quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Ele voltou.


Nosso Assassino serial favorito está de volta desde o último domingo, quando foi exibido o primeiro episódio da quinta temporada da série. Um episódio um tanto quanto incomum, pesado, choroso, “de luto” – e se você pensar bem, não poderia ter sido diferente, tendo em vista a forma como foi encerrada a quarta temporada, com um acontecimento tão chocante (não se preocupe, não vou revelar nenhuma surpresa pra quem ainda não viu) que eu cheguei a pensar que deveria ser alguma espécie de delírio. Pois bem, não foi nada disso. Aconteceu mesmo, e agora nosso querido Dexter vai ter que aprender a conviver com mais uma nova situação (ou “estado civil”, caso prefira) em sua vida pra lá de turbulenta. Vejamos no que dá. As perspectivas são as melhores possíveis, já que pelo menos até agora o programa vêm sendo feito na base de uma temporada melhor que a outra.

Falo isso sem exagero, até porque eu demorei um pouco a ser “fisgado” pela história. Comecei a assistir por recomendação de amigos e por ter achado interessante a premissa (um “seria killer” de “serial killers”), mas confesso que a ambientação (Miami, a mais “caliente” das metrópoles americanas - sou meio cismado com essa cidade, não sei dizer exatamente porque) me incomodou um pouco e até o meio da primeira temporada não vi nada de “arrebatador”. Só naquele ponto, com o sempre eficiente recurso (Hitchcock que o diga) de revelar ao público algo que os personagens não sabem, a coisa começou a decolar pra valer, e eu passei a acompanhar com um interesse crescente as atribulações do dia-a-dia dos personagens, condição “sine qua non” para a perfeita apreciação de um programa do tipo – porque no final das contas é, na verdade, uma novela. Mas uma novela com grandes atuações, uma grande história e, acima de tudo, ótimos personagens desenvolvidos por meio de diálogos inteligentes e eficientes. Deborah, a irmã de Dexter, é minha favorita, mas me diverti muito assistindo o desenrolar da trama como um todo, ao ponto de poder afirmar, sem medo de errar, que esta é, hoje, a minha série de TV favorita. O único ponto que me incomoda, e ao mesmo tempo fascina, é a ambigüidade da coisa, já que você acaba se identificando e torcendo por uma pessoa que é, no fim das contas, um assassino terrível, seguidor de um suposto código de honra e conduta injustificável, a não ser que você seja um apreciador da Lei do Talião (olho por olho, dente por dente) e ache plausível a premissa de que a vingança pelas próprias mãos é legítima. Não é o meu caso. Em todo caso, não há como negar: eu gosto de Dexter – a série E o personagem, magnificamente interpretado por Michael C. Hall, o Dave de “A 7 Palmos” (creio que estranhei também, no início, ver a imagem daquele cara que eu estava tão acostumado a associar com um personagem frágil e sensível na pele de um assassino frio e calculista – muito embora “humano, demasiado humano”, como ele mesmo vai perceber – e se surpreender com a descoberta – ao longo da série.)

por Adelvan

* * *

(Wikipedia) Dexter é uma premiada série televisiva estadunidense do canal Showtime, exibida desde 2006 nos Estados Unidos, e desde 2007, no Brasil pelo canal FX Brasil, e, em Portugal pela RTP2, FX Portugal, Fox Portugal e Fox Portugal HD.

A série é baseada no livro Darkly Dreaming Dexter, de Jeff Lindsay, e conta a história de Dexter Morgan, um assassino em série que trabalha como analista forense especialista em padrões de dispersão de sangue, no departamento de polícia do Condado de Miami-Dade. Dexter é interpretado por Michael C. Hall.

Nos Estados Unidos, a primeira temporada teve doze episódios e foi exibida de 1 de outubro de 2006 a 17 de dezembro de 2006. A segunda temporada, nos EUA, foi exibida no segundo semestre de 2007 e também contou com doze capítulos.

Valendo-se do fato de ser um expert forense em análise sanguínea e de trabalhar no Departamento de Polícia de Miami, Dexter, de um modo bem meticuloso e sem pistas, mata criminosos que a polícia não consegue trazer à Justiça. A série narra a trajetória de sua vida dupla por meio de flashbacks e, paulatinamente, vai desvelando diversos segredos dos personagens, criando um ambiente de constante suspense.

A série Dexter é baseada nos livros de Jeff Lindsay, que são os seguintes:

  • Darkly Dreaming Dexter (2004)(br: Dexter - A Mão Esquerda de Deus, Editora Planeta, Julho de 2008)
  • Dearly Devoted Dexter (2005) (br: Querido e Devotado Dexter, Editora Planeta, Setembro de 2009)
  • Dexter in the Dark (2007) (br: Dexter no Escuro, Abril de 2010)
  • Dexter by Design (2009)
  • Dexter Is Delicious (2010)

Elenco:

Prêmios:

2006

2007

2010

Indicações:

2006

2007

2008

2009

2010

Robert Crumb tem problemas com as mulheres

Robert Crumb tem problemas com as mulheres – mas quem não tem, incluindo elas próprias? A diferença é que, à maneira própria dos gênios, o artista norte-americano, radicado há décadas na França, transforma suas taras, manias e preferências sexuais em grande arte.

É essa faceta da produção do quadrinista, voltada para o belo sexo, que agora chega às livrarias, no volume justamente intitulado Meus problemas com as mulheres (Conrad). O álbum, em excelente edição de capa dura, surge na esteira da recente avalanche de lançamentos (e relançamentos) do artista que as editoras despejaram no mercado, a fim de aproveitar sua passagem pelo Brasil na última Feira Literária de Paraty, em agosto.

A despeito do pretexto, uma oportunidade comercial, qualquer material de Robert Crumb vem sempre em boa hora. Que dirá um inédito, no qual ele se desnuda (e às suas musas) das formas mais desinibidas e sacanas possíveis.

Efeito “bagageiro” - O negócio de Crumb é um só: mulher grande. Não importa se é loira, morena, negra, judia ou católica (como ele mesmo). Tem que ser voluptuosa. Ou, como ele mesmo descreve no cartum intitulado O corpo feminino perfeito: “Nádegas excepcionalmente grandes, bem carnosas e firmes, com efeito bagageiro”.

Chauvinismo à parte, Crumb poderia muito bem ser brasileiro. Mas a graça maior do livro, além de sua arte espetacular, claro, é a forma hilariante e aberta com a qual ele descreve seus altos e baixos no relacionamento com o sexo oposto. Chega a ser até mesmo meio parecido com Woody Allen, especialmente o do filme Tudo o Que Você Sempre Quis Saber Sobre Sexo (Mas Tinha Medo de Perguntar), de 1972.

Tímido, magrela, reprimido, Crumb começou a fazer sucesso com as mulheres quando iniciou a publicação dos seus quadrinhos (criados à base de muito ácido lisérgico) nas revistas underground dos anos 1960. “Jovens hippies maravilhosas começaram a dar mole pra mim. (...)Fiquei bestificado! Como aquelas garotas podiam gostar de um paspalho como eu?”, escreve, na HQ-título do livro. O resto, como se diz, são várias histórias. Em quadrinhos.

Meus problemas com as mulheres / Robert Crumb / Editora Conrad / 100 p. / R$ 49,90

http://www.lojaconrad.com.br/

por Franchico

Rock Loko

"A Prova de Morte" no Cine Cult


Death Proof ***** - Realização: Quentin Tarantino. Elenco: Kurt Russell, Rosario Dawson, Vanessa Ferlito, Jordan Ladd, Rose McGowan, Sydney Poitier, Tracie Thoms, Mary Elizabeth Winstead, Zoë Bell, Michael Parks, James Parks, Quentin Tarantino, Monica Staggs. Nacionalidade: EUA, 2007.

A cicatriz que marca a cara de Stuntman Mike (Kurt Russell) é o que ele tem de menos inquietante. Dublê de filmes e séries de televisão dos anos 70, ele distrai-se a utilizar o seu carro Chevy Nova “à prova de morte” para matar belas jovens. “Death Proof” é um slasher movie misturado com o típico filme de perseguições. Uma homenagem, tal como “Kill Bill” o tinha sido para os filmes de kung-fu.

Aqui existem mulheres bonitas (uma especial nota para quem tenha um foot fetish) e carros cheios de estilo. As referências aos anos 70 são inúmeras, quer as estéticas, como a fotografia de Brigitte Bardot cuja pose é emulada por Jungle Julia, quer as cinematográficas, como o evidente “Vanishing Point” (1971). Mas, ao mesmo tempo, Tarantino faz questão de se descolar de um tempo fixo, e dá-nos telefones celulares e carros figurantes totalmente atuais.

A estrutura do filme divide-se em duas partes, separadas cronologicamente por alguns meses e por dois grupos diferentes de jovens mulheres. O primeiro é composto por Jungle Julia (Sydney Poitier, filha do actor Sidney Poitier), Arlene (Vanessa Ferlito), Shanna (Jordan Ladd, filha da Charlie’s Angel Cheryl Ladd) e Lanna Frank (Monica Staggs), jovens arrogantes com vontade de beber uns copos, fumar alguma erva e divertirem-se. Do segundo grupo fazem parte Kim (Tracie Thoms), Abernathy (Rosario Dawson), Lee (Mary Elizabeth Winstead) e Zoë (Zoë Bell, a dupla de The Bride em “Kill Bill”, aqui interpretando-se a si mesma), mulheres temperamentais decididas a experimentar as potencialidades de um Dodge Challenger R/T de 1970, o mesmo modelo usado em “Vanishing Point”.

Ainda à semelhança de “Kill Bill”, “Death Proof” é também um filme sobre a vingança. Mas em contraste com exploração sexual típica deste género de filmes, Tarantino dá uma unusual força às mulheres, estabelecendo um ritmo crescente, que vai desde os intensos diálogos (tarantinescos) da primeira parte à intensa acção física da parte final. A violência e o gore assumem aqui um deliberado estilo anos 70, com fotografia granulada, cores gastas, película com riscos, mudanças de bobine e cortes propositados na montagem.

Tarantino rodeia-se de elementos familiares, desde o toque do celular, "Twisted Nerve", de Bernard Herrmann, que acompanhou a arrepiante caminhada de Daryl Hannah em “Kill Bill Vol.1”, até ao carro amarelo com barras pretas, “vestido” exatamente igual a Uma Thurman. Também de “Kill Bill Vol.1” vêm os agentes McGraw, pai e filho interpretados, respectivamente, por Michael e James Parks. As paredes estão repletas de posters, e apetece parar cada frame e analisar com atenção todos os detalhes, sabendo de antemão que todos eles foram pensados com extrema minúcia.

