , sans-serif "important"; font-size: 100px; font-weight: 700; line-height: 60px; margin: 12px 5px 0px 0px; padding: 0px; text-transform: uppercase;">B</span>astam algumas linhas para que o leitor se veja diante da pandemia do novo coronavírus. É impossível atravessar esse trecho do romance de Fiódor Dostoiévski sem associá-lo imediatamente à peste que assola o planeta. Embora seu poder de sugestão para os dias que correm seja flagrante e dispense comentários, devo uma explicação sobre as circunstâncias que trouxeram os delírios noturnos de Raskólnikov até aqui. <em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">Crime e Castigo</em> foi publicado há mais de 150 anos, em 1866. Li o romance quando já era adulto, há mais ou menos três décadas – e só uma vez. Bem próximo do final da trama, o pesadelo foi uma das cenas que me capturaram para sempre. Mas permaneceu todo esse tempo bem guardado, num canto remoto da memória, como que adormecido. E, ironicamente, não foi o cataclismo do coronavírus que o despertou.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Estávamos na campanha presidencial de 2018, poucos dias depois do atentado sofrido por Jair Bolsonaro em Juiz de Fora, quando essa passagem de <em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">Crime e Castigo</em> acendeu na minha mente como faísca. Corri para a estante, peguei o livro, achei o trecho, li uma, duas, várias vezes, e transcrevi a cena para o computador. Sem que tivesse isso muito claro, eu estava à procura de uma imagem que fosse excessiva, hiperbólica ou absurda mesmo para dar conta do sentimento de horror e incredulidade que havia me tomado. Tentei escrever um artigo a quente para o site da piauí usando a alegoria da peste que enlouquecia as pessoas para falar da calamidade que então se desenhava no horizonte do país. Simplesmente não funcionou. Não demorou para que o recurso à literatura me parecesse postiço e um pouco afetado diante da urgência da situação. A dinâmica daqueles dias tumultuados acabou devorando as minhas pretensões de iluminar o ingresso do país nas trevas com a imaginação sombria de Dostoiévski.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Sigo mais um pouco com essa digressão. Quando Bolsonaro e Fernando Haddad passaram ao segundo turno, logo ficou evidente quem iria ganhar. O PIB (ou a parte dele que ainda não tinha assumido publicamente seu lado) correu em bloco para o colo do candidato da extrema direita; do outro lado – onde se encontravam supostamente os democratas do país –, cada um correu para um canto, com cara de paisagem. Àquela altura da campanha, além da óbvia associação com o transe bolsonarista, o pesadelo de Raskólnikov me servia também como imagem da autofagia do campo político civilizado: <em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">Todos ficaram perturbados, ninguém se entendia, cada um achava que a verdade se encerrava só nele e sofria ao olhar para os demais, cada um batia no peito, chorava e retorcia as mãos. Não sabiam quem nem como julgar, não conseguiam entrar em acordo sobre o que era bom e o que era mau. Não sabiam quem deviam culpar e quem deviam inocentar</em>.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Não se tem notícia de que lideranças comprometidas historicamente com a democracia chegaram a chorar ou retorcer as mãos, mas todas, sem exceção, abdicaram de suas responsabilidades, cada uma batendo no próprio peito, como se a verdade se encerrasse toda em si, como se essa fosse apenas uma eleição – mais uma. Cegos ou omissos, colaboraram todos para pavimentar o caminho que Bolsonaro atravessou com ares triunfais, cuspindo ódio. É mais do que provável que esse desfecho fosse inevitável. Não acredito que a onda conservadora e a fúria revanchista que fermentaram na sociedade ao longo dos últimos anos pudessem ser revertidas nas urnas. Nada, no entanto, justifica as mesquinharias, a falta de percepção ou o pouco caso dos democratas diante do que estava em jogo. Ninguém fez boa figura. Ninguém mesmo.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Os tucanos empilharam vexames. Começaram lá atrás, em 2014, quando, derrotado por Dilma Rousseff, Aécio Neves colocou o resultado da eleição sob suspeição (nunca é demais relembrar os momentos marcantes da acumulação primitiva do bolsonarismo, chamemos assim). O playboy emplumado das Alterosas foi depenado pelo caminho, mas os tucanos seguiram sua marcha torta. Depois de apoiar o impeachment, dando aval (e não apenas os votos) à destituição de Dilma, o PSDB embarcou no governo de Michel Temer, capitaneado pelas pretensões delirantes de José Serra. Nomeado chanceler em retribuição à participação ativa nas articulações da parlamentada (na boa definição de Marcos Nobre), Serra acreditava que Temer era Itamar e ele seria o novo Fernando Henrique Cardoso. A sequência do filme todos conhecem. O senador tucano está praticamente reduzido à condição de fugitivo da Lava Jato – ele, que foi um importante ministro da Saúde na era FHC, hoje é irrelevante. E o PSDB, como se sabe, foi parar nas mãos de João Doria Júnior. Depois de abandonar a prefeitura paulistana e trair o padrinho Geraldo Alckmin, ele não hesitou em se oferecer para a dança do acasalamento com Bolsonaro, elegendo-se governador de São Paulo no sufoco, agarrado à chapa Bolsodoria. Da molecagem de Aécio em 2014, passando pelo patrocínio ao impeachment em 2016, até a carona no colo de Bolsonaro, em 2018, a trajetória descrita pelos tucanos pode ser lida como uma sucessão de flertes, cada vez mais ousados e explícitos, com a direita incivilizada. Em determinado momento pareceu impossível discernir a linha que separava o PSDB do Novo.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Ciro Gomes decidiu flanar em Paris no segundo turno da campanha, como se nada fosse, delegando ao irmão Cid a tarefa de avançar com a retroescavadeira contra a militância petista. Retroescavadeira era apenas metáfora, entendam. Como me disse um bom observador logo depois da eleição: “Descobrimos na campanha que o Ciro era melhor do que a gente imaginava, e também muito pior do que podíamos imaginar.” A definição paradoxal vai ao ponto. Os valores de Ciro são progressistas, sua atuação é relevante e faz diferença, mas sua personalidade é autoritária e ele invariavelmente descamba. Ciro quase nunca respeita o seu interlocutor. Exercita com gosto um tom professoral diante de entrevistadores inofensivos ou servis; quando o entrevistador lhe aperta o calo – às vezes basta um beliscão de leve –, tende a ser agressivo ou truculento, com variações de grau. É uma pena.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Lula e o PT tampouco estiveram à altura dos acontecimentos. Não é possível desconsiderar a circunstância decisiva de que o líder petista estava preso – vítima de um processo viciado, conduzido de maneira francamente parcial, com o propósito claro de alijá-lo da disputa eleitoral –, mas isso não o eximia de responsabilidades políticas. Da cadeia, o ex-presidente levou Haddad ao segundo turno e ao mesmo tempo o impediu de ter alguma chance de virar presidente. No dia seguinte à votação do primeiro turno, o candidato foi a Curitiba visitar seu criador. Pretendia sair dali com respaldo para fazer a campanha a seu modo. Queria caminhar ao centro e, entre outras coisas, tinha a intenção de convidar Pérsio Arida para ministro da Fazenda. Seria um lance ousado, com chances remotas de dar certo (um dos pais do Plano Real, banqueiro e ex-sócio de André Esteves, Arida era até a véspera responsável pela coordenação da área econômica de Geraldo Alckmin). Tudo isso, porém, ficou para as calendas gregas. Haddad saiu da sede da Polícia Federal como havia chegado: sob tutela. Foi até o fim o candidato de Lula, quando precisava ter sido o candidato da democracia. A direção do PT tratou de enquadrá-lo nos termos definidos pelo ex-presidente. Gleisi Hoffmann está lá para isso. Tem o espírito tarefeiro, mesmo diante das missões mais constrangedoras. Nem ela nem a burocracia petista fizeram esforço para derrotar Bolsonaro. Pelo contrário, houve um boicote branco a Haddad, como se fosse preferível a derrota nas urnas para não perder o discurso de que Lula estava sendo vítima de um complô. Naquelas condições, o desempenho do candidato foi surpreendente. O que o impulsionou na reta final foi uma espécie de mutirão espontâneo e desesperado na sociedade, sobretudo entre os jovens, à revelia do PT e das lideranças políticas – todos acoelhados.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<br /></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<span class="capitalize" style="box-sizing: border-box; display: inline-block; float: left; font-family: "piaui" , "tahoma" , sans-serif "important"; font-size: 100px; font-weight: 700; line-height: 60px; margin: 12px 5px 0px 0px; padding: 0px; text-transform: uppercase;">B</span>olsonaro venceu nos termos dele, a bordo de um partido de aluguel, sem alianças regionais nem tempo de exposição na tevê, carregando como vice um general que, como ele, só tem boas recordações do golpe de 1964. Venceu sem fazer concessões, sem nenhum aceno ao centro do espectro político, contrariando a tendência das eleições em dois turnos. Venceu reiterando a retórica extremista e desafiando o establishment (parte dele encantado com a “sinceridade rústica” do capitão). Bolsonaro venceu misturando o discurso do ódio, do ressentimento e da revanche à promessa de redenção nacional, com forte conotação religiosa. O atentado que sofreu no início de setembro elevou à potência máxima os contornos messiânicos e a carga irracional da candidatura. A partir da facada nasceu um mártir que estava sacrificando a própria vida para salvar o país. A graça divina havia intercedido em favor do Brasil.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
O fervor cristão, a fanatização da política, o anticomunismo delirante, a defesa da família patriarcal e o nacionalismo tacanho passaram a compor a nova gramática do poder. Era preciso expurgar os traidores da nação, restaurar os valores perdidos, fazer a limpeza, promover uma verdadeira faxina – dos esquerdistas, dos corruptos, dos transviados, a lista é virtualmente infinita, porque sempre haverá algo a ser varrido do mapa –, tudo convergindo para a ideia de que a missão de Bolsonaro, vocalizada por ele próprio, seria destruir o que existe e a partir daí refundar a pátria, entendida como um lugar idílico, onde estariam salvos, para falar como Dostoiévski, <em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">os puros e os eleitos, destinados a originar uma nova espécie de pessoas e uma nova vida, a renovar e purificar a terra</em>. É claro que <em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">ninguém via tais pessoas, em nenhum lugar, ninguém ouvia suas palavras nem sua voz</em>. Aliás, cadê o Queiroz?</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
O pesadelo de Raskólnikov reproduz a dinâmica do livro bíblico do <em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">Apocalipse</em> (o Juízo Final antecede a paz eterna dos justos no Paraíso), duvidando, ao mesmo tempo, do final feliz da história. Não há salvação em Dostoiévski. No caso de Bolsonaro, isso não é um problema. Enquanto a obra divina não se realiza, ele já elegeu para si um Éden tropical. Sua imagem do paraíso sempre foi a grande obra dos golpistas fardados que usurparam o poder no país por 21 anos. Dentro da longa noite do arbítrio, o presidente nunca escondeu que tem, digamos assim, um carinho especial pelo período de maior escuridão do regime militar, aquele em que a engrenagem da tortura, das mortes e dos desaparecimentos funcionou a todo vapor. (Aqui vale um parêntese: desaparecimentos, como se sabe, é um eufemismo para designar as mortes produzidas pelo Estado e não assumidas enquanto tais, o que representa uma volta a mais no parafuso da crueldade, com consequências indeléveis para parentes e amigos das vítimas). Estamos falando do intervalo de tempo que vai do AI-5, no final de 1968, até a metade dos anos 1970, quando o regime começa a “dar uma fraquejada” e Ernesto Geisel decide encampar aquela besteira de “abertura lenta, gradual e segura”. Erro brutal, porque para resolver os problemas do Brasil só “matando 30 mil”. A frase poderia estar na boca de um personagem de Rubem Fonseca, mas quem a pronunciou foi Bolsonaro, ao defender, em 1999, numa entrevista à TV Bandeirantes, o fechamento do Congresso e a necessidade de uma guerra civil para fazer “um trabalho que o regime militar não fez”. O primeiro alvo a ser executado seria o próprio presidente da República: “Começando com FHC. Não deixar ele de fora, não. Matando!” Vão “morrer alguns inocentes”, ele admitiu, mas acrescentou: “Tudo bem.” É assim mesmo, “em tudo quanto é guerra morre inocente”.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Não havia guerra nenhuma, a não ser aquela que fermentava na mente ruim do deputado. O disparate gerou, é claro, certo desconforto, mas ninguém levou adiante o pedido de cassação do mandato do genocida. Afinal, parecia ocioso perder tempo com um tipo periférico e perturbado, uma espécie de zumbi boquirroto, saudoso de “uma página infeliz da nossa história”, já superada.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
O país atravessava uma séria crise monetária em 1999, é verdade, mas se respirava por toda parte ares democráticos. Àquela altura, uma década depois da Constituição de 1988 – a Cidadã – e depois da travessia de um impeachment que havia fortalecido a crença nas instituições, o consenso em torno da democracia parecia consolidado. Era sobre esse solo comum democrático que as divergências brotavam. A despeito de todos os problemas, tinha se formado a partir do Plano Real a perspectiva concreta de um novo ciclo de desenvolvimento e, com ele, a esperança de que iniquidades históricas do país começariam a ser reparadas. Tínhamos a sensação muito palpável de que algo estava em construção.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
É divertido e triste ao mesmo tempo recordar que em 1994 a aliança dos tucanos com o então PFL foi motivo de grande escândalo e intermináveis discussões entre intelectuais. A muitos aquilo soava como uma concessão moralmente intolerável, um imperdoável passo em falso à direita, que recolocava em cena, ainda que na condição de coadjuvantes, velhas raposas da Arena, o braço de sustentação da ditadura no Congresso. Na grande angular da história, porém, o vilão da esquerda naqueles anos era a globalização, da qual FHC seria um fantoche, um presidente mais ou menos decorativo a serviço do capital que desconhecia fronteiras. À luz dos dias atuais, diante do avanço da xenofobia de extrema direita pelo mundo e da participação especial do Brasil nesse circo de horrores, vislumbro a montanha de ilusões em que estávamos sentados e o tamanho do tombo que levamos. Ainda estamos caindo, não se animem.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<br /></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<span class="capitalize" style="box-sizing: border-box; display: inline-block; float: left; font-family: "piaui" , "tahoma" , sans-serif "important"; font-size: 100px; font-weight: 700; line-height: 60px; margin: 12px 5px 0px 0px; padding: 0px; text-transform: uppercase;">A</span>atmosfera do país e a relevância política de Bolsonaro haviam mudado muito quando ele proferiu, em abril de 2016, seu voto a favor do impeachment de Dilma Rousseff. À sua maneira, o futuro presidente lançava ali o seu programa de governo, com direito ao bordão de campanha no final. O oxigênio da democracia brasileira já estava sendo cortado:</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">Nesse dia de glória para o povo brasileiro, tem um nome que entrará para a história nessa data, pela forma como conduziu os trabalhos nessa Casa. Parabéns, presidente Eduardo Cunha</em>.<em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;"> Perderam em 1964. Perderam agora em 2016. Pela família e pela inocência das crianças em sala de aula, que o PT nunca teve. Contra o comunismo. Pela nossa liberdade. Contra o Foro de São Paulo. Pela memória do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, o pavor de Dilma Rousseff. Pelo Exército de Caxias, pelas nossas Forças Armadas. Por um Brasil acima de tudo e por Deus acima de todos, o meu voto é sim!</em></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Em poucos segundos, Bolsonaro estabeleceu a conexão histórica entre os dois golpes (1964-2016) – o primeiro, militar; o segundo, jurídico-parlamentar –, como se desenhasse uma moldura para homenagear no centro do quadro o “pavor de Dilma Rousseff”. Ao acrescentar esse aposto ao nome do torturador, o deputado de alguma maneira fez reviver a própria tortura, num exercício de sadismo de que pouca gente é capaz. De forma provavelmente inédita no Congresso Nacional desde o fim do regime militar, estavam sendo atiradas no lixo a democracia como experiência histórica e a democracia como ideia e referência fundamental da vida política.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Detenho-me mais um pouco aqui porque Brilhante Ustra não foi um patife qualquer. Teve papel de destaque no “trabalho” que, segundo o lamento de Bolsonaro, a ditadura não terminou. O DOI-Codi que Ustra comandou entre 1970 e 1974 foi chamado de “casa dos horrores” na sentença histórica, proferida em 2008, em que o juiz Gustavo Santini Teodoro condenou o coronel. Ustra foi o único oficial militar condenado civilmente pela Justiça brasileira pelo crime de tortura. Isso porque a Lei da Anistia, de 1979, serviu como escudo legal para impedir que os torturadores fossem levados penalmente ao banco dos réus.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Ao contrário do que aconteceu no Chile, na Argentina e no Uruguai, no Brasil a tortura e os assassinatos cometidos por agentes do Estado jamais foram punidos. Nunca mais serão – e isso não é trivial. Faz pensar na maneira como o país costuma lidar com seus traumas, por meio de negaças e acomodações, sem nunca enfrentá-los. Na língua de Freud, se diria que o país, incapaz de elaborar os traumas, convive indefinidamente com seus sintomas. A começar pela escravidão, o trauma que nos formou como nação. Foi abolida há mais de 130 anos, em 1888, mas a dívida com a população negra jamais foi reparada. Os sintomas dessa omissão crônica, dessa nossa maneira de driblar as exigências da civilização e perpetuar no presente a herança colonial, estão aí, à vista de todos, nos morros, nas periferias, nas prisões, dentro das nossas casas, estampados em praticamente todos os indicadores sociais – renda, escolaridade, mortes, oportunidades de trabalho etc. Alguém pode mostrar um indicador, deve haver ao menos um, em que os negros não estejam expostos a situações de maior vulnerabilidade ou exclusão? Pois é.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Ustra foi condenado por uma ação movida pela família Almeida Teles, não por uma iniciativa do Estado. Entre 1972 e 1973, pai, mãe e dois filhos, uma criança de 4 e outra de 5 anos, foram presos e torturados nas dependências do DOI-Codi em São Paulo. Além deles, a irmã da mãe, uma jovem grávida de sete meses, também foi vítima de sevícias. Todos presenciaram a morte por tortura de um amigo da família. Ustra, segundo os termos da ação, “praticou pessoalmente os atos de tortura”. Quem conta isso é a historiadora Janaína de Almeida Teles, a criança de 4 anos da família torturada, hoje com 53 anos. Extraí seu relato de um artigo intitulado <em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">Os Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos e a Luta por Verdade e Justiça no Brasil</em>, incluído no livro <em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">O que Resta da Ditadura</em>, organizado por Vladimir Safatle e Edson Teles, irmão da autora. O livro, que reúne reflexões feitas num seminário promovido pela Universidade de São Paulo em 2008, quando o AI-5 completou 40 anos, só seria lançado em 2010, num momento em que falar dos restos da ditadura estava meio fora de moda até na esquerda (Lula vivia sua apoteose como presidente, com mais de 80% de aprovação popular).</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Eu estava na redação da <strong style="box-sizing: border-box; font-family: PalatinoBold, serif; margin: 0px; padding: 0px;">piauí</strong> com alguns colegas no domingo em que a Câmara aprovou o impeachment de Dilma. Lembro-me bem do mal-estar que os termos do “sim” de Bolsonaro provocou em todos. Sua apologia ao torturador representava uma ruptura na sequência modorrenta de votos paroquiais e involuntariamente cômicos (em nome de Deus, em nome da minha tia, pelo futuro dos meus filhos, em homenagem ao meu papagaio…). Houve silêncio na redação por alguns segundos. Alguém soltou um sonoro “filho da puta”. Escrevi naquela mesma noite um pequeno texto para o site da revista, comentando um aspecto até então despercebido de uma pesquisa recém-publicada do Datafolha. No topo da pirâmide social, Bolsonaro já então liderava a corrida presidencial. Tinha 23% das intenções de voto entre os eleitores com renda familiar superior a dez salários mínimos. No conjunto da sociedade, ainda estava em quarto ou quinto lugar, com 7% ou 8%, dependendo dos adversários, mas sempre atrás do líder Lula, de Marina Silva e do candidato tucano (Aécio, Serra ou Alckmin). Na tarde em que Jair Bolsonaro “reparou uma justiça” ao exaltar o militar condenado por tortura na ditadura, boa parte da elite já havia arrastado suas fichas para o lado do capitão.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Dois anos e meio depois, a uma semana de ser eleito presidente, o candidato fez aquele famoso discurso transmitido por celular a manifestantes aglomerados na Avenida Paulista, em São Paulo. Para quem convalescia de uma facada, Bolsonaro aparece em cena bastante disposto e corado, sorridente na maior parte do tempo. Postado em pé no quintal dos fundos de casa, veste uma camiseta verde e tem atrás de si, como cenário, algumas peças de roupa e lençóis brancos pendurados no varal. Tudo é muito descontraído, casual, calculadamente mambembe. Revendo o vídeo, tive a impressão de que Bolsonaro lia o que falava de forma pausada, interagindo com a excitação da massa. Foi um discurso atroz. Atrás da câmera, fora de quadro, pode-se ouvir uma pessoa rindo em pelo menos duas ocasiões, quando o candidato diz que Lula iria “apodrecer na cadeia” e quando diz que vai mandar a “petralhada” para “a ponta da praia”. É um risinho sarcástico e meio abafado, de personagem de desenho animado, uma espécie de Muttley, o cão rabugento de Dick Vigarista, que sabe do que o chefe (ou o papai) está falando. Pinço algumas passagens desse discurso, em ordem aleatória, preservando os erros de português, em nome da autenticidade:</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">“Lula, você vai apodrecer na cadeia.”</em></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">“A faxina agora será muito mais ampla.”</em></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">“Será uma limpeza nunca visto na história do Brasil.”</em></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">“Esses marginais vermelhos serão banidos de nossa pátria.”</em></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">“Vocês verão umas Forças Armadas altiva.”</em></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">“Vocês, petralhada, verão uma polícia civil e militar com retaguarda jurídica pra fazer valer a lei no lombo de vocês.”</em></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">“Bandidos do MST, bandidos do MTST, as ações de vocês serão tipificadas como terrorismo.”</em></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">“Petralhada, vai tudo vocês pra ponta da praia.”</em></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">“O Brasil não será mais motivo de chacota junto ao mundo.”</em></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Essa última frase está aí apenas para que você, leitor, possa dar uma risada nesses tempos de cólera. A verdade é que “rimos do fato de que não há nada de que se rir”, como escrevem Adorno e Horkheimer na <em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">Dialética do Esclarecimento</em>. “Faxina”, “limpeza”, “marginais”, “banidos”, “apodrecer”, “lombo”, “bandidos”, “petralhada” – tudo transpira ódio e recende a fascismo. A “ponta da praia”, talvez nem todos saibam, era o nome dado pela ditadura a um local de desova de cadáveres no Rio de Janeiro. Bolsonaro fala como torturador, não como candidato à Presidência. Assim como hoje governa como miliciano, não como estadista.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<br /></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<span class="capitalize" style="box-sizing: border-box; display: inline-block; float: left; font-family: "piaui" , "tahoma" , sans-serif "important"; font-size: 100px; font-weight: 700; line-height: 60px; margin: 12px 5px 0px 0px; padding: 0px; text-transform: uppercase;">I</span>nsisti nesses registros já antigos porque a demência atual já aparece inteira lá. Não havia nada incubado. Tudo já era explícito. O inimigo da democracia que dedica em 2016 seu voto ao “pavor de Dilma Rousseff” é o mesmo que, em 2018, ameaça mandar os adversários para “a ponta da praia”. É exatamente o mesmo que, vinte anos antes, queria “matar 30 mil” e fechar o Legislativo para resolver o problema do país. É o mesmíssimo inimigo da democracia que, agora, no meio da mais grave pandemia mundial em mais de um século, participa, na condição de presidente da República, montado na caçamba de uma camionete, de um ato público em frente ao Q.G. do Exército a favor do AI-5, contra o Congresso e o STF – isso tudo três dias depois de ter demitido seu ministro da Saúde porque ele teimava em ser… razoável. Esse é o Messias do Brasil.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Mas ainda era pouco. Quando já estávamos estupefatos, exauridos, sem saber o que dizer nem como dizer diante da capacidade infinita do presidente de humilhar a racionalidade, multiplicar o caos e vilipendiar o sofrimento alheio, quando a cota de desmandos e desvarios no meio da pandemia já havia transbordado, Bolsonaro decide dobrar a sua meta e investe sobre a Polícia Federal, na intenção de capturá-la para si, provocando o pedido de demissão de Sergio Moro.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
A queda do ministro da Justiça elevou a crise político-institucional a um patamar inédito. Veio uma semana depois da saída do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, que encarou um mês de fritura em praça pública, período durante o qual Bolsonaro deu seus rolezinhos pelos arredores de Brasília, conclamou a população a desrespeitar o isolamento social, fez discursos mistificadores, propaganda indevida de remédio, tossiu, fungou, abraçou e apertou a mão de incautos. “A hora dele ainda não chegou”, disse o presidente a meia dúzia de admiradores na entrada do Palácio da Alvorada, dias antes de demitir Mandetta, falando como se fosse um meganha ameaçando um delinquente. Já a hora de Moro chegou sem aviso. Havia, sim, um acúmulo de rusgas entre eles, sobretudo “no tocante à <em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">qüestão</em>” da Polícia Federal, mas a briga estava fora dos holofotes. Entramos numa nova fase do governo, não há dúvida. Pode ser o início do fim de Bolsonaro, mas está parecendo apenas o início de algo ainda pior sob Bolsonaro – “É melhor já ir se acostumando”, dizia o slogan de campanha, em tom intimidador.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<br /></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<span class="capitalize" style="box-sizing: border-box; display: inline-block; float: left; font-family: "piaui" , "tahoma" , sans-serif "important"; font-size: 100px; font-weight: 700; line-height: 60px; margin: 12px 5px 0px 0px; padding: 0px; text-transform: uppercase;">N</span>a reunião que decretou o AI-5, em 13 de dezembro de 1968, quando chegou sua vez de votar, o coronel Jarbas Passarinho, então ministro do Trabalho, dirigindo-se ao presidente, justificou sua adesão ao fechamento do regime com uma frase que entrou para a história: “Sei que à Vossa Excelência repugna, como a mim, e creio que a todos os membros deste conselho, enveredar para o caminho da ditadura pura e simples. […] Mas, às favas, senhor presidente, neste momento, todos, todos os escrúpulos de consciência.” Atribui-se a Pedro Aleixo, vice-presidente do marechal Costa e Silva, uma ressalva ao AI-5 que ele teria feito na famigerada reunião: “O problema desse ato não é o senhor, nem os que com o senhor governam o país, mas o guarda da esquina.” A autoria da frase é duvidosa (não consta da gravação em áudio da reunião), mas ela entrou para a mitologia do período.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Não estou equiparando a ocupação da PF e do Ministério da Justiça pelos apaniguados do clã Bolsonaro com um novo AI-5. Rememoro as duas passagens da reunião porque ambas me vieram à mente quando o presidente foi questionado por uma seguidora no Twitter a respeito da amizade do diretor indicado para a PF com o seu filho Carlos, o atormentado Zero Dois. Ele respondeu assim: “E daí? Devo escolher alguém amigo de quem?” Afinal, para que escrúpulos de consciência? Pulemos então para a parte que interessa – “Vai tudo vocês às favas!” Escrevi na véspera da eleição, em 2018, que o país estava muito próximo de transformar o guarda da esquina do AI-5 em presidente da República. Aqui estamos, um ano e meio depois. No eco desse “e daí?”, pode-se escutar a voz do guarda da esquina da ditadura.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Bolsonaro escancarou a intenção de fazer da PF um braço de sua polícia política. Um arremedo disso já existe, infiltrado na Agência Brasileira de Inteligência (Abin), na inteligência militar, nessa coisa anômala e ao mesmo tempo didática chamada “gabinete do ódio”, espalhada entre representantes das polícias pelos estados e sabe-se lá entre quantos milicianos, a exemplo de Fabricio Queiroz e do finado Adriano da Nóbrega. O cavalo de pau na PF é um passo decisivo para consolidar a submissão do aparato de segurança e investigação do Estado aos interesses particulares do presidente, escusos por definição. É também um passo arriscado, entre outras razões porque na cúpula da corporação existem hoje profissionais sérios e comprometidos com o combate à corrupção e ao crime organizado nos marcos da legalidade. O fato é que a distância entre o topo da República e o submundo do aparelho estatal e paraestatal de segurança e repressão do país nunca foi tão pequena. O bolsonarismo representa a vitória do modelo miliciano de gestão da violência brasileira.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<br /></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<span class="capitalize" style="box-sizing: border-box; display: inline-block; float: left; font-family: "piaui" , "tahoma" , sans-serif "important"; font-size: 100px; font-weight: 700; line-height: 60px; margin: 12px 5px 0px 0px; padding: 0px; text-transform: uppercase;">H</span>á ainda muita gente que se apega à capacidade de resistência das instituições. É uma maneira de brincar de avestruz. Basta um “recuo” do presidente para que os arautos da nossa vitalidade democrática venham dizer nos jornais e nas redes sociais que está tudo bem. Ou, quando Bolsonaro não recua, nossos arautos vêm a público para dizer que “desta vez, ele se excedeu”, apenas para, depois do próximo absurdo do presidente, voltarem a público para repetir, com a mesma inflexão na voz, que “desta vez, ele se excedeu”, num moto-contínuo que revela mais apatia diante das ameaças às instituições do que propriamente confiança cega nelas.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Os adeptos dessa tese terão sempre uma parcela de razão – as instituições, bem ou mal, exercem aqui e ali a função de contraponto à insanidade presidencial, evitando algumas vezes o pior. Isso vale até o momento em que forem imperceptivelmente contagiadas pela demência. Volto aqui às perturbações de Raskólnikov:</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">As pessoas contaminadas por eles se tornavam imediatamente endemoniadas e loucas. Mas nunca, nunca as pessoas se consideravam tão inteligentes e tão inabaláveis na verdade como ocorria com os infectados.</em></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
As instituições, tão inteligentes e tão inabaláveis em suas convicções, já foram contaminadas, perdão pela insistência, em 2016. Em 2018, veio a segunda onda da contaminação, mais resistente porque disfarçada numa eleição democrática. O vírus antidemocrático tem levado a melhor sobre as notas de repúdio que pretendem combatê-lo. A indignação retórica se transformou numa espécie de cloroquina política. Não vai conter o avanço da pandemia autoritária.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
O que temos visto nos constantes embates entre o presidente e a ordem legal segue um padrão teatral, com forte componente de autoengano: a cada “vitória” da institucionalidade, a cada “recuo” de Bolsonaro, o que ocorre na prática é uma pequena vitória do perdedor – ele avançou mais duas casas, avançou mais 5%. A exemplo do que acontece em várias partes do mundo, a democracia brasileira está sendo roída e vai se desmanchando aos poucos. É um processo de erosão, com picos de aceleração e momentos menos perceptíveis, não uma implosão. Não há no Brasil, até segunda ordem, espaço político para um golpe de manual, na antiga acepção de tomada abrupta do poder pela força. Até porque os militares já estão no poder. Bolsonaro entupiu o primeiro escalão do governo de generais. Estima-se que sejam em torno de 2,5 mil os militares que ocupam cargos de confiança na esfera federal. Estão no filé-mignon da administração pública. É o que se chamava na época do PT de aparelhamento do Estado. Alguém acha que essa gente toda estaria disposta a inibir as tentações autoritárias do presidente? Teria compromisso efetivo com a democracia? Bolsonaro é pior que os militares, mas os militares não são melhores do que ele. Soa estranho? Vamos fingir que o nome disso seja dialética.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
