segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

A Celebração do absurdo

Luiz Humberto é um daqueles bravos batalhadores anônimos que mantêm viva a cultura underground. Mora em Poço Redondo, sertão sergipano, município onde fica a gruta de Angicos, onde Lampião e Maria Bonita foram assassinados. Já há tempos ele mantém o "Purgatorius Records", selo independente dedicado à barulheira. Recentemente colocou no ar também um blog, com o mesmo nome, do qual extraí o texto a seguir, publicado originalmente na edição conjunta dos Fanzines Escarro Napalm e Buracaju, na primeira metade dos anos 90. Trata-se do único registro conhecido acerca da mais extrema das bandas de rock (ou não) que meus ouvidos já tiveram o prazer (ou não) de escutar, rivalizando com Daminhão Experiença ou com o grupo Raubvogeln, ambos do Rio de Janeiro, no quesito "proposta musical radical anti-comercial".

Agradeço imensamente ao Luiz por ter digitado e disponibilizado o texto.

Para conhecer o blog dele, clique aqui.

A.

ATSOB ATERP - A Celebração do Absurdo!

“Blues,jazz,clássicos,soul,rap,rock,punkrock,rockabilly,hardcore,heavy trash,grind,noise,splatter,death e a puta que pariu-tudo bosta ultrapassada!!!”. São palavras de Hermenegildo, guitarrista da banda ATSOB ATERP, dona daquele que talvez seja o mais radical dos estilos musicais. Mais podre e violento que banheiro publico de periferia, duas vezes mais rápido que a mais rápida banda grindnoisecore, mais suja que açougue em dia de abate. E olha que isto aqui não é chamada para seriado do Super Homem não - é sério! Trata-se de algo inexplicável - não precisa entender ou gostar, apenas sentir. Conheço fãs roxo de grindcore que não conseguiram ouvir sequer uma faixa do trabalho deles!

Surgiram no inicio de 1991. Não usam bateria nem baixo, apenas uma guitarra. O acompanhamento é feito por ruídos os mais variados e imprevisíveis - você poderia imaginar o som de bosta seca caindo num piso forrado com penas de galinha amplificado ao extremo??! Só existe uma banda no mundo com este estilo. Tanto é que ensaiam sempre em locais obscuros, tentando, com isso, evitar a comercialização de suas músicas.

Através de uma gravadora mais que independente e obscura - e você nem imagina o quanto! - já lançaram dois LPs (isso mesmo!). O 1º, intitulado “ERDOPUI BIX”, contém apenas um som, a faixa-titulo, gravada nove vezes com "arranjos" diferentes, e mais um som extra, ”UIBIXER DOP”, que na realidade é mais uma variação de “ERDOPUI BIX”, só que gravada de um modo mais convencional, com baixo e bateria. Já o 2º disco tem 500 "músicas", e é tão rápido que parece ter apenas 2, uma no lado A e outra no lado B. Não vamos comentar porque não conseguimos ouvi-lo devido uma inovação usada no material que foi feito o vinil. O mesmo é propositalmente tão ruim que na terceira vez que se tentar ouvi-lo começarão a surgir bolhas que inviabilizarão a audição e poderão até causar danos nas agulhas dos aparelhos dos mais insistentes. Hermenegildo: ”Não queremos boyzinhos cantarolando nossas músicas por aí.” Até porque este não é um som que se queira ouvir várias vezes. Outra coisa: como pode-se dizer que este vinil é uma bosta, o papel da capa assemelha-se em textura e “qualidade” a papel higiênico. Serve ao menos para limpar a bunda.

Além dos LPs, o ATSOB ATERP possui também uma demo-tape. Como eles não se preocuparam nem um pouco em divulgá-la, surgiram vários boatos a respeito. Alguns dizem conter 10 músicas longas, lembrando às vezes o King Crinsom, outras Napalm Death da fase Lee Dorian. Faltava personalidade - coisas da inexperiência. Já chegaram até a jurar de pé junto que se você tocar a fita ao contrário vai ouvir Pelé entoando aos berros ”Eu não sou cachorrão”, do legendário Waldick Soriano. Perguntamos ao Hermenegildo se ele não poderia me arranjar uma cópia, mas eles já destruíram a matriz. Restou apenas a capa, cuja imagem reproduzimos acima. Pôde apenas me informar que, nesta gravação eles usaram, além da inseparável guitarra, reco-reco, agogô, pandeiro, cuíca, bumbo e lixo hospitalar.

Vale salientar que o material de que falamos aqui dificilmente será encontrado devido ao total disleixo da banda com relação a divulgação, marketing e coisas do gênero. As 500 cópias que restaram do 1º LP eles não vendem e pretendem queimar numa missa negra a se realizar num dia de finados próximo - a esta altura, portanto, já devem tê-lo feito. Do 2ºLP lançaram 1000 cópias. Distribuiram 400 por todo o mundo, 200 viraram merda ao serem manuseadas e as outras 400 eles pretendem - não se sabe como - colocar dentro de capas de discos da Xuxa e vender para algum grande magazine.

Se você achou tudo isso muito esquisito, uma grande besteira ou uma atitude ”do caralho”, prepare-se então para esta: quando você estiver lendo este artigo, provavelmente não existirá mais nenhuma banda ATSOB ATERP. E o motivo da dissolução é justamente a publicação deste texto. Issso mesmo! Nas palavras de Hermenegildo: ”Quando eu liberei os dados pro teu zine, depois eu pensei muito e me arrependi pra caralho. Porra, meu, gravar, ensaiar, tocar, tudo bem, mas ser publicado em artigo já é demais! Daqui a pouco vão querer que a gente faça um show também! É muita exploração pra uma banda só! Queremos ser nós mesmo!” Parece até que ele sofre de uma doença ainda não catalogada nos arquivos clínicos: a “modafobia”. Mas não se desespere: eles já tem planos para uma nova banda. Não precisa nem dizer que se recusaram a comentar o assunto: ”Não queremos cometer o mesmo erro duas vezes...”

Pra terminar, gostaríamos de esclarecer que os membros da banda, à excessão de Hermenegildo, se recusaram a divukgar seus nomes verdadeiros ou endereços. Podemos lhes dar apenas o de um amigo do Hermenegildo, endereço este que usamos para entrar em contato com a banda. Mas vejam bem: Não garantimos resposta!

Por: ADELVAN KENOBI & SILVIO CAMPOS

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