E para quem se canse do carácter ‘self-conscious’ das excessivas referências, ou ache insuficiente a moralidade subjacente do “cá se fazem cá se pagam”, basta deixar-se inebriar pelo sentimento de perigo real providenciado pela incrível perseguição final, onde o CGI não tem lugar e onde Zoë Bell é simplesmente impressionante.

Uma nota ainda para a sempre boa selecção de banda sonora, de onde destaco JEEPSTER dos T-Rex, HOLD TIGHT dos Dave Dee Dozy Beaky Mick and Titch e, para terminar, a viciante CHICK HABIT de April March (versão da música de Serge Gainsbourg “Laisser Tomber les Filles” popularizada por France Gall).

por Rita Almeida

CINERAMA

* * *

É um povo extremamente verborrágico, este que habita os filmes de Quentin Tarantino. A depender de seu estágio mental inicial, se você está pouco disposto a prestar atenção, por exemplo, chega a cansar. Mas se prestar atenção e começar a se deixar envolver pelo clima “nonsense” da coisa, invariavelmente será fisgado. “A Prova de morte” não foge à regra: começa com um longo diálogo entre 4 amigas num carro a caminho de um bar. No bar, mais diálogos, mas aí já notamos que elas estão sendo seguidas, e o “perseguidor” é ninguém menos que Kurt Russel, que também entra no bar e protagoniza mais alguns diálogos impagáveis, especialmente aquele com o qual ele consegue convencer a personagem de Vanessa Ferlito a proporcionar-lhe uma dança sensual exclusiva. E que dança, senhoras e senhores ! Certamente um dos pontos altos do filme e que estava ausente do corte inicial quando em conjunto com “Planeta Terror”, de Robert Rodriguez, para compor o combo “Grindhouse”. “Stuntman” Mike, o personagem de Kurt Russel, consegue convencer uma das freqüentadoras do bar a aceitar uma carona e aí suas reais intenções, antes apenas sugeridas, vêm à tona: “Stuntman” (Dublê) usa um carro adaptado, “à prova de morte”, para matar suas vítimas - ao que tudo indica, sempre garotas gostosas, bem resolvidas e de personalidade forte, daquele tipo que costuma assustar homens inseguros. Depois de matar a moça de forma bem criativa, numa sequencia de dar inveja aos melhores “slash movies”, Mike parte para o ataque às 4 garotas do bar, o que rende uma das melhores cenas de acidente automobilística que meus olhos já tiveram o prazer sádico de presenciar, tudo mostrado nos mais diversos ângulos e em câmera lenta, com direita a pedaços que compunham os outrora deliciosos corpos das beldades se espatifando no chão entre cacos de vidro e metal contorcido. Absolutamente memorável.

Corta! Segunda parte, lado B. Mike sobreviveu (lembre-se que seu carro é “a prova de morte”) e já está na caça de novas vítimas. Mas desta vez as meninas (ou pelo menos 3 delas) não são tão inofensivas quanto ele imaginava, o que gera um final inesperado e caricato ao extremo, capaz de arrancar gargalhadas até mesmo do mais carrancudo dos cinéfilos apreciadores de Jean Luc Godard. De quebra, mais uma cena para ficar nos anais da sétima arte, a da longa perseguição final. Destaque para a presença de Zoë Bell, atriz e dublê neozelandesa que já havia trabalhado com Tarantino em Kill Bill justamente como dublê de Uma Thurman, fazendo o papel dela mesma.

“Death Proof” ganhou muito com o novo corte, e não apenas por conta da cena de “slap dance”, embora esta, por si só, já valesse uma nova “versão do diretor”, caso não tenha sido esta a intenção se por acaso o projeto “grindhouse” não houvesse fracassado. Eu tinha visto apenas a versão em conjunto com “planeta terror”, no computador, e posso atestar que vale muito a pena assitir no cinema e com os tais 17 minutos a mais, que eu diria que são indispensáveis. Vale notar que, apesar do fetiche escancarado em cada frame, Tarantino não trata suas personagens femininas de forma misógina, muito pelo contrário: elas têm personalidade, são espertas e divertidas. É o tipo de mulher que você baba e quer muito comer já no primeiro encontro, mas caso não role e não haja perspectiva de rolar, ainda assim vale a pena ter apenas como amiga.

O filme foi exibido em Aracaju na última (última mesmo*) Sessão Notívagos e vai estrear amanhã no “Cine Cult”, onde deve permanecer em exibição por 15 dias, sempre às 14:00h. Não deixe de ver.

Por falar em Sessão Notívagos, a da noite de 24 de setembro contou com as presenças da Cabedal, excelente combo “samba rock” local, e da banda Do Amor, do Rio de Janeiro. O show da Cabedal foi, como de costume, redondinho e pontuado por excelentes composições próprias complementadas por covers bem sacados. Já a Do Amor surpreendeu os incautos com uma música dançante porém permeada de experimentalismos, chegando a lembrar as bandas pós-punk nacionais dos anos 80 (do tipo Patife Band) em determinados momentos. Para dançar e para pensar, sem perder a ternura e muito menos o bom humor, jamais. Grandes músicas, como “chalé”, “Pepeu baixou em mim”, “Isto é Carimbo” e “shop Chop”, executadas com precisão por um quarteto pra lá de competente, capaz de driblar, inclusive, a única deficiência “apontável” no grupo, a falta de um bom vocalista, no sentido técnico da palavra – porque artisticamente falando eles tiram de letra, adaptando muito bem a estrutura das canções às suas vozes e revezando os vocais entre todos os componentes.

* Será? Espero que não ...

por Adelvan

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Plínio - 50 Motivos para votar nele ...


1. Pela coerência histórica e compromisso de vida inteira com as lutas sociais;

2. Por não ser um candidato de si, mas sim de um partido e de um projeto coletivo;

3. Por conseguir aglutinar uma gama fantástica de apoiadores, intelectuais e lideranças que contribuem com a teoria e prática da transformação social;

4. Por apostar num processo de aglutinação das forças de esquerda para além do 3 de outubro, respeitando sempre as demais organizações e candidaturas anti-capitalistas;

5. Por representar o Partido Socialismo e Liberdade, símbolo de integridade ética e combatividade;

6. Pela capacidade pedagógica de diálogo amplo com a população sobre a necessidade de acabar com a desigualdade social brasileira;

7. Por defender, sem titubear, as lutas dos movimentos sociais independentes;

8. Por ser o único candidato à Presidência que prestou contas ao site Ficha Limpa;

9. Pela autenticidade da candidatura que não esconde a verdade atrás de macetes do marketing;

10. Por guiar a campanha entorno dos temas que interessam à classe trabalhadora, sem alimentar as pautas secundárias do oportunismo eleitoreiro;

11. Por fazer uma campanha apenas com militantes e voluntários;

12. Por apoiar integralmente todas as candidaturas do PSOL;

13. Por ter Hamilton Assis como vice, militante baiano do movimento negro;

14. Por não aceitar dinheiro de empresas para a campanha;

15. Por não fazer alianças com coronéis, banqueiros, latifundiários e empresários;

16. Por ter assinado compromisso com os movimentos de reforma urbana e reforma agrária durante a campanha;

17. Por ter assinado compromisso com a plataforma programática da infância e adolescência da Fundação Abrinq.

18. Por defender a união civil entre pessoas do mesmo sexo e ter assinado compromisso com a luta LGBT;

19. Por denunciar a falta de democracia nestas eleições, também cometidos pela grande imprensa;

20. Por defender a auditoria da dívida pública, com suspensão do pagamento dos juros e amortizações, controle do fluxo de capitais e do câmbio, com subordinação do Banco Central (BC) ao Estado e taxação progressiva das grandes fortunas (acima de R$ 2 milhões);

21. Por defender da reestatização da Vale; contra as privatizações, em especial a dos Correios (não à transformação da EBCT em Correios do Brasil S/A);

22. Por defender a soberania nacional;

23. Por defender o fim da privatização das florestas, a revogação da MP 458, que legaliza a grilagem no campo; o desmatamento zero e o ecossocialismo;

24. Por dar apoio aos povos indígenas, ribeirinhos e das populações tradicionais, e ser contra a construção da hidrelétrica de Belo Monte;

25. Por defender a revitalização e contra a transposição das águas do Rio São Francisco; contra obras que inviabilizam a permanência das comunidades tradicionais da região; a revitalização e implantação de projetos para combater os efeitos da seca;

26. Por defender a Petrobrás 100% estatal; com monopólio estatal da produção e exploração de petróleo; controle estatal e social sobre o pré-sal, com transição para fontes de energia renováveis;

27. Por defender a reforma agrária, os movimentos sociais sem-terra e suas ocupações; a limitação do tamanho da propriedade rural em mil hectares;

28. Por defender o fim do trabalho escravo e infantil;

29. Por defender a segurança alimentar da população, contra os alimentos transgênicos;

30. Pela proposta de reforma urbana; a defesa dos movimentos sociais de sem-tetos e das ocupações; pelo direito à moradia digna; contras as remoções forçadas e por um plano de utilização de imóveis vazios que hoje servem à especulação imobiliária como ponto de apoio fundamental em uma política de habitação popular;

31. Pela defesa do fim da criminalização dos movimentos sociais e da pobreza; anistia a todos os militantes e dirigentes dos movimentos perseguidos com mandatos de prisão, condenações e processo judiciais;

32. Por defender a legalização das drogas culturais e o fim do extermínio da juventude negra e pobre;

33. Por defender a manutenção do direito de greve e fim dos interditos proibitórios; contra o arrocho salarial e o congelamento de salários do funcionalismo; contras as medidas e projetos que visam precarizar, privatizar e destruir os direitos dos servidores e os serviços públicos;

34. Pela defesa do fim do fator previdenciário e defesa da previdência pública;

35. Pelo apoio à demarcação, homologação, titulação e garantia de inviolabilidade dos territórios indígenas, quilombolas e os territórios de matriz africana; combate ao racismo ambiental;

36. Por defender a redução da jornada de trabalho de 40 horas, sem redução de salários; fim da flexibilização da jornada e dos direitos trabalhistas, fim dos bancos de horas;

37. Por defender o salário mínimo proposto pelo Dieese, no valor aproximado de 2 mil reais.

38. Por defender o Plano Nacional de Educação da Sociedade Brasileira e destinação de 10% do PIB para garantir educação pública em todos os níveis;

39. Por defender o fim do modelo de gestão por Organizações Sociais na Saúde e extinção das Fundações privadas na gestão pública; defesa da saúde pública universal, integral e com controle social;

40. Por ter defendido a auditoria da dívida ecológica decorrente dos passivos ambientais provocados pelas grandes indústrias e o agronegócio; utilização do dinheiro do resgate dessa dívida para pesquisa e transição para matrizes energéticas limpas e renováveis;

41. Por defender a reforma política com participação popular, baseada no financiamento público exclusivo de campanha;

42. Por defender a legalização do aborto, pelo fim da criminalização das mulheres;

43. Pela defesa contra o racismo, a homofobia e o machismo;

44. Por ter defendido a democratização dos meios de comunicação; auditoria de todas as concessões das emissoras de rádio e TV; fim da criminalização das rádios comunitárias; anistia aos comunicadores populares; proibição da propriedade cruzada dos meios de comunicação; banda larga universal operada em regime público; criação do Conselho Nacional de Comunicação como instância deliberativa de definição das políticas de comunicação com participação popular; políticas públicas de incentivo à implementação de softwares públicos e livres, ampliando o acesso e a democratização;

45. Por apoiar as experiências em novas iniciativas de economia solidária, cooperativas e associativas;

46. Por defender a retirada das tropas militares do Haiti e sua substituição por contingentes de médicos, técnicos e professores;

47. Por ter defendido a política externa referenciada na soberania brasileira, no combate ao imperialismo e no apoio às lutas e à autodeterminação dos povos;

48. Pelo combate sem tréguas à corrupção institucionalizada no Brasil – defendendo a punição de todos os envolvidos em denúncias de desvios de verbas, cassação de mandatos de parlamentares corruptos, financiamento público exclusivo de campanha.

