quinta-feira, 10 de abril de 2014

#EUNOLOLLABR2014

“Uma sequência de canções como Ceremony, Bizarre Love Triangle, True Faith, The Perfect Kiss e Blue Monday, para quem aprecia o artesanato pop, traz um sentimento de se estar diante de uma obra clássica, algo como apreciar o Davi de Michelangelo.” Esta frase de Jotabê Medeiros, no Estadão, ilustra bem o meu sentimento por ter estado diante do palco da clássica e lendária banda de Manchester na noite de encerramento do Festival Lollapaloosa Brasil 2014, ocorrido no último final de semana no Autódromo de Interlagos, em São Paulo. Foi uma celebração.

Que começou em clima de expectativa entre os que escolheram ignorar o “hypado” Arcade Fire, se apresentando num palco ao lado – o maior - no mesmo horário. Eu havia desistido de tentar ver de perto o Soundgarden, que tocou antes, ao ver a impressionante multidão que se direcionava ao palco ônix depois do show do Pixies. Tracei, então, uma nova estratégia: vi os heróis do grunge de Seattle sossegadamente, de longe, sentado na grama do alto de uma das colinas que circundavam o local da apresentação, aproveitando para descansar e ver, finalmente, um show completo, de perto, de forma decente. Do New Order.

Infelizmente o tempo entre o fim de um e o começo do outro era de apenas cinco minutos, o que tornaria impossível ver os dois na íntegra, já que a distancia entre os palcos era muito grande. Tive que sair, portanto, antes do fim do show do Soundgarden, pois estava decidido a ver a apresentação do New Order por inteiro. Cheguei a tempo: os técnicos ainda davam os últimos retoques na estrutura, com uma tela preta ao fundo onde o nome da banda aparecia ocasionalmente ...

E então eles entraram, foram ovacionados pelo público e começaram com “Crystal”, uma boa faixa mais recente, do álbum “get ready”, de 2001 – note: “mais recente”, no caso, já significa 13 anos de lançada! Pra “compensar”, mandaram uma nova mesmo, inédita, chamada “singlularity” – anunciada com uma verdadeira obsessão por Bernard Summer, o vocalista. Que parecia estar um pouco “alto” – não por acaso disse que amava as “caipirinhas”.

“Singularity” é muito boa e cumpriu com louvor a função de provar que eles ainda podem ter balas guardadas na agulha, mas vamos ao que realmente interessa: os hits! Show de banda clássica em megafestival não é lugar para novidades, já que muita gente – eu, por exemplo – tem ali uma rara oportunidade de ver pela primeira vez ao vivo as músicas que embalaram sua vida. O “bailão” começa pra valer com “Transmission”, do Joy Division, e a partir daí foi só alegria, com os grandes sucessos se sucedendo enquanto o telão mostrava imagens artísticas sofisticadas, algumas extraídas dos clipes, outras que parecem ter sido feitas especialmente para serem exibidas ao vivo, como o belíssimo filme que ilustra “your silent face”, de “Power, corruption and lies”. A platéia ia à loucura assim que reconhecia as introduções dos clássicos, como “The perfect Kiss” e “Bizarre Love triangle”. Em “Blue Monday” Bernard toma o lugar de Gillian Gilbert e improvisa um solo nos teclados, conseguindo, ao final, extrair um sorriso da sempre séria e compenetrada tecladista/programadora. Entre uma musica e outra o “frontman” fala muito com o público - algumas besteiras, inclusive, e pelo menos uma "gafe": agradeceu com um "Muchas gracias" - e, quando não está empunhando a guitarra, arrisca alguns passos de dança desengonçados. A banda, como um todo, parecia animada e estava bem afiada, com destaque para Stephen Morris, já "coroa" – todos eles estão, com excessão do baixista – competente – que substituiu Peter Hook e do outro guitarrista – destruindo lá atrás, na bateria “turbinada” com instrumentos de percussão eletrônica.