O general Hamilton Mourão, herdeiro da cadeira de Bolsonaro na hipótese de impeachment ou na eventualidade de renúncia (ambas por ora improváveis), organizou em 2015, quando ocupava o posto de comandante militar do Sul, uma homenagem à memória do coronel Brilhante Ustra, morto naquele ano. Corria o governo Dilma, e Mourão acabou sendo demitido do cargo pelo então chefe do Exército, general Eduardo Villas Bôas.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Augusto Heleno, atual chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência, mentor de Bolsonaro e patriarca do generalato instalado no Planalto, é um herdeiro da linha dura do regime militar. Atuava como ajudante de ordens do general Sylvio Frota quando este, então ministro do Exército, em 1977, tentou emparedar o presidente Ernesto Geisel. Acabou exonerado por Geisel, a quem criticou publicamente, depois de ser apeado do ministério, por “complacência com a infiltração comunista e a propaganda esquerdista”, conforme relata o jornalista Elio Gaspari em seu livro <em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">A Ditadura Encurralada</em>. A abertura do regime avançou. Mais de quarenta anos depois, não consta que as ideias do então jovem capitão Heleno tenham evoluído.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Esses são os “moderados”, os razoáveis, os que controlam os impulsos do presidente. Chegamos a esse ponto. Sim, claro que existem divergências entre os militares de alta patente. Deve haver entre eles aqueles que sejam democratas além da página 2. Não é certamente o caso nem de Mourão nem de Augusto Heleno. Numa democracia digna do nome, de toda maneira, essas divergências deveriam ser resolvidas dentro dos quartéis, não no terceiro andar do Palácio do Planalto.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<br /></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<span class="capitalize" style="box-sizing: border-box; display: inline-block; float: left; font-family: "piaui" , "tahoma" , sans-serif "important"; font-size: 100px; font-weight: 700; line-height: 60px; margin: 12px 5px 0px 0px; padding: 0px; text-transform: uppercase;">B</span>olsonaro substituiu o chamado presidencialismo de coalizão pelo presidencialismo de colisão. Trocou a cooptação pelo conflito. Sim, é verdade que ele agora está pedindo socorro ao Centrão, mas logo a coisa vai desandar. É só esperar. O que define o bolsonarismo é o desprezo pelo Congresso, pelos partidos, pelas instituições, pela imprensa livre, pela sociedade civil organizada. Ele gosta do caos, ele gosta de dar tiros. Sua opção política funciona porque ele tem o Exército às suas costas. O projeto autoritário de Bolsonaro passa pela atrofia do poder civil e do estado laico, dois pilares da vida democrática.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Até aqui falei mais do primeiro aspecto, mas é evidente que a deslaicização do Estado está no centro da regressão brasileira. Assim como está em formação uma polícia política, há uma milícia neopentecostal em expansão no país. Não me refiro aos fiéis, embora seja fato que a pauta conservadora encontre maior acolhida entre a população evangélica. Para não cairmos nós na intolerância obscurantista, é preciso fazer esforço e separar as vítimas da ausência do Estado e da exclusão social dos neotubarões da fé que falam em seu nome. Bolsonaro os abraçou, estamos nos convertendo numa república semirreligiosa, na qual o chefe da nação ignora as recomendações médicas contra a pandemia, mas participa de rodas de oração para afastá-la do país (ou apenas deles, os eleitos de Deus).</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Se dependesse da vontade de Bolsonaro, Edir Macedo seria o novo Roberto Marinho. Se isso acontecesse – acho que não chegaremos a tanto –, seríamos um país bem pior do que já somos. Não é preciso deixar de lado a memória do vínculo umbilical da Globo com a ditadura, nem mesmo é preciso aliviar nas críticas que lhe dirigimos hoje para reconhecer, ao mesmo tempo, que não é na tela da emissora que a barbarização do país está se desenrolando. Por abominável que seja, o BBB da Globo é mais inofensivo que o BBB da Bíblia, do Boi e da Bala que cerram fileiras com Bolsonaro. Não precisamos escolher entre um e outro, alguém dirá. Minha resposta é que talvez precisemos, sim. Seria como ter que escolher entre um horizonte muito acanhado e horizonte nenhum.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<br /></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<span class="capitalize" style="box-sizing: border-box; display: inline-block; float: left; font-family: "piaui" , "tahoma" , sans-serif "important"; font-size: 100px; font-weight: 700; line-height: 60px; margin: 12px 5px 0px 0px; padding: 0px; text-transform: uppercase;">A</span>eleição de Bolsonaro representa um revés histórico comparável ao golpe de 1964. Isso para mim era intuitivamente óbvio desde o começo, quando desencavei sem querer da memória o romance de Dostoiévski. De tudo que li nos últimos meses, foi o crítico Roberto Schwarz quem melhor organizou o que aproxima e o que diferencia o governo do guarda da esquina de hoje do regime autoritário de ontem. Recapitulo os pontos principais da entrevista que ele concedeu à <em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">Folha de S. Paulo</em>, em novembro passado.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Como em 1964, houve em torno de Bolsonaro uma aliança entre o fundo regressivo da sociedade, descontente com os rumos liberais da civilização, e um programa pró-capital, encarnado nas promessas de Paulo Guedes. “Ao dar protagonismo político, a título de compensação, aos sentimentos antimodernos de parte da população, os mentores do capital fizeram um cálculo cínico e arriscado”, diz Schwarz. Na Alemanha dos anos 1930, o cinismo custou muito caro: “Aceitando e estimulando o nazismo, a grande burguesia alemã deflagrou um processo incontrolável, ao fim do qual já não se sabia quem devorava quem.” Nas palavras do crítico, se Bolsonaro não chegar lá, “não terá sido por falta de vontade”.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Feita a aproximação, Schwarz ressalva que há uma diferença decisiva entre o atual casamento das pautas arcaizantes do bolsonarismo com a reforma liberal da economia e aquele outro casamento celebrado em 1964. “Cinquenta anos atrás, quem marchava com Deus, pela família e a propriedade eram os preteridos pela modernização, representativos do Brasil antigo, que lutava para não desaparecer”, diz Schwarz. Apesar da “derrota do campo adiantado, continuava possível – assim parecia – apostar no trabalho do tempo e na existência do progresso e do futuro”.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Já o neoatraso bolsonarista é de outro tipo e está longe de ser “dessueto”, diz o crítico. A própria escolha da expressão “dessueto”, impregnada de naftalina e com cheiro de coisa antiga, assume aqui conotação crítica. Vejamos:</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">A deslaicização da política, a teologia da prosperidade, as armas de fogo na vida civil, o ataque aos radares nas estradas, o ódio aos trabalhadores organizados etc. não são velharias nem são de outro tempo. São antissociais, mas nasceram no terreno da sociedade contemporânea, no vácuo deixado pela falência do Estado. É bem possível que estejam em nosso futuro, caso em que os ultrapassados seríamos nós, os esclarecidos</em>.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Dessueto, caro leitor, somos você e eu (peço escusas para preservar a veleidade de estar no campo esclarecido nestes tempos em que a linha que separa o esclarecimento da escuridão anda desbotada).</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Em 1964, transpor o subdesenvolvimento era uma ambição real tanto da esquerda como da direita – “horizonte com que hoje ninguém mais sonha”, diz Schwarz. Sua hipótese, que ele mesmo admite ser pessimista, é de que “a sequência de superações que durante algum tempo deu a sensação de que o país decolava rumo ao Primeiro Mundo pode ter chegado a seu limite”. Em sentido substantivo, o Brasil deixou de ser um país em formação. Somos isso que está aí, esse bicho anômalo, improvável, como o ornitorrinco de que falava o sociólogo Francisco de Oliveira em 2003. Nossa próxima contribuição ao mundo será a destruição irreversível da Amazônia. Com um pouco de sorte, se lhe deixarem trabalhar, esse será mais um legado de Bolsonaro.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<br /></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<span class="capitalize" style="box-sizing: border-box; display: inline-block; float: left; font-family: "piaui" , "tahoma" , sans-serif "important"; font-size: 100px; font-weight: 700; line-height: 60px; margin: 12px 5px 0px 0px; padding: 0px; text-transform: uppercase;">N</span>um registro mais pessoal, a mesma ideia de algo definitivamente malformado aparece no último livro de ensaios de Nuno Ramos. No prefácio de <em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">Verifique Se o Mesmo</em>, lançado pela Todavia, o artista plástico e escritor diz a certa altura: “Quero apenas declarar, e me perdoe o leitor esse tom abrupto, que os acontecimentos recentes parecem encerrar o ciclo de esperanças que acompanhou minha vida adulta desde os anos 1980.” O texto é de maio de 2018, anterior, portanto, à eleição presidencial, mas já está impregnado pelo ambiente que levou Bolsonaro ao poder.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Logo depois de dizer isso, Ramos menciona que a consciência do fim desse ciclo aparece pela primeira vez num texto que ele publicou na <em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">Folha</em>, em 2014 (incluído no livro). <em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">Suspeito que Estamos</em> é uma intervenção política, mas também uma obra de escritor. “Suspeito que o tema primordial e decisivo da sociedade brasileira sempre tenha sido, e seja ainda, a violência”, ele diz. Ramos suspeita de muita coisa, mas é em torno dessa ideia poderosa que tudo orbita. Cito duas passagens do texto.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">Por estar em toda parte, suspeito que esse tema </em>[a violência]<em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;"> aproxime-se, entre nós, do impensável, e que traga em seu DNA, como esses vírus de mutações constantes e velozes, alguma coisa metamórfica que sempre se transfigura e escapa</em>.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
E mais adiante:</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">Suspeito que Paulo Coelho, o padre Marcelo Rossi e o bispo Edir Macedo sejam três faces de uma mesma e última privatização – a do infinito</em>.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
É espantoso que um texto de maio de 2014, escrito meses antes da reeleição de Dilma (contra Aécio, Eduardo Campos e depois Marina, lembrem-se disso), exprima tão bem o país tão pior que estamos experimentando neste momento.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Volto ao prefácio: “Sempre considerei que meu trabalho representava uma inflexão ao mesmo tempo gulosa e pessimista diante desse quadro [do país], mas, para que houvesse pessimismo, era preciso que o outro polo estivesse vivo.” A dinâmica alimentada por décadas se quebrou. “Alguma coisa definitivamente se formou, está formada, deixamos que se formasse – e não parece nada boa”, diz Ramos.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<br /></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<span class="capitalize" style="box-sizing: border-box; display: inline-block; float: left; font-family: "piaui" , "tahoma" , sans-serif "important"; font-size: 100px; font-weight: 700; line-height: 60px; margin: 12px 5px 0px 0px; padding: 0px; text-transform: uppercase;">C</span>omecei este texto revelando os sentimentos de horror e incredulidade diante do que estava por vir em 2018. Um ano e meio depois, termino renovando aqueles sentimentos, dos quais não me livrei, fisicamente falando, acrescidos, neste momento, da sensação incontrolável de que “os acontecimentos recentes parecem encerrar o ciclo de esperanças que acompanhou minha vida adulta desde os anos 1980”.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Com a licença de Nuno Ramos, suspeito que as consequências do estrago de Bolsonaro na vida brasileira vão perdurar por muito tempo depois do fim de seu mandato. A violência sempre foi e, mais do que nunca, é o tema primordial e decisivo da sociedade brasileira. Com a eleição de Bolsonaro, abrimos um alçapão que não poderia ter sido aberto. O cinismo das elites brasileiras pode custar, já está custando muito caro. Tenho vontade de dizer: as vítimas do novo coronavírus são os petralhas que o presidente ameaçou mandar para a ponta da praia uma semana antes de vencer. Naquela época, a imprensa dizia – com falsa isenção, com falso espírito crítico, com uma equidistância que só ela, na sua miopia de classe, conseguia enxergar e, sim, com uma dose intolerável de cinismo – que estávamos diante de “dois extremos” igualmente perigosos, diante de uma “escolha difícil”, diante de “duas ameaças” à democracia. Aqui estamos hoje. Não venham agora, por favor, com a ladainha de que Bolsonaro passa e as instituições permanecem. É justamente o contrário o que está se desenhando no horizonte muito acanhado ou no horizonte nenhum que temos à nossa frente.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Volto a <em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">Crime e Castigo</em>, exatamente ao ponto em que acaba o pesadelo narrado no início deste texto:</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhMUAAZaZcRDlVL_Zx2UslWkDrlK4C85xnzZfdR1SNSXxfFZ1ESzef1iPCDsGv-oW1APot93x8JeUo2WfB-WfDqsBlkcwBOoDudqp8zimRFPImFuQl7HAm8Df_rCfol4HujfQ_uo2AsczuV/s1600/capa_164_interna.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" data-original-height="1600" data-original-width="1186" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhMUAAZaZcRDlVL_Zx2UslWkDrlK4C85xnzZfdR1SNSXxfFZ1ESzef1iPCDsGv-oW1APot93x8JeUo2WfB-WfDqsBlkcwBOoDudqp8zimRFPImFuQl7HAm8Df_rCfol4HujfQ_uo2AsczuV/s400/capa_164_interna.jpg" width="296" /></a></div>
<em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">O que atormentava Raskólnikov era o fato de que esse delírio insensato se refletia nas suas recordações de modo tão triste e tão angustiante que a sensação dos devaneios febris demorou muito tempo para passar</em>.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
por Fernando de Barros e Silva</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
na <a href="https://piaui.folha.uol.com.br/materia/dentro-do-pesadelo-2/" target="_blank">piauí</a></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<br /></div>
Adelvan Kenobihttp://www.blogger.com/profile/06307759808605250885noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4793536658109166560.post-12347354862377210412020-01-11T09:42:00.000-08:002020-01-15T13:48:25.193-08:00Blues sergipano<div class="MsoNormal" style="background-clip: initial; background-color: white; background-image: initial; background-origin: initial; background-position: initial; background-repeat: initial; background-size: initial; color: #222222; font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; line-height: 12.65pt; margin: 0cm 0cm 10pt;">
<table cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="float: left; margin-right: 1em; text-align: left;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiw6l5AmqNATnKEsMthgHiE7KVm56KNljR94Rhsl8rYhyphenhypheni77fEApTqfJ7SKbsdN4agcjw8j2-iw8TSczCz_DJ6YtbT2rvGJCPe_AHJaXjkV2y8QdEFsFjNDs6gl7WSlIPPCoUDP3gDxO7vA/s1600/Blues+Silvio.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; margin-bottom: 1em; margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="640" data-original-width="960" height="212" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiw6l5AmqNATnKEsMthgHiE7KVm56KNljR94Rhsl8rYhyphenhypheni77fEApTqfJ7SKbsdN4agcjw8j2-iw8TSczCz_DJ6YtbT2rvGJCPe_AHJaXjkV2y8QdEFsFjNDs6gl7WSlIPPCoUDP3gDxO7vA/s320/Blues+Silvio.jpg" width="320" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Silvio Campos</td></tr>
</tbody></table>
O Blues é um gênero musical eminentemente norteamericano. Sua origem remonta o fim do século XIX e é fruto de uma mistura entre raízes das tradições musicais africanas; "spirituals" - um tipo de música "gospel" negra, sempre acompanhada de palmas e movimentos corporais; canções de trabalho, criadas pra distrair durante a dura rotina da labuta diária, e cantos folclóricos. Entoada quase sempre em tom de lamento, caracteriza-se pelo padrão de chamada e resposta e por progressões de acordes específicos. Projetou-se mundialmente na década de 1950 ao migrar para a área urbana de Chicago, principalmente, e ser eletrificado. Influenciou decisivamente na gênese e no posterior desenvolvimento do rock and roll, com a chamada "invasão britânica".</div>
<div class="MsoNormal" style="background-clip: initial; background-color: white; background-image: initial; background-origin: initial; background-position: initial; background-repeat: initial; background-size: initial; color: #222222; font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; line-height: 12.65pt; margin: 0cm 0cm 10pt;">
No Brasil os principais expoentes do gênero são Blues Etílicos, André Christovam e Celso Blues Boy(já falecido).</div>
<div class="MsoNormal" style="background-clip: initial; background-color: white; background-image: initial; background-origin: initial; background-position: initial; background-repeat: initial; background-size: initial; color: #222222; font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; line-height: 12.65pt; margin: 0cm 0cm 10pt;">
<table cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="float: right; margin-left: 1em; text-align: right;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg_U4gaV6Bj-mIFGkxBeyzbfpzxHFPxV2H4s5gy5WskHwiKxU0JlGPQHFZ7FxqcjcunPa1TZEEi6bHgjEoc9yycD1v-rz65UBenzDiPPv3y2XcBHUMlOzY2jUZFi9ryDpOVXZ5ibYKrJCz9/s1600/Blues+Ferdinando.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; margin-bottom: 1em; margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="960" data-original-width="640" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg_U4gaV6Bj-mIFGkxBeyzbfpzxHFPxV2H4s5gy5WskHwiKxU0JlGPQHFZ7FxqcjcunPa1TZEEi6bHgjEoc9yycD1v-rz65UBenzDiPPv3y2XcBHUMlOzY2jUZFi9ryDpOVXZ5ibYKrJCz9/s400/Blues+Ferdinando.jpg" width="266" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Ferdinando</td></tr>
</tbody></table>
Em Sergipe até a década de 1990 não se tem notícia de nenhum nome de relevância que tenha assumido para si a tarefa de tocar blues - o estilo era diluído no repertório de músicos de bar e bandas de rock and roll, sem grande destaque. Algumas, inclusive, o ostentavam no nome, como a Passos Blues band e a Shaman´s Blues. Eram, no entanto, bandas de rock.</div>
<div class="MsoNormal" style="background-clip: initial; background-color: white; background-image: initial; background-origin: initial; background-position: initial; background-repeat: initial; background-size: initial; color: #222222; font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; line-height: 12.65pt; margin: 0cm 0cm 10pt;">
Tudo mudou com a chegada da Angelus Novus, em 1995. Foi formada pelo guitarrista e compositor Gilberto Monte, com Beto "Hendrix" na segunda guitarra, Dinho Dog no baixo e Carlinhos na gaita. Completavam a formação os irmãos Fabio(vocal) e Rafael(bateria), da então recém criada Snooze - foi a primeira incursão musical deles fora dos domínios do rock. Fabinho era o caçula da turma, tinha apenas 16 anos, e sequer bebia álcool - levava para os shows uma garrafa térmica com chá para encarar a responsabilidade de ser um frontman tão jovem. A Angelus Novus foi uma grande novidade para a cidade na época e atraía pequenas multidões para suas apresentações, quase sempre no Tequila Café e no Capitão Cook . Tocavam basicamente “Standards” e clássicos de nomes consagrados do gênero, mas tinham também algumas poucas composições próprias. Chegaram a se apresentar uma vez em Lagarto, na "Rinha de Zezé Rocha", com Snooze e Maria Scombona. Detalhe: Rafael Jr. era o baterista das três bandas! Shows de rock - e blues - no interior eram raridade. Ainda são, na verdade ...</div>
<div class="MsoNormal" style="background-clip: initial; background-color: white; background-image: initial; background-origin: initial; background-position: initial; background-repeat: initial; background-size: initial; color: #222222; font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; line-height: 12.65pt; margin: 0cm 0cm 10pt;">
Por volta de 1998 Gilberto Monte se mudou para Salvador, onde hoje é um produtor musical requisitado, e a banda continuou por algum tempo com um novo nome, Little Red Rooster, até encerrar definitivamente as atividades. O que poucos sabiam é que no interior do estado, em Itabaiana, um grupo de amigos já algum tempo se reunia em torno de Ferdinando, um virtuoso guitarrista autodidata, para tocar blues.</div>
<div class="MsoNormal" style="background-clip: initial; background-color: white; background-image: initial; background-origin: initial; background-position: initial; background-repeat: initial; background-size: initial; color: #222222; font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; line-height: 12.65pt; margin: 0cm 0cm 10pt;">
Em 1993, na capital do agreste sergipano,Carlos Magno, um fã dos Smiths misantropo e recluso, havia comprado uma guitarra para montar uma banda de rock de garagem, mas acabou se dando melhor como baterista. Vendeu-a a um amigo, Ferdinando. Todos se impressionaram com a rapidez e a facilidade com que Ferdinando aprendeu a tocar. Como a banda de rock não tinha dado muito certo, juntaram-se ao baixista Fabio e decidiram se dedicar a uma outra paixão em comum, o blues. Nascia a Urublues, que ficou muito tempo apenas ensaiando e aprendendo a tocar covers.</div>
<div class="MsoNormal" style="background-clip: initial; background-color: white; background-image: initial; background-origin: initial; background-position: initial; background-repeat: initial; background-size: initial; color: #222222; font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; line-height: 12.65pt; margin: 0cm 0cm 10pt;">
Magno se revela um letrista de mão cheia – era um leitor voraz – e eles vão aos poucos amadurecendo composições em torno de suas palavras. Urublues se torna, então, uma banda quase que 100% autoral - ao contrário da Angelus Novus - com excelentes composições que falavam daqueles velhos temas de lamentos universais, como desilusões amorosas e noites de bebedeira em “quartos de hotel construídos pra abrigar romances que terminam em pontas de faca”, nas palavras do jornalista Rian Santos.</div>
<div class="MsoNormal" style="background-clip: initial; background-color: white; background-image: initial; background-origin: initial; background-position: initial; background-repeat: initial; background-size: initial; color: #222222; font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; line-height: 12.65pt; margin: 0cm 0cm 10pt;">
O primeiro show aconteceu apenas em 1999, em Carira, com duas bandas punk, Karne Krua e Gee-O-die. Mas a partir daí tomaram gosto pelo palco e não pararam mais: logo estavam abrindo para o Jason, do Rio de Janeiro, no Tequila Café, e tocando em Lagarto, no Festival Rock Sertão de Nossa Senhora da Glória, em Canindé do São Francisco, Poço Redondo, Tobias Barreto, Ribeira do Pombal, na Bahia, e em em Aracaju nos festivais Punka, Cajurock, Noites Fora do eixo, Rua da Cultura, Casa Rua da Cultura, no Teimonde, Capitão Cook, Casa Cultiva, em encontros de estudantes da ufs, onde fosse: era só chamar que lá ia o urublues com seu “boogie vigarista”.</div>
<div class="MsoNormal" style="background-clip: initial; background-color: white; background-image: initial; background-origin: initial; background-position: initial; background-repeat: initial; background-size: initial; color: #222222; font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; line-height: 12.65pt; margin: 0cm 0cm 10pt;">
A primeira gravação “demo”(de demonstração) foi o registro caseiro de um ensaio lançado em CDR sob o nome “Na estrada do sol”. A segunda, “Andarilho”, lançada em 27 de fevereiro de 2010 num show antológico no Capitão Cook, foi mais caprichada, contando inclusive com a participação de Leo Airplane, um dos músicos e produtores mais requisitados da cidade, na faixa “Migalhas”. A formação, durante esses mais de 20 anos de atividade, contou sempre com Ferdinando na guitarra e voz e Fabio Santana no baixo, com os bateristas Magno, Marcio, “Pitoco” e Davi, além dos gaitistas Igor Cortes e Mateus Santana. No início da década de 2010 a banda se separou e Ferdinando engatou uma carreira solo, Ferdinando Blues Trio. Voltaram agora em 2019, depois de um hiato de aproximadamente 4 anos, com o baterista Junior Giorgio. Estão compondo músicas novas e pretendem voltar aos palcos apenas quando tiverem um álbum pronto.</div>
<div class="MsoNormal" style="background-clip: initial; background-color: white; background-image: initial; background-origin: initial; background-position: initial; background-repeat: initial; background-size: initial; color: #222222; font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; line-height: 12.65pt; margin: 0cm 0cm 10pt;">
A outra grande banda de blues sergipana é a Máquina Blues, capitaneada por Silvio Campos, veterano cantor, compositor e guitarrista de infinitas bandas de rock, e Melcíades, guitarrista, filho do célebre arquiteto e artista plástico itabaianense de mesmo nome. Silvio é mais conhecido da cena punk local, principalmente por ter sido um dos fundadores da mais importante banda de rock do estado, a Karne Krua. Mas sempre teve vontade de tocar e cantar blues. Seu primeiro projeto nesta seara foi a WRS e as Mulheres invisíveis, com Robson “Macaxeira” (hoje no Ferraro Trio) e Wendell Miranda (ex-guitarrista da Karne Krua). Faziam um som basicamente acústico e tocavam em bares. Chegaram a se apresentar em Salvador, mas teve vida curta, pois Wendell se mudou para São Paulo.</div>
<div class="MsoNormal" style="background-clip: initial; background-color: white; background-image: initial; background-origin: initial; background-position: initial; background-repeat: initial; background-size: initial; color: #222222; font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; line-height: 12.65pt; margin: 0cm 0cm 10pt;">
A Máquina começou a funcionar pra valer quando Silvio encontrou um fiel escudeiro, Melciades, que era cliente de sua loja de discos. Montaram a Máquina Blues no ano 2000, com Paulo Antônio no baixo e Adriano Tavares na bateria. A exemplo da Urublues, com um repertório quase que 100% autoral: Silvio se revelou um excelente compositor do estilo, o que foi uma surpresa pra muita gente, já que todos os seus projetos, até aquele momento, giravam em torno do rock pesado, principalmente o punk Hard Core. É também um grande intérprete, com uma entrega impressionante no palco e vocais viscerais movidos a conhaque e com um orgulhoso sotaque nordestino.</div>
<div class="MsoNormal" style="background-clip: initial; background-color: white; background-image: initial; background-origin: initial; background-position: initial; background-repeat: initial; background-size: initial; color: #222222; font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; line-height: 12.65pt; margin: 0cm 0cm 10pt;">
A Máquina nunca parou e segue funcionando a todo vapor, tocando bastante pelas noites sergipanas, especialmente em pubs e barzinhos, mas também em alguns palcos públicos e festivais, como os extintos Rua da Cultura e Zons. Nestes quase 20 anos de existência lançaram apenas um EP “demo”, em CDR, em 2003, e um álbum em CD “oficial” – industrializado, “de fábrica” – totalmente independente no ano passado(2018). Chama-se “Um blues pra elas” e pode ser adquirido em formato físico em Aracaju na Rua Santa Luzia, 151, no centro, ou ouvido “na nuvem” em <a data-saferedirecturl="https://www.google.com/url?q=http://deezer.com&source=gmail&ust=1578849737476000&usg=AFQjCNG9fCWJb_UTsYzxmaTk6EacpcGJpw" href="http://deezer.com/" style="color: #1155cc;" target="_blank">deezer.com</a>.</div>
<div class="MsoNormal" style="background-clip: initial; background-color: white; background-image: initial; background-origin: initial; background-position: initial; background-repeat: initial; background-size: initial; color: #222222; font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; line-height: 12.65pt; margin: 0cm 0cm 10pt;">
Em 2009 esta incipiente porém orgulhosa “cena” de blues sergipano ganhou um importante reforço quando a Aperipê FM colocou no ar um programa dedicado exclusivamente ao gênero, o “Encruzilhada”. Produzido e apresentado por Isabela Raposo, ia ao ar aos domingos das 22H à meia noite e fez história, transmitindo inclusive apresentações ao vivo, direto dos estúdios, das bandas locais. O programa promoveu também algumas concorridas festas de aniversário – em uma delas a Máquina lançou um EP virtual, “Esse blues triste”.</div>
<div class="MsoNormal" style="background-clip: initial; background-color: white; background-image: initial; background-origin: initial; background-position: initial; background-repeat: initial; background-size: initial; color: #222222; font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; line-height: 12.65pt; margin: 0cm 0cm 10pt;">
Não podemos deixar de mencionar, também, The Baggios, que apesar de não ser exatamente uma banda de blues é fortemente influenciada pelo estilo e tem hoje uma grande projeção no meio independente nacional, aventurando-se, inclusive, em algumas turnês internacionais, na Europa e no México. Foram indicados ao Grammy latino pelo álbum “Brutown”.</div>
<div class="MsoNormal" style="background-clip: initial; background-color: white; background-image: initial; background-origin: initial; background-position: initial; background-repeat: initial; background-size: initial; color: #222222; font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; line-height: 12.65pt; margin: 0cm 0cm 10pt;">
Além da Máquina e do Urublues foram formados alguns projetos esporádicos, como o Double Trouble, dupla que reunia Julico, da The Baggios, e Little Mel, da Máquina Blues. Mais recentemente Silvio Campos, o incansável, tem se dedicado a uma nova empreitada, a “Dry Blues”, com Max no baixo, Matheus na bateria e Julio na guitarra.<br />
<br />
A.<br />
<br />
#</div>
Adelvan Kenobihttp://www.blogger.com/profile/06307759808605250885noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-4793536658109166560.post-908175706838251072019-12-21T10:44:00.000-08:002019-12-21T10:44:09.263-08:00Contagem regressiva<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<span class="capitalize" style="box-sizing: border-box; display: inline-block; float: left; font-family: Piaui, Tahoma, sans-serif !important; font-size: 100px; font-weight: 700; line-height: 60px; margin: 12px 5px 0px 0px; padding: 0px; text-transform: uppercase;">J</span>air Bolsonaro sempre teve clareza de que chegou ao poder por uma confluência única de circunstâncias, uma janela no tempo difícil de se repetir. Desde que se elegeu, tem apenas duas preocupações: evitar o impeachment e se reeleger. A tática para atingir suas metas é a mesma: manter o sólido apoio de uma parcela do eleitorado que não é maioria, mas que é grande o suficiente tanto para resistir a um impeachment como para chegar ao segundo turno em 2022.</div>
<div class="piaui-miolopost" id="piaui-519666285" style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin: 50px; padding: 0px; text-align: center;">
</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
A partir do terceiro mês de mandato, a parcela que apoia o atual presidente se estabilizou em torno de um terço do eleitorado. Mesmo que o apoio venha a cair para um quarto dos eleitores, ainda assim Bolsonaro tem boas chances de ser bem-sucedido. O sinal vermelho para seu projeto só acenderá caso caia abaixo desse patamar.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
A grande ameaça está no fato de que o duplo objetivo – evitar o impeachment e conseguir a reeleição – não é um fim em si mesmo. É apenas um meio. O objetivo real de Bolsonaro é destruir a democracia. Manter-se no poder e vencer a eleição em 2022 são apenas requisitos para alcançar esse objetivo maior.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
É claro que esse roteiro pode mudar. Bolsonaro pode tentar um golpe antes de 2022. Mesmo que seja uma tarefa ainda mais difícil neste momento de dispersão e de fragmentação, as forças democráticas têm de se preparar como puderem também para isso. Este texto é otimista. Acredito que, pelo menos por enquanto, as condições para um golpe não estão dadas e que está mantido o roteiro de destruição da democracia pela via eleitoral.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Apesar de todas as indicações, tem muita gente que ainda duvida de que o objetivo de Bolsonaro seja destruir a democracia. Os atos e palavras antidemocráticos do atual presidente não passariam, segundo essas pessoas, de “arroubos”. Outra parcela da sociedade acha que “as instituições democráticas” irão mantê-lo na linha. Porque, afinal, Bolsonaro continua apostando em eleições. E está realizando o que prometeu durante a campanha de 2018.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Mas o que Bolsonaro prometeu em 2018 foi exatamente isso – destruir as instituições democráticas. Na campanha, as “instituições democráticas” eram “o sistema”. E o sistema é “de esquerda”. O liberalismo que ele abraçou é meramente econômico – Bolsonaro tem ojeriza ao liberalismo político. Entre outras razões, é por isso que não passa de conversa fiada dizer que se trata de um governo “liberal na economia e conservador nos costumes”. É um governo liberal na economia e antiliberal em política.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