49. Por ter certeza que os melhores anos de sua vida serão aqueles que estão por vir.

50. Por sua opção pela igualdade.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Dinosaur jr. em Salvador



No último domingo eu vi um dos melhores shows de minha vida: Dinosaur jr. Ao Vivo na Concha Acústica do Teatro Castro Alves, em Salvador, na Bahia. Dá pra acreditar que eu nunca tinha ido na Concha acústica do TCA ? Encravado no Campo Grande, centro da cidade, além de amplo, espaçoso, bonito e com uma excelente estrutura, o local é lendário, um dos melhores e mais democráticos espaços culturais da região. Por lá já passou de tudo, como por exemplo um show do Sepultura em formação "clássica", com Max Cavalera, no início dos anos 90, que alguns de meus amigos Headbangers daqui que foram não cansam de lembrar. Me bati com um brother das antigas, o vocalista da banda punk baiana Injuria, por lá, mencionei que era minha primeira vez na Concha e ele já foi lembrando da primeira vez dele, em 1989, show do Cólera com o Taurus ! Por aí dá pra notar a diversidade e a importancia desses espaço para o cenário não apenas soteropolitano, mas também de todo o nordeste.

Era também a primeira vez do Cidadão Instigado, e Fernando Catatau estava emocionado por isso. Ele já tinha tocada por lá com outros músicos, como Otto, há poucos dias, mas não com a SUA banda, o Cidadão. E foi um show excelente, como não poderia deixar de ser, já que a estrutura era de primeira. Aquele mesmo desfile de pequenas pérolas psicodelicas pontuadas por uma originalíssima sonoridade influenciada pela musica REALMENTE popular brasileira dos anos 70 e 80 - sim, não há como negar, Cidadão Instigado É influenciado por aquele brega clássico (que Catatau prefere chamar de musica romantica), e é sensacional. É como se Odair José tivesse tomado um ácido e tirado uns sons com alguma banda psicodelico/progressiva virtuosa. Destaque para "Deus é uma viagem", com seu clima num "crescendo" que culmina numa espécie de louvação. Acho essa música uma obra-prima - aliás, acho o disco "Uhuu" um dos melhores (senão o melhor) do rock brasileiro dos últimos tempos. Rock mesmo, brasileiro, mas ROCK - "Viva a resistencia roqueira no Brasil", gritou Catatau numa certa altura. Excelente.

Antes do Cidadão teve A BANDA DE JOSEPH TOURTON. Legal. Bons musicos, boas intenções (musica instrumental experimental), mas falta composição. Não me ofendeu, mas também não empolgou.

Mas a gente estava lá para ver o Dinosaur jr. Vimos, e ouvimos. Ouvimos muito. Muito alto. Foram precedidos pela montagem de duas paredes de amplificadores, com a mítica marca "Marshall" reluzindo na maioria deles. Isso num pequeno intervalo pontuado pela versão reggae do Dark side of the moon cometida pelo Easy Star All-Stars nos alto-falantes e algumas entrevistas pessimamente conduzidas por um entrevistador ridiculo que parecia ter caido de para-quedas no evento nos telões. Mas quando entraram no palco, entraram "com gosto de gás", como costumamos dizer por aqui. Quer dizer, não entraram correndo, nem saudando a galera aos gritos de "Huhuu" ou coisas do tipo. Apenas entraram, ligaram seus instrumentos e começaram a triturar, sem dó nem piedade, nossos tímpanos. E nós gostamos, muito. O ritual de sado-masoquismo sonoro começou com uma faixa de "Green mind", aquela que no disco tem uma flautinha bacana criando um clima (acho que é "thumb" - perdão por não saber o nome com precisão, sou apenas um "jornalista amador"). Perfeito. Deu o tom do que seria o restante da apresentação: Displicente, porém super eficiente. Displicencia é, aliás, a marca registrada não tanto da banda em si, mas de seu líder, J. Mascis. Enquanto Lou Barlow se acabava batendo cabeça enquanto espocava as cordas de seu contra-baixo no lado direito do palco e o baterista batia sem dó nem piedade em suas peles, Mascis apenas ligava suas fender Jazzmaster no talo e nos emocionava com aquelas belas melodias saídas de sua voz preguiçosa. Barlow arriscou uns "obrigados" em bom português, Mascis falou alguns "thank you" numa vozinha afetada, em tom de brincadeira, e foi isso. A comunicação com o público foi através da música. Só clássicos, como prometido. "The Wagon", "I Feel the pain" e "over it", aquela do sensacional videoclipe deles andando de Bike e skate, foram as vencedoras na categoria "recepção entusiasmada" por parte dos presentes. De minha parte, me emocionou bastante a execução de "out there", do "Where you been", disco com o qual eu e quase todo mundo com mais de 30 aqui no Brasil foi apresentado ao som da banda, já que foi o primeiro a ser lançado em terras tupiniquins, em plena "era do grunge". Para o bis, apenas dois sons. Encerraram com o excelente cover de "just like heaven", do the cure. Aliás, nunca vi um final de show tão abrupto. Pararam de sopetão, agradeceram com um "thank you" apressado e caíram fora. Pode ter dado a impressão aos desavisados de que eles não estavam felizes por estar ali. Pode até ser que eles realmente não estivessem felizes por estar ali - o que eu acho difícil - mas não importa: Eu estava feliz, meus amigos estavam felizes e as pessoas ao nosso redor também pareciam bastante satisfeitas. Voltamos pra casa felizes e eu estou feliz até agora, digitando isso aqui pra você. Espero que você tenha ficado feliz depois de ler.

por Adelvan, uma pessoa feliz.

PS 1: Ah, comprei uma camiseta linda, azul, com a estampa da capa do Farm. Estou usando-a, feliz, nesse exato momento.

PS 2: As fotos Ao Vivo são do show no Recife.


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para qem não viu ainda:

Porque você deveria ir ver os shows do Dinosaur jr. no Brasil

Texto feito por Tiago Marditu, jornalista, músico e profundo conhecedor da obra do Dinosaur Jr ...

Qualquer roqueiro sabe, ou, ao menos, deveria saber, da importância de estar sábado no teatro da UFPE, ou no shows de São Paulo e Salvador que rolam por esses dias. “Ah, você está se referindo a edição desse ano do Festival Coquetel Molotov“, diria você, leitor antenado. Sim, mais especificamente de um show: o do Dinosaur Jr.

Mal comparando, assistir ao show do Dinosaur Jr agora é uma oportunidade imperdível para qualquer fã de rock dos anos 90, assim como assistir ao Deep Purple , na tour que passou pelo Brasil em 2003, foi imperdível para os admiradores do rock do anos 70. Só que, nesse caso em especial, a jurássica banda dos 90 (ou dos 80, já que ela foi formada em 1983 e lançaram seus três primeiros discos nos idos anos 80) voltou com sua formação original – J. Mascis, na guitarra e vocal, Lou Barlow, no baixo e vocal, e Murph na bateria – e, pasmem, vem lançando grandes discos e fazendo shows muito bem cotados por público e crítica especializada. Tente imaginar quantos outros artistas se encontram na mesma situação, obtendo resultados igualmente efetivos. Eu sei, são poucos mesmo.

Se isso ainda não te emocionou, saiba que estamos tratando, acima de tudo, de uma banda que, não só foi responsável por cunhar o rock alternativo dos anos 80/90, mas que hoje também tem a função de preencher algumas lacunas do gênero, que, saudavelmente, diga-se de passagem, incorporou novos elementos que o afastaram de suas origens básicas. O Dinosaur Jr ainda se mantém firme e forte com seu rock melódico, enérgico e barulhento, com raízes fincadas tanto no punk/hardcore oitentista, como no country rock dos primeiros discos do The Byrds e no hard rock de um James Gang. Uma banda de alma rústica, caipira por essência.

Como não se não se admirar com um grupo que teima em fazer uso ostensivo da guitarra e que ficou conhecida por causa dos solos desse instrumento. Sim, solos de guitarra, o ápice da indulgência rockeira; solos esses que aparecem aos montes em suas músicas, longos, quase intermináveis, sempre empapuçados de distorção e sujeira acima da média. Em priscas eras, isso já era uma verdadeira heresia para uma banda com passado hardcore (leiam mais sobre isso abaixo) e que estava fomentando um estilo de música que também viria a abolir firulas nas 6 guitarras e nos demais instrumentos. Hoje em dia, o grupo empunha de forma natural essa tradição que pode, e deve conviver em paralelo com as mais diversas novidades sonoras.

Difícil ao menos não respeitar a figura de J Mascis, um dos grandes guitar heroes do rock underground americano, que mostrou que garotos tímidos e estranhos também poderiam formar grandes bandas de rock. Com seu vocal anasalado, sua postura distanciada e letras quase sempre melancólicas, se tornou ídolo de uma geração que hoje se encontra na faixa de 30/40 anos e ainda encontra nicho em um público bem mais jovem, que claramente se identifica com o espírito adolescente presente na música de sua banda.

Tendo em vista tudo dito acima, nem é preciso salientar a obrigatoriedade de estar presente, hoje à noite, no teatro da UFPE, no caso de Recife. Caso ainda resta alguma dúvida, talvez isso seja a constatação de que você envelheceu muito mais do que deveria.