O Bis foi magistral: começa com o telão mostrando as imagens dos encapuzados carregando os quadros do Joy Division na praia enquanto a banda toca “Atmosphere” e termina, como não poderia deixar de ser, com “Love Will tear us apart”, enquanto uma apresentação de fogos de artifícios anunciava o fim daquela edição do festival. No telão, a sentença: JOY DIVISION FOREVER. Fui às lágrimas. Foi bem mais fácil encarar a maratona da volta – uma longa caminhada até a estação de trem para viajar em pé em vagões lotados – assim, de alma lavada.

Uma maratona insana que começou na noite anterior. Como só o Nine Inch Nails, praticamente, me interessava, cheguei tarde, depois de uma verdadeira via crucis para conseguir trocar meus ingressos comprados pela internet. Tudo era muito organizado e bem sinalizado, mas também muito, MUITO longe - e grande. Uma falha aqui e ali, passagens estreitas para o fluxo de pessoas que causavam aglomeração, mas nada de muito sério. Por conta das distâncias, principalmente, já cheguei acabado e fui logo aproveitando uma tenda montada para que as pessoas descansassem em frente ao palco em que Lorde cantava “Royal”.

O tempo vai passando e eu de repente me toco que não sabia exatamente quando nem onde o Nine Inch Nails iria tocar. Vou à loja de merchandising e peço pelo folheto com o roteiro dos shows, que eles não tinham. Mas uma moça simpática tinha e me mostra que já estava na hora do show. Onde? No palco ônix, lá atrás, depois da roda gigante. “QUE RODA GIGANTE????!!!”. “Pois é, daqui não dá nem pra ver a roda gigante, mas se você for por ali – e me mostra uma passarela interminável lotada de gente – depois da curva você vê, lá longe. É lá.”

PÂNICO! Disparei pelo local indicado até ver, finalmente, a tal roda gigante – que ficava MUITO longe. E, no caminho, havia um tumulto, muita gente indo e vindo, tava tudo parado, com os monitores desesperados tentando organizar a circulação das pessoas. Eu não estava só: um carioca e dois pernambucanos, desconhecidos, me acompanharam na tarefa de vencer a multidão e a enorme distancia até finalmente ouvir, ao longe, “March of the pigs”, uma de minhas favoritas. Chegamos, finalmente, a tempo de ver, ainda, cerca de 45 minutos de show. Bom, pesado e com uma iluminação criativa, apesar de um tanto quanto anticlimático no meio, com algumas canções hipnóticas e experimentais não muito apropriadas para um festival. Os fãs ficaram em transe, o resto foi se posicionar para ver o Muse. Ao final, no bis, uma emocionante interpretação de “Hurt”, uma das melhores músicas “pop” (ênfase nas aspas) já feitas. Um daqueles momentos que fazem você perceber que valeu a pena o sacrifício – e olha que o saldo daquela noite, numa análise fria, foi pra lá de negativo: tanto esforço pra ver tão pouco tempo de uma banda que eu já tinha visto ao vivo antes, no Claro que é rock de 2005! Bom, pelo menos eu já sabia me localizar e tratei de me preparar melhor para a noite seguinte. Aproveitei o resto do sábado para explorar as atrações paralelas, como uma simpática loja de discos de vinil montada num espaço da Skol onde encontrei algumas pérolas: além dos discos das bandas que se apresentariam no festival haviam bolachas do Fugazi, Bikini Kill, Eddie – “original Olinda Style” – e até um raro exemplar da coletânea “Cult” “Another kind of noise”. Só biscoito fino, tudo estalando de novo, lacrado – menos a coletânea, que saiu nos anos 1990 e, que eu saiba, nunca foi relançada.

No domingo cheguei cedo porque queria ver Johnny Marr. Mas não tão cedo ao ponto de não pegar o show começado: era no distante palco ônix, também. Frustrado, já começava a considerar aquele um verdadeiro “festival de coitos interrompidos”, mas tratei de relaxar e curtir a apresentação. Que foi muito boa, mesmo acontecendo sob um sol escaldante. E surpreendente: num dado momento ele chama ao palco ninguém menos que Andy Rourke, o baixista dos Smiths, e juntos eles tocam “How Soon is now”. Lágrimas. E mais lágrimas na sequencia, com “There´s a light that never goes out” cantada a plenos pulmões pela platéia emocionada. Além dessas, dos Smiths, ele tocou também "Bigmouth Strikes again" e “Stop Me If You Think You’ve Heard This One Before”, num set recheado de boas canções extaídas do primeiro álbum solo, recém-lançado.