No mundo todo, movimentos antidemocráticos destroem a democracia pela via eleitoral. Para isso, reduzem a democracia à realização de eleições, justamente. Insistem que a democracia não depende de instituições democráticas e de uma cultura política democrática para existir, precisa apenas de eleições e de consultas populares. Pelo contrário, as instituições democráticas e a convivência democrática na vida cotidiana são “ideológicas”, “de esquerda”.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
É um liberalismo autoritário, um Frankenstein político. Para que cada pessoa possa fazer o que bem entende em sua vida privada, deve ter sua vida política reduzida a votar. Uma democracia reduzida ao voto não precisa de imprensa livre, Judiciário independente, escola que fomente a tolerância, Legislativo que fiscalize, movimentos sociais de contestação, autocontrole democrático da burocracia estatal.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Quando Eduardo Bolsonaro falou em “um novo AI-5”, a repulsa foi de tal ordem que não se prestou a devida atenção ao que ele disse em seguida: “Se a esquerda radicalizar a esse ponto, vamos precisar dar uma resposta. E essa resposta pode ser via um novo AI-5, pode ser via uma legislação aprovada por plebiscito, como ocorreu na Itália.” É claro que quem define o “ponto” da “radicalização” é quem fala. Especialmente se estiver no poder. O primeiro caminho escolhido por Eduardo Bolsonaro é usar a Presidência para decretar um novo AI-5, assim como o pai falou em invocar a Lei de Segurança Nacional contra Lula.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
O outro caminho imaginado por Eduardo Bolsonaro foi o de um “plebiscito”. Quando a democracia é reduzida ao ato de votar, a realização de plebiscitos ou referendos dá a aparência de tornar o processo político “mais democrático”, já que “se vota mais”. E a referência à legislação aprovada na Itália pode ser à Lei de Legítima Defesa, cuja cópia foi entregue em mãos a Eduardo Bolsonaro pelo então homem forte do governo, o líder da extrema direita italiana, Matteo Salvini. Mas pode ser também uma referência a qualquer plebiscito da Itália de Mussolini, sempre lembrado veladamente por Salvini de maneira elogiosa.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
ara realizar seu projeto autoritário, Bolsonaro precisa investir em duas frentes simultâneas. Precisa manter as instituições democráticas existentes no mesmo estado de colapso em que já se encontravam desde as manifestações de Junho de 2013 – uma das razões decisivas para explicar sua eleição, aliás. Com isso, ele pretende eliminar entraves ao seu projeto que possam vir da própria burocracia de Estado, pretende eliminar a diversidade no fomento à cultura e os controles institucionais penosamente conquistados ao longo da redemocratização. Ao mesmo tempo, Bolsonaro quer introduzir uma nova cultura institucional, aparelhando o Estado com o máximo de adeptos do autoritarismo que conseguir. É marcante como aposta na formação de quadros jovens em seu governo. É visível a tentativa de construir um dispositivo cultural de extrema direita para chamar de seu. Com isso, tornará o aparelho de Estado o quanto possível uma arma eleitoral em 2020 e em 2022.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Na outra frente, Bolsonaro espera tornar mais orgânica sua base de apoio, convencendo-a paulatinamente de que a saída autoritária é não só a melhor, mas a única possível. Foi o que pretendi dizer há um ano, logo após a eleição, aqui mesmo na <strong style="box-sizing: border-box; font-family: PalatinoBold, serif; margin: 0px; padding: 0px;">piauí</strong> (<a href="https://piaui.folha.uol.com.br/materia/a-revolta-conservadora/" style="border-bottom: 2px solid rgb(63, 213, 240); box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px; text-decoration-line: none;">“A revolta conservadora”, edição 147, dezembro de 2018</a>): “Como venceu a eleição com muita mobilização, mas sem nenhuma organização, Bolsonaro tem de convencer seu eleitorado mais fiel de que a revolução conservadora apenas começou. Precisa pedir tempo e paciência para desmontar de uma vez por todas o sistema político. Precisa conseguir que as pessoas de sua rede se engajem e se candidatem na eleição de 2020 para preparar uma renovação geral que prometerá completar apenas em 2022. A tática de identificar tudo que não é o seu governo – ou seja, a ‘esquerda’ – com o ‘sistema político’ o impede de utilizar os mecanismos clássicos do mesmo sistema para atingir esse objetivo.”</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
No mundo todo, não só no Brasil, eleições estão produzindo impasses. O exemplo mais recente é o da Espanha, um país de regime parlamentarista que realizou quatro eleições nos últimos quatro anos. Por toda a parte, as forças políticas adotaram posições meramente defensivas. Empenham-se em manter as bases eleitorais que têm, sem qualquer pretensão de ampliação ou de solapamento das bases de adversários.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Mas, apesar do travamento e do impasse, o Brasil não é a Espanha. É um país governado por um presidente de extrema direita que sinaliza o tempo todo sua intenção de instaurar um governo autoritário na primeira oportunidade. O atual presidente tem clareza de que propostas autoritárias têm tanto mais chance de vingar quando se apresentam em situações de travamento e de impasse como a nossa.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<br /></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<span class="capitalize" style="box-sizing: border-box; display: inline-block; float: left; font-family: Piaui, Tahoma, sans-serif !important; font-size: 100px; font-weight: 700; line-height: 60px; margin: 12px 5px 0px 0px; padding: 0px; text-transform: uppercase;">M</span>esmo quem considera que a situação é gravíssima age como se estivéssemos diante de um governo normal. Há um descolamento flagrante entre repetir à exaustão que a democracia está em risco e a ausência do sentido de urgência que deveria acompanhar essa constatação. O resultado é uma paralisia da ação que pode colocar tudo a perder.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Bolsonaro é agora presidente e não mais um candidato <em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">outsider</em>. Mas, paradoxalmente, continua a ser tratado como candidato e como se ainda <em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">outsider</em> fosse. O paradoxo tem sua razão de ser: ele se põe de fato como um presidente <em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">outsider</em>; e é de fato candidato. Lançou-se à reeleição com menos de seis meses no cargo. E então a imprensa cobre seu governo como se fosse campanha eleitoral. Mais do que isso, tanto as mídias sociais como as forças políticas lidam com o governo como se estivéssemos em campanha eleitoral.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Continuamos a subestimar o atual presidente e as chances que tem de realizar seu projeto autoritário. Como todo <em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">outsider</em> que se preze, Bolsonaro age sempre como se estivesse acuado, encurralado. E acreditamos. Acreditamos que o presidente da República está sempre na defensiva, perdendo. O presidente da República!</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Tratamos Bolsonaro como se ele ainda fosse um candidato azarão e não o presidente do país. Como se fosse algo óbvio que seu projeto fracassará. Afinal, “não é possível que um sujeito tosco como esse, que não faz articulação política” possa chegar a 2022 com qualquer chance – é o que ouvimos dia sim, outro também. Mesmo porque – assim continuam os mantras da preguiça mental que tomou conta de nós nos últimos tempos – “a economia não vai decolar” e Bolsonaro pagará o preço.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Sério? Vamos agora acreditar em unicórnios em lugar de fazer política? Vamos colocar em risco a democracia brasileira com base em palpites de botequim?</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
O efeito dessa preguiça política generalizada é favorável a Bolsonaro em pelo menos três sentidos. Entra no ritmo eleitoral em que ele se sente confortável. Acredita no show de um presidente acuado, nas cordas, sem margem de ação. E, paradoxalmente, trata seu governo como se fosse um governo normal. A prova mais cabal dessa normalidade é que todas as forças políticas continuam a fazer cálculos meramente eleitorais, sem levar em conta que é a própria democracia que está em risco.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<br /></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<span class="capitalize" style="box-sizing: border-box; display: inline-block; float: left; font-family: Piaui, Tahoma, sans-serif !important; font-size: 100px; font-weight: 700; line-height: 60px; margin: 12px 5px 0px 0px; padding: 0px; text-transform: uppercase;">A</span>campanha midiática de normalização do governo Bolsonaro como um governo democrático ficou delegada sobretudo ao ministro da Economia, Paulo Guedes. Na semana em que a <em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">Folha de S.Paulo</em> foi frontalmente atacada por Bolsonaro, Guedes concedeu uma entrevista ao jornal, em 3 de novembro último. A entrevista pretendeu mandar o recado de que o governo continua contando com gente esclarecida, ciosa das liberdades democráticas, verdadeiramente liberal no sentido político da expressão. A normalidade foi expressa com perfeição já na chamada da entrevista, que reproduziu a seguinte fala de Guedes: “Dá para esperar quatro aninhos de um liberal-democrata após trinta anos de centro-esquerda?” Como se estivéssemos diante de uma simples “alternância no poder”. Como aconteceu em outra ocasião, quando Guedes afirmou que iria “enterrar o modelo econômico social-democrata” dos governos do PSDB e PT.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
E, no entanto, ao identificar PSDB e PT como farinha do mesmo saco social-democrata, Guedes ecoa Bolsonaro, que identifica todas as forças políticas que não a sua ao “sistema”, à “esquerda”. O ministro fala como se integrasse um governo liberal sem mais. Ao mesmo tempo, deixou claro na entrevista que seu horizonte não se restringe a apenas “quatro aninhos”. Perguntado sobre a inclusão da Petrobras na lista de empresas a serem privatizadas, Guedes respondeu assim à jornalista Alexa Salomão: “Não agora. Num segundo mandato o presidente vai considerar as grandes [<em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">empresas estatais</em>]. Nós, da equipe econômica, queríamos tudo agora.”</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Para não deixar dúvidas de que se trata de um governo revolucionário, que vai muito além da adesão incondicional ao projeto reeleitoral dos “oito aninhos”, Paulo Guedes também entrou de cabeça no discurso apocalíptico-salvacionista dos mártires. No anúncio de sua proposta de refundar o Estado e a sociedade no Brasil, em 5 de novembro, usava uma pulseira com os dizeres “Apocalipse 12:11”.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
O texto bíblico do versículo 11 do capítulo 12 do livro do <em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">Apocalipse</em> (o “livro da revelação”) diz: “Eles, pois, o venceram pelo sangue do Cordeiro e pela palavra que testemunharam, pois desprezaram a própria vida até a morte.” Trata-se do capítulo bíblico que introduz o tópico das batalhas com o Diabo, que foi jogado para fora do Céu, para a Terra. O capítulo narra nada menos do que o conflito cósmico entre o bem e o mal: o mártir vence, mas morre; e morre para vencer.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
A pulseira bíblica indica o que está por trás da versão liberal-tecnocrática do caos como método implantado por Bolsonaro como estilo de governo. Guedes propõe tanta mudança radical ao mesmo tempo que é impossível debater com alguma seriedade. O discurso nacionalista, o religioso e o tecnocrata se uniram para abolir de uma tacada o lento trabalho constituinte e constitucional realizado nos últimos 31 anos pela sociedade e pelos três poderes.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Sem nem entrar no mérito das inúmeras propostas e de suas muitas incoerências e iniquidades, o ministro age como se jogasse no colo do Congresso uma Constituinte específica. Isso, com eleições municipais pela frente, sem qualquer preparação anterior. Trata-se, além disso, de um pacote de medidas que poderia ter sido debatido de maneira escalonada, em uma série coerente.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Vai passar pelo Congresso? De que maneira? Essas são as perguntas que miram o alvo errado. O pacotaço de Guedes vai na contramão do consenso que se formou na elite do capitalismo global. Todas as políticas adotadas para enfrentar a crise econômica mundial iniciada em 2008 salvaram os sistemas financeiros, mas apenas empurraram o real problema com a barriga. O ciclo de revoltas de 2011 a 2013, que mirou essa primeira gambiarra, está sendo agora retomado em diferentes partes do planeta em novo patamar. Duas coisas já estão claras para a elite do capitalismo global: a desigualdade chegou a níveis inadministráveis; estamos efetivamente em estado de emergência ambiental.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
O plano Guedes quer introduzir com trinta anos de atraso as mesmas políticas que levaram à crise de 2008. Somada à política de vale-tudo ambiental do governo Bolsonaro e ao estado deplorável das instituições, caminhamos para um acirramento das nossas crises superpostas. É nesse contexto que deve ser compreendida a declaração de Guedes durante entrevista coletiva em Washington, no último dia 25 de novembro: “Sejam responsáveis, pratiquem democracia. Ou democracia é só quando o seu lado ganha? Quando o outro lado ganha, com dez meses você já chama todo mundo para quebrar a rua? Que responsabilidade é essa? Não se assustem, então, se alguém pedir o AI-5. Já não aconteceu uma vez? Ou foi diferente?” Não há democrata que tenha o direito de permanecer indiferente a um ataque dessa magnitude à democracia. Não há democrata que tenha o direito de continuar a acreditar que Paulo Guedes é um democrata depois de uma declaração como essa.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Do pacotaço de Guedes o que de fato importa para o projeto de poder do atual presidente é culpar “o sistema” pelo resultado “distorcido” que vier do Congresso. Seja lá qual for. A narrativa oficial já está preparada de antemão: Bolsonaro apresentou um projeto de reformulação de cima abaixo do país e não foi ouvido pelo “sistema”. Como queríamos demonstrar.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<br /></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<span class="capitalize" style="box-sizing: border-box; display: inline-block; float: left; font-family: Piaui, Tahoma, sans-serif !important; font-size: 100px; font-weight: 700; line-height: 60px; margin: 12px 5px 0px 0px; padding: 0px; text-transform: uppercase;">C</span>om alguma variação, as pesquisas de opinião sobre o presidente mostram que o eleitorado se divide em três terços: aprovação, rejeição, nem aprovação nem rejeição. Também os principais nomes colocados para 2022 se organizam segundo essa divisão: Bolsonaro, Lula, João Doria/Luciano Huck. Não importa aqui se o eleitorado se divide exatamente em três terços. O que importa é que se consolidou na política institucional uma tática de organização que se baseia na divisão em três partes, seja lá o tamanho que tenha cada uma. Para a manutenção dessa lógica, o que não pode acontecer é alguma das partes cair para um patamar abaixo de um quinto do eleitorado.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
A tática de cada terço é a mesma: fidelizar o eleitorado que acredita ser seu. Não há empenho de ninguém em minar a base das outras forças ou em estender a sua própria para além de seu terço.Por paradoxal que possa parecer, é confortável para todas as demais forças políticas dar por certo, por exemplo, que a parcela do eleitorado que está com Bolsonaro não pode ser reconquistada para a democracia. A tática de cada um dos três terços reforça a dos demais.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Desapareceu do horizonte a lucidez do discurso de Mano Brown no último comício no Rio de Janeiro do então candidato Fernando Haddad, em 2018: “Não sou pessimista, sou realista. Eu não consigo acreditar que pessoas que me tratavam com tanto carinho, pessoas que me respeitavam, me amavam, que serviam o café de manhã, que lavavam meu carro, que atendiam meu filho no hospital se transformaram em monstros. Eu não posso acreditar nisso. Não posso acreditar que… Essas pessoas não são tão más assim.”</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Uma importante figura de referência do terço do meio, por exemplo, considera que não vale a pena perder tempo em solapar a base de apoio de Bolsonaro. Em entrevista a Igor Gielow publicada pela <em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">Folha </em>em 24 de outubro, Jorge Bornhausen avaliou que o “centro deverá apoiar Luciano Huck na disputa com o PT para enfrentar Jair Bolsonaro no segundo turno em 2022, deixando João Doria de lado”. Para o ex-governador, ex-ministro e ex-senador, “Huck e um nome do PT irão disputar a vaga no segundo turno contra Bolsonaro (PSL). O presidente manterá seus 25%, 30% de apoio, apesar de tudo”. O político de 82 anos, que já pertenceu à Arena, ao PDS, ao PFL, ao DEM e ao PSD, deixou claro que não quer conversa com o terço à esquerda. Diz ter votado em Bolsonaro no segundo turno de 2018 “por exclusão, porque não voto no PT”. Bornhausen faz do partido de Lula, e não de Bolsonaro, o adversário a ser primeiramente batido em 2022.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Também Lula, já livre, aposta fundo na fidelização de seu terço do eleitorado. Em reunião da Executiva Nacional do PT em Salvador, em 14 de novembro, disse: “Vocês já viram alguém pedir para FHC fazer autocrítica? […] Quem quiser que o PT faça autocrítica, que faça a crítica você. Quem é oposição que critica, ela existe para isso. […] Na dúvida, a gente defende nosso companheiro.” É claro que exigir autocrítica de outra pessoa ou outra instituição é uma contradição em termos. Se é <em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">auto</em>crítica, não cabe exigir que outra pessoa a faça. Lula tem razão, quem quer criticar, que critique.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Mas por que mirar em FHC quando é Bolsonaro o presidente? Lula fala de “oposição” como se ainda estivesse na Presidência da República e como se o PSDB ainda tivesse força para liderar a oposição a seu governo. Como se ainda estivéssemos na República do Real, encerrada definitivamente com a eleição de Bolsonaro. Como se o adversário a derrotar fosse o terço “nem nem” – que nem apoia nem rejeita Bolsonaro – e não o próprio Bolsonaro.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Sobretudo, Lula fala como se a tática do PT na eleição de 2018 tivesse sido sem mácula. Como se a total ausência de empenho efetivo em trazer o eleitorado “nem nem” para a candidatura Haddad não tivesse qualquer relação com o resultado. Em seu discurso na abertura do Congresso Nacional do PT em São Paulo, em 22 de novembro, Lula disse: “Não fomos nós os responsáveis, ativos ou omissos, pela eleição de um candidato que tem ojeriza à democracia.” O que mais se ouve na parte mais mobilizada do terço fiel ao PT é que quem não votou em Haddad não passa de canalha sem remissão. Trabalham com a convicção de que repetindo o mesmo erro de 2018 terão um resultado completamente diferente em 2022. Porque o PT já estará preparado para enfrentar as <em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">fake news</em>. E porque não haverá a facada que garantiu Bolsonaro no segundo turno em 2018. Então tá.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<br /></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<span class="capitalize" style="box-sizing: border-box; display: inline-block; float: left; font-family: Piaui, Tahoma, sans-serif !important; font-size: 100px; font-weight: 700; line-height: 60px; margin: 12px 5px 0px 0px; padding: 0px; text-transform: uppercase;">O</span>que é necessário para que um acordo mínimo entre as forças que não apoiam Bolsonaro possa acontecer? O que é necessário para que uma agenda pública alternativa à lógica de campanha eleitoral mantida por Bolsonaro consiga se impor? Menos do que isso ainda: o que é necessário para dar o primeiro passo para evitar a catástrofe, para que forças políticas adversárias, mas dispostas a manter a democracia, aceitem simplesmente sentar para conversar?</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Há uma montanha de desconfianças acumuladas de lado a lado. Mas, se a convergência em torno de um acordo mínimo em defesa da democracia não começar a ser construída desde já, a democracia já perdeu. Porque a construção de um acordo desse tipo tem de elaborar anos de golpes duríssimos, de mágoas e de acusações graves. E isso leva tempo.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
É justamente da continuidade dessa desconfiança generalizada no campo democrático que se alimenta Bolsonaro. O atual presidente conta com a divisão no interior do campo democrático, aposta que continuarão dinamitadas todas as pontes entre as forças desse campo. Bolsonaro ainda não dispõe de uma maioria de extrema direita para chamar de sua. Só tem chance de realizar seu projeto autoritário se as forças democráticas não forem capazes de chegar a um acordo para isolá-lo.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
O eleitorado “nem nem” é uma realidade. Mas o “centro” de Jorge Bornhausen é uma abstração política. O que se costuma chamar de centro é um estacionamento composto por aquela parte do eleitorado que não quer ser obrigada a escolher previamente se votará mais à esquerda ou mais à direita na próxima eleição. Foi sempre o sonho de parte da direita e de parte da esquerda tornar o centro algo orgânico, uma força política com identidade própria. Funciona como recurso retórico. Mas só.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
É enorme a responsabilidade de uma direita comprometida com a democracia. Mesmo que não exclusivamente, ela tem o papel de roubar votos de Bolsonaro, de minar sua base de apoio, de disputar a sério a representação à direita para isolar a extrema direita. Em setembro último, o Datafolha tentou medir o efetivo apoio a Bolsonaro e chegou ao resultado de que o “núcleo duro de entusiastas” do atual presidente é de cerca de 12% da população, sendo algo como 22% os “entusiastas médios” do bolsonarismo. Ou seja, há muito apoio a Bolsonaro a ser roubado se houver um esforço real nessa direção. Parte desse esforço terá de ser feito pela esquerda, mas a responsabilidade da centro-direita é ainda maior. O único que tentou isso até agora foi João Doria – o mesmo que Bornhausen achou por bem tirar do jogo sucessório. Foi atrás de Alexandre Frota e de Joice Hasselmann, por exemplo. Mas Doria continua restrito a São Paulo, não tem capacidade de articulação nacional.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Isolar Bolsonaro requer ainda outro passo: a centro-direita precisa parar de fazer o jogo “me engana que eu gosto”, como se estivesse “usando” o atual governo para passar as mudanças legislativas com que sonha há mais de duas décadas. Quem usa os outros é quem está no poder. E quem está no poder é a extrema direita.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Em suma, Rodrigo Maia não preside o país, preside a Câmara dos Deputados. E seu mandato acaba bem antes do de Bolsonaro, em fevereiro de 2021. Os candidatos a substituí-lo nada têm a ver com o projeto do “novo centro”. É bom começarem a pensar nisso desde já.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<br /></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<span class="capitalize" style="box-sizing: border-box; display: inline-block; float: left; font-family: Piaui, Tahoma, sans-serif !important; font-size: 100px; font-weight: 700; line-height: 60px; margin: 12px 5px 0px 0px; padding: 0px; text-transform: uppercase;">P</span>or fim, para que o movimento de ataque à base de apoio de Bolsonaro seja bem-sucedido, é necessário um cessar-fogo de parte a parte entre a centro-direita e Lula. O “centro” precisa parar de tratar Lula e o PT como inimigos preferenciais e passar a considerá-los como adversários com os quais é necessário se entender sobre o que será a democracia brasileira. Porque, como se sabe, na democracia há apenas adversários, e não inimigos.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Por isso mesmo, o único inimigo de fato é Bolsonaro. Porque é inimigo da democracia. Diante da ameaça autoritária representada pelo atual presidente, é politicamente irresponsável agir como se a polarização ainda fosse entre PT e PSDB. Irresponsabilidade, aliás, que é um presente para Bolsonaro.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
A centro-esquerda alternativa ao PT desejada por Ciro Gomes e pelo PSB é um espaço ainda mais imaginário do que o “centro” de Bornhausen. Ciro quer abrir um espaço onde espaço não há, quer fazer política entre Lula e Luciano Huck. Para isso, resolveu hostilizar Lula e o PT de maneira permanente. Mais um presente para Bolsonaro.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Se uma candidatura de esquerda chegar ao segundo turno contra Bolsonaro em 2022, é evidente que vai precisar do eleitorado “nem nem” para vencer a eleição. Ainda mais se for um candidato do PT, um partido que registra hoje taxa de rejeição por volta de 43% no eleitorado. A parcela “nem nem” não virá para uma candidatura de esquerda “por gravidade”, por “não ter para onde ir”, como muita gente insiste em fantasiar.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
O eleitorado “nem nem” só poderá vir a apoiar um candidato da esquerda contra Bolsonaro se sentir que novas regras de disputa política foram acordadas, se acreditar que um novo solo democrático para o exercício da divergência foi construído entre os adversários de ontem. Não para apagar as diferenças, muito pelo contrário. Como escrevi no texto de dezembro de 2018 aqui na <strong style="box-sizing: border-box; font-family: PalatinoBold, serif; margin: 0px; padding: 0px;">piauí</strong>: “Uma concertação democrática como essa teria ao mesmo tempo de defender instituições indefensáveis na sua forma atual e propor uma renovação radical dessas mesmas instituições. Cada força política de oposição teria de ter garantido o espaço de fazer oposição à sua maneira e como bem entender, ao mesmo tempo que se perfilaria ao lado de todas as outras forças de defesa das instituições democráticas e de sua reforma.” O eleitorado “nem nem” só poderá apoiar uma candidatura da esquerda contra Bolsonaro se tiver a segurança de que não será hostilizado, de que sua posição será respeitada. Hostilizar essa parcela do eleitorado por não ter votado em Haddad em 2018 é o mais vistoso dos presentes para Bolsonaro.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Ao sair da cadeia, em 1945, após nove anos de prisão, Luiz Carlos Prestes apoiou o ditador que tinha mandado prendê-lo. Elegeu-se senador e viu seu partido, o PCB, ser posto na clandestinidade dois anos depois. Independentemente da montanha de equívocos de sua posição, o que Prestes fez ao apoiar Getúlio Vargas em 1945 foi política. Mesmo perseguido, mesmo na clandestinidade, aquele PCB -stalinista fez mais pela frágil democracia da Constituição de 1946 do que muito autoproclamado democrata histórico.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Lula e o PT ocupam hoje um lugar histórico ainda mais importante do que ocuparam Prestes e o antigo PCB em 1946. O PT governou por treze dos 22 anos da República do Real, tem a maior bancada na Câmara dos Deputados. É enorme a responsabilidade política de Lula e do PT na sustentação da democracia em seu momento de maior fragilidade desde a redemocratização.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<br /></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<span class="capitalize" style="box-sizing: border-box; display: inline-block; float: left; font-family: Piaui, Tahoma, sans-serif !important; font-size: 100px; font-weight: 700; line-height: 60px; margin: 12px 5px 0px 0px; padding: 0px; text-transform: uppercase;">“S</span>istema” é o lugar que o vencedor da eleição presidencial de 2018 atribuiu a quem perdeu. Quem hoje defende a democracia faz parte do “sistema”. Bolsonaro conseguiu transformar em “sistema” até mesmo o próprio partido pelo qual se elegeu. Essa é a lógica da política atual. Mostra a hegemonia de Bolsonaro no debate público, mesmo sendo apoiado por apenas um terço da população.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Se as forças democráticas entrarem em concertação (explícita ou implícita, não importa) para tentar encontrar uma convergência mínima que permita salvar a democracia, com certeza receberão o carimbo de “sistema”, darão razão à tática antissistema de Bolsonaro. Mas a atual tática meramente defensiva dos grupos não bolsonaristas também não se mostrou até agora capaz de escapar dessa consequência. Pelo contrário, apenas reforçou a posição de Bolsonaro. Porque o impasse dos três terços mantém tudo como está sem apontar para nenhuma saída, sem apontar para nada além da permanência do atual estado de crise da democracia. Se alguma das forças políticas não bolsonaristas vier a vencer o atual presidente em 2022 mantendo sua tática de hoje, apenas adiará a crise. Apenas produzirá novos Bolsonaros.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
É por isso também que uma convergência mínima das forças não bolsonaristas não pode se resumir a restaurar o que foi a democracia brasileira. Tem de ir além de seu importante primeiro passo de um cessar-fogo nos bombardeios mútuos e permanentes. Tem de ser uma concertação que aponte para o futuro, para a construção de um novo espaço comum de divergência democrática, para reformas significativas das instituições.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Pode ser pura miragem o encontro entre Lula e Rodrigo Maia anunciado pelo colunista do UOL Tales Faria, em 19 de novembro último. Mas, mesmo sendo uma luz ainda fraca demais para o tamanho do túnel em que nos metemos, seria já um sinal alentador. Vai no mesmo sentido a tese da corrente majoritária do PT apresentada no último congresso nacional do partido, em novembro: “Não há contradição entre consolidar a unidade dos progressistas e, ao mesmo tempo, buscar alianças mais amplas, até com personalidade e setores de centro, em prol do Estado de Direito.” Já o discurso de Lula na abertura do mesmo congresso do PT vai em sentido contrário, segue na mesma linha dos pronunciamentos em Curitiba e no Recife, feitos após a sua libertação.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
Os canais de diálogo e de concertação política estão hoje entupidos e enferrujados. Uma verdadeira DR [<em style="box-sizing: border-box; margin: 0px; padding: 0px;">discussão da relação</em>] do campo democrático vai exigir disposição, paciência e tempo. Um tempo que parece curto para o tanto de conversa que ainda precisa acontecer. Na melhor das hipóteses, o campo democrático tem menos de três anos para encontrar um acordo mínimo, tem menos de três anos para evitar a catástrofe.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; padding: 0px;">
Se o projeto autoritário em curso ainda mantiver seu roteiro eleitoral, o imperativo categórico da política brasileira é derrotar Jair Bolsonaro na eleição de 2022. Dar prioridade a qualquer outro objetivo em relação a esse significa arriscar tudo. Significa arriscar a pouca democracia que ainda temos.</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; padding: 0px;">
<br /></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; padding: 0px;">
por Marcos Nobre</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; padding: 0px;">
<a href="https://piaui.folha.uol.com.br/materia/contagem-regressiva/?fbclid=IwAR0JQMP8WLN177VfVRKL5k7YUUNfPZgCWWtIt2yx2TixMUOxipKJ7yx_U3Q" target="_blank">piauí</a></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; padding: 0px;">
<br /></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; padding: 0px;">
#</div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; padding: 0px;">
<br /></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEimmjLFRRpl2GmJRYcwQWTZPMUwgXZdd9vRUY_9WdqSzV2xgONxsMbA-0S_KZInTYGb5d-zdeIowl0wtouY6GvppAqfVHpKZjHhrtyjpeqc8QLLRWLjG2fabkbUivO1Bd18-SgJsqVWIBYW/s1600/Dwj8im5XgAEgrzI.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1200" data-original-width="829" height="640" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEimmjLFRRpl2GmJRYcwQWTZPMUwgXZdd9vRUY_9WdqSzV2xgONxsMbA-0S_KZInTYGb5d-zdeIowl0wtouY6GvppAqfVHpKZjHhrtyjpeqc8QLLRWLjG2fabkbUivO1Bd18-SgJsqVWIBYW/s640/Dwj8im5XgAEgrzI.jpg" width="442" /></a></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; padding: 0px;">
<br /></div>
<div style="background-color: white; box-sizing: border-box; color: #2b2b2b; font-family: Palatino, serif; font-size: 20px; margin-bottom: 1.4em; padding: 0px;">
<br /></div>
Adelvan Kenobihttp://www.blogger.com/profile/06307759808605250885noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4793536658109166560.post-56465806555257880392019-09-27T19:20:00.001-07:002019-09-27T19:21:15.160-07:00“Quero Que Você Entre Em Pânico”“Onde está aquela garota?”, uma adolescente, ainda vestindo o uniforme da escola se pergunta em voz alta. “Que
garota?” “Você
sabe!” Suas amigas parecem intrigadas por um momento, depois se
descontraem em reconhecimento. “É, é.