Dinosaur (1985): Como na maioria dos discos de estréia, a banda ainda estava procurando sua identidade. Em alguns momentos, dá para perceber que havia uma certa dificuldade, de um molde para um razoavemente extenso leque de influências. Rola um flerte com o pós-punk (“Pointless”) e chegam a soar como um Mission of Burma lo-fi em “Gargoyle”. A hard rokeira “Mountain Man” é um dos destaques, com direito a uma passagem descaradamente hardcore e vocais “demoníacos” no finzinho da música. O grande lado negativo fica por conta da péssima produção que deixou as canções sem o punch necessário, arrematando ainda o fato da performance da banda ainda estar aquém do que eles viriam demonstrar nos trabalhos seguintes.

You’re Living Over Me (1987): A obra prima do grupo, ponto final. Discoteca básica para qualquer um que deseja entender o tal do rock alternativo dos anos 90. A produção ainda é vacilante em vários pontos, mas o repertório presente faz isso se tornar quase irrelevante. Das 10 músicas presentes, 8 poderiam estar tranquilamente em um “Best of” da banda, o que não é pouca coisa – a acústica e estranha “Poledo”, de autoria de Barlow, é bem bacana, mas está mais para um protótipo de algo Sebadoh do qualquer outra coisa, e a última é um impagável cover de “Show Me The Way”, de Peter Frampton. Os característicos momentos em que os decibéis correm soltos começam a se mostrar bem mais presentes, assim como um maior cuidado com as melodias e refrões.

Bug (1988): Disco que está pau a pau com You’re Living Over Me, perdendo talvez por alguns décimos. Finalmente a banda se encontra. O famoso paredão guitarrístico da banda aparece forte como nunca. A faixa de abertura, “Freakscene”, é considerada a música mais representativa da banda, trazendo à tona todos os elementos característicos do trio: riff pegajoso, o vocal semidesafinado de J cantando uma melodia certeira, energia saindo pelo ladrão e o esperado momento “guitar freakout”. Apesar de tudo isso, J nunca escondeu o fato desse ser o disco da banda que ele menos gosta – possivelmente isso se deve às brigas intermináveis que ocorreram durante a gravação do mesmo, culminando na saída de Barlow da Dinosaur Jr.

Green Mind (1991): Talvez como forma de exorcizar o stress do disco anterior, a banda, agora resumida a um duo (Murph e J, que,além das guitarras, gravou todos os baixos), resolveu caminhar pra um direcionamento mais tranquilo e menos ruidoso. Até as faixas mais agitadinhas, como “Blowing It” e “The Wagon”, são um tanto quanto mais serenas se comparadas as dos discos anteriores. Uma forte atmosfera country rock pode ser sentida aqui, ratificando ainda mais a capacidade da banda de fazer grandes canções.

Where You Been (1993): Todo fã com mais de 28 anos tem grande carinho pelo Where You Been, pois provavelmente foi com esse disco seu primeiro contato com a música do grupo. O ex-baixista da banda de Mark Lanegan, Mike Johnson, é efetivado no grupo. A despeito das sempre eficazes linhas de baixo de Barlow, Johnson era um músico com maiores predicados e acrescentou uma certa dose de sofisticação ao som da banda. O batera Murph também teve um desempenho dos mais inspirados. Esse talvez seja o disco onde as referências de rock setentistas estejam mais presentes.

Without a Sound (1994): Uma continuação natural do Where You Been, talvez um pouco mais diversificado musicalmente e contendo ótimos momentos, vide “Grab It”, “Yeah Right“ e “Fell The Pain”. Quem dessa vez saiu da banda foi Murph, cansado das desavenças com o gênio forte de J – aliás o próprio resolveu assumir as baquetas – em priscas eras, antes de partir para a guitarra, ele era baterista – e fez um grande trabalho.

Hand Over It (1997): O disco mais atípico do Dino Jr. Em algums momentos, teclados, trompetes e arranjos de corda se destacam mais que as guitarras. Mas isso não quer dizer que elas não apareçam; elas estão lá, mais ruidosas do que nunca. Pode-se até dizer que esse é o disco mais shoegazer da banda – por falar nisso, Kevin Shields e Bilinda Butcher, dos shoegazers-mores, My Bloody Valentine, fazem backing vocals em algumas faixas.

Beyond (2007) e Farm (2009): Os dois últimos discos da banda trazendo de volta sua formação original podem caber em um mesmo lugar: há poucas diferenças estéticas entre ambos e neles o power trio está mais afiado do que nunca, mostrando um vigor sonoro impressionante. Ao fazer um “back to the basics”, buscando a sonoridade dos primeiros discos, somada a toda carga obtida com os anos de estrada, o resultado final obtido foi bem acima do esperado. Músicas como “Been There All The Time”, “Pick Me Up”, Amost Ready” (do Beyond),“Over It”, “I Want You To Know” e “Plans” (do Farm) estão entre as melhores coisas que eles já fizeram em toda sua trajetória.

Fonte: altnewspaper

sábado, 25 de setembro de 2010

A Arte de Gil Vicente

A 29ª Bienal de São Paulo abriu na terça-feira, 21, com uma polêmica ao redor do trabalho de Gil Vicente. O artista brasileiro expõe uma série de 10 desenhos chamada "Inimigos" nos quais ele está apontando uma arma para 10 líderes mundiais, incluindo o atual presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, e o ex-presidente brasileiro Fernando Henrique Cardoso.

"Eu tive uma decepção muito grande com o Lula", declarou artista. Para Vicente, desvio de verbas é "o mesmo que terrorismo". "O dinheiro roubado durante oito anos de governo daria para resolver todos os problemas do estado", avaliou. Graças a sua descrença com a política atual, do Brasil e do mundo, Vicente decidiu deixar claro o seu sentimento com a obra.

Bienal de SP tem foco na política - Em todos os quadros é o próprio artista quem executa o político. "Meu trabalho é movido por uma coisa interior, não é intelectual, mas nesse caso eu tinha uma mensagem explícita. Tomei o cuidado de fazer o desenho de forma legível, não queria que fosse uma charge ou que tivesse estilizações", explicou o artista. Os quadros também não têm fundo e são em tamanho real para causar mais impacto em quem vê.

Apesar de Vicente ter sua obra reconhecida pela organização da Bienal, outras pessoas acreditam que a mensagem dele não deve ser transmitida. O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo (OAB-SP), Luiz Flávio Borges D’Urso, enviou um ofício para o Ministério Público (MP) pedindo que seja apurada a existência de apologia ao crime na obra. Os curadores da Bienal, Agnaldo Farias e Moacir dos Anjos, declararam que não pretendem retirar a obra.

* * *

GIL VICENTE Vasconcelos de Oliveira
Recife, 1958
Vive e trabalha em Recife

www.gilvicente.com.br

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Lula, o "filho do Brasil"

Dia desses estava assistindo a mais uma sensacional entrevista com Plínio de Arruda Sampaio na internet quando ele citou um episódio curioso para ilustrar a deficiência da educação no Brasil. Segundo seu relato, foi convidado a fazer uma palestra num colégio e num dado momento, quando estava chamando Lula de "segundo Getulio", notou que ninguém parecia estar entendendo nada. Perguntou quem ali sabia quem foi Getulio Vargas e só duas ou três mãos levantaram num auditório lotado.

A comparação é pertinente. Assim como com Getulio, é impossível fazer, de forma sensata, um julgamento fechado sobre a figura do nosso ilustre operário-presidente. Eu, particularmente, acho que Getulio Vargas foi o maior presidente da História do Brasil. O responsável pela industrialização de base do país, pela implementação das leis trabalhistas, do monopolio da exploração do petróleo, dentre muitos outros feitos memoráveis. Ao mesmo tempo, foi um ditador brutal, simpatizante do fascismo e dado ao culto à personalidade. Lula é o maior presidente do Brasil desde Getulio, mas não tanto pelas qualidades do seu governo em si, e mais pela mediocridade e/ou insensibilidade de seus antcessores quanto aos clamores populares. A excessão que se costuma fazer é a Juscelino Kubitschek, mas eu discordo. Juscelino foi o principal responsável pela inserçaõ no Brasil de um modelo de desenvolvimento atrelado às grandes corporações multinacionais, notadamente no que se refere à produção de automóveis. Foi em seu governo que se desenhou um dos maiores erros estratégicos de nosso país em termos de planejamento econômico, a priorização do transporte rodoviário em detrimento do ferroviário. Fora isso, construiu Brasilia, esse enorme desperdicio, um gigantesco monumento ao nada. João Goulart não governou, ficou só nas boas intenções e de boas intenções, todos sabemos, o inferno está cheio. Tirando os mandantes do Regime Militar, evidentemente, o que tivemos? Janio Quadros era um lunático, Collor ainda pior, Sarney foi uma tragédia, Itamar, foi Itamar, e Fernando Henrique Cardoso ... Bem, há controvérsias, mas eu acho a presidencia de FHC desastosa. Foi nela que o Brasil mergulhou na aventura neo-liberal, dilapidando seu parimonio público. A inflação foi domada, na saúde foram criados os medicamentos genéricos e implantou-se um exemplar programa de combate à AIDS, referência em todo o mundo, e só. Todos os demais indicadores são péssimos, sem falar que o Brasil foi à bancarrota umas duas ou três vezes. Só não fechou as portas por falência porque, ao contrario do que reza o credo neo-liberal, um país não é uma empresa.

Lula também é dado a "cultos à personalidade". O filme que conta sua história acaba de ser indicado como representante do Brasil na corrida pelo oscar. Sem comentários. Já com relação à chamada "imprensa golpista", não acho que ele esteja totalmente equivocado, tendo em vista que são muitos os interesses em jogo e não dá pra acreditar na suposta "isenção" dos meios de comunicação, todos comprometidos com a manutenção do "status quo" do qual há tempos se beneficiam. Mas também não dá pra ser ingênuo ao ponto de não notar que "há algo de podre no reino da Dinamarca". Sempre há. "Enxergar o que acontece embaixo de nossos narizes exige um esforço constante", disse uma vez George Orwell. Desconfie, sempre. De todos.

Desconfianças à parte, não deixo de achar sensacional a capa de hoje do Jornal Extra, do Rio de Janeiro, que reproduzo ao lado. Reproduzo também uma recente entrevista de Lula ao Portal Terra.

É isso.

A.


* * *

Lula: "nove ou dez famílias" dominam a comunicação no Brasil - Para Lula, imprensa tem candidato e partido.

A três meses e meio do término de seu governo, o presidente Lula está certo da vitória de sua candidata à presidência da República, Dilma Rousseff, mas recomenda: "cautela". Numa conversa exclusiva de uma hora com o Terra no Palácio do Planalto, Lula, provocado, esmiúça o que pensa da mídia e sobre a mídia. Diz que, de alguma forma, o país tem, terá que discutir e legislar - no Congresso, ele ressalva - sobre o assunto. Para definir como percebe o olhar da chamada grande mídia, Lula resume:

-Eles têm preconceito, até ódio...

