Tudo começa, evidentemente, com o Black Sabbath, e é este o primeiro dos muitos acertos do autor: apesar de terem havido precursores, como o Blue Cheer e seu intenso “Vincebus eruption”, foi com o Black Sabbath que o metal deu seus primeiros passos. Outra sentença do livro com a qual eu concordo é a de que a maioridade do estilo foi alcançada no final dos anos 70, quando o Judas Priest deixou de ser “apenas” mais uma boa banda de Hard rock para se assumir, explicitamente, como Heavy metal, coisa que o Sabbath nunca fez. O Judas lapidou o estilo tanto musical quanto visualmente, com toda aquela já célebre iconografia repleta de tachinhas de metal ornamentando roupas de couro. Daí para a NWOBHM e a “festa” que foram os anos 80 foi um pulo ...
Christe dá um destaque especial para algumas bandas, notadamente o Metallica, cuja trajetória é praticamente esmiuçada e, a partir de determinado momento do livro, serve como fio condutor da narrativa. Narrativa que é rebuscada, detalhada e, mais importante, perfeitamente contextualizada – além de ser pontuada por infinitas listas, uma verdadeira obsessão do autor. Tem lista pra tudo: de maiores discos da história deste ou daquele subgênero (alguns bem obscuros) às músicas de maior duração.
Foi assim, com este apreço à analise e à contextualização, que fatos como a “corrida pela velocidade” deflagrada pelo “speed metal” são esmiuçados de forma extremamente competente - corrida ganha, diga-se de passagem, pelo Napalm Death, que com seu até hoje impressionante “From Slavement to obliteration” fez surgir um novo subgênero musical, o mais infame e extremo de todos, o “grindcore” (acho o segundo disco do Napalm mais emblemático para o estilo, já que “scum” ainda carrega fortemente a sonoridade do Hard Core “crust”). O mesmo acontece com o trecho que discorre sobre o flerte do metal com o rap, que começou com o Aerosmith e o Run DMC e desembocou na antológica colaboração entre o Anthrax e o Public Enemy, passando pelo “funk metal” do Faith No More e pelo furioso Body Count, de Ice T. - o livro reproduz, por sinal, muitas declarações de Chuck D., certamente uma das maiores cabeças pensantes da música contemporânea.
A narrativa é, ainda, pontuada por deliciosas histórias de bastidores, algumas bastante desconhecidas, outras de amplo conhecimento publico mas que acabam adquirindo uma nova dimensão ao serem inseridas numa linha de tempo que demonstra o quanto a história do Heavy Metal é rica em fatos e conceitos. Exemplo: eu não sabia, mas o Celtic Frost não foi mais uma das muitas bandas a simplesmente piratear uma imagem de HR Giger para reproduzi-la na capa de um de seus discos. Segundo Christe, eles entraram em contato com o artista plástico via carta e foram surpreendentemente bem recebidos pelo mesmo, ao ponto de se tornarem amigos de longa data. Outro exemplo: há uma engraçadíssima descrição de como o Manowar se aproveitou da suposta “traição” do Metallica para se promover - os membros da clássica banda thrash californiana haviam cortado os cabelos e recheado o encarte de seu último disco com fotos tiradas por um fotógrafo da moda, Anton Corbijn. Por conta disso, em seus shows da época os eternos guerreiros do metal, assim que identificavam alguém com uma camiseta da banda “rival” na platéia, o chamavam ao palco e o exortavam a abandonar aquele “caminho da perdição” e voltar ao seio do verdadeiro Heavy Metal. A “conversão” era coroada pela troca da camiseta por outra do Manowar, entre goles de Jack Daniels, para o delírio da audiência.
Um dos melhores capítulos de toda a obra, no entanto, é o que disseca a polêmica cena Black metal da Noruega com uma lucidez e apego aos detalhes poucas vezes vista. Sua análise, mais uma vez, é precisa, ao explicar, por exemplo, como o cristianismo foi imposto de forma violenta ao país dos vikings há cerca de mil anos atrás, o que gerou um descontentamento histórico que perdura até hoje em boa parte da população. A análise do autor vai além da abordagem simplista e sensacionalista focada apenas na queima de igrejas e no culto ao satanismo para explorar a inventividade de boa parte dos nomes mais célebres do cenário da época, cujo som ia do minimalismo extremo e selvagem a sofisticados climas “ambient” onde procuravam reproduzir a atmosfera lúgubre das florestas de sua terra – tudo isso, é claro, sem deixar de contar, em detalhes, toda a história do mais famoso epísódio ocorrido no período, o assassinato de Euronymous, do Mayhen, por Varg Vikernes, do Burzum.
O livro só não é mais completo porque foi publicado originalmente em 2003, o que nos deixa ávidos por colher as impressões do autor sobre alguns fatos recentes e marcantes na história do estilo, como o lançamento dos documentários de Sam Dunn (a quem ele indiretamente acusou de plágio recentemente em uma entrevista) e a impressionante “volta por cima” do Iron Maiden que, depois de uma longa fase de decadência nos anos 90, começou a se recuperar com a volta de Bruce Dickinson (devidamente registrada no livro), na virada do milênio, e hoje está novamente no topo, com direito a premiação no Grammy e tietagem explicita de Lady Gaga, a maior estrela pop da atualidade – tudo isso coroado pela antológica turnê “somewhere back in time world tour”, que levou a banda a incluir em seu roteiro de shows territórios ainda não exploradas, como a vizinha Recife, em Pernambuco.
Grande livro, enfim, ricamente ilustrado, impresso em papel de boa qualidade e com uma encadernação gostoso de se manusear. Recomendo a leitura, sem sombra de dúvidas.
por Adelvan kenobi
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Detalhes:
TÍTULO: HEAVY METAL: A HISTORIA COMPLETA
TÍTULO ORIGINAL: SOUND OF THE BEAST: THE COMPLETE HEADBANGING HISTORY OF HEAVY METAL
ISBN: 9788502085374 AUTOR: Ian Christe
TRADUTOR: Milena Durante | Augusto Zantoz
IDIOMA: Português
ENCADERNAÇÃO: Brochura
FORMATO: 16 x 23
PÁGINAS: 480
ANO DA OBRA/COPYRIGHT: 2003
ANO DE EDIÇÃO: 2010
EDIÇÃO: 1ª
TÍTULO ORIGINAL: SOUND OF THE BEAST: THE COMPLETE HEADBANGING HISTORY OF HEAVY METAL
ISBN: 9788502085374 AUTOR: Ian Christe
TRADUTOR: Milena Durante | Augusto Zantoz
IDIOMA: Português
ENCADERNAÇÃO: Brochura
FORMATO: 16 x 23
PÁGINAS: 480
ANO DA OBRA/COPYRIGHT: 2003
ANO DE EDIÇÃO: 2010
EDIÇÃO: 1ª
Boa resenha. Estou pra comprar esse livro. Abraço!
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