Aquela garota.”<br />
<br />
Alguns minutos depois, um grupo de meninos um pouco mais informados começam a entoar simulando um sotaque sueco: “Greta! Greta!”<br />
<br />
Toda vez
que a polícia nos empurra para a calçada, alguns de nós na multidão imaginam
que estamos prestes a ver Greta Thunberg, a garota sueca de 16 anos que
inspirou milhões de outras crianças ao redor do mundo a matar aula às
sextas-feiras para protestar contra o fracasso dos seus governos em impedir o
desastre climático.<br />
<br />
A greve climática de 20/09, atraiu milhões de pessoas ao redor do
mundo. A que ocorreu em Nova Iorque foi a maior do país até o momento,
com 70.000 pessoas na rua. Grande parte do motivo foi a emoção de ter
Greta Thunberg aqui na cidade. O sistema de ensino público nova-iorquino
ter permitido que os alunos faltassem aula sem penalidade também
ajudou, resultando no que talvez tenha sido a marcha climática da classe
trabalhadora mais diversa que os Estados Unidos já viram. Mas os
números também se devem ao impulso que Greta deu ao movimento.<br />
<br />
Movimentos
são coletivos, mas algumas pessoas têm a personalidade certa para liderar na
hora certa. Quem acha que o socialismo seria tão popular nos Estados Unidos
hoje se Bernie Sanders não tivesse concorrido à presidência em 2016? As
condições históricas estão corretas, mas o povo também precisa de líderes.
Greta é uma dessas pessoas. Não há dúvidas de que ela é grande parte do motivo
pelo qual as pessoas estão indo às ruas e por que até os políticos e a mídia
estão começando a levar essa questão mais a sério.<br />
<br />
Greta é
autista. Como Slavoj Žižek observou, isso é provavelmente parte do seu apelo.
Ela se refere ao seu autismo como um “superpoder”, e pode ser que
seja mesmo. Pessoas autistas muitas vezes têm dificuldades para entender
comunicações sociais. Isso não deve ser idealizado; torna a vida deles mais
difícil, e a sociedade nem sempre é tolerante com essas diferenças. Para uma
porta-voz climática como Greta, no entanto, não é difícil ver como o autismo
pode ajudar.<br />
<br />
A maioria das pessoas, especialmente as meninas, é socializada para
fazer com que os outros sintam-se bem, para serem gentis e não serem
chatas. É impossível chamar atenção para uma ameaça à civilização humana
sob tais restrições sociais. A possível extinção da nossa espécie não
faz ninguém se sentir bem. Além disso, a maior parte das pessoas é
socializada para dizer às outras que elas estão fazendo um ótimo
trabalho, ou pelo menos para encontrar maneiras de enfatizar o que é
positivo. Mas, novamente, é impossível dizer a verdade sobre o clima
dessa maneira. Na semana de 15 a 21 de setembro de 2019, Greta disse sem
rodeios, na cara dos membros do Congresso americano, para pararem de
puxar seu saco. “Por favor, guardem seus elogios”, disse ela. “Nós não
os queremos. Não nos chamem aqui só para nos dizer como somos
inspiradores, porque isso não leva a nada.” Ela disse: “eu sei que vocês
estão tentando, mas não o suficiente. Sinto muito.”<br />
<br />
Pessoas autistas muitas vezes conseguem concentrar-se fenomenalmente
em um único assunto. Isso pode torná-los trabalhadores
extraordinariamente produtivos, como descobriram alguns empregadores.
Greta é incomum para uma ativista contemporânea, pois ela raramente
menciona outras questões. O Transtorno do Déficit de Atenção com
Hiperatividade (TDAH) é a metáfora neurológica da nossa era da internet;
há muitos problemas atraindo nossa atenção, enquanto nossas formas
contemporâneas de consumir mídia — notificações constantes em nossos
celulares, tweets — nos desencorajam a dar a qualquer um deles a atenção
constante que necessitam. Talvez uma dose de autismo seja o antídoto
certo para o nosso TDAH coletivo.<br />
<br />
omo qualquer pessoa com um impacto tão grande na cultura política,
Greta tem seus críticos. Não é de surpreender que a maioria deles esteja
à direita, exatamente onde esperamos encontrar negadores climáticos que
odeiam crianças excepcionais. Mas também houve uma reação contra ela na
esquerda.<br />
<br />
Algumas vêm
daqueles esquisitões para os quais nenhum ser humano é abnegado o suficiente.
Greta, sendo uma ativista climática de princípios e levando a sério seu papel
de exemplo para os outros, não usa aviões; as viagens aéreas são a forma de
transporte que mais emitem carbono. Para vir a Nova Iorque para a Cúpula do
Clima da ONU (e a Greve Climática) neste mês de setembro, ela viajou de barco.
Alguns dos críticos mais rígidos de Greta ficaram indignados com o fato de os
adultos que pilotavam o barco planejarem voltar de avião à Europa. Outros
ficaram aborrecidos com fotos de plástico descartável a bordo do barco. Isso é
o ambientalismo como uma neurose punitiva, e não política.<br />
<br />
Outros
críticos de Greta, com uma perspectiva política bastante diferente, estão igualmente
equivocados: estão chateados devido ao barco de carbono zero ser tão caro,
enfatizando, com um ressentimento populista idiota, que é um “iate”.
Para esses críticos de esquerda, Greta é o rosto de um movimento ambiental de
“elite”. Eles suspeitam que ela seja muito institucionalmente
amigável e amada pela mídia para fazer algo bom. Eles estão seguros de que ela
não pode ser verdadeira, que se trata de um fenômeno fabricado. Essas críticas
parecem fugir do cerne da questão tanto quanto as feitas pelos obcecados pelo
plástico.<br />
<br />
Não tenho dúvidas de que a embarcação de carbono zero é cara. Na
verdade, espero mesmo que seja; que pais deixariam um filho atravessar o
Atlântico em um barco a remo barato? Além do mais, certamente não
parecia uma viagem luxuosa. Quanto à idéia de que Greta é abraçada pelas
elites e pela mídia, qual é a insinuação aqui? Que ela estaria tentando
nos distrair participando do movimento ambiental mais radical e popular
ao invés de bombardear a sede da ExxonMobil e raptar os irmãos Koch?
Essa é uma fantasia sombria e risível para quem assiste de perto o
movimento ambiental dominante se aconchegando junto às piores empresas e
políticos, arrecadando fundos para o drama de bichinhos fofos ameaçados
de extinção, enquanto ecossistemas inteiros estão em perigo.<br />
<br />
Greta
Thunberg continua dizendo aos adultos — francamente, implacavelmente, não
facilitando — que ela não pode nos salvar. Ela está certa. Precisamos refazer
toda a nossa sociedade. Mas ela chamou nossa atenção e nos deu um exemplo, e
precisávamos disso. Na Greve Climática houveram muitos bons sinais. Alguns
fariam qualquer pessoas que já foi criança rir, como “Mantenha a Terra
Limpa, Não É Seu (C)Urano”. Outros, como “Compostem os Ricos”,
propunham soluções sagazes. Alguns foram de partir o coração: “Estou
Estudando Para Um Futuro Que Foi Destruído”. Um dos melhores levou uma
citação de Greta Thunberg: “Quero Que Você Entre Em Pânico”. Isso
provavelmente não é algo que uma pessoa “normal” diria.<br />
<br />
por<a class=" molongui-font-size-18-px molongui-text-align-left " href="https://jacobin.com.br/author/liza-featherstone/" itemprop="url" style="color: inherit;"> Liza Featherstone</a><br />
<br />
jacobin<br />
<br />
<br />
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi5fsB8M7WfRlVNF_Ah4d2ruwETwJF-NjpCfcmRVxMfwCgig95-3Qs71XcyGwomZydSy0EFJCJOviEe2H5UrWXZqPTAuYo1fiKFEV4ACWkXdWD4XYGCA85eGZ93p93Zf3dckPaobmlVCllR/s1600/greta+70998025_10156731016194639_5148244222448500736_n.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="900" data-original-width="720" height="640" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi5fsB8M7WfRlVNF_Ah4d2ruwETwJF-NjpCfcmRVxMfwCgig95-3Qs71XcyGwomZydSy0EFJCJOviEe2H5UrWXZqPTAuYo1fiKFEV4ACWkXdWD4XYGCA85eGZ93p93Zf3dckPaobmlVCllR/s640/greta+70998025_10156731016194639_5148244222448500736_n.jpg" width="512" /></a></div>
Adelvan Kenobihttp://www.blogger.com/profile/06307759808605250885noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4793536658109166560.post-25561664879944302832019-09-04T14:37:00.000-07:002019-10-07T17:11:56.126-07:00BACURAU<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhUPG2q5kM6_Dlc_CUgq3BKicpGkm9FF7zmJJrCnqEqY5TInJYScGiuuoTibVPsVevBALXrZibFPutqU3pccmAha2pfweatlaZNow3XFeITGJxwClA7qruh_tZ4k4M3V_bKtMzSXzbmmOr3/s1600/Bacurau+desenho+.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="678" data-original-width="616" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhUPG2q5kM6_Dlc_CUgq3BKicpGkm9FF7zmJJrCnqEqY5TInJYScGiuuoTibVPsVevBALXrZibFPutqU3pccmAha2pfweatlaZNow3XFeITGJxwClA7qruh_tZ4k4M3V_bKtMzSXzbmmOr3/s320/Bacurau+desenho+.jpg" width="290" /></a></div>
<div class="">
Assim como <i>Aquarius</i>, a recepção de <a data-link-track-dtm="" href="https://brasil.elpais.com/brasil/2019/08/20/cultura/1566328403_365611.html" target="_blank"><i>Bacurau</i></a>
parece comprometida pela expectativa, compartilhada por apoiadores e
críticos, de que o filme seja uma análise da conjuntura presente. No
caso de <i>Bacurau</i>, a confusão começa já na questão sobre o
registro em que devemos lê-lo. A suposta influência de Tarantino é
enganosa: não se trata de uma película ao estilo do diretor americano,
mas que explora um gênero cultivado por ele e Robert Rodriguez –– algo
que poderíamos descrever como filme B de fantasia de vingança coletiva. <a data-link-track-dtm="" href="https://brasil.elpais.com/brasil/2019/09/13/opinion/1568332061_508519.html" target="_blank">Bacurau</a>
não seria, assim, uma tentativa de copiar, mas de fazer a mesma coisa
por outros meios, com referências predominantemente não-hollywoodianas: <i>Punishment Park</i> (Peter Watkins), <i>The Wicker Man</i> (Robin Hardy) e <i>Brasil Ano 2000</i>
(Walter Lima Jr.), para arriscar algumas. É quando o lemos como filme
de gênero que vários traços do filme, como sua violência estilizada,
começam a fazer sentido.</div>
<div class="">
<br /></div>
<div class="">
O que <a data-link-track-dtm="" href="https://brasil.elpais.com/tag/quentin_tarantino" target="_blank">Tarantino</a> descobriu a partir de <i>Death Proof</i>
é que aderir às convenções do filme B lhe permitia ser maniqueísta e
didático ao falar de política. Há, claro, uma grande ironia aí: em
tempos em que o próprio fim do mundo pode ser assistido com
distanciamento irônico, é como se só o distanciamento propiciado pelo
artifício e o absurdo nos desse o direito de ir direto ao ponto. Dito de
outro modo, é como se a condição necessária para dizer a verdade sem
rodeios –– e nada é mais verdadeiro que uma fantasia de vingança ––
fosse a inverossimilhança. Porque a verdade, no fim, está menos na
caracterização dos personagens ou na plausibilidade da trama que na
catarse que o filme provoca ao realizar na tela uma fantasia de vingança
–– de mulheres, em <i>Death Proof</i>; judeus, em <i>Bastardos Inglórios</i>; negros, em <i>Django Livre</i> e <i>Os Oito Odiados</i>; e latinos, em <i>Machete</i>.</div>
<div class="">
<br /></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj_tJYcrqoNVAGArcPR14eFhVuVL1r7_x39Q5ge0fL19WMn_3K5C6V8cDlHPULNBnPjURClAZtZyHeEyJmHwnclJPjTxZLi5VT95ADIK1rizcJ1UAz92wrIBNFHVq0x28QHLHLHyR6m74kf/s1600/Bacurau+1+AIMRcE2kVKCFlx8vVSrU9w.jpeg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" data-original-height="1600" data-original-width="1097" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj_tJYcrqoNVAGArcPR14eFhVuVL1r7_x39Q5ge0fL19WMn_3K5C6V8cDlHPULNBnPjURClAZtZyHeEyJmHwnclJPjTxZLi5VT95ADIK1rizcJ1UAz92wrIBNFHVq0x28QHLHLHyR6m74kf/s400/Bacurau+1+AIMRcE2kVKCFlx8vVSrU9w.jpeg" width="273" /></a></div>
<div class="">
Sob
este aspecto, acusar de didatismo uma cena como aquela em que os
estrangeiros humilham os paulistas que os levam à Bacurau é não entender
a piada. O esquematismo e a falta de sutileza não estão ali a serviço
da mensagem, mas do efeito catártico que a cena proporciona: a vingança é
um prato que se come lambuzando-se. Não por acaso, a cena parece ter
incomodado especialmente os críticos do sudeste –– o que sem dúvida só
faz aumentar o prazer que o público nordestino pode extrair dela.<br />
<br />
Mas se <i>Bacurau</i> é uma fantasia de vingança, quem são os vingados? Reduzir o filme a uma revanche do <a data-link-track-dtm="" href="https://brasil.elpais.com/tag/movimento_elenao" target="_blank">#elenão</a>
é a leitura mais superficial que se pode fazer, seja contra ou a favor.
Tampouco podemos dizer que trata apenas dos nordestinos ou sertanejos.
Basta projetar sobre o filme um pouco de economia política, porém, e ele
se torna bem menos metafórico e bem mais literal. A violência que o
filme vinga, passada, presente e futura, é aquela que existe nas
fronteiras do capitalismo e do Estado. É a violência a que estão
expostos aqueles que, sem nunca serem incluídos por completo nem nos
serviços públicos nem no mercado, podem a qualquer momento se tornar
objetos do poder político ou do interesse econômico. É a violência que
ronda os “involuntários da pátria”, na expressão certeira de Eduardo
Viveiros de Castro: indígenas acossados pela fronteira extrativa,
camponeses cercados por posseiros e jagunços, favelados ameaçados pela
especulação imobiliária, pela polícia, pela milícia. É a violência
através da qual o sistema capitalista se expande e se defende; aquela
que se manifesta na busca por mão-de-obra e natureza baratas, nos
processos de acumulação primitiva e na gestão das populações
“excedentes” (leia-se: desprovidas de funcionalidade econômica). Esta
violência não é uma metáfora; ela está acontecendo neste exato momento
em alguma terra indígena, periferia ou fronteira que, de um ponto mais
central das redes que dela se alimentam, nós não vemos ou preferimos não
ver.</div>
<div class="">
<br /></div>
<div class="">
A transformação de Bacurau numa zona de caça para
turistas, mediada pela elite local (o prefeito) e nacional (os
paulistas), não é, assim, uma alegoria do imperialismo tirada de alguma
cartilha dos anos 60, mas outra coisa. O que o filme faz é tomar um
traço do presente e estendê-lo até o futuro –– que é, afinal, onde ele
se passa. O resultado é a projeção bastante lúcida de um cenário cada
vez mais possível, em que as fronteiras e a violência que as acompanha
proliferam e podem aparecer em (quase) qualquer lugar a qualquer hora.
Em que há cada vez mais bolsões de pessoas deixadas às margens, sem
acesso aos <i>benefícios do desenvolvimento</i>, mas sempre sujeitas a
terem uma última gota de rentabilidade extraída de si (o abastecimento
de água cortado, o safári humano como serviço de luxo). Em que as
populações “excedentes” se tornaram tão numerosas que seu <i>manejo</i>
é feito ao ar livre, em execuções em massa exibidas pela televisão. Em
que extrativismo e exterminismo finalmente tornaram-se inteiramente
reversíveis.</div>
<div class="">
<br /></div>
<div class="">
Quem viu os discursos de Donald Trump e <a data-link-track-dtm="" href="https://brasil.elpais.com/brasil/2019/09/24/politica/1569323723_562966.html" target="_blank">Jair Bolsonaro na ONU</a>
reconhecerá este cenário. O negacionismo climático não é burrice, mas a
aposta de setores que já assumiram que a manutenção de suas condições
atuais de vida tornou-se incompatível com a sobrevivência da grande
maioria. O antiglobalismo não é um desvario, mas a justificativa
ideológica de quem já percebeu que, sem uma correção radical de rumo ––
justamente o que eles querem evitar ––, o capitalismo não dá mais para
todo mundo. O resultado disso só pode ser, de um lado, o caos crescente
causado pela crise ambiental, pela extinção de qualquer rede de proteção
social, pela automação do trabalho e pelo empreendedorismo predatório;
e, de outro, a formação de enclaves fortemente protegidos. Morador da
Barra da Tijuca, Bolsonaro pode, pelo menos nesse sentido, dizer que vem
do futuro.</div>
<div class="">
<br /></div>
<div class="">
Famosamente, Michel Foucault chamou de
“biopolítica” um acordo tácito entre governantes e governados
estabelecido a partir do século XVIII. Em troca de potencializar a
utilidade econômica dos governados, os governantes assumiam o dever de
fazer viver (através de políticas de saúde, seguridade, legislação
trabalhista...), reservando para ocasiões extraordinárias o direito de
deixar ou fazer morrer. Esta biopolítica sempre foi inseparável, nas
suas fronteiras, de uma violência letal: para que algumas populações
vivessem dentro de certos parâmetros, era preciso que outras fossem
exploradas até à morte. O nazismo apenas levou esta lógica às últimas
consequências.</div>
<div class="">
<br /></div>
<div class="">
O cenário que <i>Bacurau</i> e a extrema
direita mundial projetam aponta para a dissolução deste pacto e uma
virada abertamente necropolítica do capitalismo. Num mundo de
concentração de renda astronômica, degradação ambiental crescente,
recursos cada vez mais escassos e aumento das populações excedentes ––
desempregados estruturais, refugiados climáticos, população carceral ––,
o Estado tende a eximir-se da responsabilidade de fazer viver e a
privatizar –– para empresas de segurança, “empreendedores” e “cidadãos
de bem” –– o direito soberano de fazer morrer. Vista assim, a combinação
de ultraliberalismo e culto da violência de <a data-link-track-dtm="" href="https://brasil.elpais.com/tag/donald_trump/a" target="_blank">Trump</a> e <a data-link-track-dtm="" href="https://brasil.elpais.com/tag/jair_messias_bolsonaro/a/" target="_blank">Bolsonaro</a> faz perfeito sentido.</div>
<div class="">
<br /></div>
<div class="">
Se <i>Bacurau</i> pretendia ser uma previsão do futuro próximo, aliás, aí está seu maior deslize. Na figura de Tony Jr., o típico político <i>moderno</i> filho do latifundiário local, <i>Bacurau</i> parecia apostar que quem se beneficiaria da crise econômica e política seria a direita <i>liberal</i>
que historicamente cumpre no Brasil a função de ser o lado civilizado
da família dos coronéis e senhores de escravos. Como muita gente, <a data-link-track-dtm="" href="https://brasil.elpais.com/tag/kleber_de_mendonca_vasconcellos_filho" target="_blank">Kleber Mendonça</a>
não foi capaz de imaginar que, não achando um candidato viável entre o
quadro de sócios do Country Club, a elite brasileira optaria por botar o
capataz da fazenda na presidência.<br />
<br />
Em <i>Bastardos Inglórios</i>,
Tarantino inclui uma cena (o assassinato de Hitler) cuja função é
lembrar-nos que aquilo é só uma fantasia. A droga que os moradores tomam
em <i>Bacurau</i> talvez também deva ser interpretada assim. A
catarse é um poderoso psicotrópico e cria um sentimento de comunhão
inclusive com gente com quem há pouco em comum: muitos daqueles que se
identificaram com <i>Bacurau</i> talvez defendessem em outras
oportunidades a necessidade de uma aliança com Tony Jr. Passados os
efeitos da droga, porém, continuamos no mesmo lugar. Como sair? É neste
ponto que o filme foi mais criticado, a violência dos personagens sendo
entendida como um apelo à radicalização num momento em que seria preciso
desarmar a polarização política. Mas enquanto a questão se resumir a “é
preciso radicalizar ou deve-se dialogar com o centro?”, o problema
estará mal colocado.</div>
<div class="">
<br /></div>
<div class="">
Primeiro, porque carece de conteúdo
concreto. Radicalizar como? Em relação a quê? Dialogar sobre o quê? Em
quais bases? Com qual centro? É isto que falta responder. Segundo,
porque parece supor que sair da polarização envolveria tirar a média
aritmética dos extremos existentes. Mas quando os extremos são o <i>reformismo fraco</i>
do PT e a terraplanagem bolsonarista, o meio-termo fatalmente estará
bem aquém do necessário. O erro implícito aí é, terceiro, tratar centro e
extremos como coordenadas que estão dadas, quando o objetivo da
política é justamente transformar as coordenadas –– ou, como entendeu o
ideólogo conservador Joseph Overton, fazer com que o centro se desloque
em nossa direção. É exatamente isso que a extrema direita tem sabido
fazer, e não foi com “bom senso” que eles ocuparam esse lugar.</div>
<div class="">
<br /></div>
<div class="">
Quarto, porque supõe que <i>bom senso</i>
era o centro do debate político tal como este existia até alguns anos
atrás, e que é a este centro que deveríamos voltar, contra extremos <i>irreais</i>. O que este <i>realismo</i>
não entende é que as condições materiais e políticas para aquele
consenso deixaram de existir: não há retorno possível. O único caminho
possível hoje é na direção de redefinir o centro, criar um novo consenso
–– e, novamente, foi a extrema direita quem entendeu isso primeiro, mas
para propor um projeto que é sustentável apenas para os muito poucos.
Por último, o problema é mal posto porque, como a menina <a data-link-track-dtm="" href="https://brasil.elpais.com/tag/greta_thunberg_ernman" target="_blank">Greta Thunberg</a>
tem mostrado, diante de questões como o aquecimento global ou o futuro
que a extrema direita prepara, não há mais tempo ou espaço para soluções
de compromisso: ou diz-se um não definitivo à barbárie, ou não se está
dizendo rigorosamente nada. A este <i>não</i> ainda é preciso, sem
dúvida, dar a forma concreta de programas, propostas, ações. Mas ou se
faz isso ou não se faz nada: fingir que tudo pode continuar como está é a
posição menos realista a essa altura.</div>
<div class="">
<br /></div>
<div class="">
por<b> </b>Rodrigo Guimarães Nunes</div>
<div class="">
<br /></div>
<div class="">
<a href="https://brasil.elpais.com/brasil/2019/10/05/cultura/1570306373_739263.html?%3Fssm=FB_BR_CM&hootPostID=d32bbba933cfe864ca59ece2673389aa&fbclid=IwAR0R5ILEOWLNct9FzyKdRRTCR2dtLTUlDWWyifVqyWJ6rndXiuOJnGwooEg" target="_blank">El país</a> </div>
<div class="">
<br /></div>
<div class="">
#</div>
<div class="">
<br /></div>
<div class="">
</div>
Adelvan Kenobihttp://www.blogger.com/profile/06307759808605250885noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4793536658109166560.post-83336549606415713942019-06-28T14:51:00.000-07:002019-06-28T14:51:12.957-07:00Brizola, que falta faz ...<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh1JCFxXZEOVD8Xj9V555UpVAmdfO48EG0uWVqB5oIjRPMe6VsxYfIW6GtMzeVqPki9R7Xt-QqldMkEifgun6WNBvYiIuJxhjr0xWXjXrZoZeRpDMvUewcfTBlxKU3FGInZ_LtB7-hkguQh/s1600/brizola-favela-2512.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="750" data-original-width="1125" height="213" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh1JCFxXZEOVD8Xj9V555UpVAmdfO48EG0uWVqB5oIjRPMe6VsxYfIW6GtMzeVqPki9R7Xt-QqldMkEifgun6WNBvYiIuJxhjr0xWXjXrZoZeRpDMvUewcfTBlxKU3FGInZ_LtB7-hkguQh/s320/brizola-favela-2512.jpg" width="320" /></a></div>
<strong>Leonel Brizola</strong> deixou a vida para entrar para
história em 21 de junho de 2004, quinze anos atrás. Seu nome é o sino de
bronze da luta anti-imperialista que a partir do Brasil abalou o século
anterior – o punho erguido de uma Pátria que diz para História: “eis-me
aqui”.<br />
<br />
Nascido em 22 de janeiro de 1922 em uma família de pobres camponeses
em Cruzinha, distrito de Carazinho no Rio Grande do Sul, Leonel de Moura
Brizola era o caçula de uma tradição guerreira. Seu pai, José Brizola
lutou ao lado do caudilho Leonel Rocha nos conflitos entre maragatos e
chimangos que ensoparam a campanha gaúcha com o sangue da peonada. Ao
regressar da guerra, José foi sequestrado e assassinado por soldados
inimigos em ato criminoso, praticado depois da assinatura do tratado de
paz. Conta Moniz Bandeira que o filho mais jovem de José ganhou seu nome
quando, aos dois anos de idade, brandindo uma espada de madeira, disse
“eu sou Leonel Rocha!”<br />
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh6f33edUuMzSUAXUwswiLkyvfUfZlv7XnnZgb19EMSKzd2U1ekZ-GZGv4igwzAqVyjovAw-k11g2jJrLpuwgzzKqdVtIQalUJbLAml5tzqNntlgm_ep4W7bLfDI3T81Vx8XVh2v_jXIAu2/s1600/Brizola+CQzWGfFWIAAV_fB.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" data-original-height="1200" data-original-width="866" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh6f33edUuMzSUAXUwswiLkyvfUfZlv7XnnZgb19EMSKzd2U1ekZ-GZGv4igwzAqVyjovAw-k11g2jJrLpuwgzzKqdVtIQalUJbLAml5tzqNntlgm_ep4W7bLfDI3T81Vx8XVh2v_jXIAu2/s400/Brizola+CQzWGfFWIAAV_fB.jpg" width="287" /></a></div>
Com muita dificuldade, Brizola ingressa em um curso de engenharia em
Porto Alegre, trabalhando para se manter na capital gaúcha. É no ocaso
do Estado Novo que inicia sua atuação política, no meio da campanha do
queremismo, quando Brizola se vê requisitado por vários dos nascentes
partidos. Na época ainda sem uma clara definição política, Brizola conta
que simpatizava com Getúlio Vargas e Luís Carlos Prestes. Mas não
conseguiu se identificar com a petulância dos militantes do PCB, que em
suas palavras se “achavam os donos da verdade” e eram extremamente
sectários. Igualmente, o PSD, organizado pelos interventores do Estado
Novo e representante dos interesses da oligarquia rural e urbana, não o
atraiu devido a seu “instinto de classe”.<br />
<br />
Na estrutura do PSD, criou-se um Departamento Trabalhista, que
deveria acomodar o movimento sindical. No entanto, com aval do ministro
do Trabalho Marcondes Filho e do próprio Vargas, os sindicalistas se
rebelaram contra essa tentativa e fundaram seu próprio partido, o PTB.
Com o PTB em oposição ao governo Dutra do PSD, Brizola a duras penas
organizou o partido no Rio Grande do Sul, chegando a conciliar um
mandato como deputado estadual com os estudos em engenharia.<br />
<br />
O suicídio de Vargas é o episódio-chave na formação de Brizola. O
líder trabalhista dizia que seu norte político era a Carta-Testamento de
Getúlio, denunciando o íntima ligação da penúria do povo brasileiro com
a espoliação internacional do país.<br />
<br />
Como governador do Rio Grande do Sul, Brizola enfrentou os monopólio
norte-americano da Bond & Share, que controlava o fornecimento de
energia elétrica em seu estado. A transnacional se recusava a fazer a
expansão que a rede elétrica, imprescindível para o desenvolvimento do
estado. Brizola então encampou o serviço público, pagando um cruzeiro
pela empresa – valor que correspondia exatamente ao seu valor uma vez
computado seu passivo. Também enfrentou a toda poderosa ITT na luta
infraestrutura gaúcha, empresa notória por seu patrocínio ao golpe no
Chile em 1973. Devido a esses episódios, ficou conhecido “Castro
brasileiro” pela mídia estadunidense, atemorizada pela possibilidade do
levante de um titã como o Brasil em seu hemisfério.<br />
<br />
Ainda como governador, Brizola protagonizou a Campanha da Legalidade
em 1961, quando alguns militares tentaram impedir a posse de João
Goulart, que se encontrava em missão oficial a China quando Jânio
Quadros renuncia. Por meio de apaixonadas transmissões pela Rádio
Guaíba, organiza o povo gaúcho, inclusive com a distribuição de armas no
que foi a maior e mais intensa mobilização popular da história
brasileira. Assim, o povo organizado debela o golpe que se desenhava,
embora o Congresso aprove uma emenda instituindo o parlamentarismo,
somente para esvaziar a presidência de seus poderes.<br />
<br />
Brizola fica até o final de seu mandato em 1963 como governador em
vez de se candidatar para algum cargo pelo Rio Grande do Sul, como
senador ou deputado federal. Se se candidatasse, seria obrigado a
renunciar para se descompatibilizar, como mandava a legislação da época.