A ênfase, a contundência no julgamento e comentários quando o tema é este, mídia, são permeadas por gestos e palavras que mostram um presidente da República disposto e pronto para o próximo comício. Bem humorado, carregado de adrenalina. Antes do início da entrevista, Lula quer conversar, diluir ansiedades e tensões.

"Baby...", diz a um jornalista, "pô, que gravador é esse, não tinha um digital?", provoca outro. Segura a gravata de um terceiro, parece admirar o tecido, os desenhos, e opina:

-Mas essa gravata... esses desenhos parecem uma ameba!

O presidente da República faz as honras da casa, pede que se sirva um cafezinho, uma água antes de, atraído para o tema, partir para o ataque:

- Na campanha passada, os caras diziam porque o avião do Lula... porque o Aerolula... (Estavam) disseminando umas bobagens... vai despolitizando a sociedade. Agora, estão dizendo que a TV pública é a TV do Lula. Nunca disseram que a TV pública de São Paulo é do governador de São Paulo e as outras são dos outros governadores...

Para Lula, críticas à falta de liberdade na área de comunicação, mais do que injustas, não têm sentido. Ele diz duvidar que outros países tenham mais liberdade de informação do que o Brasil:

-Nesse momento do Brasil, falar em falta de liberdade de comunicação? Eu duvido. Eu quero até que vocês coloquem em negrito isso aqui. Eu duvido que exista um país na face da Terra com mais liberdade de comunicação do que neste País, da parte do governo.

O presidente se mostra disposto a um duro embate com setores da mídia: - A verdade é que nós temos nove ou dez famílias que dominam toda a comunicação desse País. A verdade é que você viaja pelo Brasil e você tem duas ou três famílias que são donas dos canais de televisão. E os mesmos são donos das rádios e os mesmos são donos dos jornais.

"No Brasil - foi o Cláudio Lembo que disse isso para o Portal Terra -, a imprensa brasileira deveria assumir categoricamente que ela tem um candidato e tem um partido. Seria mais simples, seria mais fácil. O que não dá é para as pessoas ficarem vendendo uma neutralidade disfarçada", cobra Lula.

O presidente sinaliza que mudanças nessa área deverão ser discutidas no Congresso Nacional e poderão ser viabilizadas no próximo governo:

-O Brasil, independentemente de que de quem esteja na Presidência da República, vai ter que estabelecer o novo marco regulatório de telecomunicações desse País. Redefinir o papel da telecomunicação. E as pessoas, ao invés de ficarem contra, deveriam participar, ajudar a construir, porque será inexorável.

Terra - Presidente, em 1978 o senhor era um líder operário, estava na Bahia em um encontro de petroleiros, no Hotel da Bahia, eu era um estudante de comunicação, ainda tinha AI-5, censura à imprensa. Na década seguinte, nos anos 80 e 90, em inúmeras conversas com o senhor o assunto acabava de alguma forma passando pelo monopólio na mídia. No ano 2002, na véspera da eleição, de novo conversamos sobre isso. Em 2006, a uma semana do senhor ser reeleito presidente, numa conversa o senhor disse que não iria "tirar nada" de ninguém, que isso não seria democrático, mas que a ideia era redistribuir meios, ajudar os meios, ter uma maior diversidade de opinião. Chegando agora, nesta reta final (em 2010) o senhor tem feito críticas duras, dizendo que a imprensa, a mídia tem um candidato e não tem coragem de assumir e, ao mesmo tempo, o contraditório diz que existiria um Projeto Político, projeto vocalizado outro dia pelo José Dirceu, para "enquadrar meios de comunicação". Então, queria que o senhor dissesse o que o senhor realmente pensa disso, e se realmente existe uma expectativa, se existe alguma coisa em relação a isso...
Luiz Inácio Lula da Silva - Olha, primeiro, na nossa passagem pela Terra... não pelo Terra, pela Terra, a gente ouve coisas absurdas, que a gente gosta e que a gente não gosta. Veja, qualquer coisa nesse País tem o direito de me acusar de qualquer coisa. É livre. Aliás, foi o PT que, no congresso de São Bernardo do Campo, decidiu que era proibido proibir. Era esse o slogan do PT no congresso de 1981.

Terra - O Caetano vai dizer que é dele...
O que acontece muitas vezes é que uma crítica que você recebe é tida como democrática e uma crítica que você faz é tida como antidemocrática. Ou seja, como se determinados setores da imprensa estivessem acima de Deus e ninguém pudesse ser criticado. Escreveu está dito, acabou e é sagrado, como se fosse a Bíblia sagrada. Não é verdade. A posição de um presidente é tomada como ser humano, jornalista escreve como ser humano, juiz julga como ser humano. Ou seja, temos um padrão de comportamento e julgamento e, portanto, todos nós estamos à mercê da crítica. No Brasil - , e foi o Cláudio Lembo que disse para o Portal Terra -, a imprensa brasileira deveria assumir categoricamente que ela tem um candidato e tem um partido, que falasse. Seria mais simples, seria mais fácil. O que não dá é para as pessoas ficarem vendendo uma neutralidade disfarçada. Muitas vezes fica explícita no comportamento que eles têm candidato e gostariam que o candidato fosse outro. Tiveram assim em outros momentos. Acho que seria mais lógico, mais explícito. Mas, eles preferem fingir que não têm lado e fazem críticas a todas as pessoas que criticam determinados comportamentos e determinadas matérias.

Terra - Então, não existiria nenhum projeto futuro...
Se existir uma idéia, ela será discutida pelo próximo governo. Pelos próximos governos. Ela será decidida pelo Congresso Nacional , porque é impossível você imaginar fazer uma coisa que discuta comunicação se você não passar pelo Congresso. Quando nós tomamos a decisão de fazer a Conferência da Comunicação - nós já fizemos conferências de tudo que você possa imaginar, até de segurança pública -, quando fizemos a Conferência de Comunicação, alguns setores das comunicações participaram, algumas tevês participaram, algumas empresas telefônicas participaram e muitos jornais participaram. Ela foi feita a nível municipal, a nível estadual e nível nacional. Determinados setores da imprensa não quiseram participar e começaram a achar que aquilo era antidemocrático, que aquilo era não sei das contas. Eu não sei qual é a preocupação que as pessoas têm de a sociedade discutir comunicação. Uma legislação que está regulamentada em 1962. Portanto, não tem nada a ver com a realidade que nós temos hoje, com os meios de comunicação que nós temos hoje. Com a agilidade da internet, por exemplo. Então, o que nós achamos é que o Brasil, independentemente de quem esteja na Presidência da República, vai ter que estabelecer o novo marco regulatório de telecomunicações desse País. Redefinir o papel da telecomunicação. E as pessoas, ao invés de ficarem contra, deveriam participar, ajudar a construir, porque será inexorável. Ninguém tinha a dimensão há 15 anos atrás do que seria a internet hoje. Ninguém tinha. Ninguém tem a dimensão ainda do que pode ser a TV digital. E a pluralidade que ela pode permitir de utilização dos canais de televisão. Então, discutir isso é uma necessidade da nação brasileira. Uma necessidade dos empresários, dos especialistas, dos jornalistas, ou seja de todo o mundo para ver se a gente se coloca de acordo com o que nós queremos de telecomunicações para o futuro do País.

Terra - Como essa discussão quase sempre se dá em meio a campanha, a gente não tem a oportunidade de falar assim tão claramente. O que mais incomoda o senhor: é a cobertura (ser) crítica de um lado e não existir a investigação sobre os demais candidatos? Seria isso?
Não, não. Veja, Bob você me conhece há muito tempo e sabe o que eu tenho afirmado. Só existe uma possibilidade no meu governo de alguém não ser investigado. É não cometer erro. Se cometer erro, tem de ser investigado. Isso vale para todo mundo. Agora, eu acho que a imprensa presta um papel importante.

Terra - O senhor está dizendo que ela é desequilibrada? Só está cobrindo um lado e não está cobrindo...
É que eu acho que a imprensa está cumprindo um papel importante quando ela denuncia. Por que? Ou você sabe porque alguém denunciou, ou você sabe porque alguém cobriu ou você sabe porque saiu na imprensa. Quando sai alguma coisa na imprensa você vai atrás. Você vai, então, apurar. De tudo aquilo que é uma feijoada, o que é feijão, o que é carne, o que é costela, o que é carne seca. Você vai separar as coisas para saber o peso de cada uma. E é exatamente o que a gente faz nesse governo. Ou seja, eu vou te dar um exemplo, sem citar jornal. Na campanha passada, os caras diziam, "porque o avião do Lula...", porque o Aerolula... Passando para a sociedade, disseminando umas bobagens, vai despolitizando a sociedade. Agora, estão dizendo que a TV pública é a TV do Lula. Nunca disseram que a TV pública de São Paulo é do governador de São Paulo e as outras são dos outros governadores. Agora, uma TV para um presidente que está terminando o mandato daqui a três meses, é a TV Lula. Ou seja, esse carregamento de...composto de ...de muita ...de muita, eu diria, de muito preconceito ou de muita até, eu diria até, às vezes, ódio, demonstra o que? O velho Frias (Octavio Frias de Oliveira, publisher da Folha, falecido em abril de 2007) me dizia: "Lula, o pessoal do andar de cima não vai permitir você subir lá...". Quem me dizia isso era o velho Frias repetidas vezes: "Lula, cuidado, o pessoal do andar de cima não vai permitir você chegar naquele andar...". Sabe? Então, o pessoal se comporta como se o pessoal da Senzala tivesse chegando à Casa Grande. E ficam transmitindo uma coisa absurda. Nesse momento do Brasil, falar em falta de liberdade de comunicação....? Nesse momento do Brasil! Eu duvido, duvido. Eu quero até que vocês coloquem em negrito isso aqui: Eu duvido que exista um país na face da Terra com mais liberdade de comunicação do que neste País, da parte do governo. Agora, a verdade é que nós temos nove ou dez famílias que dominam toda a comunicação desse País. A verdade é essa. A verdade é que você viaja pelo Brasil e você tem duas ou três famílias que são donas dos canais de televisão. E os mesmos são donos das rádios e os mesmos são donos dos jornais...

Terra - Nos municípios, isto tem uma capilaridade: o chefe político tal...
Então, muita gente não gostou quando, no governo, nós pegamos o dinheiro da publicidade e dividimos para o Brasil inteiro. Hoje, o jornalzinho do interior recebe uma parcela da publicidade do governo. Nós fazemos propaganda regional e a televisão regional recebe um pouco de dinheiro do governo. Quando nós distribuímos o dinheiro da cultura, por que só o eixo Rio-São Paulo e não Roraima, e não o Amazonas, e não o Pernambuco, e não o Ceará receber um pouquinho? Então, os homens da Casa Grande não gostam que isso aconteça.