De lá fui para o primeiro palco, “Interlagos”, para ver o Savages. No caminho, uma inglesinha bonitinha mas ordinária da qual eu nunca tinha ouvido falar cantava umas musiquinhas pop sem vergonha no gigantesco palco “Skol”. Cheguei exausto, claro – as distancias eram inacreditáveis, não se contavam em metros não, é coisa de quilômetros rodados mesmo – então vi a  primeira parte do show de longe, da tenda “relax”. Savages é uma banda inglesa relativamente nova, formada só por mulheres, que faz um som bastante derivativo do chamado “post punk” dos anos 80, com forte influencia de Siouxsie and the Banshees, especialmente nos vocais – o que está muito longe de ser um demérito, muito pelo contrário. Muito bom show. Já mais descansado, me aproximei e cheguei quase à beira do palco, pois a área estava semivazia – para os padrões de um grande festival, que fique claro. E pude, finalmente, ver um show do Lollapalooza completo e, pelo menos em parte, de perto, quase sentindo o suor da vocalista – estilosíssima, toda de preto com um sapato de salto alto vermelho.  

E então rumo ao palco maior, “Skol”, para esperar pelos Pixies. Já cansado de novo – ah, meus vinte e poucos anos e vários quilinhos a menos que não voltam mais – por isso vi de longe. Mas foi um show foda, muito bom. Entraram todos juntos, saudaram a platéia e sentaram o pau numa saraivada de canções pop ácidas e barulhentas, já tão conhecidas que nem soam mais tão deliciosamente estranhas como quando ouvi pela primeira vez, em vinil, na extinta loja “akydiscos” – a primeira vez que seus ouvidos tomam contato com “Debaser” você nunca esquece.

Assim como no New order, faltava alguém no comando das 4 cordas, mas a baixista que cumpria a ingrata tarefa de substituir Kim Deal, a  argentina - criada nos Estados Unidos - Paz Lenchantin, se saiu muito bem. Não falou nada, e poderia ter se comunicado bem, já que é fluente no espanhol, mas exibiu o tempo inteiro um belo sorriso, o que era, também, uma das marcas da musa. Era não, é: Kim seguem em frente, preparando uma carreira solo.

Comunicação zero com a platéia – sério, nem uma palavra. A não ser pelo que realmente importa: a música. Algumas novas, e boas, inclusive. Comunicação não é exatamente o forte dos Pixies, como pode ser comprovado no documentário "loudQUIETloud", e é provavelmente isso que dá às suas apresentações um clima estranho, meio distante, que só não é "frio" porque a entrega na execução das canções é palpável, visível e audível, especialmente quando Frank Black - ou seria Black Francis? - se esgoela no microfone.

5 minutos para o Soudgarden e me parece que vacilaram, pois tinha mais gente para ver Cornell e Cia. que os pixies, num palco menor e distante. Desisti: ia pegar começado mesmo e jamais conseguiria chegar perto do palco, a julgar pela multidão inacreditável se dirigia ao “Ônix”. Fiz mais um pit stop estratégico em outra tenda “relax” e aproveitei pra comer um sanduíche ruim e caro, claro. Não fosse assim, não seria um “mega” festival. Só então fui lá, ver uma das bandas mais aguardadas de todo o evento - primeira vez deles no Brasil! Vi, mas de longe, de MUITO longe. De cima de uma das várias colinas que circundavam o palco ônix. Até que o visual era bonito, parecia Woodstock. Mas o som, dali, estava sofrível. No entanto, não tinha jeito: era muita gente e muito cansaço, de minha parte. Foi aí que tomei a decisão de repensar a estratégia final, bem sucedida, como vocês puderam ver no início deste relato.

Saldo pra lá de positivo, apesar dos  pesares. Cheguei no hotel em que estava hospedado, no centro de São Paulo, destruído. Mas feliz. Que venha a próxima edição.

Ou não. Nâo sei se tenho pique pra outra não ...

A

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