Permaneceu no cargo para oferecer sustentação ao governo Goulart e à
campanha para voltar ao presidencialismo. A organização popular mais uma
vez rende frutos e o Congresso Nacional se vê forçado a convocar um
plebiscito em janeiro de 1963 a respeito da emenda do parlamentarismo,
prontamente derrotada. Neste mesmo ano, Brizola é eleito deputado
federal pelo estado da Guanabara – seu último mandato antes do golpe de
1964.<br />
<br />
No segundo semestre de 1963, os Estados Unidos apertam o cerco
imperialista ao Brasil. O presidente Kennedy restringe o acesso do
Brasil a linhas de crédito e adotas outras medidas agressivas para
obrigar o país a derrubar a Lei de Remessa de Lucros – projeto de lei do
próprio Vargas promulgado por Goulart. Mas a balança de pagamentos
brasileira naquela época estava extremamente comprometida pela escassez
de dólares, principalmente pela remessa de lucros, que consumia as
divisas estrangeiras em posse do Brasil. Por essa razão, o fantasma da
inflação assolava o país. Goulart via-se entre a cruz e a espada: ou
lutava pelo Brasil ou capitulava para os estadunidenses. Sua opção marca
a história brasileira.<br />
<br />
Progressivamente isolado ao longo dos primeiros meses de 64 –
principalmente depois de propor e em seguida retirar um pedido de estado
de sítio em função de uma entrevista de Lacerda para um jornal
norte-americano – Goulart faz o famoso comício da Central do Brasil em
março daquele ano. O discurso precipita a ala conservadora das Forças
Armadas e das montanhas das Minas Gerais desce a tropa de Olympio Mourão
Filho para tomar o Rio de Janeiro e depor o governo democrático e
popular dos trabalhistas.<br />
<br />
Brizola permanece no Rio Grande do Sul para assegurar a posse do
general Ladário Pereira Teles como comandante do III Exército. Quando o
Presidente da República chega ao estado sulista depois de uma passagem
infrutífera por Brasília, o general chega a oferecer o Exército para a
defesa do país e da constituição. Não querendo manchar o Brasil com o
sangue de tantos filhos em uma luta quase sem chances de vitória,
Goulart declina a oferta. Ele e Brizola então fogem para o Uruguai. No
exílio, as articulações de resistência de Goulart e Brizola acabam
fracassando e os dois ficam por anos sem se falar.<br />
<br />
Temido pelas forças antinacionais que haviam se apossado do país em
1964, Brizola ficou 15 anos exilado, um dos maiores períodos de
afastamento compulsório registrados. Com o início da abertura “lenta,
gradual e segura” do Regime Militar em 1979, os trabalhistas no exílio e
no Brasil se encontram em Lisboa, onde assinam uma Carta objetivando a
reconstrução do PTB.<br />
<br />
Mesmo após tantos anos de exílio, a ditadura não deu trégua a Brizola
– o regime moribundo fez de tudo para obstaculizar a campanha de
Brizola ao governo do Rio de Janeiro em 1982. Golbery em conluio com o
TSE entrega a sigla PTB para Ivete Vargas, somente para atrapalhar a
reorganização dos trabalhistas. Aos prantos na Associação Brasileira dos
Jornalistas, Brizola rasga um pedaço de papel escrito PTB e rascunha em
outro a nova sigla para o velho partido, herdeiro da tradição
patriótica de Vargas: PDT.<br />
<br />
Ainda na campanha de 1982, Brizola enfrenta a Globo no famoso
escândalo da Proconsult, quando a emissora foi cúmplice de uma tentativa
de fraude eleitoral para entregar o governo do Rio de Janeiro para
Moreira Franco. Os mandatos de Brizola como governador do Rio de Janeiro
serão marcados por um forte cunho popular. Junto com Darcy Ribeiro,
promove uma revolução na educação do estado com os CIEPs, até hoje
referência em política educacional no Terceiro Mundo. Como governador,
Brizola teria um papel destacada na campanha pelas Diretas Já em 1984.<br />
<br />
A relação com entre o PT e o PDT foi de distância desde as primeiras
tentativas de aproximação ainda em 1979. Orientados pelo uspianismo que
condenava a tradição varguista e por uma visão pós-moderna da classe
trabalhadora, as lideranças do Novo Sindicalismo jamais se aproximaram
dos trabalhistas. Mesmo assim, num gesto de grandeza patriótica, Brizola
apoia Lula no segundo turno das eleições de 1989, para tentar evitar o
desastre que seria o governo Collor – gesto que o próprio Lula foi
incapaz de repetir 29 anos depois em 2018, quando sacrificou o país
sabotando a campanha de Ciro Gomes para manter a hegemonia petista sobre
a esquerda.<br />
<br />
O veterano Brizola ainda disputou eleições presidenciais ao longo dos
anos 90, depois de um segundo mandato como governador do Rio de
Janeiro, sempre condenando o neoliberalismo. Na última eleição, apoiou
Ciro Gomes e ao longo do primeiro mandato de Lula, denunciou o caráter
neoliberal da gestão petista. Faleceu em 2004, deixando, junto de
Vargas, o legado do patriotismo popular brasileiro.<br />
<br />
Em todas as suas falas, Brizola denunciava a contradição central do
Brasil, que determina o país como um todo: a dependência. Assim como
está escrito na Carta-Testamento de Getúlio Vargas, a condição de
precariedade do povo brasileiro não pode ser separada da espoliação
pelos monopólios internacionais. Brizola era herdeiro da luta de Vargas
pela siderurgia em Volta Redonda, a criação da Vale, da Eletrobras, da
Petrobras, da Justiça do Trabalho e a estrutura sindical que permitiria a
organização de nosso povo.<br />
<br />
Em uma fala na UNE em 1961, Brizola disse que “se nada temos com a
União Soviética, devemos ter coragem de dizer que nada temos com os
Estados Unidos”. O então governador do Rio Grande do Sul se posiciona
contra a importação de modelos estrangeiros para o país, tanto a
esquerda como a direita. Buscava uma solução brasileira para os
problemas brasileiros – ainda que tal solução não prescindisse de um
socialismo, mas um socialismo com caráter brasileiro. Neste mesmo
discurso, mesmo dizendo que não era inimigo dos Estados Unidos, não
deixou de reconhecer que as reformas que o Brasil tanto necessitava
obrigatoriamente implicaria em uma modificação nas relações com os EUA.<br />
<br />
Ao longo de sua vida, Brizola fez jus a seu sangue guerreiro. Até seu
último suspiro, batalhou contra o caráter colonial do Brasil e lutou
por sua emancipação. Deixará em todos os brasileiros a eterna dúvida do
que poderia ter sido o país se o herdeiro de Vargas tivesse chegado à
presidência. Chegou a colocar medo nas grandes corporações
estadunidenses, que sabem a ameaça estratégica que o Brasil representa
como uma superpotência no hemisfério ocidental. Brizola foi o punho
erguido do Brasil ameaçando o domínio dos EUA sobre as Américas.<br />
<br />
por <span class="byline"><span class="author vcard"><a class="url fn n" href="https://portaldisparada.com.br/author/arthur/">Arthur Silva</a></span></span><br />
<br />
<a href="https://portaldisparada.com.br/cultura-e-ideologia/brizola-o-punho-erguido-do-brasil/" target="_blank"><span class="byline"><span class="author vcard">Disparada</span></span></a><br />
<br />
<span class="byline"><span class="author vcard"># </span></span> Adelvan Kenobihttp://www.blogger.com/profile/06307759808605250885noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4793536658109166560.post-21047689571646239462019-06-12T14:43:00.000-07:002019-06-12T14:43:27.488-07:0070 Anos de Mil novecentos e oitenta e quatro<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEilcLXN747pClNn33KIzEp2Nb_pX-8cNlbQpUV-xvCoINY0D-eZHhu1hzygrlb1Gk1OKFdsmQsYGlAi1MNFuVVHONQelJtWC31kmag99JjrGhLw-Kzs7VcEc-H_nl0L9224H79FQ_XxyU_y/s1600/George-Orwell-statue-at-BBC-crop-2.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" data-original-height="603" data-original-width="967" height="199" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEilcLXN747pClNn33KIzEp2Nb_pX-8cNlbQpUV-xvCoINY0D-eZHhu1hzygrlb1Gk1OKFdsmQsYGlAi1MNFuVVHONQelJtWC31kmag99JjrGhLw-Kzs7VcEc-H_nl0L9224H79FQ_XxyU_y/s320/George-Orwell-statue-at-BBC-crop-2.jpg" width="320" /></a></div>
Embora seja um <em>long-seller</em> continuamente republicado, recentemente as <a href="https://brasil.elpais.com/brasil/2017/01/26/cultura/1485423697_413624.html">vendas de <em>Mil novecentos e oitenta e quatro</em> - intitulado assim no original, embora geralmente citado em números -, a distopia de Orwell publicada pela primeira vez há 70 anos, dispararam nos Estados Unidos</a>, onde, segundo o <em>The New York Times</em>,
a editora Penguin enviou várias centenas de milhares de exemplares
pouco depois de Kellyanne Conway, conselheira do Gabinete do presidente <a href="https://www.google.com/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=1&cad=rja&uact=8&ved=2ahUKEwj84Jz-it3iAhWnIbkGHRNbBiUQFjAAegQIAxAB&url=https%3A%2F%2Fbrasil.elpais.com%2Ftag%2Fdonald_trump&usg=AOvVaw0RSdOytXVTTDjLJXQII_GX">Donald Trump</a>,
ter repreendido a imprensa por insistir que a Administração
reconhecesse que o número de participantes da cerimônia de posse de
Trump era uma informação falsa que sua equipe tinha feito circular.
Afinal, disse Conway, não se tratava nem de uma mentira nem de um erro,
mas do que definiu como “fatos alternativos”. Ao ouvir suas palavras,
muitos cidadãos relembraram algumas previsões do romance de Orwell: a
“novilíngua”, um vocabulário sintético e reduzido, cuja pobreza visa
também reduzir a capacidade de pensar; e o “Ministério da Verdade”, no
qual funcionários no livro se aplicam a corrigir os testemunhos do
passado recente e a reescrever a história para que ela se encaixe
perfeitamente no discurso oficial. Ou seja, o que muitos viram em Conway
era uma implantação sem complexos da mentira institucionalizada,
presente em maior ou menor medida não só em Trump, mas em geral nos
discursos da política, do comércio, da religião... do jornalismo...<br />
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhcmzWnG9_3tTrI9Xr2cGGoIFLnFwJ0EA6GIQp6ZH0K8-GZayCKMAYlAi4awjcG216peAW3Iglqnle-3Ah_Cz1r_Y9DH8rIsd4Zr_e2B1U8VUN60pn-C9COTVQGNVprM_fWQh4gzTP8cnFS/s1600/george+orwell+1559917321_955905_1559921868_sumario_grande.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1600" data-original-width="1060" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhcmzWnG9_3tTrI9Xr2cGGoIFLnFwJ0EA6GIQp6ZH0K8-GZayCKMAYlAi4awjcG216peAW3Iglqnle-3Ah_Cz1r_Y9DH8rIsd4Zr_e2B1U8VUN60pn-C9COTVQGNVprM_fWQh4gzTP8cnFS/s400/george+orwell+1559917321_955905_1559921868_sumario_grande.jpg" width="265" /></a></div>
Caminhamos mansamente em direção a uma sociedade de vigilância em massa
na qual a informação é manipulada para manter as pessoas sob controle,
como o romance reflete? Orwell imaginou um mundo pós-revolucionário onde
tudo o que aconteceu antes da Revolução fundadora de<em>1984</em>
(valores humanísticos, formas de relacionamento, debate público,
liberdade de expressão, cultura...) foi abolido e esquecido. A nova
sociedade materialista que o romance descreve é dividida em três
classes: os membros do partido, os “proles” e os “escravos”. O aparato
de repressão, onipotente e implacável, vigia cada movimento dos súditos
por meio de um sistema de telas instaladas no espaço público e no
doméstico. Não existe privacidade. O poder é encarnado em um tirano
inacessível cuja imagem é exibida em todos os lugares com o slogan “O
Grande Irmão zela por ti”.<br />
<br />
Em uma <a href="https://www.google.com/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=1&cad=rja&uact=8&ved=2ahUKEwjy2sKSi93iAhURDrkGHeLSBLsQFjAAegQIBBAB&url=https%3A%2F%2Fbrasil.elpais.com%2Ftag%2Flondres&usg=AOvVaw3hIUv-hg4krKWTycHIxZdy">Londres</a>
sinistra, o protagonista, Winston Smith, modesto mas inquieto
funcionário do departamento de História do Ministério da Verdade,
conhece Julia, empregada do departamento de Ficção do mesmo ministério.
Ela opera uma “máquina de escrever romances”: histórias com argumentos
simples e personagens estereotipados, semelhantes àquelas que em nosso
mundo real hoje são escritas por computadores que usam <a href="https://brasil.elpais.com/tag/inteligencia_artificial">inteligência artificial</a>.
Winston e Julia se apaixonam e tentam se juntar a uma fantasmagórica
organização clandestina de dissidentes que, no fundo, sabem estar
condenada ao fracasso, porque o poder é invencível. Essa tensão entre o
poder esmagador, por um lado, e, por outro, o amor e a liberdade, é a
substância do romance.<br />
<br />
Deixando de lado notáveis exceções, como o controle exercido pelo
Governo chinês sobre sua população e satrapias várias, o onipresente
Estado policial todo-poderoso e controlador que Orwell fabulou... não
existe. Paradoxalmente, um dos maiores problemas em grande parte do
mundo é a fraqueza ou a falência dos Estados. Mas os <a href="https://brasil.elpais.com/brasil/2019/06/03/economia/1559583647_707974.html">monopólios todo-poderosos da tecnologia</a>,
com seu controle da verdade e sua avidez vampírica por informação,
podem ser um substituto plausível para esse Estado fictício. Nesse
sentido, também na realidade, O Grande Irmão está te vigiando e te
espionando – sim, com uma <em>interface</em> agradável e com a
aquiescência e a entusiástica cooperação da massa – por meio das telas,
do telefone celular que cada um carrega no bolso, do indelével rastro
digital deixado por cada usuário.<br />
<br />
Na sociedade ocidental de hoje, o sexo tampouco é reprimido e severamente controlado como em <em>1984</em>,
mas encorajado e exposto. E, no entanto, sua prática na juventude é
substancialmente atrasada e reduzida, de acordo com estatísticas
oficiais de uma dezena de países do primeiro mundo citadas pela revista
cultural norte-americana <em>The Atlantic</em>. Essa demora pode ser a primeira indicação da <a href="https://brasil.elpais.com/brasil/2017/06/20/opinion/1497961144_872971.html"><em>recessão sexual</em></a>,
sinal de “uma retirada mais ampla da intimidade física que se estende
até a entrada na maturidade”. (As causas dessa queda da libido podem ser
pressões econômicas, ansiedade, fragilidade psicológica, uso
generalizado de antidepressivos, televisão em streaming, estrógenos
dispersados pelo plástico no meio ambiente, <em>smartphones</em>, falta de sono, obesidade, excesso de informação... ou o que ocorrer a qualquer analista).<br />
<br />
No inferno cartografado por Orwell em seu livro, escrito no
pós-guerra, a miséria é generalizada, as pessoas caminham cabisbaixas e
tolhidas, os bens de consumo são escassos, a aparência das coisas é
cinza, o trabalho é embrutecedor e os horários abusivos. Hoje o mundo
real não é assim, pensam os membros do partido. Mas proles e os escravos
certamente reconhecem essas paisagens.<br />
<br />
Em um dos mais famosos, tétricos e patéticos cenários de <em>1984</em>,
os chamados “dois minutos de ódio”, as massas se reúnem diante de uma
grande tela para vaiar e execrar o inimigo em um paroxismo demente. Ao
lê-lo, é inevitável lembrar das <a href="https://brasil.elpais.com/tag/redes_sociales">redes sociais</a>, onde hoje qualquer um que coloque o focinho fora do bando se expõe a ser linchado virtualmente.<br />
<br />
Outros artefatos e termos usados para descrever o mundo de <em>1984</em>
foram incorporados à paisagem e à linguagem comum. Orwell concebeu suas
profecias como uma admoestação, uma advertência contra um futuro
totalitário, seja soviético, seja fascista, e contra o cultivo
sistemático da mentira que observou pela primeira vez na Espanha, em
Barcelona, durante a Guerra Civil, que lhe deixou surpreso e pensativo
ao constatar “com que facilidade a propaganda totalitária pode controlar
a opinião das pessoas cultas nos países democráticos”.<br />
<br />
O estilo de Orwell é direto e tem uma formidável capacidade de criar
empatia com o leitor, que ao lê-lo ouve a voz de um personagem simpático, honesto,
próximo, bom. Essa proximidade, é claro, é uma grande virtude literária. Como Camus, escrevia impulsionado
por uma obrigação moral. Tinha que expiar seu trabalho como oficial de
polícia do império na Birmânia, onde passou cinco anos depois de ter
estudado em Eton, e de onde voltou com uma forte consciência política
anti-imperialista.<br />
<br />
Escreveu com o máximo verismo reportagens sobre os londrinos pobres e
se reduziu voluntariamente à condição de vagabundo. Frequentou mendigos
em pé de igualdade por um longo tempo. Daí surgiu seu primeiro livro, <em>Na Pior em Paris e em Londres</em>.<br />
<br />
Com o mesmo espírito de coerência e sacrifício, quando Franco se levantou contra a República espanhola foi para <a href="https://brasil.elpais.com/tag/barcelona">Barcelona</a> e imediatamente se apresentou como voluntário para lutar na frente. Desta aventura ficou o testemunho de sua <em>Homenagem à Catalunha</em> e o rastro de uma experiência e conhecimentos sobre a lógica do totalitarismo que se refletiria em sua famosa fábula <em>Revolução dos Bichos</em>, e que cristalizou em <em>1984</em>.<br />
<br />
Este romance foi seu legado: ele o escreveu tendo em mente <em>Nós</em>,
de Yevgeny Zamyatin, com muito trabalho, dúvidas e correções em uma
ilha escocesa ventosa e fria, onde se retirou com esse objetivo, logo
depois de ter ficado viúvo de uma esposa muito querida, sozinho, doente
de tuberculose – na época muitas vezes letal –, como um longo testamento
político. De fato, morreu no ano seguinte à publicação.<br />
<br />
O escritor britânico John Lanchester aponta que o mundo de hoje é
mais parecido com a distopia daquele que foi professor de Orwell, Aldous
Huxley: <em>Admirável Mundo Novo</em> (1932). Esse livro descreve uma
sociedade marcada pela ciência e pela tecnologia e entregue a uma
“narcotizante promiscuidade sexual”, tranquilizada pelo prazer e pelas
drogas (o <em>soma</em> milagroso) e imersa em uma infantilização geral; e coerentemente com isso, narrado em um tom mais leve do que <em>1984</em>. Para entender o presente, Lanchester propõe uma síntese entre <em>Admirável Mundo Novo</em> e <em>1984</em>.<br />
<br />
Nessa síntese talvez se devam incluir algumas das tendências e
inovações que inundam o nosso mundo. Como as chamadas “capacidades
aumentadas”– drogas, próteses, implantes cerebrais–, os novos órgãos
obtidos com <a href="https://brasil.elpais.com/tag/impresora_3d">impressoras 3D</a>;
os robôs que controlam nossas casas, aprendem e transmitem nossos
dados; a realidade virtual que entretém e anestesia...<br />
<br />
Orwell não se
estendeu em descrições de novas tecnologias e máquinas: colocou o foco
em um estado mental e social. É por isso que seus augúrios conectam com
os leitores. Como Dorian Lynskey afirma em uma recente biografia de
Orwell – <em>In the Shadow of Big Brother</em> (<em>Na Sombra do Big Brother</em>)
–, o britânico “estava muito mais interessado na psicologia do que nos
sistemas”. Aí reside a chave do poder e dos mecanismos de controle da
massa através da mentira e do medo. Isso dificilmente muda.<br />
<br />
por<span class="autor-nombre" itemprop="name"><a href="https://brasil.elpais.com/autor/ignacio_vidal_folch/a/" itemprop="url" title="Ver todas as notícias de Ignacio Vidal-Folch"> Ignacio Vidal-Folch</a></span><br />
<br />
<a href="https://brasil.elpais.com/brasil/2019/06/07/opinion/1559917321_955905.html" target="_blank"><span class="autor-nombre" itemprop="name">El País</span></a><br />
<br />
<span class="autor-nombre" itemprop="name">#
</span>
<br />
<br />
<br />
<br />
Adelvan Kenobihttp://www.blogger.com/profile/06307759808605250885noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4793536658109166560.post-18725961855267112612018-06-13T08:59:00.000-07:002018-06-13T08:59:07.405-07:0050 Anos de 2001 - Uma odisséia no espaço<div class="p1">
<span class="s1">N</span><span class="s1">o <a class="external-link" href="https://www.cartacapital.com.br/cultura/1968-o-ano-em-que-o-festival-de-cinema-de-cannes-parou" target="_blank" title="">fim de março de 1968</a>, as primeiras cópias de <i>2001: Uma Odisseia no Espaço</i> começaram a ser projetadas para integrantes das <a class="external-link" href="https://www.cartacapital.com.br/cultura/nova-promotora-pode-mudar-rumo-do-caso-weinstein-em-nova-york" target="_blank" title="">elites do cinema de Hollywood</a> e do jornalismo cultural dos Estados Unidos, e produziram um retumbante fracasso.</span></div>
<div class="p1">
<br /></div>
<div class="p1">
<span class="s1">Ninguém tolerou a visão de futuro do
nova-iorquino de ascendência judia Stanley Kubrick, nem mesmo o
cientista e escritor inglês Arthur C. Clarke, que trabalhava havia
quatro anos, em parceria com o cineasta, na versão literária do filme,
que seria lançada logo a seguir.</span></div>
<div class="p1">
<br /></div>
<div class="p3">
<span class="s1">No livro recém-lançado <i>2001: Uma Odisseia no Espaço – Stanley Kubrick, Arthur C. Clarke e a Criação de uma Obra-Prima</i>,
o escritor e cineasta Michael Benson, nascido seis anos antes da
estreia, narra com gozo as circunstâncias agudas daqueles dias de 50
anos atrás.<span class="Apple-converted-space"> </span> </span></div>
<div class="p3">
<br /></div>
<div class="p3">
<span class="s1">Nas pré-estreias, Clarke, executivos do
estúdio MGM e críticos de cinema se irmanaram naquilo que a viúva de
Stanley, Christiane Kubrick, descreve no livro como o “prazer em ver a
dor alheia” estampada no rosto do cineasta.</span></div>
<div class="p3">
<br /></div>
<div class="p3">
<span class="s1">Acontecia ali um daqueles fenômenos em
que as elites de um determinado tempo se divorciam completamente da
realidade e entendem um fato pelo contrário simétrico do que ele
significa. Desesperado pela rejeição inicial, Kubrick encurtou 19
minutos do filme (restaram 139 minutos para a posteridade).</span></div>
<div class="p3">
<br /></div>
<div class="p3">
<span class="s1">Em lépidos 16 dias, um dos inúmeros críticos que apontaram os “erros” de <i>2001 </i>produziu a primeira reavaliação, de <i>mea-culpa</i>, sobre o filme, e o apontou como “obra-prima”. Amparado pelas plateias mais jovens, <i>2001 </i>se transformaria no filme mais lucrativo de 1968 e num dos épicos cinematográficos indeléveis do século passado.</span></div>
<div class="p3">
<br /></div>
<div class="p3">
<span class="s1">Estima-se que a MGM, que embolsara algo como 12 milhões de dólares com <i>2001</i>, foi recompensada com uma bilheteria de até 190 milhões de dólares. Antes que <a class="internal-link" href="https://www.cartacapital.com.br/sociedade/1968-juventude-e-militancia" target="_self" title="">1968</a>
terminasse, a nave Apollo 8 fez o primeiro voo ao redor da Lua; em
julho de 1969, a vida imitou Kubrick e fez um terráqueo pisar pela
primeira e única vez o solo do satélite artificial do planeta que <i>2001 </i>gostaria de suplantar.</span></div>
<div class="p3">
<br /></div>
<div class="p3">
<span class="s1">De modo análogo ao que Kubrick fez ao
explorar por dentro as espaçonaves e o robô com (maus) sentimentos
humanos HAL 9000, o livro de Benson penetra as entranhas da produção de
1964-68 para explorar minuciosamente o futuro do pretérito que é a
substância de <i>2001</i>.</span></div>
<div class="p3">
<br /></div>
<div class="p3">
<span class="s1">O que emerge é a colisão criativa sem
tréguas entre passado e futuro, memória e invenção, o peso do tempo e a
leveza do vento. É flagrante o desespero financeiro de Arthur Clarke
diante da relutância de Kubrick em liberar o lançamento da versão
literária de <i>2001</i>.</span><span class="s1">Ao longo da produção, o diretor vai extirpando as palavras da versão <a class="internal-link" href="https://www.cartacapital.com.br/blogs/intervozes/fomento-a-producao-audiovisual-na-tv-fortalece-comunicacao-publica" target="_blank" title="">audiovisual</a>.</span></div>
<div class="p3">
<br /></div>
<div class="p3">
<span class="s1">Quando o livro vem à tona, o texto passa a
servir de guia auxiliar de decifração para os enigmas não verbais do
filme – o monólito alienígena que atravessa milhões de anos entre a
Terra e a Lua e Júpiter e além, o salto humano entre o berço terrestre e
o infinito intergaláctico, o astronauta que envelhece e volta ao útero
materno ao percorrer o Portal das Estrelas imaginado por Clarke, e assim
por diante.</span></div>
<div class="p3">
<br /></div>
<div class="p5">
<span class="s2">Na tensão entre opostos</span><span class="s1">
complementares, é como se Kubrick compusesse a melodia da sinfonia que
adornaria (ou melhor, ocultaria) as letras de Clarke para um épico <i>folk-rock</i>
de Bob Dylan (a certa altura, o diretor cogita, não se sabe se a sério
ou zombeteiramente, entregar a encomenda da trilha sonora para os
Beatles).</span></div>
<div class="p5">
<br /></div>
<div class="p5">
<span class="s1">Na contramão das trilhas especialmente
compostas para filmes de grande orçamento, Kubrick queria impor à MGM o
uso de peças eruditas – do ribombante e nietz-schiano <i>Also Sprach Zarathustra </i>(1896),<i> </i>do alemão Richard Strauss, ao manjado e “cafona” <i>Danúbio Azul </i>(1867),<i> </i>do austríaco Johann Strauss.</span></div>
<div class="p5">
<br /></div>
<div class="p3">
<span class="s1">Ao vencer a peleja, o diretor impôs à
indústria canibal um paradoxal balé futurista banhado por sons compostos
mais de um século antes de 2001. Contraste ainda mais chocante era
produzido pela cena de envelhecimento do astronauta, ambientado num
quarto de hotel interestelar decorado à moda Luís XV.</span></div>
<div class="p3">
<br /></div>
<div class="p3">
<span class="s1">O arco de ambição da odisseia homérica e joyciana de Kubrick para longe da<span class="Apple-converted-space"> </span></span><span class="s1">ave-mãe
Terra ajuda a explicar a repulsa da elite que primeiro teve acesso ao
filme, e faz o diretor retroceder a hominídeos de milhões de anos atrás,
no prólogo <i>A Aurora do Homem</i>.</span></div>
<div class="p3">
<br /></div>
<div class="p3">
<span class="s1">Combustível fóssil abastece e incendeia a
narrativa de Benson sobre o processo de caracterização dos neandertais
coreografados pelo mímico Daniel Richter. Ele também acabaria por
interpretar Moonwatcher, o homem-macaco namorado da Lua que, após
vislumbrar o monólito, aprendia a usar ossos como armas e tornava a
espécie carnívora e ereta.</span><span class="s1"> </span></div>
<div class="p3">
<br /></div>
<div class="p3">
<span class="s1">Ao atirar aos céus o fêmur animal que, na
montagem, se convertia numa espaçonave em forma de espermatozoide capaz
de furar a Via Láctea, Moonwatcher metaforizava o raio de alcance
almejado por <i>2001</i>.</span></div>
<div class="p3">
<span class="s1"></span></div>
<div class="p3">
<span class="s1"><span class="Apple-converted-space"></span></span></div>
<div class="p3">
<br /></div>
<div class="p3">
<span class="s2">Richter só foi </span><span class="s1">creditado
como ator, porque Kubrick não admitia que ninguém, além dele,
acumulasse mais de um crédito nos letreiros. De olho nas estatuetas
danúbias do Oscar, o diretor engoliu a equipe de efeitos visuais e
assinou a autoria desse setor que era um dos monólitos de inovação do
filme.</span></div>
<div class="p3">
<br /></div>
<div class="p3">
<span class="s1">Os efeitos visuais renderam o único Oscar para <i>2001 </i>e para Kubrick, diretor também de outros clássicos <i>pop-rock</i> do cinema mundial, como <i>Dr. Fantástico </i>(1964), <i>Laranja Mecânica </i>(1971) e <i>O Iluminado </i>(1980). Idealizador de epopeias de época, guerra, terror e <i>thriller</i> sexual, Kubrick jamais dirigiu um faroeste.</span></div>
<div class="p3">
<br /></div>
<div class="p1">
<span class="s1">Para Benson, <i>2001 </i>marca o encerramento do ciclo do cinema de <a class="external-link" href="https://www.cartacapital.com.br/blogs/telatela/2018a-qualquer-custo2019-transforma-coracao-dos" target="_blank" title="">Velho Oeste</a> e a substituição dos épicos sertanejos e caipiras pelo breu interestelar. Psicodélico na travessia do Portal das Estrelas, <i>2001 </i>o filme saiu da mente de um diretor que evitava religiosamente as drogas, por medo de que lhe sabotassem o fluxo criativo.</span></div>
<div class="p1">
<br /></div>
<div class="p1">
<span class="s1">Embora um semideus se consolide na narrativa de Benson, biógrafo não perdoa os traços <i>mui</i> humanos do mito que brinca de deus. Em diversas passagens, Kubrick é retratado como limítrofe à ética, e <i>2001 </i>assoma
como resultado da predação do artista que, à maneira das personagens,
aprendeu a usar ossos e espaçonaves como armas de destruição em massa
(não seria Hollywood se assim não fosse).</span></div>
<div class="p1">
<br /></div>
<div class="p1">
<span class="s1">Kubrick exigiu da equipe o transplante de
árvores africanas em extinção para cenário mais adequado, e depois do
uso as silhuetas vegetais pré-históricas extraídas clandestinamente
foram serradas e destruídas, simples assim.</span></div>
<div class="p1">
<br /></div>
<div class="p1">
<span class="s1">Trabalhadores acidentados no exercício da
filmagem foram sumariamente demitidos. Além do estúdio
hipercapitalista, também o cineasta aparece como obcecado por planilhas,
cálculos, lucros, luxo. Ele, afinal, também pertencia à vanguarda que
inicialmente rejeitou sua obra-prima.</span></div>
<div class="p1">
<br /></div>
<div class="p1">
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh351kXKRaSE0zmuHu0vgy0InlK28KOG1TVLi2c5F0Yj_9_Og36Q1tuO9TjAXoxpwa8MRnIJAIdxnmyXFjpctwWVtaNyJLLVSEZOwUsrIKE7K8ZeMbIo86wQeMyU2iiZfBV6geCZ1ei-h7B/s1600/2001+livro+81nYMYY6qoL.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" data-original-height="1393" data-original-width="988" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh351kXKRaSE0zmuHu0vgy0InlK28KOG1TVLi2c5F0Yj_9_Og36Q1tuO9TjAXoxpwa8MRnIJAIdxnmyXFjpctwWVtaNyJLLVSEZOwUsrIKE7K8ZeMbIo86wQeMyU2iiZfBV6geCZ1ei-h7B/s400/2001+livro+81nYMYY6qoL.jpg" width="281" /></a></div>
<span class="s1">Kubrick não quis esperar para ver a
realidade concretizar (em <i>tablets</i> e internets) e desmentir (na conquista humana tímida do espaço) sua projeção de 2001.</span><span class="s1"> O homem que, entre os 36 e os 40 anos, orquestrou uma visão transcendental de futuro morreu de infarto, em 1999, aos 71 anos.</span></div>
<div class="p1">
<br /></div>
<div class="p1">
<span class="s1">por Pedro Alexandre Sanches</span></div>
<div class="p1">
<br /></div>
<div class="p1">
<a href="https://www.cartacapital.com.br/revista/1006/apos-50-anos-livro-investiga-tensao-entre-futuro-e-passado-em-Kubrick" target="_blank"><span class="s1">#carta</span></a></div>
<div class="p1">
<br /></div>
<div class="p1">
<span class="s1"># </span></div>
<div class="p3">
<br /></div>
<div class="p3">
<br /></div>
Adelvan Kenobihttp://www.blogger.com/profile/06307759808605250885noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4793536658109166560.post-5597838690228919712018-05-17T15:28:00.001-07:002018-05-23T14:41:45.895-07:00o processoCompareci no último sábado à pré-estréia do filme "O Processo"
em Aracaju. É sempre bom ver o pequeno e charmoso Cinema Vitória lotado - e
neste caso não se trata de força de expressão, quem chegou atrasado teve imensa
dificuldade de achar onde sentar. Trata-se, como todos já devem saber, do
documentário que Maria Augusta Ramos , conhecida por seus filmes sobre o
sistema de (in)justiça, fez sobre o processo de impeachment da presidentA Dilma
Rousseff - não entendi porque no filme ela á tratada como presidentE ...