Terra - A propósito de "Casa Grande", sociologia etc..., na semana passada um importante sociólogo, Fernando Henrique Cardoso, evocou Mussolini ao se referir ao senhor como chefe de uma facção. Chegando ao final desses 16 anos (governos FHC e Lula), o senhor acha que ainda existe...
Eu acho que, sinceramente, as pessoas deveriam olhar para o Brasil e olhar para os outros países. E todo o mundo deveria agradecer a Deus o Brasil ser do jeito que ele é, o Brasil ter o governo que ele tem e ter o povo que tem. Eu lembro que o João Roberto Marinho, quando voltou da eleição do México passada, numa conversa que teve comigo falou: "Ô presidente, eu estava no México e foi de lá que eu aprendi a valorizar a democracia no Brasil. Porque, aqui no Brasil, todo mundo acata o resultado. Lá no México, eu vi um milhão de pessoas na rua contra o resultado eleitoral". Ou seja, aqui no Brasil nós não corremos esse risco. Porque esse País tem um outro jeito de exercitar a democracia. E a democracia ela só será exercitada - vocês estão lembrados que eu dizia quando era líder sindical ainda -, democracia não é o povo ter o direito de gritar que está com fome, democracia é o povo ter direito de comer. Nós estamos chegando lá, estamos chegando lá, então as pessoas, sabe, que talvez tenham problemas ideológicos, problemas de preconceito, ou seja, que não admite que...meus queridos, vejam o que vai acontecer amanhã, sexta-feira; a Bovespa, que tinha ódio de mim, e quando tinha medo de mim ela tinha apenas 11 mil pontos, hoje já chegou a 72 (mil pontos), já chegou a 68 (mil pontos). Ou seja, acima dos 60 mil pontos. E vai exatamente um presidente da República, que tanta gente tinha medo, fazer a maior capitalização da história da humanidade. Ouso dizer: nunca antes na história do planeta Terra houve uma capitalização da magnitude do que vai acontecer na sexta-feira, sabe, com a minha presença.

Terra - E isso lhe dá um prazer especial?
Me dá. Me dá um prazer especial porque é um sucesso do Brasil, é um sucesso da Petrobrás, é um sucesso do investimento em tecnologia, é um sucesso de acreditar neste País. Mas na verdade é o sucesso da ascensão do Brasil no mundo. Ou seja, quem acompanha a imprensa internacional percebe que hoje nós ocupamos na imprensa internacional num mês aquilo que a gente não ocupava em três décadas, há pouco tempo atrás. Porque no Brasil, as pessoas precisam aprender uma coisa: ninguém respeita quem não se respeita. E muita gente do Brasil costumava chegar nos Estados Unidos ou na Europa de cabeça baixa, se achando um ser inferior.

Terra - Tirava o sapato...
É. Eu, quando eu tomei posse, disse para os meus meninos: se alguém tirar o sapato, se eu souber, porque também não vou, não estou com eles, mas também se chegar lá para tirar o sapato é melhor vir embora. Porque eu mando embora. A única coisa que eu acho que vai acontecer lá é o seguinte: o Brasil vai sair mais honrado deste processo, o Brasil vai sair mais forte e não vai ser o Lula que vai ganhar, o Lula está fora disso em dezembro, meu filho.

Terra - O senhor está se referindo a isso por causa da pergunta, Mussolini...?
É, por causa disso, ou seja, eles confundem populismo com popular. Eles não sabem o que é popular porque eles nunca tiveram perto do povo. Essa gente, essa gente que não gosta de mim, na época das eleições até sorri pros pobres, até fazem promessa pros pobres, mas depois das eleições... o pobre passa perto deles um quilômetro. Então, sabe, isso é uma confusão maluca entre o populismo e o popular. O que é o populismo? É um cara, sabe, que não tem nada a ver com ninguém e aparece fazendo promessas, aparece fazendo política demagógica. Não é o nosso caso. Todas as políticas minhas são decididas, Bob... Já foram 72 conferências nacionais, conferências que começam lá no município, vai para o Estado e vem pra cá. Algumas conferências participaram 300 mil pessoas até chegar na conferência nacional. E aí nos decidimos as políticas públicas. Então eles...obviamente eu acho que tem muita gente incomodada e eu não tenho culpa, eu não tenho culpa. Sabe, tirar deles incomodou muita gente no Brasil. A Coroa Portuguesa durante muito tempo ficou incomodada por conta daqueles que diziam que era preciso mudar. Ficaram incomodados até com Dom Pedro quando ele quis mudar. Por que não ficar comigo?

Terra - O Brasil mudou e eu faço a seguinte pergunta, quer dizer, a política brasileira mudou? O senhor antigamente falava muito em reforma política, que era uma das bandeiras e hoje a gente vê os partidos enfraquecidos. Como o senhor avalia hoje a política, a necessidade da reforma política e um adendo: em uma viagem ao Pará, nas vésperas da eleição passada, em um vôo o senhor disse na entrevista que uma das suas primeiras medidas que o senhor tentaria seria a reforma política. Por quê não saiu? Por que é tão difícil de fazer?
Porque a reforma política não é uma coisa do presidente da República. A reforma política é uma coisa dos partidos políticos. E do jeito que os partidos se comportam parece que a gente tem um monte de partidos , todos criticando, sabe, a legislação que regulamenta a política no Brasil. Todo mundo quer uma reforma política, mas ninguém mexe. Porque desagrada a muita gente. Então, veja, eu mandei duas propostas de reforma, de coisas que precisariam mudar para poder melhorar a política brasileira e que não foi votado. Nós mandamos, por exemplo, a regulamentação do financiamento de campanha, para acabar com o financiamento privado e ficar com financiamento público, que na minha opinião é a forma mais honesta de se fazer campanha neste País, a fidelidade partidária... porque o que é o ideal? É você ter partido forte para você negociar com partido. Isso faz parte da democracia. Quando você faz coalizão com partido político você estabelece regras nesta coalizão, você partilha um poder com essa coalizão. Agora, do jeito que está é quase que impossível, porque a direção dos partidos não representa mais os partidos. O líder da bancada não representa mais a bancada, ou seja se criou grupos de deputados, grupos por região, grupos...ou seja, e está muito difícil para eles próprios...então, o que eu acho? Quando eu deixar a presidência, eu quero, primeiro dentro do PT, convencer o PT da necessidade de fazer uma reforma política, convencer os partidos da base aliada do governo da necessidade de se fazer uma reforma política neste País pra que a gente não fique com legenda de aluguel, como nós temos agora.

Terra - Na semana passada, o Lembo disse até naquela entrevista, primeiro que a oposição vai estar em frangalhos nas urnas e ele é do DEM, e que na verdade não vão existir praticamente partidos, só o movimento social e que seria liderado pelo senhor. O senhor concorda?
Eu não concordo porque eu não sou líder do movimento social, eu sou um dirigente partidário. O movimento social tem suas lideranças próprias. Agora, eu acho que...eu não concordo com o Lembo que não tenha partido político, o PT é um grande partido político. Nas pesquisas da opinião pública, o PT aparece com 30% de preferência em qualquer pesquisa que se faça. Demonstração de que isso é um partido, sabe, como poucas vezes no mundo você teve um partido assim, você teve um PRI, um partido comunista mexicano que era extremamente forte e aí sim era populismo, você tinha um partido comunista italiano que tinha 30% dos votos e que era um baita de um partido na Itália, embora nunca tenha chegado no poder, você tinha a social democracia que revezava o poder em uma parte da Europa, os socialistas franceses que revezavam. E você tem no Brasil o PT que é um partido organizado nacionalmente e muito forte. Agora, eu acho que as reformas, elas se darão por dentro dos partidos políticos, dentro do Congresso Nacional. E ela se dará porque nós não precisamos ter uma legenda que aluga na época da eleição, que tem horário de televisão...

Terra - Tiririca é um símbolo disso?
Veja, eu acho...eu não sou contra...

Terra - Como representação, não é demonizando...
Ele tem um partido, ele pode ser filiado no partido como qualquer outra pessoa. Deixa eu lhe falar... o Tiririca é um cidadão que representa uma parcela da sociedade brasileira.

Terra - Mas um voto de protesto...
Eu não sei se é voto de protesto, ele pode surpreender, sabe...eu acho legal o Romário estar entrando na política, acho legal o Bebeto estar entrando na política, o Marcelinho...porque, veja, a política antigamente o que era? Antigamente a política era advogado, professor, funcionário público e empresário. Ora, se você tem jogador de futebol, você tem movimento indígena, você tem...todo mundo tem que se apresentar e o Congresso estará melhor representado . Se eles trabalharem corretamente, serão valorizados. Se as pessoas não trabalharem corretamente, no próximo mandato cairão fora como já provou a história da humanidade e aqui neste País. Então, eu estou tranquilo com relação à necessidade da reforma política, ou seja, a cada dia uma pessoa só cria um partido político. Agora, na época da eleição você precisa normatizar quem é que participa do que, porque quando nós fomos criados em 80 nós tínhamos que legalizar o partido em 15 Estados e dentro de cada Estado em 20% dos municípios. Era um trabalho imenso e ter 3% de voto, sabe, para governo em 82. Não foi fácil chegar e nós fizemos. Então é preciso criar parâmetros para as pessoas organizarem. Você não pode, ou seja, você não tem um partido político, daqui a pouco os deputados são eleitos por um partido tal, antes de tomar posse, já mudaram de partido. Ou seja, você fez uma negociação com o partido que tinha 20 deputados, daqui a pouco esse partido tem 10 e a negociação está feita. Como é que fica?

Terra - Presidente, que PT é esse que neste momento da política brasileira sairá das urnas? E, segunda pergunta, onde o PT, que teve momentos de altos e baixos acentuados durante o seu mandato, onde acertou e onde errou?
Primeiro, o PT tem pouca ingerência no governo, sabe. Quando você ganha um governo, você governa, e na minha o partido tem até liberdade de em vários momentos não concordar com o governo e até fazer oposição ao governo, criticar o governo, sabe? Nós perdemos muita gente que foi do PT porque não concordou com a reforma da previdência do setor público que nós começamos a fazer em 2003. Isso faz parte também da história política do mundo inteiro. Foi assim no partido socialista francês, no alemão, no sueco, no partido democrata americano, acontece em todos os partidos políticos. Eu acho que o PT deu uma ajuda muito grande agora quando aceitou a indicação da ministra Dilma como presidente, ou seja, havia quem dissesse que o PT queria criar caso, que o PT queria uma liderança histórica, alguém com mais vínculo, e o PT aceitou tranquilamente a Dilma e eu acho que PT tomou a decisão madura e coerente, sabendo a minha relação com o PT e o peso do governo na decisão do processo eleitoral. Eu acho que foi uma decisão madura e, obviamente que, muitas vezes aceitando aquilo que a gente fazia no governo. Porque, qual é o problema do governo? Quando você chega no governo, você não participa mais da decisão de um partido. Eu, faz oito anos, sete anos, que eu não vou numa reunião do partido. Porque eu tomei como decisão de que, ao ser eleito presidente da República, eu não poderia governar para o PT, eu não poderia enxergar o mundo apenas pelo PT, eu tenho que enxergar o mundo pela pluralidade da política brasileira e da sociedade brasileira. Então, eu estabeleci uma forte relação com os trabalhadores, é verdade. Mas estabeleci também uma forte relação com os empresários, estabeleci uma relação muito forte com os setores médios da sociedade, porque é isso que é a sociedade brasileira. Ela não é apenas, sabe, vermelha ou azul ou verde. Ela é muito mais colorida do que tudo isso e o presidente da República tem que ficar com uma espécie de magistrado. Agora, quando chega época de eleição não é possível o presidente da República ficar como magistrado porque eu tenho um lado. Eu tenho um partido e tenho candidato.

