sábado, 12 de março de 2016

TUDO AO MESMO TEMPO AGORA

Patricia Piccinini "Com Ciência"
O melhor filme do ano passado foi “Mad Max: Estrada da Fúria”, mas o favorito para levar o oscar era “O Regresso”. Ganhou “Spotlight”, que joga luz sobre os casos de pedofilia envolvendo padres católicos. Menos mal: nem um, nem outro. Fez-se a justiça de Salomão. /////////////// Em todo caso, Mad Max sagrou-se como o grande vencedor em números absolutos, com a conquista de seis estatuetas, em sua maioria nos quesitos técnicos, como som e montagem. Justíssimo! Só acho que deveria ter levado também, pelo menos, o prêmio de direção: George Miller, aos 71 anos, deu uma verdadeira aula. Seu filme é cinema de ação como há muito tempo não se via – nunca mais tinha tido aquela curiosa sensação de satisfação e desconforto por perceber que a projeção estava chegando ao fim. Queria mais! Tomara que tenha continuação.

Fury road
“O Regresso” mereceu muito o prêmio pela fotografia, realmente primorosa. E só. O filme é bom, tem um bom ritmo, mas convenhamos: é “clicheroso” e, em termos de roteiro, praticamente se resume a mostrar DiCaprio correndo, arfando, sendo atacado e fugindo por duas horas e cacetada. Se bem que o ataque do urso é realmente um espetáculo, daquelas cenas que ficarão marcadas nas retinas dos olhos de quem viu no cinema, em tela grande - como deve ser – para sempre. /////////// O que não quer dizer que eu ache que a academia tenha sido injusta ao dar o oscar de melhor atuação para Leo, só acho que demorou. Ele devia ter recebido por “O Lobo de Wall Street”. /////// Foi muito bom também ver a belíssima animação brasileira “O Menino e o mundo” no páreo. Uma grande vitória. Ganhar, mesmo, era uma missão praticamente impossível, já que “Divertida Mente” é uma obra-prima. Mais uma, da Pixar. Que andava patinando. Tomara que tenha voltado aos trilhos.

O carioca Leonardo “Panço” é gente que faz: compositor e guitarrista, tocou nas bandas Soutien Xiita e Jason, com a qual rodou a Europa e o todo o Brasil, de norte a sul, inúmeras vezes, com direito a várias passagens por solo sergipano, onde tocou até no interior, em Itabaiana – feito raro para bandas “de fora”.Com sua gravadora “Tamborete” lançou um catálogo de respeito, com direito a alguns nomes de peso do underground, como o Zumbi do Mato e a Gangrena Gasosa. Hoje se dedica à escrita e a uma promissora carreira solo que começou com “Tempos”, de 2014, e segue firme com “Superfícies”, do ano passado. “Superfícies” une música e literatura: é um livro, ilustrado por fotos do próprio autor, com um disco de trilha sonora. O livro é, na verdade, uma espécie de “encarte de luxo”, já que, a meu ver, não funciona muito bem, isoladamente. Mas o disco, totalmente instrumental, é uma pequena obra-prima! Belas melodias em texturas e arranjos riquíssimos. Foi todo gravado, como sempre, na base da “brodagem”, com a ajuda dos amigos – dentre eles os sergipanos Thiago “Babalu”, nas baquetas, e Rafael Findas, nas quatro cordas. Vale muito a pena conhecer. É vendido diretamente pelo autor, que pode ser encontrado no facebook no seguinte endereço: https://www.facebook.com/leonardo.p...

Renegades of punk "na brasa", por David Doria
Ainda há público para shows de rock em Aracaju? Fecharam dois espaços que abriam para o estilo, a Caverna e a Casa Rua da Cultura. Sábado passado apenas alguns gatos pingados foram ao Rancho da Aruana ver a segunda festa Viva La Brasa, enquanto um samba no CHE tava lotado, com tanta gente que a rua em frente ficou praticamente interditada. Nada contra o samba, evidentemente. Só acho uma pena que uma banda como a Necro tenha tido tão pouco público nas duas últimas vezes que vieram tocar por aqui. Em todo caso, o rock segue em frente, porque é teimoso: ontem, dia 11/03/2016, rolou o lançamento do novo disco da excelente Penny Mocks. Próxima sexta tem Punk rock e Hard Core na pista de skate Cara de Sapo, com os paulistas da Mar Morto, os pernambucanos da Johnny 13 e os sergipanos Ideal e The Renegades of punk. Amanhã, dia 13, tem o SOS UNDERGROUND 2 no Conj. Marcos Freire, em Nossa Senhora do Socorro, com Rasga Mortalha, Mophinum, Anhan e outra que não consegui ler o nome no cartaz. Já dia 20/03, em São Cristóvão – terra da The Baggios, que acabou de tocar no Lollapalooza, em sp – rola Executor, Casca Grossa, Suicídio Coletivo, Pôdi pa caraio, Toxofobia e Enterrados de Forma Banal. Por fim, dia 16/04 tem UNDEGROUND ATTACK no parque dos cajueiros, com Cruz da Donzela, Executor, Serial, Eyeless e Mentes suicidas.