<br />
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<span lang="pt" style="mso-ansi-language: #0016; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-hansi-font-family: Calibri;">O filme começa com um sobrevoo sobre uma Brasília literalmente dividida
entre vermelhos e verdeamarelos, mortadelas e coxinhas. Aquele tipo de imagem
que ficará para a história e será vista e revista provavelmente para sempre nos
anos que virão. Todo o filme, aliás, se presta a isso: ser um registro precioso
para a história. Segue mostrando a igualmente já célebre votação na câmara dos
deputados, aquela cena dantesca onde o Brasil mostrou sua cara de forma nunca
antes vista - escancarada, despudorada. Daí parte para "o processo"
propriamente dito, supostamente judicial mas, por acontecer no senado,
eminentemente político - e farsesco. </span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<span lang="pt" style="mso-ansi-language: #0016; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-hansi-font-family: Calibri;">A diretora teve acesso aos bastidores das reuniões e do dia-a-dia da
minoria, que defendia a presidentA. Faz falta o mesmo olhar para o outro lado,
mas não há nada que se possa fazer a respeito já que o acesso lhe foi negado.
Intercala, então, imagens públicas e já conhecidas dos debates transmitidos
pela TV Senado com discussões a principio privadas. Não há entrevistas, apenas
o registro e a edição de imagens. Toda edição, evidentemente, revela o olhar do
autor e se converte num comentário, numa opinião. A diretora tem consciência
disso, já vi declarações suas afirmando que nunca teve a intenção - que na
verdade seria uma ilusão - de fazer um filme "imparcial". Mas há
sempre, também, a possibilidade da acusação de manipulação, e foi o que parece
ter acontecido no debate que se seguiu à exibição do filme naquela tarde,
quando um dos espectadores afirmou ter achado de mal gosto uma edição que
mostra a Dra. Janaína Paschoal tomando um Toddinho logo após cenas em que
destila sua costumeira fanfarronice. Disse que não gostou porque foi uma piada
"fácil" que o fez ficar com um "pé atrás" com relação ao
filme. Eu, particularmente, não tenho nada contra piadas "fáceis" e
ri bastante com a cena. Pra mim funcionou como um alívio cômico necessário
diante do tema pra lá de árido e espinhoso. Há pelo menos outras duas que se
prestam ao mesmo serviço, a cena da troca da campainha e a da troca de ironias
e sorrisos nervosos entre a presidentA Dilma e o senador Cássio Cunha Lima, um
dos diversos CANALHAS, CANALHAS, CANALHAS - palavras de Tancredo Neves durante
o golpe de 1964 oportunamente lembradas pelo senador Requião em 2016 - que
atuaram de forma cínica e dissimulada naquela verdadeira ópera-bufa.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<span lang="pt" style="mso-ansi-language: #0016; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-hansi-font-family: Calibri;">Para mim, particularmente, o filme teve um efeito parecido com o dos
"Dois minutos de ódio" que era exibido aos cidadãos da Oceania em “1984”
de George Orwell: impossível evitar o asco diante de tantos CANALHAS expostos
em tela grande. Isso porque a diretora fez questão de mostrar - corretamente,
evidentemente - todos os argumentos, contra ou a favor do impeachment,
utilizando imagens publicas de discursos proferidos em plenário e nas sempre
tensas e tumultuadas comissões. Janaína, felizmente, se permitiu ser filmada, o
que nos proporcionou algumas deliciosas cenas "extras" - dela se
alongando ou se congraçando com seus admiradores da direita hidrófoba - além dos muitos momentos patéticos já mostrados na televisão, como o episódio em que ela arma um verdadeiro barraco </span><span lang="pt" style="mso-ansi-language: #0016; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-hansi-font-family: Calibri;">numa sessão do Senado para tirar satisfações pessoais<i>. </i>Não se
pode "culpar" a diretora por nada disso, evidentemente: com relação ao ódio gerado pela situação absurda cujas consequencias estamos todos sentindo na pele trata-se de uma percepção totalmente pessoal, baseada em minhas convicções - sim, tenho
algumas. Boa parte dos presentes à sessão de pré-estreia parece ter sentido
pudor de se entregar a este sentimento - catártico, purificador, recomendo - a
julgar por alguns<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>comentários proferidos
durante o já citado "debate" - confuso, pouco produtivo - que se
seguiu à exibição. Me deu a impressão de que alguns dos que se manifestaram
ainda estão empenhados em perseguir aquele ideal jornalístico inalcançável de
isenção e imparcialidade. A meu ver, o ideal a ser perseguido é o da
honestidade intelectual, e isso a diretora demonstrou ter de sobra, a julgar
pelo que foi visto na tela. </span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<span lang="pt" style="mso-ansi-language: #0016; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-hansi-font-family: Calibri;">Gostei bastante do filme. E tenho certeza que gostarei ainda mais ao
longo do tempo, com o distanciamento histórico. Será muito bom relembrar,
especialmente, a figura patética da "Doutora" Jana e suas caras e
bocas e discursos involuntariamente cômicos, e o verdadeiro "tapa na
cara" em forma de autocrítica registrado na fala de Gilberto Carvalho em
uma das reuniões petistas. Só espero que isso aconteça numa situação ideal, no
momento utópica, em um Brasil que superou a crise pela esquerda e se tornou um
país mais justo, e não distópica, num país destroçado pelo avanço implacável da
insensatez. Quem viver, verá. </span><br />
<br />
<span lang="pt" style="mso-ansi-language: #0016; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-hansi-font-family: Calibri;">Em tempo: o final é sensacional, avançando no tempo para registrar imagens da gigantesca manifestação contra a reforma da previdência um ano depois do impeachment. O filme, que havia começado com a imagem do sobrevoo sobre a cidade dividida, termina com a fumaça do incêndio de um dos ministérios tomando conta da tela ...</span><br />
<span lang="pt" style="mso-ansi-language: #0016; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-hansi-font-family: Calibri;"><span style="mso-spacerun: yes;"> </span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<span lang="pt" style="mso-ansi-language: #0016; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-hansi-font-family: Calibri;">“O Processo” está em cartaz nos cinemas de todo o Brasil.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<span lang="pt" style="mso-ansi-language: #0016; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-hansi-font-family: Calibri;">Em Aracaju, no Cine Vitória.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiCtLfRIy1AP9sovJdKTwjXCV6eLy-W8-PX92YrF4zEZL3S3J_FC71LYJ7p0u9rO5Ryb7VNjqe8Nw6DpNyrTM6LqZCZk6oZc9o5m5F0EgVL23NQyHIGPYjwXSNx_2i2jcgp2CFeCkTb0AW6/s1600/O-PROCESSO.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" data-original-height="1600" data-original-width="1090" height="640" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiCtLfRIy1AP9sovJdKTwjXCV6eLy-W8-PX92YrF4zEZL3S3J_FC71LYJ7p0u9rO5Ryb7VNjqe8Nw6DpNyrTM6LqZCZk6oZc9o5m5F0EgVL23NQyHIGPYjwXSNx_2i2jcgp2CFeCkTb0AW6/s640/O-PROCESSO.jpg" width="436" /></a></div>
<div class="MsoNormal">
<span lang="pt" style="mso-ansi-language: #0016; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-hansi-font-family: Calibri;">Vá e veja.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<span lang="pt" style="mso-ansi-language: #0016; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-hansi-font-family: Calibri;">A.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<span lang="pt" style="mso-ansi-language: #0016; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-hansi-font-family: Calibri;">#</span></div>
Adelvan Kenobihttp://www.blogger.com/profile/06307759808605250885noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4793536658109166560.post-87787211731509668472018-04-17T08:01:00.001-07:002018-04-17T08:02:09.243-07:00A VERDADE VENCERÁ<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<span lang="pt" style="mso-ansi-language: #0016; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-hansi-font-family: Calibri;">Costumo dizer que Lula foi o segundo melhor presidente da História do
Brasil. Juscelino, que costuma ocupar este posto, a meu ver seria o terceiro -
tenho sérias críticas ao modelo de desenvolvimento por ele implantado,
principalmente no que toca à priorização do transporte rodoviário em detrimento
do ferroviário, e também à construção de Brasilia, uma idéia megalomaniaca e
despropositada. </span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<span lang="pt" style="mso-ansi-language: #0016; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-hansi-font-family: Calibri;">O primeiro seria Getulio, mas confesso que ando revendo meus conceitos.
A favor de Vargas temos o fato dele ter institucionalizado as conquistas
populares - a Petrobras até hoje se tenta mas ainda não conseguiram privatizar,
e a CLT só com o golpe de 2016 foi desmontada. Já o “legado” do PT desmoronou
quase que completamente assim que o partido foi apeado do poder. Lula, no
entanto, conseguiu o que conseguiu - e não foi pouco - num ambiente
democrático, ao contrário de Vargas, que governou na maior parte do tempo com
mão de ferro, usando e abusando de poderes ditatoriais. É uma disputa acirrada,
portanto. Mas uma coisa é certa: o metalúrgico que se tornou presidente entrará
para a História pela porta da frente, ao contrário da maioria de seus atuais
algozes. </span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<span lang="pt" style="mso-ansi-language: #0016; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-hansi-font-family: Calibri;">Ivana Jinkins, filha de um livreiro comunista, tem feito um belíssimo
trabalho com sua editora Boitempo, que acaba de lançar um livro para ficar na
história:<a href="https://www.youtube.com/watch?v=s1065LP5YUc" target="_blank"> "A Verdade vencerá"</a>. Trata-se da transcrição de uma longa
entrevista com Lula conduzida por ela mesma e por Gilberto Maringoni, Juca
Kfouri e Maria Inês Nassif, com textos adicionais de Luis Fernando Veríssimo,
Luis Felipe Miguel, Eric Nepomuceno e Camilo Vanuchi. A edição, feita a toque
de caixa e no calor de momentos dramáticos(quando todos esperavam o resultado
do julgamento do habeas Corpus no STF), é pra lá de caprichada e recheada de
notas explicativas que serão de grande utilidade em leituras futuras, além de
ricamente ilustrada com fotos de arquivo e de Ricardo Stuckert. </span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<span lang="pt" style="mso-ansi-language: #0016; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-hansi-font-family: Calibri;">Na entrevista temos um Lula em grande forma falando com sinceridade
raramente vista de temas espinhosos, como sua relação com Dilma Roussef e as
acusações que levaram à sua condenação. Sobre estas últimas, diz que se fossem
verdadeiras ele seria “o chefe de quadrilha mais burro da face da terra”, por
se contentar com um apartamento no Guarujá e reformas num sítio em Atibaia enquanto
seus subordinados se locupletavam com rios de dinheiro. Faz sentido. Sobre
Dilma, fala o que todo mundo já sabia mas nunca tinha ouvido - pelo menos não
eu - saindo de sua boca: que não tem paciência para o jogo político e cometeu
equívocos mortais na condução da economia. Ressalta, no entanto, sua lealdade.
Critica duramente, mas demonstra sempre, também, imenso respeito. </span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<span lang="pt" style="mso-ansi-language: #0016; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-hansi-font-family: Calibri;">A linguagem, como de praxe, é pra lá de informal - vários
"porras" são ditos durante as falas, que revelam curiosidades que eu,
particularmente, não conhecia, como o fato de que seu irmão, Frei Chico, nunca
foi frei. A alcunha é apenas um apelido de infância. Ou de seu radicalismo (melhor
seria chamar de sectarismo) nos primórdios da militância sindical, quando
achava que o dono de um boteco era patrão e que a sogra, que apenas gostava de
se vestir bem, era burguesa. Destaque para a saborosa história do dia em que
Brizola o levou para visitar o túmulo de Getúlio - na verdade o líder
trabalhista o havia conduzido até lá para apresentá-lo ao defunto, com quem
ficou conversando por um bom tempo.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<span lang="pt" style="mso-ansi-language: #0016; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-hansi-font-family: Calibri;">A vida de Lula foi muito dura. Seu pai, por exemplo, proibia os filhos
de estudar. Ele só conseguiu entrar para a escola escondido,
"acoitado" pela mãe, Dona Lindu, por quem tem uma devoção comovente.
As enormes dificuldades que enfrentou, no entanto, não o endureceram nem
fizeram com que perdesse a ternura: trata a todos como "meu querido",
até as altas autoridades internacionais. É curiosa, por exemplo, a forma como
ele conta o episódio do pagamento da dívida externa com o FMI, como se fosse
uma negociação no balcão de uma mercearia de bairro: diz que chamou o
presidente do fundo e perguntou: "meu querido, quanto eu te devo? Quero
pagar". Vale dizer que o "eu", no caso, não é um termo muito
apropriado e revela um certo personalismo, sempre apontado como um dos calcanhares
de aquiles do lulismo. É preciso que se diga, também, que o pagamento da dívida
foi muito mais um brilhante golpe de marketing que um triunfo verdaeiro, pois
na verdade o que se fez foi uma substituição da dívida externa pela interna,
regada a juros pra lá de generosos para o mercado financeiro.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<span lang="pt" style="mso-ansi-language: #0016; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-hansi-font-family: Calibri;">Lula é um personagem complexo e cheio de contradições: critica o excesso
de partidos mas quando vai elogiar a candidatura de Boulos lamenta que ele
tenha escolhido o PSOL e diz que esperava que ele fundasse uma nova agremiação.
Num dado momento, diz que Jader Barbalho era "de esquerda" ! Nunca
foi! Era do MDB e militava na oposição à ditadura na época por ele referida,
mas dizer que era de esquerda, é um pouco demais. Ele também dilui o charmoso
termo “companheiro” que o PT adotou em seus primórdios para emular o “camarada”
dos comunistas, ao se referir assim até a personalidades como o do ex-presidente
norteamericana George W. Bush ...</span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<span lang="pt" style="mso-ansi-language: #0016; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-hansi-font-family: Calibri;">Questionado sobre o desleixo com a formação de quadros e as mobilizações
populares de massa, diz que nem sempre isso resolve, e dá como exemplo a
campanha pelas diretas já, que levou milhões às ruas mas não conseguiu a
aprovação da emenda Dante de Oliveira no congresso. Justifica, na sequencia, a
opção pelos acordos de gabinete, que implicam em concessões de alto custo.
Sobre isso, vale a pena a transcrição literal de sua fala:</span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<span lang="pt" style="mso-ansi-language: #0016; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-hansi-font-family: Calibri;">"Fiz as concessões que o momento exigia. Fui eleito presidente com
10 senadores e 91 deputados, num colégio de 513. E, mesmo com esse balanço
desfavorável, promovi a ascensão social dos mais humildes. Tirei 36 milhões de
brasileiros da miséria, disponibilizei 47 milhões de hectares para assentamento
de pequenos produtores (quase 50% do que foi feito em quinhentos anos de
história deste país), levei outros 40 milhões a um padrão de vida de classe
média baixa, instalei luz elétrica para mais de 15 milhões de pessoas, dei
início à transposição do rio São Francisco, coisa que dom Pedro tentou fazer
nos tempos em que era imperador ... Conciliação é quando você pode e não faz.
Se eu tivesse a força que teve o PMDB em 1988, com 23 governadores e 306
constituintes, teria concedido menos e realizado muito mais. Nós demos um
padrão de vida para o povo que muitas revoluções armadas não conseguiram - e em
apenas oito anos." </span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<span lang="pt" style="mso-ansi-language: #0016; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-hansi-font-family: Calibri;">Lula é um gênio político. A forma como ele transformou sua prisão num
ato que ficará para a história foi brilhante. Prisão injusta, uma infâmia que
põe em cheque o futuro deste nosso colosso sulamericano. Mas precisamos seguir em
frente! Uma vitória da direita nas eleições de outubro seria uma tragédia, a
consolidação final do golpe. A esquerda precisa urgentemente se unir em torno
de uma candidatura viável, e o único nome que vejo como capaz de tal proeza, na
atual conjuntura, é o de Ciro Gomes. Apoiado por Lula e com Haddad como vice
acredito que formaria uma chapa fortíssima. Mas a marcha da insensatez segue
firme nos dois lados do front, infelizmente, e o mais provável é que esta união não aconteça. Fragmentada, a esquerda corre o
sério risco de ficar de fora e ter que assistir horrorizada a uma disputa entre
Alckimin e Bolsonaro no segundo turno. Isso tem que ser evitado, a qualquer
custo. </span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<span lang="pt" style="mso-ansi-language: #0016; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-hansi-font-family: Calibri;">A.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<span lang="pt" style="mso-ansi-language: #0016; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-hansi-font-family: Calibri;">#</span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
</div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<br /></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgwwbb9ViZ-iv_1eI2sclJ9paJbNVD7B-DEQiqIHXvNWHh6uyoFTu8FYAk2iG3TSkeel_CAOCP3UC2rI68p9PunBjx21nU_hTGThyo_aKO6j30inapnUCKuVQIJGSezV1wWqoU2GahGAQqy/s1600/Lula+image-6-1.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1078" data-original-width="750" height="640" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgwwbb9ViZ-iv_1eI2sclJ9paJbNVD7B-DEQiqIHXvNWHh6uyoFTu8FYAk2iG3TSkeel_CAOCP3UC2rI68p9PunBjx21nU_hTGThyo_aKO6j30inapnUCKuVQIJGSezV1wWqoU2GahGAQqy/s640/Lula+image-6-1.jpg" width="445" /></a></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<span lang="pt" style="mso-ansi-language: #0016; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-hansi-font-family: Calibri;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; text-autospace: none;">
<span lang="pt" style="mso-ansi-language: #0016; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-hansi-font-family: Calibri;"></span></div>
Adelvan Kenobihttp://www.blogger.com/profile/06307759808605250885noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4793536658109166560.post-63464172047615349262018-04-02T15:01:00.002-07:002018-04-02T15:08:55.345-07:00O PUNK NÃO MORREU<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj9A3MCoGW06En9i_YcvRac7g59MfaHa_11tHrER02fjDKLuDKZzR3HCEIgdILz6vZbpf9SxuWtQoKVUK0Whv4p2n4b6z697EJEzsYknHGqbUgGI199srF97_D6uLjv52-MnTfV157DWbub/s1600/Luiz+27657625_1842405325770318_8102172597372096088_n.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="874" data-original-width="874" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj9A3MCoGW06En9i_YcvRac7g59MfaHa_11tHrER02fjDKLuDKZzR3HCEIgdILz6vZbpf9SxuWtQoKVUK0Whv4p2n4b6z697EJEzsYknHGqbUgGI199srF97_D6uLjv52-MnTfV157DWbub/s320/Luiz+27657625_1842405325770318_8102172597372096088_n.jpg" width="320" /></a></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: small; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR; mso-hansi-font-family: Calibri;"><a href="http://blog.vivalabrasa.com/" target="_blank">Adolfo Sá no Viva La Brasa: Luiz</a> </span><span style="font-size: 12.0pt; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR; mso-hansi-font-family: Calibri;"><span style="font-size: x-large;"><span style="font-size: small;">Moraes</span> </span>Santos chegou em Aracaju vindo de Garanhus
nos anos 90 e virou uma das figuras mais emblemáticas da cena punk local.
Cabelo de espeto e jaqueta com patches, o vocalista da Cessar Fogo morreu em
fevereiro durante o carnaval mais combativo dos últimos tempos.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: 12.0pt; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR; mso-hansi-font-family: Calibri;">Blocos de rua e palavras de ordem, vampiro
neoliberal e intervenção federal, que tiro foi esse. Enquanto o mundo frevia,
Luiz era preso e morria em condições nada festivas. Até hoje não conhecemos os
culpados, autorizados, máquinas de matar. Indefesos, os amigos se mobilizaram
para liberar seu corpo no IML e chegaram junto no enterro.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: 12.0pt; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR; mso-hansi-font-family: Calibri;">Kakuseisha Punx viveu na contramão, fez seus corres
e mandou o recado nos 2 álbuns da sua banda. Convidei uns camaradas pra contar
algumas das suas melhores histórias, começando pelo baixista Lauro Francis, que
gravou com ele o disco ‘Conflitos Mundanos’ e hoje toca na Cidade Dormitório:</span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhOJrFOLuwRh5SFcW3_LbDogjIrkRCun5ySxfYLcwSxSkvlehdJQrIbKC-hGlhVyDiwkvHj6fnu9iOntJfzPbWcS7KIfxyvA65i73aJZ3B8PhBhUh0mO3BD_4nZXCl6WwD7aN1YFCPV7AnV/s1600/Luiz+enterro+27751952_1848149941862523_7972353347451026896_n.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" data-original-height="960" data-original-width="720" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhOJrFOLuwRh5SFcW3_LbDogjIrkRCun5ySxfYLcwSxSkvlehdJQrIbKC-hGlhVyDiwkvHj6fnu9iOntJfzPbWcS7KIfxyvA65i73aJZ3B8PhBhUh0mO3BD_4nZXCl6WwD7aN1YFCPV7AnV/s320/Luiz+enterro+27751952_1848149941862523_7972353347451026896_n.jpg" width="240" /></a></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: 12.0pt; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR; mso-hansi-font-family: Calibri;">“Luiz teve uma vida difícil, veio com a mãe e o
irmão porque tinha um tio aqui que poderia ajudar eles – o pai, que já era
idoso, morreu quando ele era pequeno. Nessa de vir pra Aracaju ele foi ajudar o
tio, tipo aquelas coisas que rolam de pegar jovens do interior pra
trabalhar/morar em troca de comida e casa. Rola muito com meninas, né,
trabalhar como empregadas em casa. No caso ele trabalhava na empresa, que é no
centro, onde teve contato com os primeiros punks da cidade quando era garotão.
E foi nessa época que começou a trampar como locutor de porta de loja. E depois
que saiu da casa dos tios continuou trampando pelo centro, vendendo óculos
pirata e como locutor. Locutor que foi seu trampo a vida toda. Ele era bom
nisso.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: 12.0pt; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR; mso-hansi-font-family: Calibri;">Existem várias histórias engraçadas com Luiz,
quando o conheci na adolescência lá no Marcos Freire/João Alves o apelido dele
era Nirvana. Haha. Ele tinha um lance de quando tava com uma pessoa e tinha que
ir embora, ia se despedindo andando pra trás e acenando por uns 2, 3 metros
como se não quisesse dar as costas, saca?</span><br />
<br />
<span style="font-size: 12.0pt; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR; mso-hansi-font-family: Calibri;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhB7zx-L72vOY9ZT0yPnlHhAoL7GCrtJq6m54v_G39ZFO4M2Ft5ErJdeCvQtbZMF9M2mVDX2WvIZCirA4K4HRKSfytkqIeftca2ekW9PW_GM9e-Js4JxUPrLPluS3wjGlQbbEQYcsZFrJqr/s1600/cartaz+06032018+atualiz+28660339_1990918860948456_4015712812051771835_n.jpg" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="960" data-original-width="684" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhB7zx-L72vOY9ZT0yPnlHhAoL7GCrtJq6m54v_G39ZFO4M2Ft5ErJdeCvQtbZMF9M2mVDX2WvIZCirA4K4HRKSfytkqIeftca2ekW9PW_GM9e-Js4JxUPrLPluS3wjGlQbbEQYcsZFrJqr/s400/cartaz+06032018+atualiz+28660339_1990918860948456_4015712812051771835_n.jpg" width="285" /></a>Tem uma que eu acho foda: Um conhecido o encontrou trabalhando como locutor no
Extra, todo arrumado, de farda da empresa, cabelinho penteado e tal. Viu ele lá
no trampo todo almofadinha, falou: - Porra, nem tinha reconhecido! Quando acaba
o horário de serviço você coloca a fantasia punk, né? Ele respondeu: - Não, na
verdade eu tô fantasiado agora.”</span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: 12.0pt; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR; mso-hansi-font-family: Calibri;">Maicon Rodrigues, guitarrista da Psicosônicos e Dr.
Garage Experience, já produziu uma festa punk com a Cessar Fogo em Itabaiana:</span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-size: 12.0pt; line-height: 115%; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR; mso-hansi-font-family: Calibri;">“Eu vivia meus dias de
aventura como organizador de um projeto cultural quando Luiz veio com a banda
tocar. Foi tudo muito tranquilo, desde os primeiros contatos até o dia do show,
quando os conheci pessoalmente. Todos muito simpáticos, pareciam músicos
empolgados, porém contidos, mas Luiz se destacava pelo visual punk levado ao
extremo, sempre com um sorriso no rosto e atento a tudo ao seu redor. Parecia
estar pronto pra tudo que pudesse acontecer. Lembro de sua jaqueta recheada de
patches, bottons e uma crosta de sujeira acumulada ...</span><span style="font-size: 12.0pt; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR; mso-hansi-font-family: Calibri;"> </span><br />
<br />
<span style="font-size: 12.0pt; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR; mso-hansi-font-family: Calibri;">O show foi foda como tinha que ser, após a gig
foram todos jogar seus esqueletos maltrapilhos na residência dos meus pais como
era costume com todas as bandas que eu recebia no projeto, e logo cedo se
picaram pra casa após um café. Até aí tudo bem, ‘falou valeu, até a próxima’...</span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: 12.0pt; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR; mso-hansi-font-family: Calibri;">Dias depois eu percebo um trapo estranho e vermelho
entre os panos de chão da minha mãe e saquei que era a jaqueta do Luiz. Fiz
contato com o bicho e marquei de entregá-la em Aracaju. Ao encontrá-lo ele
parecia aliviado pois nem lembrava onde tinha deixado. Parece que tinha muito
apreço pela velha jaqueta de guerra, ficou muito feliz por tê-la encontrado,
mas vi que ficou também um pouco contrariado, meio puto, e quando eu perguntei
‘qual foi man’ ele me responde:</span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: 12.0pt; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR; mso-hansi-font-family: Calibri;">- Pô, velho, sua mãe lavou a jaqueta...”</span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: 12.0pt; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR; mso-hansi-font-family: Calibri;">Rás de Sá é uma criatura das noites undegrounds
aracajuanas e conheceu Luiz quando o punk cantava numa banda thrash metal chamada
Epidemic:</span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: 12.0pt; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR; mso-hansi-font-family: Calibri;"><br />
“Vivemos em um país que juízes falam que não dá pra viver sem auxílio-moradia,
pessoas tomam antidepressivo porque não podem trocar o carro 2017 por um 2018 e
outros tratam mal os amigos quando falta grana pra cerveja ou o celular novo. O
meu amigo Luiz dormiu na rua muitas vezes e era sempre simpático e amigável,
por mais problemas que tivesse. Sempre aparecia sorrindo e falava: - Eu dormi
debaixo daquele toldo, almocei no Padre Pedro e mais tarde vou a um evento
underground. Tá massa! Protestou a vida inteira contra as Injustiças dessa
merda de país e ao mesmo tempo foi um exemplo pelo que escrevi acima.”</span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: 12.0pt; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR; mso-hansi-font-family: Calibri;"><br />
E por fim Adelvan Kenobi, testemunha ocular da escória:</span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: 12.0pt; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR; mso-hansi-font-family: Calibri;">“Os frequentadores habituais da praça Roosevelt,
conhecida como ‘praça da mini ramp’ do Bairro América, periferia de Aracaju, se
depararam no domingo 11 de março último com uma movimentação diferente e
inesperada: um grupo de punks, skatistas e aficionados da cena rock da cidade
se reuniram por lá para celebrar a vida de Luiz.</span><br />
<br />
<span style="font-size: 12.0pt; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR; mso-hansi-font-family: Calibri;">Foi uma noite bacana, com apresentações ao ar livre, na quadra, de bandas como
Casca Grossa, Iconoclastia e Putrefação Humana. Bem “rueiro”, do jeito que Luiz
curtia. Não fosse ele próprio o homenageado póstumo, certamente estaria lá
liderando alguma nova formação da Cessar Fogo, banda que ele se recusava a
deixar morrer ...</span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: 12.0pt; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR; mso-hansi-font-family: Calibri;">Era um cara boa praça, sempre gentil com todos, e
também um punk de corpo e alma, daqueles que simplesmente não conseguem se
adaptar às vicissitudes do sistema. Por conta disso, passou os últimos dias de sua vida à deriva, morando nas ruas.