Terra - O senhor tem sido muito cobrado por estar interferindo na eleição....
Deveria ser, deveria ser cobrado quem perdeu. Quem não conseguiu fazer o sucessor, porque o sucessor é uma das prioridades de qualquer governo para dar continuidade a um programa que você acredita que vai acontecer. Imagina se entra no Brasil para governar alguém que resolve querer voltar e privatizar a Petrobrás? (pausa) Onde vai o pré-sal? Ou alguém que resolva não mudar a lei e permitir que a lei do petróleo continue a mesma? A gente sabendo...o contrato de risco é quando a gente corre riscos. Mas quando a gente sabe onde tá bichinho do ouro preto, por que a gente vai fazer contrato de risco? Então, nós temos que se apoderar desta riqueza a bem do povo brasileiro, é um patrimônio do povo, não é um patrimônio da Petrobrás. Então, nós temos medo de que este País sofra um retrocesso. Por isso que eu tenho candidato. Seria inexplicável para a sociedade se eu entrasse numa redoma de vidro e falasse: olha, aconteça o que acontecer nas eleições, o presidente da República não pode dar palpite. Mas nem para escolher o Papa acontece isso.

Terra - Presidente, essas eleições já estão definidas?
Olha, nunca existe eleição decidida. Eu sempre acho que eleições e mineração a gente só sabe disso depois do resultado. Abriu a urna, agora não tem urna para abrir...

Terra - Mas tem o negócio de identidade (carteira de identidade) que pode complicar...
Olha, teria problema de identidade se você não tivesse elevado 36 milhões de pessoas da classe C. Esse povo agora está comprando, esse povo está entrando na loja, está fazendo crédito esse povo tem documento, fotografia... O que eu acho extremamente importante é que nesse processo eleitoral, a gente precisa primeiro ter muita cautela. Esse é o momento de um time que está ganhando de dois a zero. O adversário está dando botinada, está chutando no peito, está chutando na canela, o juiz não está apitando falta e nós não podemos perder a cabeça, porque o que eles querem é expulsar alguém do nosso time, para a gente ficar em minoria. Então, agora é muita cautela, vamos fazer troca de passes entre nós, vamos fazer a bola correr. Como dizia o Parreira, quando estava dirigindo o Corinthians, nós vamos ficar dominando a bola, ou seja, o tempo que a gente estiver com a bola é o tempo que a gente não toma gol...

Terra - Na prática, falta uma semana... E conseguiram a expulsão da Erenice...
Luiz Inácio Lula da Silva - Não, eles não conseguiram a expulsão da Erenice. Veja, a Erenice saiu porque se ela cometeu um erro, que ainda vai ser investigado...porque, veja, as pessoas, todos nós seres humanos precisamos aprender o seguinte: nós nascemos, crescemos e morremos. Neste período de tempo, a gente tem oportunidade, a gente aproveita ou não aproveita. Tem gente que poderia ser um baita jogador de futebol, eu conheci trezentos que eram "o novo Pelé", nenhum foi. Eu conheci trezentos que iam ser grandes políticos, nenhum foi. Então, as pessoas, na medida em que têm uma oportunidade, as pessoas estão aqui para prestar serviço à sociedade. Se alguém acha que pode chegar aqui e se servir, sabe, cai do cavalo. Porque a pessoa pode me enganar um dia, pode me enganar, sabe, mas a pessoa não engana todo mundo ao mesmo tempo. E quando acontece, a pessoa perde. O que aconteceu com a Erenice é que ela jogou fora uma chance extraordinária de ser uma grande funcionária pública deste País.

Terra - Nesse caso o senhor admite que as denúncias estavam, ao menos em parte, corretas?
Veja, eu sempre admito de que muitas vezes tem coisas que você tem que investigar. Agora, porque eu comecei falando da feijoada? Porque a feijoada tem ingredientes, você quando vai na panela de feijoada, você tem o feijão e tem lá trezentas coisas para escolher. O que eu acho é que toda notícia de denúncia ela vem como se fosse uma feijoada. Depois que você faz um processo de investigação, escolhe o que você quer ali, você vai perceber que a quantidade de coisas, você vai perceber o que é cada um. Tem coisa que tem dimensão séria, tem coisa que é boato, especulação, tem coisa que não tem profundidade. Então, qual é o papel de um presidente da República? Ou seja, na hora que você sabe de uma situação dessa, a primeira coisa que você faz é criar uma sindicância interna, ou seja, a CGU, a Casa Civil começa a investigar e a Polícia Federal abre inquérito. A partir desse momento, o presidente da República fecha a boca, certo? Porque, a partir daí, não pode ter mais nenhuma influência do governo no processo de investigação. Quando tiver resultado de todas as pessoas darem depoimento, aí você então comunica a sociedade o que aconteceu de fato e de direito.

Terra - E as denúncias não vão interferir no resultado eleitoral?
Eu não acredito. Porque tem uma coisa que as pessoas precisam começar a aprender. Se essas denúncias são manipuladas eleitoralmente porque...

Terra - Ainda que verdadeiras?
O povo percebe. Mesmo aquilo que seja verdadeiro, o povo percebe. Agora, o povo aprendeu a julgar, isso é uma coisa interessante.

Terra - Por quê mudou, presidente?
Ah, porque o povo tem acesso à informação que ele não tinha antes. Hoje, eu acho que a internet joga um papel extraordinário. Eu digo pelos meus filhos.

Terra - O senhor acessa ou acompanha ali?
Não, mas pode ficar certo de que eu serei um internauta vigoroso a partir do dia 1º de janeiro.

Terra - O senhor vai acessar até o Twitter?
Eu não sei. Eu acho que o Twitter é uma escravização. Tem gente que acorda duas horas da manhã para ficar tuitando. Tem gente que levanta para falar: ai, acordei, perdi o sono. O que eu tenho a ver com isso? Vai dormir, pô!

Terra - Mas tem ministro seu que tuita...
Ah, eu dou bronca em ministro, porque às vezes você está em um comício, o cara está tuitando lá, o cara nem prestou atenção, já pensou jogador de bola se estiver tuitando e a bola passar do lado dele... (risos) Acho um absurdo, acho uma escravização. Mas deixa eu contar uma coisa para vocês... Acho que as pessoas não estão entendendo ainda o que aconteceu na comunicação nesse País. Lá em casa, ninguém compra mais jornal. Em casa, a molecada toda lê o que tiver que ler na internet, em tempo real, sem ter que esperar: "ah, vamos ver o que vai acontecer amanhã ou depois de amanhã". São 68 milhões de brasileiros que acessam a internet. Um quarto das residências brasileiras que já tem computador. A tendência natural é isso crescendo de uma forma tão rápida, que daqui a pouco serão 150 milhões brasileiros... é por isso que o governo se interessou tanto na questão da banda larga. Porque você sabe que no Brasil é assim... todo mundo fala que vai resolver o problema, mas todo mundo só quer cuidar daquilo que tem rentabilidade. Então vamos fazer as coisas no Rio de Janeiro, vamos fazer em São Paulo, nas capitais, cidades grandes, mas quando vai se afastando e não tem rentabilidade, as pessoas não querem. Por exemplo, veja se não fosse o programa Luz Para Todos... ele está custando ao governo federal talvez o investimento de quase R$ 14 bilhões. Que governo doido iria fazer um programa Luz Para Todos se não fosse o meu? Quem das pessoas que governaram esse País estavam preocupadas em levar luz para uma aldeia indígena? Então, nós fizemos um investimento, que é o seguinte: nós já colocamos mais de 1,1 milhão km de fio neste País. Já colocamos 6 milhões de postes neste País. Já colocamos mais de um milhão de transformadores. Às vezes uma ligação custa R$ 10 mil, mesmo assim... muita gente diria: "Lula, você é louco. Gastar R$ 10 mil para atender um cara que está lá não sei onde!". Esse "cara" é tão brasileiro quanto quem mora em Copacabana ou mora na avenida Paulista. Ele tem direitos. E se a iniciativa privada não faz porque não é rentável, o governo tem de fazer. Então, esse "cara" vai ter internet. Daqui a pouco a gente vai ter numa tribo indígena de qualquer lugar deste País um cidadão (bate na mesa simulando um teclado de computador) navegando. Sabe? Vendo o portal Terra...

Terra - Mas índio não vai tuitar às duas horas da manhã...
Pode! Pode tuitar, vai que ele perde o sono! (risos).
Então, essa é uma revolução que eu acho extraordinária. Acho um bem muito importante que nós não fiquemos dependendo apenas de um. Triste era o tempo que o Brasil só tinha um canal de televisão. Triste era o tempo que o Brasil só tinha uma grande rádio. Triste era o tempo que nós tínhamos dois ou três jornais. Hoje você percebe que os grandes jornais do País não são aqueles que acham que são grandes. São os populares que existem em vários lugares. Os jornais a R$ 0,50, jornais a R$ 1, jornais de graça, jornais de Metrô... sabe? Por quê? Porque antigamente até a publicidade brasileira era feita apenas para 35%, 40% dos consumidores! Agora entrou uma gama de gente no mercado de consumo que todo mundo quer atingir essas pessoas! E aí, eu penso que uma coisa é o cidadão passar na banca, ver uma manchete e ir embora trabalhar. Outra coisa é o cidadão saber o seguinte: eu posso tirar R$ 0,50 do meu bolso e comprar um jornal ou eu posso acessar a internet e qualquer portal e ter minhas informações.

Terra - Esse crescimento me leva a um outro assunto. Todas as grandes cidades do Brasil estão estranguladas. Todas. Você chega e nem entra. Porque teve acesso à classe C, porque tem apartamento sendo vendido e comprado, porque tem muito automóvel (sendo comprado) e aí entra a Copa 2014. Não será uma pena que essas obras de infraestrutura que poderiam ou poderão ser extremamente úteis para essa nova fase do País, que isso não seja levado em consideração?
Estarão todas prontas...