Chega a ser comovente a verdadeira saga da Editora Conrad para completar, no Brasil, a publicação do emocionante mangá “Gen:Pés descalços”, um clássico que conta a história de um sobrevivente da bomba de Horoshima. Os quatro primeiros volumes foram lançados nos anos 2000 e 2001, mas a publicação só foi retomada recentemente e atualmente está no volume nove, de um total de 10. Um sinal de que, apesar da ótima fase, a publicação de quadrinhos no Brasil segue sendo uma atividade de risco. /////// Ótima fase que foi coroada este ano com a premiação do niteroiense Marcelo Quintanilha no Festival Internacional de Angoulême, na França – uma espécie de Festival de Cannes da “banda desenhada”. O oscar é o “Eisner Awards”, americano. Ganhou por “Tungstênio”, um bom conto policial curiosamente ambientado em Salvador, Bahia, mas sua obra-prima é “Talco de Vidro”, uma verdadeira “tour-de- force” pela mente de uma dentista de classe média alta de sua cidade natal, Niterói, corroída pela inexplicável inveja que sente de sua prima suburbana. Impressionante! Lembra “Crime e Castigo”, de Tolstoi. Angustiante. Nem um pouco divertida, esta mente.

Shine on, you crazy diamond
A passagem dos anos de 2015 para 2016 vai ficar na história do rock and roll - de forma negativa, infelizmente. O baixo astral por aqui, nas terras do Cacique, começou com a notícia do falecimento de Levi Marques, que desistiu da vida no fim do ano passado e deixou sem chão uma legião de amigos. Era um jovem talentoso, cantor e compositor, “performer” de primeira. E, acima de tudo, um cara “do bem”. Faz muita falta e nunca será esquecido. O mal-estar prossegue com a passagem “desta para melhor” (???!!!) de Flavio Basso, o eterno Júpiter Maçã, astro do rock underground tupiniquim que fez história em carreira solo e com a seminal banda gaúcha Os Cascavelletes e parecia ter chegado ao auge com o falecimento de Lemmy, do Motorhed, quando nos chega a notícia, nos primeiros dias do mês de janeiro do ano corrente, de que David Bowie não era, afinal, um ser imortal! Pelo menos não no plano físico, biológico. Já era difícil imaginar um mundo sem Lemmy. Sem David Bowie, é tarefa quase impossível. Seguimos vivendo, claro, mas não é mais a mesma coisa. Não mesmo.

Em todo caso, e apesar da crise, consegui fazer uma viagem a São Paulo no fim do ano. Foi por motivos de família – levar minha mãe para fazer uma visita a uma tia querida - mas aproveitei, evidentemente, para tomar um “banho de cultura” daqueles que só grandes metrópoles são capazes de proporcionar: Vi o show de David Gilmour, maravilhoso, no estádio do palmeiras – e lembrei de Levi quando recebi um telefonema de sua namorada querendo saber se o programa de rock poderia render-lhe alguma homenagem justo na hora em que o sublime guitarrista homenageava Syd Barret, o falecido fundador do pink Floyd, com a música “Shine on you crazy Diamond” – e vi as exposições de Zé do Caixão no Museu da Imagem e do Som – as montagens das exposições do MIS são sempre um espetáculo à parte: aqui, em formato de labirinto expressionista – e da australiana Patrícia Piccinini no Centro Cultural Banco do Brasil. “ComCiência” é uma impressionante exposição de esculturas ultrarealistas feitas de silicone, fibra de vidro e cabelo humano apresentando, em sua maioria, criaturas bizarras porém simpáticas, afetadas por mutações genéticas. Patricia, que se considera mãe de todos esses seres e se ofende quando os criticam, diz que se preocupa com eles e pode contar com precisão a origem de cada um. Ela cresceu acompanhando a progressão do câncer de sua mãe, morta em 1992, e sonhava que a ciência pudesse ajudá-la com a cura. "Não me importo se a medicina é natural ou se usa órgãos de porcos, por exemplo. Só quero que funcione". Nasceu daí sua fascinação pelo tema. O realismo de suas obras e o material que utiliza para confeccioná-las a aproxima do australiano Ron Mueck, cuja exposição no início deste ano na Pinacoteca de São Paulo atingiu 400 mil – eu vi e contei como foi aqui*, lembram? "Nós usamos o mesmo material, mas não estamos interessados nas mesmas coisas", diz a artista, que se diz mais surrealista do que realista. A exposição está atualmente em Brasília e depois segue para o Rio, sempre no CCBB. Se tiver a oportunidade, não deixe de ver.

* publicado originalmente no jornal Folha da Praia

A.

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