Somente com a notícia da sua morte os amigos souberam que morreu na cadeia,
para onde provavelmente foi levado por conta de um furto banal – foi portanto
mais uma vítima do encarceramento em massa que nosso país reserva como destino
aos “perdedores”, os que não se enquadram nos moldes do conformismo e da
subserviência exigidos pelos donos das casas grandes. Corria o risco,
inclusive, de ser sepultado como indigente. Não foi o caso, felizmente: uma
galera se mobilizou e conseguiu providenciar uma despedida decente.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: 12.0pt; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR; mso-hansi-font-family: Calibri;"><br />
Luiz morreu como viveu: como um punk. </span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: 12.0pt; mso-ascii-font-family: Calibri; mso-bidi-font-family: Calibri; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR; mso-hansi-font-family: Calibri;">Crucificado pelo sistema.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<span style="font-family: "calibri" , "sans-serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 115%;">#</span>Adelvan Kenobihttp://www.blogger.com/profile/06307759808605250885noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4793536658109166560.post-58620289520849294722018-01-25T15:55:00.003-08:002018-06-13T12:12:45.848-07:00Fanzines sergipanos<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
</div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
</div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiSE7vNzvtwKPd4sUcaFx7AnE4rpmBZD1ZhgqrqEstA1GuG6VvO7ATisnIwE9_eVyrKNrWeRVA2hwMYyw1oYF3SkxiRdqNrFOmsfike-jyLMEQ8Fd26y5rtJm_4CE16lzNCDzxbu2Pp9F4P/s1600/fanzines_%252821224199545%2529.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="768" data-original-width="1024" height="240" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiSE7vNzvtwKPd4sUcaFx7AnE4rpmBZD1ZhgqrqEstA1GuG6VvO7ATisnIwE9_eVyrKNrWeRVA2hwMYyw1oYF3SkxiRdqNrFOmsfike-jyLMEQ8Fd26y5rtJm_4CE16lzNCDzxbu2Pp9F4P/s320/fanzines_%252821224199545%2529.jpg" width="320" /></a></div>
Fanzines são publicações amadoras e artesanais dirigidas,
geralmente, a um público especifico: são produzidas por fãs para fãs – de rock,
quadrinhos, ficção científica, etc. A palavra, em si, é um neologismo oriundo
da união das palavras Fan(atic) e magazine, ou revista de fã(nático). O termo
foi cunhado nos Estados Unidos no início do século passado e popularizado, a
princípio, entre os fãs de ficção científica, mas tomou um novo impulso no
final da década de 1970 com o advento do punk rock e sua filosofia “Do It
Yourself”, “Faça você mesmo”. A partir daí se tornou o principal veículo de
divulgação da cena do rock independente e “underground” em todo o mundo .
<br />
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
No Brasil os primeiros fanzines de que se tem registro datam
da década de 1960 e também circulavam entre fãs de ficção científica. A partir
dos anos 1980 começou a se formar uma grande rede de circulação de informações
subterrâneas voltada principalmente para os universos do rock e das histórias
em quadrinhos, fenômeno que perdurou até a popularização da internet, no final
da década seguinte.</div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh0FW5Hj0akIlYl2MjAxyQ6Pq9ALjDJdcf-QPElYaCf4JJIVpkG8qz3b9YRegMqPIJ7fdHfpkk6_deFOFdJLKYFCu_MmsBI93XyG-478PXtk1qpx-EDNYcm2HNOWkqZ1EHAx1WV7qRJNG0n/s1600/fanzine+buracaju.jpg" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" data-original-height="1252" data-original-width="951" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh0FW5Hj0akIlYl2MjAxyQ6Pq9ALjDJdcf-QPElYaCf4JJIVpkG8qz3b9YRegMqPIJ7fdHfpkk6_deFOFdJLKYFCu_MmsBI93XyG-478PXtk1qpx-EDNYcm2HNOWkqZ1EHAx1WV7qRJNG0n/s400/fanzine+buracaju.jpg" width="303" /></a>Em Aracaju o pioneiro neste tipo de publicação foi Silvio
Campos, que já produzia seu “Arakarock” – todo feito a mão, de próprio punho –
no início da década de 1980. Seu envolvimento com o punk rock fez com que
iniciasse em 1986 a publicação do “Buracaju” – este já datilografado -,
certamente a mais importante publicação do estilo na época. Era voltado à
divulgação de bandas e do movimento anarquista e teve grande circulação
nacional, via correios, sendo o maior responsável pela divulgação da
embrionária cena roqueira local.<br />
<br />
Circulava também na época o “Seduções ecológicas” –
publicado por Ana Iuna, formada em biologia pela UFS –, o “Clube do
ódio” – mais “cabeça”, literato, meio beat, que tinha entre seus colaboradores
Helder “Podre”, hoje DJ Dolores -, “Boca Quente”, de Roberto Aquino, e o
“Centauro sem cabeça”, do poeta e capoeirista Nagir Macaô. Esta movimentação
acabou chegando até mim em Itabaiana, onde morava – e onde eu na verdade já
publicava um fanzine, o “Napalm”, sem ter consciência disso. Eu comecei a me
interessar por rock a partir do primeiro rock in rio e da leitura da revista
Bizz e resolvi fazer minha própria publicação – porque tinha ciúme de emprestar
minhas revistas! Como não conhecia o termo, chamava de “apostilha”.</div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
</div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjEc9AX260ET3Frn-ilXYhA1iRFQtSR3p9iy7eAag7ImhZgh-7yPvKrF2IaXtvmj6WmgmpffN9OcIf_M49EQezkVlgKpniDyg2-PNHeMpG6vbSjnPP1RioeaYukxF1wF7mABYh3rtr01XAc/s1600/fanzine+cabrunco-06.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1600" data-original-width="1197" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjEc9AX260ET3Frn-ilXYhA1iRFQtSR3p9iy7eAag7ImhZgh-7yPvKrF2IaXtvmj6WmgmpffN9OcIf_M49EQezkVlgKpniDyg2-PNHeMpG6vbSjnPP1RioeaYukxF1wF7mABYh3rtr01XAc/s400/fanzine+cabrunco-06.jpg" width="298" /></a></div>
Na década de 1990 meu fanzine passou a se chamar “Escarro
Napalm”. Era xerocado e teve seis edições, com periodicidade mais ou menos
semestral e tiragem de 100 a 150 exemplares distribuídos pelo correio. O número
2 foi publicado em conjunto com o “Buracaju” de Silvio. O formato era meio
oficio, com as páginas dobradas e grampeadas, simulando uma revistinha mesmo.
Foi o formato que Silvio também passou a adotar para seu Buracaju. Ele também
publicou, na época, um fanzine maior, tamanho A4, chamado Microfonia. Silvio
era um exímio diagramador autodidata: gostava de experimentar com texturas de
fundo e colagens decorativas, além de usar muito bem os novos recursos que as
copiadoras disponibilizavam na época, com edições em cores diferenciadas, como
azul ou vermelho – às vezes duas cores numa mesma página, o que encarecia o
produto, mas produzia efeitos diferenciados. Ele publicou também o fanzine
“Ultralibido”, mais erótico e escrachado, e o informativo “A Bomba”, que consistia
de uma única página impressa dos dois lados e dobrada em formato de folder. Este
formato, mais barato tanto para copiar quanto para mandar pelo correio, foi
adotado por um grupo de punks anarquistas em seu informativo “Humanismo”, que
teve circulação expressiva, com numeração alta e periodicidade regular – fato
raro.</div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
</div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhbER4dCfQGhYhRWHJ-Ydjr3vbqZ10_FEeaP7AugOWhv6oHiLpQ_TeDyoXpTlClyCLLKDOT3Mbeooq4_GFuMaWR8lembNhNR06Md9y3gqS5Aj0-SjOaekrRTf16Qhqsk3iGf42KV543JCSq/s1600/fanzine+putrefy.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" data-original-height="1600" data-original-width="1217" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhbER4dCfQGhYhRWHJ-Ydjr3vbqZ10_FEeaP7AugOWhv6oHiLpQ_TeDyoXpTlClyCLLKDOT3Mbeooq4_GFuMaWR8lembNhNR06Md9y3gqS5Aj0-SjOaekrRTf16Qhqsk3iGf42KV543JCSq/s400/fanzine+putrefy.jpg" width="303" /></a></div>
Outros punks seguiram o exemplo de Silvio e passaram a
publicar seus próprios fanzines no início da década de 1990. Os que mais se
destacaram foram o “Brigada de resgate”, de Jall Chaves, um baiano de
Alagoinhas radicado na cidade, e o “Zoada”, de Cícero “Mago”. “Mago” publicou
também o “Muda Expressão”, que não tinha texto, era feito só com colagens de
frases e imagens recortadas. Cícero é irmão de Jamson Madureira, notório
artista gráfico que colaborava com capas de fitas demo e ilustrações para
diversos fanzines – chegou, inclusive, a ilustrar dois livros, do poeta Araripe
Coutinho e do depois ministro do Supremo Carlos Ayres de Brito. No final da
década de 1990 Madureira costumava aparecer esporadicamente pelas ruas da
cidade com mais uma edição das histórias em quadrinho de seu personagem fixo,
“Automazzo”. “A Amante do mutante”, a primeira, é antológica, marcou época.</div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
A primeira metade da década de 1990 foi a mais rica para os
fanzines em Aracaju. A partir da troca de idéias entre malucos das mais
diversas tribos urbanas que freqüentavam as escadarias da Catedral e as lojas
“Lókaos” e “BR Records”, especializadas em rock underground, foram surgindo
publicaçãoe como “Furúnculo no cérebro” - uma publicação da “Zé Guiaba
produções artísticas”, de Teleu; “Entropia indiscreta” e “Acatalepsia”, de
Furia; “Sinagoga´s Butterfly” - mais “cabeção”, voltado para a filosofia e a
literatura, publicado a seis mãos por Dani Maya, Sérgio “Dedão” e Clarck Bruno;
“Mouth Stranger”, de Estranho e Carlos “Mouth” - que focava no Heavy Metal; e o
maior e mais célebre de todos, aquele que alcançou visibilidade nacional e é
considerado até hoje um dos melhores fanzines já publicados no Brasil: o
“Cabrunco”.</div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
</div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
</div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiEOi7fWIk7A_VlAZLbIfqZ06cuc3i_91RwVTNVVlBFpLx0XUeAxQXEJPlWwq3lTcwHGOtgtgw84M_0zHhdFJDypXR00nuFN9YqgEsYkZl7TZqydk-DzZkR9MQmJPTu92Fzxk7FSY0PSgA0/s1600/fanzine+mouth+stranger+Imagem.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1600" data-original-width="1215" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiEOi7fWIk7A_VlAZLbIfqZ06cuc3i_91RwVTNVVlBFpLx0XUeAxQXEJPlWwq3lTcwHGOtgtgw84M_0zHhdFJDypXR00nuFN9YqgEsYkZl7TZqydk-DzZkR9MQmJPTu92Fzxk7FSY0PSgA0/s400/fanzine+mouth+stranger+Imagem.jpg" width="303" /></a></div>
O “Cabrunco” era o que se chamava na época de “pro-zine” –
mais profissional, com cara de revista. Era editado, principalmente, por Adolfo
Sá, que posteriormente se formou em jornalismo pela UFS – seu TCC foi sobre
fanzines -, com a ajuda de Rafael Jr., baterista da Snooze, nas sessões
dedicadas à musica, e de Marcio “de Dona Litinha” – hoje vocalista da Naurêa –
falando de literatura. Foi xerocado até o número 6. O número 7 teve capa
colorida e foi impresso na Gráfica Digital. O 8 na Gráfica da UFS. Era bancado,
principalmente, por anunciantes, por isso tinha uma tiragem bem maior que o
usual. Chegou a chamar a atenção da imprensa nacional, sendo eleito, ao lado do
“Papakapika”, do Paraná, um dos dois melhores fanzines do Brasil. Não se
prendia a um tema específico, mas dava grande destaque à cena roqueira local,
com resenhas de shows, discos e fitas “demo”. Publicou entrevistas antológicas
com Mundo livre S/A e Zenilton, que eles encontraram por acaso, de “rolê” na
rua – ele morava em Aracaju. Em pleno auge de sua redescoberta via Raimundos, o
forrozeiro veterano, rei do duplo sentido, foi emparedado pelos “cabrunquentos”
e se saiu com pelo menos uma declaração bombástica – e antológica: “Eu tô
achando é bom que esses minino novo me descobriram. Agora quero aproveitar o
sucesso, quero mais é morrer emaconhado e com AIDS, comendo essas minina
novinha”. Todas as edições do “Cabrunco” estão disponíveis para download em pdf
no blog de Adolfo, <a href="http://blog.vivalabrasa.com/">http://blog.vivalabrasa.com</a></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi5qobrKATqmwis63PGNCr_BXlN3m7uuA94ArdXdapN3wixcJ3fpl2JrLlyE_MNtEShVmLE1DMehv1G00kyML3pFh-K_pTZAKRjR3hJwV1-VcR-WODIOEcbrBQU1AjPbFDaxheR-Oxabcqb/s1600/fanzine+pagina+suja.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" data-original-height="1228" data-original-width="873" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi5qobrKATqmwis63PGNCr_BXlN3m7uuA94ArdXdapN3wixcJ3fpl2JrLlyE_MNtEShVmLE1DMehv1G00kyML3pFh-K_pTZAKRjR3hJwV1-VcR-WODIOEcbrBQU1AjPbFDaxheR-Oxabcqb/s400/fanzine+pagina+suja.jpg" width="283" /></a></div>
Surgiu também, nesta época, um fanzine no interior, o
“Putrefy”, publicado em Estância por Alberto “Pereba” – que hoje, atente o
estimado leitor para as voltas que o mundo dá, é padre! Era escrotíssimo, com
sátiras engraçadíssimas, algumas “impublicáveis” em qualquer veículo
minimamente respeitador da moral e dos bons costumes. Sua personagem “Jezebel,
a puta”, era antológica! Já na primeira década do século XXI aconteceu uma
interessante movimentação “fanzinística” em Itabaiana, com títulos como “Xibiu”,
“100Palavras”, “Rosebud”, “Vitrola de papel”, “The Cool Megafun Zine”, “Fun
Zine” e “Tico Tico no Fullbach”, que iam da poesia – Samara era a musa local
desta seara – ao rock de garagem, passando por muita polêmica e fofoca. Foi uma
época intensa na cidade serrana, com toda uma movimentação roqueira underground
gravitando ao redor dos shows que aconteciam no Bar “Casagrande”, uma espécia
de CBGB “ceboleiro”, com bandas como Karranca, Dr. Garage, Urublues e
Carburadores.<br />
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
</div>
Com a popularização da internet a circulação de fanzines
xerocados pelo correio foi minguando até praticamente desaparecer. No limiar do
novo século poucos nomes surgiram por aqui – lembro apenas do “Cartão Postal”,
que era publicado por Duardo Costa e Carol. Até Silvio, incansável, parou de
“fanzinar” - sua última publicação, "Boogie Hooker", era dedicada ao blues e distribuída nos shows de uma de suas bandas, a Máquina Blues. Mas há resistência: um jovem franzino e entusiasmado chamado Aquino
Neto tomou gosto pela coisa através da “fanzinoteca” improvisada que o “velho
guerreiro” manteve por algum tempo em sua loja, a “Freedom”, e passou a
publicar um novo fanzine chamado “Guerrilha”, todo feito à mão. Recentemente
lançou o “Linhas Tortas”, muito melhor elaborado, e segue na atividade com uma
distribuidora de publicações alternaticas chamada “Café com veneno”, onde
publica, dentre outros, os desenhos do talentoso itabaianense Maicon Rodrigues.
Também em Itabaiana temos Adilson Lima, que produz quadrinhos divertidos e
ilustrou a capa do novo disco da banda de Thrash metal sergipana Berzerkers. </div>
<div class="MsoNormal">
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEit8Javm6SL4gaIUtKzAaLIfz7q1zhHQyOW7tDFmjQPl9oCOpPk2r-4obTlDQrrS6MCK9PvgvdUtmDm0JCAxT3fPZRZVVpALp_2RwdlLWUj7BrOo3ppKusqAopRy49DH8JY6Z1IF_i0DSfQ/s1600/fanzine+escarro+pg.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1262" data-original-width="971" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEit8Javm6SL4gaIUtKzAaLIfz7q1zhHQyOW7tDFmjQPl9oCOpPk2r-4obTlDQrrS6MCK9PvgvdUtmDm0JCAxT3fPZRZVVpALp_2RwdlLWUj7BrOo3ppKusqAopRy49DH8JY6Z1IF_i0DSfQ/s400/fanzine+escarro+pg.jpg" width="307" /></a></div>
É importante dizer, no entanto, que a movimentação "fanzineira" diminuiu mas não acabou de vez: "vira e mexe" me deparo, na Freedom, com alguns fanzine novos produzidos no velho esquema, xerocados, como “O Velho
punk”, do veterano Robério “Nininho”, "Páginas Sujas", de Alécio, e "Kaos Universal", do casal Kelly(que também é de Itabaana) e Renan - moram em São Cristóvão, cidade histórica que faz parte da região metropolitana de Aracaju. Em shows de rock eles também costumam dar as caras, eventualmente - alguns muito caprichadinhos, como o "Ouija", de Marcio Tiago, outros rápidos, rasteiros e panfletários, geralmente pequenas publicações punks e feministas. </div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Recentemente estive numa feira de publicações alternativas
no Museu da Imagem e do som de São Paulo, a “Feira Plana”. Nem sabia que
existia, mas existe, e é impressionante: muita gente! Cheguei atrasado para uma
palestra sobre a série “Zine é compromisso”, da revista Vice, que havia me
entrevistado. Ao me ver por lá, o camarada Marcio Sno – maior pesquisador e
divulgador do universo “fanzinistico” no Brasil – passou a me apresentar aos
amigos como “uma lenda viva, o cara que foi mencionado no auditório, que fazia
fanzine sem saber o que era fanzine no interior de Sergipe na década de 1980”.<br />
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
</div>
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEho0cBKqNPZ-cx0aAKPjIR9w0bLe4n4dS_Lmb9Se4bvAa2CxQDNWp-9AM08RMJJtf97LFmYkXJdW_yM3l8_klFwDWTQY-D61HqihPu0NUUpla8OubJT1o_cwcpt0AavcMkGNUdOK0sVrywl/s1600/Cumbuca+27157020_1407968885998460_1752436992_n.png" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" data-original-height="812" data-original-width="598" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEho0cBKqNPZ-cx0aAKPjIR9w0bLe4n4dS_Lmb9Se4bvAa2CxQDNWp-9AM08RMJJtf97LFmYkXJdW_yM3l8_klFwDWTQY-D61HqihPu0NUUpla8OubJT1o_cwcpt0AavcMkGNUdOK0sVrywl/s400/Cumbuca+27157020_1407968885998460_1752436992_n.png" width="293" /></a>O mundo, realmente, dá voltas.</div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Da revista <a href="http://agencia.se.gov.br/noticias/governo/editora-do-governo-lanca-16-edicao-da-revista-cumbuca-ca3f20db-64ac-4409-a3de-af09cc75427e" target="_blank">"Cumbuca"</a></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
A.</div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
#</div>
Adelvan Kenobihttp://www.blogger.com/profile/06307759808605250885noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-4793536658109166560.post-46484217924508854462018-01-04T07:11:00.000-08:002018-01-04T07:11:06.585-08:00200 Anos de "Frankenstein" - Em 1 de janeiro de 1818 foi publicada uma modesta edição do mítico romance em que uma precoce Mary W. Shelley moldou os dilemas e avanços de sua época<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
Frankenstein nasceu de algo mais do que o desafio de <a href="https://brasil.elpais.com/tag/george_gordon_byron_lord_byron/a/">Lord Byron</a>
ao lado de uma chaminé com vista para o lago Léman no verão mais frio
do século XIX. Tudo o que foi depositado por Mary Wollstonecraft Shelley
na narração que deu à luz um mito universal – inspirador de quase mil
obras entre o <a href="https://brasil.elpais.com/tag/cine/a">cinema</a>,
o teatro e os quadrinhos – tem relação com as circunstâncias
extraordinárias que a cercaram desde que nasceu em 30 de agosto de 1797
em Londres. Ao seu redor o velho mundo havia se fragmentado após várias
revoluções. A industrial se encontrava em plena excitação graças ao
aperfeiçoamento da máquina a vapor de James Watt. A política digeria a
overdose de guilhotina de Robespierre e companhia abraçando a volta da
ordem. As ideias e a ciência (ainda chamada filosofia natural) estavam
igualmente agitadas, com as teorias de Lavoisier que inauguram a química
moderna e as expedições aos polos para se aprofundar no magnetismo. E
todas aquelas revoluções tomavam chá em sua casa atraídas por seu pai, o
romancista e filósofo radical William Godwin (1756-1836), partidário da
abolição da propriedade e contrário a toda forma de governo. O primeiro
anarquista.</div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
<br /></div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
O próprio entorno
doméstico é forjado contrário à convenção. Godwin vivia com sua segunda
esposa, Mary Jane Clairmont, e cinco filhos de diferentes origens
biológicas no que hoje seria uma moderna família reconstituída. <a href="https://brasil.elpais.com/tag/mary_shelley/a/">Mary W. Shelley</a>
cresce marcada pelo pensamento de sua mãe, a escritora e filósofa Mary
Wollstonecraft (1759-1797), que a convida a formar-se como uma cidadã
consciente em vez de uma esposa submissa. Uma mãe ausente, cujo túmulo
era um local frequente de leitura. A autora transportará sua experiência
de orfandade à criatura literária, que espalha dor e morte porque não
tem quem a queira.</div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
<br /></div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
Em 1792, após o sucesso de um ensaio em defesa da Revolução Francesa, Mary Wollstonecraft publicou <em>Uma Reivindicação pelos Direitos da Mulher</em>,
onde exigia a educação às meninas: “Para fazer o contrato social
verdadeiramente equitativo, e com a finalidade de estender aqueles
princípios esclarecedores que só podem melhorar o destino do homem, deve
permitir-se às mulheres encontrar sua virtude no conhecimento, o que é
praticamente impossível a menos que sejam educadas mediante as mesmas
atividades que os homens”. É considerado o primeiro tratado feminista,
paralelamente à <em>Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã</em> escrita pela francesa Olympe de Gouges, decapitada em Paris por querer levar os direitos humanos longe demais.</div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
<br /></div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
Se o pensamento de Mary
Wollstonecraft era transgressor em si mesmo, sua vida encarnou vários
mitos românticos por seus desamores e suas duas tentativas de suicídio.
Entre o episódio do láudano e o do rio Tâmisa viajou pela Escandinávia
com sua primeira filha, Fanny, e uma babá. Da experiência sairia um
livro de viagens que entusiasmou William Godwin: “Se alguma vez foi
escrita uma obra com a intenção de que um homem se apaixonasse pelo
autor, acho que é essa”. Os dois escritores se tornam amigos, amantes e,
por último, cônjuges entre chacotas da imprensa conservadora (Godwin
havia se manifestado contra o casamento em escritos públicos). Na
quarta-feira 30 de agosto de 1797 nasce a única filha do casal, Mary. A
filósofa passou as contrações lendo em voz alta <em>Os Sofrimentos do Jovem Werther</em>,
de Goethe, com seu marido. O mesmo livro que no futuro será apreciado
por uma criatura de dois metros e meio de altura e lábios negros.</div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
<br /></div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
Mary talvez não tenha
sido educada como teria desejado sua mãe, que faleceu 11 dias após o
parto, mas seu pai estimulou seu intelecto desde o começo. Os biógrafos
sugerem que cresceu com mais pensadores do que afetos. “Ela
frequentemente sentia-se sozinha e carente de um sentimento de
identidade familiar”, diz James Lynn, “as relações com a segunda esposa
de seu pai eram pobres, e mesmo que Godwin tenha lhe dado uma boa
educação, não deu atenção às suas necessidades emocionais”.</div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
<br /></div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
Mary podia ouvir em sua
casa o poete Samuel Taylor Coleridge, o inventor William Nicholson e o
químico Humphry Davy. Seu pai a levava em conferências sobre
eletricidade e para tomar chá com o divulgador do vegetarianismo John
Frank Newton. Todo esse magma individual e criativo deixou marcas em
Frankenstein: o capitão Walton faz referência a um poema de Coleridge
(‘A Balada do Velho Marinheiro’) e o gigante mata, mas é vegetariano. Um
velho amigo de Godwin é apresentado no começo do romance: “Na opinião
do doutor Darwin, e de alguns fisiologistas da Alemanha, os
acontecimentos em que a presente ficção é baseada não são inteiramente
impossíveis”.</div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
<br /></div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
O médico e naturalista Erasmus Darwin, defensor de uma teoria sobre a origem única da vida e avô do autor de <em>A Origem das Espécies</em>, também será evocado em Villa Diodati no frio verão de 1816. Horas antes de Mary ter a visão que alimenta <em>Frankenstein</em>,
os poetas Lord Byron e Shelley recordam um de seus supostos testes,
como relata a própria escritora: “Ao que parece havia conservado um
pouco de massa em um pote de vidro, até que, por algum extraordinário
processo, aquilo começou a se agitar com um movimento autônomo. (...)
Talvez um cadáver pudesse reviver, o galvanismo deu provas de coisas
semelhantes: talvez as partes que compõem uma criatura possam ser
construídas, e depois possam ser reunidas e dotadas de calor vital”. A
grande pergunta que se faz Victor Frankenstein – “Onde estará o
princípio da vida?” – era a grande pergunta da época.</div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
<br /></div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
Diante da falta de
respostas precisas, os substitutos triunfam. A eletricidade vive seu
momento de glória desde meados do século XVIII. As descobertas
científicas de Benjamin Franklin, Luigi Galvani e Alessandro Volta
convivem com a prestidigitação ambulante. Em seu ensaio <em>Mulheres e Livros</em>,
o editor Stefan Bollman recria um popular espetáculo de “aparelhos
elétricos”: “Colocavam em funcionamento as rodas de suas máquinas
eletrostáticas e enviavam descargas elétricas através das mãos de uma
cadeia humana. Suspendiam uma pessoa de tal forma que levitava e faziam
com que sua cabeça brilhasse”.</div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
<br /></div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
Até mesmo Percy Bysshe
Shelley entrou na onda da eletricidade em Oxford, como detalha Charles
E. Robinson, principal especialista na obra de Mary W. Shelley, em sua
introdução a uma edição anotada para cientistas e inventores publicada
em comemoração ao bicentenário da criação da obra: “Construiu sua
própria pipa elétrica, fez faíscas saltarem de um aparelho elétrico e
até armazenou o fluido da eletricidade em garrafas de Leyden: esses
testes servem de base às experiências elétricas do pai de Victor,
Alphonse, em <em>Frankenstein</em>”.</div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
<br /></div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
O poeta Shelley também
acabaria frequentando a ágora doméstica de William Godwin, atraído pelo
pensamento de um filósofo quase mais célebre por controvérsias públicas
como a que manteve com Malthus do que por seus densos tratados
políticos. Percy também era especialista em controvérsias: casou-se
apesar da oposição de sua influente família e acabava de ser expulso de
Oxford por fazer propaganda do ateísmo. Mary tinha 16 anos quando foge
com ele, mas voltam logo por falta de dinheiro. A partir daí suas
biografias alimentam o mito do casal perfeito do romantismo, com uma
sucessão de sucessos literários e cadáveres jovens: só um de seus quatro
filhos sobrevive e, aos 29 anos, Percy B. Shelley se afoga na Itália.
No futuro a escritora se afastará da condição de maldita e se preocupará
em obter a aprovação social para ela, seu único filho e o poeta morto.</div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
<br /></div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
Mas quando Mary W.
Shelley escreve seu relato em 1816 para a competição sobre histórias de
fantasmas, convocada por Lord Byron no verão mais frio do século, tem
somente 18 anos, um bebê vivo e outro morto, e uma relação escandalosa
que acabará com o suicídio da primeira esposa de Shelley. Ignora que
está forjando um mito universal e que, naquela família onde só contavam
os que tinham méritos literários, ultrapassará a popularidade de todos
eles.</div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
<br /></div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
Em 1 de janeiro de 1818, quase dois anos depois da estadia no lago Léman, é publicado <em>Frankenstein ou o Prometeu Moderno</em>
com uma tiragem de 500 exemplares. Não tem assinatura. A mão de Percy
B. Shelley (que fornece correções ao manuscrito) chega a ser especulada.
Mas se algum incrédulo sobreviveu nesses 200 anos, perdeu a última
esperança em 2013. Nesse ano foi leiloado por 477.422 euros (1,9 milhão
de reais) um exemplar da primeira edição dedicada a Lord Byron “pelo
autor”. A letra foi autentificada como a de Mary W. Shelley.</div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
<br /></div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
Na segunda edição de
1823 (de tiragem semelhante à anterior), a escritora se identifica. Em
apenas três anos são feitas 10 adaptações teatrais diferentes, incluindo
finais paródicos sobre a morte da criatura, que irá se afastando-se de
seu cultivado espírito original – lia Plutarco, Milton e Goethe – para
transformar-se no imaginário coletivo em um monstro de parafuso na
cabeça e um tanto bobalhão. A obra se emancipa da autora. Seus leitores
encontram em <em>Frankenstein</em> o que precisam: terror gótico, antecipação da ficção científica e um dilema ético sobre os limites da ciência.</div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
<br /></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
</div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
No dia de Halloween de
1831 é lançada uma terceira edição de 4.020 exemplares. A escritora
introduz mudanças e cala os céticos: “Certamente, não devo ao meu marido
a sugestão de nenhum episódio, nem sequer de um guia nas emoções e,
entretanto, se não fosse por seu estímulo, essa história nunca teria
adquirido o formato com o qual se apresentou ao mundo”. Assina sua
introdução como M.W.S., mas a história da literatura prescindirá do
sobrenome materno.</div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
<br /></div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiHaQM8PNwmnsSJ7wVJSQ47u8Elu6Z98Z_f6cd4aAVn9hLfgBmTje_vWhj_OFAzdck4ZU573xmBLmPBxuPcuVhpWiy1dD9FCCSAQYi0JfRIZtPGBZAVu_Yf7yBr1lRc0ZbLZWtM34XJD0M_/s1600/frankenstein+81GgkXCuV7L.jpg" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" data-original-height="1600" data-original-width="1200" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiHaQM8PNwmnsSJ7wVJSQ47u8Elu6Z98Z_f6cd4aAVn9hLfgBmTje_vWhj_OFAzdck4ZU573xmBLmPBxuPcuVhpWiy1dD9FCCSAQYi0JfRIZtPGBZAVu_Yf7yBr1lRc0ZbLZWtM34XJD0M_/s400/frankenstein+81GgkXCuV7L.jpg" width="300" /></a>Mas somente rastreando
suas origens familiares e as circunstâncias dos primeiros anos de sua
vida pode-se responder à pergunta que tantas vezes fizeram a Mary W.