Terra - Mas que não se leve em consideração que essas cidades aproveitem a oportunidade de desestrangular...
Deixa eu dizer uma coisa... Primeiro, nós temos que ter em conta o seguinte: a geração que está governando o Brasil nesse momento, os prefeitos, os governadores, o presidente da República e as que virão. Nós estaremos fazendo quase que um reparo aos acontecimentos da década de 70 no País, da década de 60. Ou seja, o êxodo rural quando milhões de brasileiros se locomoveram de suas casas e vieram para os grandes centros urbanos. Por conta disso, a irresponsabilidade dos administradores públicos da época que foram permitindo que o povo fosse ocupando espaços inadequados, espaços proibidos, espaços à beira de córregos, nas encostas de morros... e foram se constituindo as grandes favelas e junto com as favelas os grandes problemas. Nós estamos num processo de fazer reparação nisso. Reconstruindo a cidadania a partir das favelas. A primeira tomada de decisão foi acabar com as palafitas, que é o projeto mais degradante de habitação humana. Aí depois urbanização de favela. Eu até gostaria que se vocês pudessem, antes de terminar meu mandato, visitarem comigo o Complexo do Alemão, do Pavão-Pavãozinho, Manguinhos... que vocês vão ver o que é que está acontecendo nesses lugares e no Brasil inteiro. Eu estou falando esses lugares porque aparecem mais na televisão. Estamos fazendo teleférico no Complexo do Alemão, que vai ter seis estações. Cada estação vai ter biblioteca, vai ter escola funcional, delegacia, vai ter internet... Nós vamos levar para o morro a polícia com objetivo de proteger a sociedade, e não entrar de forma inadequada como se fazia sempre. Nós vamos levar cidadania. Quero que vocês vejam o que está acontecendo com as UPAs (Unidades de Pronto-Atendimento) nas favelas, com a geração de emprego, com a geração de oportunidades... e essas coisas a gente só vê se a gente for. Se a gente quiser fazer jornalismo sentado no gabinete e não sair para ver o que está sendo feito no Brasil, nós podemos cometer o erro das pessoas que foram exiladas e voltaram e não deram conta que o Brasil tinha mudado. Ficaram achando que o Brasil era o de 64. É preciso arejar a cabeça para ver o que está acontecendo no Brasil. O povo está feliz, o povo está percebendo que tem futuro. Não sei se isso incomoda algumas pessoas... tem gente que não gostaria que tivesse tudo assim, né? "Tem muita gente bem! Esse governo vai terminar seu mandato com mais de 80% de bom e ótimo e onde que existe isso?" (diz, mudando o tom de voz)

Terra- Sim...
Eu acho normal, não fico com raiva quando o cidadão de classe média, seja no Rio de Janeiro, seja em São Paulo ou em Belo Horizonte, tomando seu uísque com os amigos critica o Bolsa Família de assistencialista. Eu acho normal. Ele dá de gorjeta o Bolsa Família. Agora para uma pessoa que está com fome, R$ 100, meu filho... Quando a gente determina que 30% da alimentação escolar tem de ser comprada no local, o que acontece naquele município? Uma revolução!

Terra - O que você acha da oposição ter criticado o Bolsa Família e agora quer até 13° para o programa?
O problema é o seguinte: essas pessoas que são oposição hoje não estavam habituadas a fazer oposição. Tinha alguns que fizeram muito atrás. Já faz tempo que o Serra fez oposição, foi 1970, porque depois já virou secretário do Planejamento do (Franco) Montoro. Então as pessoas desabituaram a fazer oposição e fazem isso com certo preconceito, com uma certa raiva. Eu antigamente ficava ofendido com o preconceito. Hoje, eu acho que nós já vencemos todos os preconceitos. O PT também errou muito quando era oposição. Nós erramos muito. Se você pegar o projeto da Constituição que nós fizemos era um projeto tão severo, tão rígido (bate na mesa), que nós não conseguiríamos governar. Mas é próprio de quem é oposição.

Terra - Errou no Plano Real...
O Plano Real é uma coisa que nós perdemos uma eleição. Eu tinha quarenta e poucos por cento no mês de março, eu fui caindo, caindo, caindo... e o Fernando Henrique, que talvez não se elegesse deputado federal por São Paulo, começou... Aquilo não foi uma campanha entre dois homens. Aquilo foi campanha entre a estabilização e a moeda e o outro lado. A gente não acertou o discurso como eles não estão acertando agora.

Terra - No que eles estão errando politicamente?
Não posso dizer o que eles estão errando (risos). Não posso dar dica... não vou dizer qual canto que vou chutar o pênalti.

Terra - Qual é a avaliação do senhor sobre o comportamento do Serra?
Eu, para ser muito sincero, poderia dizer para vocês que o Serra está hoje na situação que eu estive nas duas eleições que perdi. O Serra foi candidato contra mim em 2002 quando o povo queria mudança e eu era mudança e ele, situação. Agora, ele quer mudança quando o povo quer continuidade. Então, foram dois momentos muito delicados. A mesma coisa fui eu. Fui candidato contra o Plano Real e era um massacre. Não precisava ninguém falar mal de mim era só a história daquele pãozinho batendo no prato, a história daquele engraxate em Nova York, que o engenheiro era um engraxate... Aquilo não deu resultado porque a gente não conseguiu gerar os empregos que eram necessários. Aí depois quando chegou em 98 eu já sabia qual era o discurso do Fernando Henrique Cardoso: "olha, quem estabilizou, vai gerar emprego". E a gente não tinha como desfazer isso. Se bem que em 94 eles fizeram uma sacanagem comigo. Fizeram uma decisão de não permitir que houvesse imagem externa que era para impedir que eu colocasse as imagens das Caravanas da Cidadania na televisão. Mas, de qualquer forma, eu não lamento. Hoje, para ser muito sincero, agradeço a Deus por ter chegado à presidência quando eu cheguei. Cheguei mais maduro, mais preparado. Cheguei sabendo mais coisas que eu sabia em 1989, em 1994 e 1998. Apesar de ficar lamentando, eu agradeço a Deus. Meus adversários deveriam agradecer a Deus também. Todo dia! Porque eles imaginavam que ia ser um fracasso para eles voltarem e eles estão com bronca do sucesso. Você veja uma coisa... ô gente, quando nós chegamos nesse País, em 2003, o crédito total disponibilizado para 8,5 milhões de quilômetros quadrados e 190 milhões de habitantes era de R$ 380 bilhões. Hoje, só o Banco do Brasil tem isso. O nosso crédito hoje é R$ 1,6 trilhão. A Caixa Econômica financiava R$ 5 milhões e esse ano vai financiar R$ 70 bilhões ou mais. O Banco do Nordeste emprestou, em 2002, R$ 262 milhões e esse ano vai emprestar quase R$ 30 bilhões. Esse é o País que mudou e que as pessoas precisam compreender e ao invés de ficar triste, ficarem alegres. Quando eu deixar a presidência não ficará um bando de miseráveis como eles largaram para mim, mas ficarão milhões de brasileiros que estão ascendendo na sua vida social, na possibilidade de emprego.

Terra - Então, que América Latina o senhor encontrou e como é que acha que ela está hoje? O que poderia ter avançado nas tarifas, nas moedas?
Primeiro vou contar uma coisa para vocês. Esse é um fato histórico importante para as pessoas aprenderem. Em 1990, eu tinha perdido as eleições para o (Fernando) Collor, mas eu tinha me convencido que nós tínhamos criado uma força política importante no Brasil. E resolvi propor a convocação de uma reunião de toda a esquerda na América Latina. Tinha regiões em que se discutia muito que a única saída era pela via armada, tinha lugares que começavam a discutir mais fortemente a democracia... O dado concreto é que nós fizemos uma reunião em junho de 1990, no Hotel Danúbio, em São Paulo, eu lembro que era Copa do Mundo, era um sucesso, lembro que a única coisa que unia os argentinos era o Maradona. E lembro de países pequenos que tinham 18 organizações de esquerda, que foram para a reunião. Treze, doze, quatorze. E essas pessoas não conversavam entre si. Ali nós começamos a estabelecer um debate sobre a necessidade das pessoas acreditarem que pela via democrática era possível chegar ao poder. Eu era a prova de que era possível chegar ao poder pelas eleições diretas. Nós criamos o Foro de São Paulo. De lá para cá, todos os países da América Latina e América Central, com exceção de Cuba que já tinha seu regime anterior, chegaram ao poder pela via eleitoral. Todos. O mais recente foi El Salvador, que o Mauricio Funes chegou ao poder. O Evo Morales... você quer bem maior para a Bolívia do que um índio ser presidente da República? Antes era eleita gente que nem sequer falava a língua deles! Eram loiros de olhos azuis. De repente, você elege um companheiro como o Evo Morales, que crescem as reservas, cresce o PIB, cresce a distribuição de renda... Por quê? Porque ele tem vínculo com aquele povo e sabe que tem que cuidar da parte mais pobre. Então, eu acho que houve um avanço excepcional na América Latina. Também acho que a rotatividade no poder é importante. Defendo isso porque acho importante a prática democrática. Se vai ser dois mandatos, três mandatos, quatro mandatos, cinco mandatos... Nenhum americano hoje se queixa do (Franklin) Roosevelt ter sido presidente quatro vezes. Ninguém.

Terra - Presidente, quais são as principais barreiras para que a América Latina tenha um papel preponderante como mercado, essa questão que o Mercosul discute muito e não consegue avançar?
Oh, gente! Pelo amor de Deus! Deixa eu falar uma coisa para vocês. O problema hoje é que quem está em crise são os ricos. Nós estamos muito bem aqui na América Latina. Você sabe quanto que a gente tinha de balança comercial com a Argentina? Nove bilhões. Agora a gente chegou a R$ 30 bilhões. O maior parceiro comercial do Brasil hoje não é a Europa, não é os Estados Unidos, é a América Latina como um todo. Então o que acontece, nós fizemos um trabalho de diversificar as relações e a América do Sul está se fortalecendo. Quanto tempo você acha que a França conseguiu chegar ao que é, que a Alemanha chegou ao que é? Nós demos passos importantes. A economia chilena cresce, a Argentina cresce, o Uruguai cresce, o Paraguai cresce... Todo mundo está crescendo.

Terra - O senhor pretende ter um papel formal na América Latina, na América do Sul?
Não, não... Primeiro, essa coisa de líder... ninguém se auto-indica. Quando você é levado ao posto de líder é porque os teus liderados reconhecem força em você. Se eles não reconhecem, não adianta você dizer: "eu sou líder, eu sou líder!". Não existe isso.

Fonte: Terra

Gilberto Nascimento
Antonio Prada
Bob Fernandes