Shelley: “Como é possível que eu, à época uma jovenzinha, pudesse
conceber e desenvolver uma ideia tão horrorosa?”.</div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
<br /></div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
por<span class="autor-nombre" itemprop="name"><a href="https://brasil.elpais.com/autor/tereixa_constenla/a/" itemprop="url" title="Ver todas as notícias de Tereixa Constenla"> Tereixa Constenla</a></span></div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
<br /></div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
<span class="autor-nombre" itemprop="name"><a href="https://brasil.elpais.com/brasil/2017/12/29/cultura/1514544921_146287.html" target="_blank">El país</a> </span></div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
<br /></div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
<span class="autor-nombre" itemprop="name"># </span>
</div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
</div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
<br /></div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
<br /></div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
<br /></div>
<div class="m_-3334514591212096810gmail-MsoNormal">
<br /></div>
Adelvan Kenobihttp://www.blogger.com/profile/06307759808605250885noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4793536658109166560.post-29803106223615514212017-12-14T08:12:00.001-08:002018-01-10T10:54:44.471-08:00jão(do ratos, citando rui barbosa): "não se iluda com pessoas de cabelo branco, pois os canalhas também envelhecem"<table cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="float: left; margin-right: 1em; text-align: left;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjq04tazVFxKeG6xDmnftFK2POVG2YlH584yZHBu9unSvl1RDpGYb9HcHSTXWMxh0aPeg6joc3bSC_PynGDLrfJVtBUCPNuU-AnpxB2Y3AS0oYXBtTfH-eEptw1qT82z7lDMbewOUyj8U16/s1600/J%25C3%25A3o+38281053524_86b96608d0_o.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; margin-bottom: 1em; margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="712" data-original-width="1068" height="213" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjq04tazVFxKeG6xDmnftFK2POVG2YlH584yZHBu9unSvl1RDpGYb9HcHSTXWMxh0aPeg6joc3bSC_PynGDLrfJVtBUCPNuU-AnpxB2Y3AS0oYXBtTfH-eEptw1qT82z7lDMbewOUyj8U16/s320/J%25C3%25A3o+38281053524_86b96608d0_o.jpg" width="320" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Foto: Gibran Mendes</td></tr>
</tbody></table>
“Foi um golpe de velhos aristocratas que não querem ver pobre em
avião. Para eles pobre tem que andar de ônibus, tem que se foder,
engraxar o sapato deles e servir a comida deles. Rui Barbosa dizia não
se iluda com pessoas de cabelo branco, pois os canalhas também
envelhecem”.<br />
<br />
Com essa frase João Carlos Molina Esteves, 55 anos, ou simplesmente Jão, guitarrista do <i>Ratos de Porão </i>e do<i> Periferia SA</i>,
resume o cenário político do Brasil após o golpe que colocou Michel
Temer na presidência da república. Fundador da lendária banda criada em
1981 em meio a explosão do movimento punk no Brasil, Jão atendeu a
reportagem do <b>Porém.net</b> horas antes de um show do RDP no <i>Jokers Pub, </i>em Curitiba.<br />
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiL-LJkdYx_zq6XlWfy8mh09IyiA9PPkilNNpaBG4ZlzfAM-S2K2ro1ph7hS84Y069zFK3utRtPnJHpiiqBkdIGzawRWn2SeP-aCaSraXzLyqefsk1eKaP_Q3ep04EU39wuMszWvVrwmhDt/s1600/j%25C3%25A3o+88cd1c79d2b7c8f5d707f4a646d35cfa.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" data-original-height="1600" data-original-width="1060" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiL-LJkdYx_zq6XlWfy8mh09IyiA9PPkilNNpaBG4ZlzfAM-S2K2ro1ph7hS84Y069zFK3utRtPnJHpiiqBkdIGzawRWn2SeP-aCaSraXzLyqefsk1eKaP_Q3ep04EU39wuMszWvVrwmhDt/s400/j%25C3%25A3o+88cd1c79d2b7c8f5d707f4a646d35cfa.jpg" width="263" /></a></div>
A formação atual com Jão na guitarra, João Gordo no vocal, Boka na
bateria e Juninho no baixo é a com mais longevidade ao longo dos 36 anos
de carreira do Ratos. Depois de tantas mudanças de integrantes (13 no
total), Jão diz que a tolerância e o respeito as individualidades de
cada um tem sido a fórmula. “São três veganos e eu sou o açougueiro da
banda”, brinca o guitarrista, que é um dos sócios do <i>Underdog</i>, um bar-restaurante em São Paulo especializado em carnes. O prato principal é a parrilla argentina.<br />
<br />
Veia operária que permanece ativa no RDP, Jão falou da ascensão do
fascismo, da extrema direita e personagens caricatos como Jair
Bolsonaro, ao qual classifica como uma ‘toupeira’. “Tem um monte de
filha da puta que tem orgulho de um cara deste. Devem se identificar
pela toupeirice. Discuto nas redes sociais com esses babacas que
acreditam que a terra é plana, que Hitler era comunista. Os Bolsominions
da vida, esses escrotos que seguem MBL. Tem até punk que gosta de
Bolsonaro. Um cara deste não está entendendo porra nenhuma”.<br />
<br />
Esse cenário político atual deve inspirar o próximo projeto do Ratos
de Porão, como antecipa o guitarrista. “Estamos terminando de compor,
pois o momento do Brasil é bem propício. Motivo para fazer letra tem”. O
último álbum lançado pela banda foi <i>Século Sinistro</i>, em 2014. Confira a entrevista na íntegra:<br />
<br />
<b>São 36 anos de carreira. Como manter a mesma pegada, atravessando gerações de fãs?</b><br />
O Ratos de Porão nunca criou expectativa de sucesso, de exposição em
mídia. A própria correria foi mantendo a coisa viva. Não somos uma banda
popular nem dentro do rock, mas temos um público fiel no mundo inteiro.
Isso é gratificante. É legal você ver um cara da Sérvia, por exemplo,
que vai no seu show e diz: escuto sua banda faz tempo. Tem isso e tem o
fato da gente gostar do que faz, isso é o que mantém a banda viva. A
gente vê muita banda que pinta e depois de um ano some. Vamos pegar um
exemplo daquela época das bandas emo, o Restart. Os caras fizeram
sucesso, talvez ganharam em um ano mais do que eu ganhei na vida
inteira, mas os caras não conseguem viver sem aquilo, sem grana e as
facilidades que o sucesso traz. A gente já teve exposição em mídia, o
Gordo já foi apresentador da MTV, mas isso para o Ratos nunca foi um
retorno positivo. Somos uma banda que veio do punk, então o fato do
vocalista trabalhar na TV não trouxe sucesso, pelo contrário, trouxe
cobrança ideológica. A banda sempre tentou manter-se a parte disso,
inclusive o Gordo.<br />
<br />
<b>O Ratos passou por mudanças de integrantes e do som da banda. Fale dessas transformações e cobranças que receberam.</b><br />
O lance da cobrança do estilo musical já foi pior, pois às vezes é
difícil para algumas pessoas assimilarem. Queira ou não, o Ratos deu a
cara para bater, deu um passo a frente, ninguém estava misturando punk
com metal quando a gente começou. Da parte do punk sempre teve aquele
lance dos caras torcerem o bico. O Ratos sempre fez discos diferentes um
dos outros, sempre mantendo o estilo da banda. Óbvio que teve outros
ingredientes que foram somados a nossa música, influências diversas
também. Tem banda como ACDC, Motorhead, Ramones, Cólera, que podem ficar
tocando a mesma coisa a vida inteira e se sentir bem com isso. Não é
meu caso. Gosto de fazer coisas que sejam relevantes para mim em
primeiro lugar.<br />
<br />
<b>E o que tem escutado?</b><br />
Tem uns estilos que meio que doem no saco, bandas nessa linha tipo
Slipknot, tem umas guitarronas e tal, maior visual maneiro, mas eu não
consigo parar para ouvir. Não sei se estou ficando um velho chato.
Quando eu pego coisa nova para ouvir é banda tipo Slayer, que lança
sempre disco bom, Napalm Death, Testament, Exodus. Não são bandas novas,
são discos novos. Citei o new metal, que o cara vai cantando meio
‘amorosozinho’ e depois vai ficando ‘raivosão’. Sei lá, prefiro ouvir um
Johnny Cash.<br />
<br />
<b>Como é a relação com os demais integrantes do RDP?</b><br />
Bem boa, viajamos junto para caralho. Viajamos mais juntos entre nós
do que com as nossas famílias. Respeitamos as individualidades. Sou o
único que não sou vegano. A gente tem nossa vida fora da banda e ninguém
fica andando junto para lá e para cá. Fora do lance do Ratos, cada um
tem sua vida e é bem diferente a vida de cada um. Isso é bom, pois na
época lá de atrás, quando a gente do Ratos andava toda hora junto, tinha
mais treta. Na época do Jabá [ex-baixista e um dos fundadores
1981-1993], do Spaghetti [ex-baterista 1981 a 1991]. A gente era jovem,
louco para caralho, a banda tinha mais exposição. Quando a gente fez
o Brasil [álbum lançado em 1989], a gente estava em gravadora grande,
saía em revista, éramos um bando de punk louco sem noção. Era mais
complicado, pois isso acaba desgastando.<br />
<br />
<b>Seu pai tinha uma oficina de pintura de carros, você
trabalhou de motoboy, com Kombi em transportadora. Podemos considerar o
Jão, a veia operária do Ratos?</b><br />
Pode se dizer que sim. Hoje eu tenho um bar, que a especialidade é
carne, a parrilla argentina. Isso criou uma piada dentro da banda de que
o Ratos criou um açougue. Três são veganos e eu sou o açougueiro da
banda. Venho de família operária, o rock me deu muita coisa, mas nunca
me deu luxo. Consegui criar minhas filhas, viver e criá-las
honestamente. Criar filho com rock no Brasil é meio foda, ainda mais com
um som do tipo do Ratos.<br />
<br />
<b>Qual a diferença dos projetos e dos públicos do Ratos de Porão e do Periferia SA.?</b><br />
O público do Ratos é mais eclético. Vai desde o pessoal do punk, do
hardcore, do metal, até uns perdidos que falam que é a banda do João
Gordo. Já o Periferia é algo mais direcionado musicalmente, não é tão
eclético. Fazemos um punk de protesto, hardcore old school. Essa é a
nossa pegada. Muita gente que não vai no show do Periferia, vai no show
do Ratos. E tem gente que vai no Periferia e não gosta do Ratos.<br />
<br />
<b>Vocês foram precursores do punk no Brasil e na época havia
rivalidade entre os punks de São Paulo (capital) e do ABC. Fale desse
período.</b><br />
Era uma treta de gangue bairrista, uns se achavam mais punk que os
outros. Quando entrei no punk eu nunca tinha ido para o ABC. Pelo fato
do ABC ter as empresas multinacionais, as indústrias, tinha muito
punk working class, mais tinha muito skinhead, aquele lance
nacionalista. E isso também era motivo de briga. No fundo acho que todo
mundo gostava de brigar e de ter uma treta. Eu particularmente, o Jão,
nunca tive nada com os caras. Eu até achava que tinha umas bandas do ABC
bem mais fodas que as de São Paulo, tipo o Áustria. Quando teve o
Começo do Fim do Mundo [festival punk em 1982], no Sesc Pompéia, foi
tenso, pois juntou todo mundo, juntou punks de São Paulo e do ABC pela
primeira vez. O clima era de que iria dar merda. Os caras do ABC achavam
que a gente era playboy, mas não tinha playboy, a gente era da
periferia de São Paulo. Subúrbio e periferia é tudo a mesma coisa, gente
excluída da sociedade. Hoje já tem o lance ideológico, do tipo: sou
vegano e não ando com você, sou anarcopunk e não ando com você,
sou crust e não ando contigo.<br />
<br />
<b>Quais as histórias mais bizarras que lembra nestes 36 anos?</b><br />
Coisas bizarras acontecem sempre. Mas tem umas coisas que são bem
loucas, se puxar no Youtube vai achar lá “Ratos: bolt of love”, a gente
tocando em um barco do amor em um lago na Finlândia. A gente tocando e o
barquinho chacoalhando. Esse ano fizemos uma turnê latino-americana em
lugares que nunca tínhamos ido. Costa Rica, El Salvador. É louco ver que
a gente tem público lá. Na Bolívia, por exemplo, teve um show com uns
moleques que tinham umas camisetas escritas Ratos de Porão a mão, pois
os moleques não tinham dinheiro para comprar e acho que nem chegava
nosso material lá. Isso é louco, pois remete a minha adolescência. Tinha
umas camisetas escritas “vida ruim”, “Ratos de Porão”. Me identifiquei
para caralho. Hoje, mesmo com esse mundo globalizado, tem um monte de
excluído. Se marcar está pior. A evolução é relativa.<br />
<br />
<b>Em 1989 vocês lançaram Brasil, com clássicos como Amazônia
Nunca Mais, Farsa Nacionalista, Máquina Militar, Crianças Sem Futuro.
Trace o Brasil de 1989 e o Brasil atual?</b><br />
O momento atual do Brasil como sociedade está bem estranho. Não sei
até que ponto as redes sociais influenciaram nisso. Hoje em dia tem um
monte de filha da puta eleitor do Bolsonaro que tem orgulho disso,
orgulho de um cara que é a maior toupeira. Se identificam pela
toupeirice entre o candidato e o eleitor. Discuto nas redes sociais com
uns babacas que acreditam que a terra é plana, que Hitler era comunista.
O mundo tem muita informação hoje, na minha época você tinha que correr
atrás da informação. Era através de livros, livro te salvava. Hoje os
idiotas compram ideias prontas. A política no Brasil está bizarra, a
eleição do ano que vem é um negócio temeroso. As opções são brutas, até
Luciano Huck tentaram lançar. Depois do golpe, pois isso foi um golpe,
um golpe de velhos aristocratas que não querem ver pobre em avião. Para
eles pobres tem que andar de ônibus, tem que se foder, engraxar o
sapato deles, servir a comida deles. Olha o Temer, eu desejo muito mal
para esse verme filho da puta. Onde está aquela galera que estava
fazendo dancinha na Paulista pintado? Onde está essa gente? Essa galera
não está se sentindo enganada? Não é possível, o preço da gasolina para
mim é o mesmo que para eles. Olha esse lance trabalhista [reforma
trabalhista], eu não sou empregado, mas no meu bar eu tenho várias
pessoas registradas. Eu não concordo com isso ai e não vou fazer isso
com os caras que trabalham para mim. O bagulho foi um crime, um roubo,
uma exploração.<br />
<br />
<b>E o Dória?</b><br />
Putz, o Doriana é triste hein malandro! Os caras pensaram que ele
iria colocar todo mundo de camisa polo Ralph Lauren na escola, caviar na
merenda, vai vendo. O cara é um patife, um marqueteiro. Nunca cuidou
nem da conta corrente dele, não sabe administrar nada. É capaz de um
bosta deste tentar ser candidato. Quem votou no cara lá em São Paulo não
quer dar o braço a torcer, assim como a galera que apoiou o golpe. Os
caras tem tipo orgulho, jamais vão admitir que estão errados. O cara
burro não admite nunca, ele vê que a gasolina está mais de quatro
contos, vê os direitos trabalhistas roubados, vê professor não ganhando
salário, mas não admite a merda toda. Pega o Alckmin, outro patife da
pior espécie. Já dizia Rui Barbosa, “não se iluda com pessoas de cabelo
branco, pois os canalhas também envelhecem”.<br />
<br />
<b>A repressão, a violência policial, sempre estiveram nas letras do Ratos. Diante do atual cenário, para onde podemos caminhar?</b><br />
Acho preocupante todo esse lance de repressão. Eu sempre posto lá
[Facebook], a polícia militar tem que acabar, porque esse formato aí é
da ditadura. Estamos no mesmo nível daquela época, vai professor
protestar porque não está ganhando salário e leva bala de borracha,
spray de pimenta no olho. Quando eu posto isso sempre vem os
Bolsominions dizer: “quem tem medo de polícia é bandido (sic)”. Essas
frases prontas. Não sou bandido, mas sou cabreiro com a polícia sim.<br />
<br />
<b>Quando o Ratos estava prestes a completar 30 anos foi lançado
o documentário Guidable. Recentemente vocês fizeram um show com outras
bandas, como Resto de Nada, Mercenárias, AI-5, em comemoração aos 40
anos do punk rock. E para os 40 anos do RDP, o que vislumbrar?</b><br />
Quando o Ratos fez 30 anos eu juntei quase todo mundo que tocou no
Ratos, faltou só o Pica Pau [ex-baixista 1995 a 1999]. Era para ter
saído um DVD disso ai. Contamos a história da banda através da
discografia com as formações da época. Mas deu merda no áudio e
desistimos de lançar. Sobre os 40 anos têm quatro anos para gente
pensar, mas vamos comemorar de alguma forma sim.<br />
<br />
<b>Vocês estão no estúdio compondo?</b><br />
Estamos terminando de compor, mas cada um tem sua vida, seus projetos
paralelos, mas estamos querendo fazer disco novo por aí, pois o momento
do Brasil é bem propício. Motivo para fazer letra tem. O Ratos sempre
foi chato com a gente mesmo neste lance de composição. A gente vai
gravar o disco na certeza que tem que estar legal. A gente prefere
demorar um pouco mais para lançar um disco ao invés de fazer um bagulho
nas coxas.<br />
<br />
<b>Nestes 36 anos de banda, se pudesse voltar no tempo, o que faria diferente?</b><br />
Não fumaria crack. Isso atrasou meu lado, perdi amigos. Vida pessoal
ficou na merda, devendo para traficante. Mandamos o Jabá embora da
banda, que era o fundador junto comigo. Esse tipo de coisas. Essas
cagadas se eu não pudesse fazer seria bem melhor. Foi uma fase bem
crítica, não sei como a banda não acabou e até conseguiu produzir
coisas.<br />
<br />
<i>por</i> <i>Júlio Carignano</i><br />
<br />
<a href="http://porem.net/2017/12/11/os-canalhas-tambem-envelhecem/" target="_blank"><i>porém.net</i></a><br />
<br />
<i># </i> <br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />Adelvan Kenobihttp://www.blogger.com/profile/06307759808605250885noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4793536658109166560.post-57172770647441327952017-10-30T15:04:00.002-07:002017-10-30T15:15:38.841-07:00China Miéville e o "romance sem ficção" da revolução russa<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg0GctA4y9wmbThRI2-MdFDvMdHqXsHDb2CitUMGFE46CV1X6yu9Qt-fe2xT6DTtSnjKRi8vkvaenHDwGni44K-JhCOOVp6ZUWWpuf0yfZ_eG3JhUAZnfe9yd8QVls518tvGOuOiUeIG9rE/s1600/Outubro+mieville.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="620" data-original-width="620" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg0GctA4y9wmbThRI2-MdFDvMdHqXsHDb2CitUMGFE46CV1X6yu9Qt-fe2xT6DTtSnjKRi8vkvaenHDwGni44K-JhCOOVp6ZUWWpuf0yfZ_eG3JhUAZnfe9yd8QVls518tvGOuOiUeIG9rE/s320/Outubro+mieville.jpg" width="320" /></a></div>
<xml><w:worddocument><a href="http://epoca.globo.com/vida/noticia/2016/07/mistura-do-radicalismo-politico-e-literatura-fantastica-de-china-mieville.html">China
Miéville</a> é quase um <b>Maiakóvski</b> inglês. Assim como o poeta
que revolucionou o verso russo e cantou a insurreição comunista de outubro de
1917, Miéville se divide entre a literatura e a militância política. Ele é um
premiado autor de <b>ficção científica</b>. Seus volumosos romances
são apinhados de monstros, alienígenas, seres mitológicos e luta de classes.
Também é um estudioso do marxismo, doutor em Direito Internacional pela <b>London
School of Economics</b> e militante do <b>Partido Trabalhista</b>
britânico. Em seu livro mais recente, Miéville combina suas duas paixões: <i><b>Outubro
</b></i>(Boitempo, 384 páginas, R$ 59), recém-publicado no Brasil, narra, mês
a mês, os eventos que culminaram na <b>Revolução Russa</b>. Ao
contrário dos outros livros de Miéville, <i>Outubro </i>não tem uma linha
sequer de ficção nem um único personagem inventado. Em entrevista a ÉPOCA,
Miéville contou como foi escrever um romance sem ficção e refletiu sobre os <b>dilemas
da esquerda</b> contemporânea, que não sabe direito como olhar para a
revolução bolchevique.<br />
<br />
</w:worddocument></xml><br />
<div class="MsoNormal">
<b>ÉPOCA – Como foi para um autor de
literatura fantástica escrever um livro de não ficção?</b><b><span style="font-family: "times new roman" , "serif";"><br />
<b>China Miéville</b></span><b><span style="font-family: "calibri" , "sans-serif"; mso-ascii-theme-font: minor-latin; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-bidi-theme-font: minor-bidi; mso-hansi-theme-font: minor-latin;"> </span>– </b></b><span style="font-family: "times new roman" , "serif";">Difícil. Eu estava muito nervoso.
Segui uma regra bastante rigorosa: não podia inventar nada. Estava ansioso pela
recepção das pessoas que conhecem o assunto muito bem. <i>Outubro </i>foi
escrito principalmente para quem não conhece a história, mas eu não queria que
especialistas pensassem que eu não tinha feito meu dever de casa quando lessem.
A recepção foi muito simpática. Valeu a pena. De tudo o que eu já escrevi, esse
é o livro que me causou mais ansiedade, porque, embora seja uma história, e não
uma discussão política, as questões políticas estão ali, tácitas.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<b>ÉPOCA – Em </b><i><b>Outubro</b></i><b>, o senhor diz
que não aborda essa história com neutralidade, que tem seus heróis e seus
vilões. Como fez para não deixar que seus sentimentos pela Revolução Russa
interferissem demais no texto?</b><b><br />
<b>Miéville –</b></b> Os escritores não são neutros, mas podem tentar
ser justos. Há alguns personagens no livro de quem eu discordo politicamente ou
que representam ideias às quais me oponho, mas que, ainda assim, são
personagens fascinantes. Por outro lado, tentei não ser muito compassivo com
figuras de quem estou próximo politicamente. O final do livro, por exemplo, é
uma longa discussão sobre os erros da revolução. Não sou eu quem deve julgar
quão bem-sucedido eu fui, mas posso afirmar que sempre estive muito consciente
do problema e me esforcei muito para não ser injusto.<br />
<br />
<b>ÉPOCA – Sempre que o assunto é a Revolução Russa, surge a pergunta:
como a revolução popular se transformou num Estado totalitário? O senhor tem
alguma resposta?</b><b><br />
<b>Miéville – </b></b>Para mim, não há uma causa única que explique o
que deu errado, mas uma complexidade de causas. A revolução foi cercada por
todos os lados e houve tentativas deliberadas de destruí-la. Naquele contexto,
algumas decisões tomadas pelos revolucionários não ajudaram as coisas a
avançar. Por exemplo: em 1924, os bolcheviques desistiram de insistir que uma <b>revolução
socialista</b> não pode ser bem-sucedida em um só país, devido à
integração da economia mundial. Naquele ano, ao perceber que a possibilidade da
revolução internacionalista recuava, eles viraram esse argumento de
ponta-cabeça e concluíram que, sim, o socialismo em um só país era possível.
Para mim, isso foi uma catástrofe absoluta! Naquele momento de desespero, em
vez de identificar com clareza o problema, eles preferiram se enganar,
minimizando o problema.<br />
<br />
<b>ÉPOCA – Aqui no Brasil, depois do impeachment da presidente Dilma
Rousseff, debate-se muito a reconstrução da esquerda. Recentemente, o filósofo
Ruy Fausto, um renomado estudioso do marxismo, publicou o livro </b><i><b>Caminhos
da esquerda</b></i><b>, no qual ele argumenta ser urgente a esquerda
abandonar suas velhas patologias: populismo e tendências totalitárias e
antidemocráticas. O senhor acredita que a esquerda deva se livrar de algumas
patologias?</b><b><br />
<b>Miéville –</b></b> Com certeza há patologias. Só um sectário
acharia que a esquerda não tem patologias para se livrar. Precisamos nos livrar
de nossas patologias e discutir como seguir em frente, como criar o que chamo
de “esquerda habitável”. Isso é crucial. Por meio de minha experiência, percebo
na esquerda um certo sectarismo, uma brutalidade indesejada. É claro que há
muita gente que não compactua com isso, mas são patologias que percebo, e acho
que a esquerda não se esforçou o suficiente para se livrar delas. Eu mesmo já
me envolvi em brigas feias no interior da esquerda britânica. Essas brigas
sempre nos deixam absolutamente exaustos. É claro que vamos discordar, mas não
precisamos conduzir nossa política sempre dessa maneira. Aliás, há bastante
gente na esquerda, especialmente os mais jovens, que diz isso com seriedade, o
que me dá muita esperança.<br />
<br />
<b>ÉPOCA – Atualmente, a esquerda discute muito a situação venezuelana.
No Brasil, o PT apoia o governo antidemocrático de Nicolás Maduro.
Recentemente, o líder do Partido Trabalhista britânico, Jeremy Corbyn, disse
que a violência é praticada tanto pelo governo quanto pela oposição. Qual
deveria ser a postura da esquerda diante da crise venezuelana?</b><b><br />
<b>Miéville – </b></b>A esquerda pode começar não se aliando com os
bastiões da direita que tentam proclamar a morte do chavismo e dos projetos
populares na <b>América Latina</b>. Dito isso, acredito que nós, de
esquerda, devemos enfrentar com pragmatismo e seriedade os problemas de Maduro
e seu regime, que vêm cerceando a democracia. A esquerda não pode dizer que não
há problemas ali. Há, no entanto, grupos na <a href="http://epoca.globo.com/palavrachave/venezuela/">Venezuela</a> que não se
aliam de modo algum com Maduro e recusam esse tipo de chantagem política que
diz que, se você não apoia o regime, você está dançando no ritmo do capital ou
é um fascista. Esse tipo de chantagem deve ser rejeitada. Não posso, em sã
consciência, alinhar-me com o regime de Maduro, mas isso não quer dizer que eu
apoio a oposição. Precisamos fortalecer as tendências minoritárias da esquerda
venezuelana que estão comprometidas, acima de tudo, com a democracia popular.<br />
<br />
<b>ÉPOCA – Nos últimos tempos, o eleitorado de centro-esquerda tem se
voltado para candidatos populistas e de extrema-direita. Recentemente, o
ex-chefe estrategista da Casa Branca Steve Bannon disse: “Se a esquerda estiver
focada em raça e identidade, nós avançamos com o nacionalismo econômico e,
assim, esmagamos os democratas”. Focar em questões raciais e de gênero em vez
do antigo programa econômico estatizante é um erro das esquerdas?</b><b><br />
<b>Miéville –</b></b> É perigoso comprar essa narrativa que afirma
que toda essa conversa sobre racismo alienou os pobres brancos. É um erro. <b>Ignorar
opressões estruturais e históricas, como o racismo americano ou o brasileiro,
para não alienar a classe trabalhadora branca, é covardia política</b> e
falta de senso estratégico. Ignorar o racismo significa não lidar seriamente
com a questão das classes sociais, porque classe social, raça e gênero estão
imbricados. Seria um insulto ignorar um movimento como o <b>Black Lives
Matter</b>, que provocou um impacto extraordinário na política americana.
Mas, é claro, há maneiras melhores e piores de lidar com as políticas
identitárias. Há muita gente na internet, uma<b> esquerda de Twitter</b>,
que impõe essas plataformas de uma maneira que não ajuda ninguém.<br />
<br />
<b>ÉPOCA – Na eleição britânica, a esquerda radical conseguiu
resultados surpreendentes, mas Jeremy Corbyn não foi eleito. Apostar no
radicalismo pode ajudar a esquerda a voltar ao poder?</b><b><br />
<b>Miéville – </b></b>No mundo todo estamos assistindo a um <b>colapso
do liberalismo</b>. Um programa radical pode, sim, vencer. É verdade que
estamos nos estágios iniciais – se tivermos sorte – de um ressurgimento da
esquerda. E não surpreende que a nova esquerda ainda não tenha conseguido
superar décadas de desencanto popular com os políticos. Há uma montanha a
escalar. Nos últimos meses, aprendemos que essa montanha pode, sim, ser
escalada.<br />
<br />
<b>ÉPOCA – Na época do Brexit, o senhor afirmou que era difícil para a
esquerda se posicionar sobre a saída dos britânicos da União Europeia, porque o
voto anti-UE estava sendo patrocinado por uma onda de preconceito e xenofobia.
Agora, parece haver muita ansiedade quanto aos impactos do Brexit na economia
britânica. Como o senhor avalia a saída britânica do mercado comum um ano após
o referendo?</b><b><br />
<b>Miéville – </b></b>O governo britânico está lidando com o <a href="http://epoca.globo.com/palavrachave/brexit/">Brexit</a> sem nenhum
programa ou tática. Os sonhos econômicos da direita anti-UE – uma espécie de
parque de diversões no Atlântico – são mais que absurdos. E a direita xenófoba
saiu fortalecida do referendo. O desejo nostálgico de muitos liberais de novo
referendo, ou de simplesmente ignorar o resultado, é ridículo. A tarefa agora é
– usando a fraseologia da esquerda do Partido Trabalhista – fazer um Brexit
para muitos, não para poucos, contra o Brexit dos reacionários. É uma tarefa
muito difícil, que acarretará muita dor e dificuldades, mas não é impossível.
Vale a pena lutar.<br />
<br />
por RUAN DE SOUSA GABRIEL<br />
<br />
<a href="http://epoca.globo.com/cultura/noticia/2017/10/china-mieville-o-colapso-do-liberalismo-abre-espaco-para-esquerda.html" target="_blank">Época</a><br />
<br />
#<br />
<br />
<br />Adelvan Kenobihttp://www.blogger.com/profile/06307759808605250885noreply@blogger.com0