Sempre
curto, também, quando rola algum hit de FM da década de 1980. Me remete a uma
época muito boa, de descoberta do mundo – nasci em 1971. Tipo “Captain of the
heart”, do Double(quem?). Era o que eu ouvia antes de virar “roqueiro”: radio
FM. E AM por tabela, via meu pai.
Porque virei
“roqueiro” praticamente parei de ouvir radio – voluntariamente, no caso – e
perdi de curtir quando tocava coisas que hoje curto, como Teas for fears e Pet
Shop Boys. Passei a levar uma “vida imbecil, zanzando atrás do que é bom” e
controlando o que vai no meu som – acredite, John, do pato Fu, dedicou essa
musica pra mim uma vez, num show. Tínhamos contato por carta, quando eu era
fanzineiro.
Em todo
caso, tocava rock no rádio na década de 1980. Muito, até. Eu diria inclusive
que comecei a virar “roqueiro” ouvindo U2, Dire Straits, Ira!, Camisa de Vênus,
Replicantes e Hojerizah na Atalaia FM, principalmente. Mas em 1986 eu ouvi os
acordes iniciais de “Caught somewhere in time” do iron Maiden – não no radio,
no caso, numa vitrola mesmo, direto dos sulcos de um LP – e fudeu: virei “metaleiro”. E, pelo menos em
Aracaju, metal não tocava no radio.
Assinei a
revista Rock Brigade, especializada em Heavy metal, mas lia também a Bizz, que
era mais “pop” e chegava em Itabaiana, na Livraria Cunha – que na verdade era
uma papelaria, mas funcionava também como banca de revistas. Sempre fui
“eclético”. E graças a um programa de rádio da mesma Atalaia FM produzido de
forma independente por Antonio Passos e Roberto Aquino, donos da primeira loja
especializada em rock e música independente do estado, a Disturbios Sonoros,
pude finalmente ampliar significativamente meus horizontes musicais ouvindo
coisas que eu só conhecia de ler a respeito na clássica publicação da Editora
Abril. Tipo Fellini, Harry, e clássicos como Mutantes e Casa das máquinas – da
primeira a primeira que ouvi, no programa de Passos e Roberto, foi “O meu
refrigerador não funciona”, e da segunda foi “vou morar no ar”. Lembro bem porque
sempre gravava tudo em fitas k7 para ouvir depois, “n” vezes. Pena que não
guardei essas fitas, hoje em dia seriam relíquias. Detalhe: acho que cheguei a
ligar para a radio umas duas ou três vezes pra reclamar porque eles não tocavam
Iron Maiden ...
Muito por
conta dessa minha relação de afeto pelo Rock
Revolution – era o nome do programa – sempre tive vontade de fazer também o
meu. Aconteceu, em parte, na década de 1990, lá em Itabaiana mesmo. Eu já
morava em Aracaju, mas despencava pra lá a cada 15 dias com a mala do carro
cheia de LPs para dar minha contribuição ao Guilhotina,
o programa que um amigo, Ademir Pinto, tinha na Itabaiana FM. Ele era operador
e havia sugerido ao dono da radio ocupar um espaço ocioso aos sábados, depois
da Voz do Brasil, aproveitando os acervos de discos dos amigos, dentre eles eu.
Não tenho
idéia até hoje se tivemos alguma audiência – de vez em quando o telefone tocava
e nós ficávamos excitados achando que era algum ouvinte mas era sempre sobre
algum assunto que não tinha nada a ver com o que estávamos tocando – mas me
diverti fazendo. Também porque Ademir já queria ser demitido mesmo então
liberou para que os produtores chutassem o pau da barraca: uma vez ele me ligou
avisando que o programa ia rolar mas seria interrompido a qualquer momento por
chamadas direto de um povoado onde um poço artesiano ia ser inaugurado pelo
vice-governador do estado, que não por acaso era também o proprietário da
radio. Coloquei no ar, então, um especial “grindcore”, com Napalm Death,
Carcass, Extreme Noise Terror e afins. O vice governador ouviu, mas não o
demitiu, apenas reclamou porque a gente não tocava Raul Seixas.
Quem tinha
audiência cativa era o programa “concorrente”, o Sabotage, de Adelardinho Jr., que ia ao ar no mesmo horário por
outra emissora, a Princesa FM. Muito por conta do carisma e de algumas grandes
sacadas “sem noção” de seu produtor/apresentador: pra que se tenha uma idéia,
uma vez ele pegou em mercadorias o valor de dois patrocínios que uma sorveteria
e uma funerária deviam e sorteou entre os ouvintes um caixão de defuntos cheio
de picolés. O sucesso foi tanto que a promoção se tornou anual, com direito ao
caixão ser conduzido em cortejo até a casa do ganhador – em pelo menos uma ocasião
com o próprio dentro, para o horror de sua mãe, desavisada, que quase morreu de
enfarto.
Já no inicio
do século XXI o rádio seguia com algum prestigio, apesar da crescente concorrência
da internet, e um grupo de amigos conseguiu o feito de colocar no ar, também
pela Atalaia FM, um novo programa dedicado ao rock “indepentente”, o playground – no caso mais “indie” mesmo, refletindo o
gosto musical dos mancebos, Rafael Jr, baterista da Snooze, Patrick Tor4, Bruno
Aragão e Augusto. Muito Weezer, Sonic Youth, Flaming Lips e afins, inclusive
com faixas raras e exclusivas baixadas da internet, a grande novidade da época.
Toda essa
história de guerrilha sonora escavando trincheiras nas ondas do radio converge,
na segunda metade da primeira década do novo século, para uma novíssima
programação da emissora pública do estado, a Aperipê FM, que caiu nas mãos,
graças às voltas que o mundo dá também na política, do DJ Patrick Tor4, o mesmo
da trupe que fazia o playground. Foram
tempos gloriosos, onde taxistas desavisados poderiam se deparar, ao mudar de
estação, com uma programação totalmente inesperada dividida em segmentos
antológicos como o Clube do jazz, Império periférico – dedicado ao rap -, Encruzilhada – que tocava blues -,Vanguarda e o programa de rock. Os dois últimos eram os mais radicais. O
primeiro, produzido e apresentado por Alessandro “Cabelo”, tocava musica de ...
vanguarda. Mas de vanguarda MESMO, indo a extremos tais que passou a adotar o
aviso “seu rádio não está com defeito, você está ouvindo o Vanguarda”, depois
que um operador da radio achou que o sinal estava fora do ar.
Já o
programa de rock foi concebido e apresentado, nos seus dois primeiros anos no
ar, por Fabio “Snoozer” e por este que vos digita, que o levou até o final, 9
anos depois. Também flertava com extremismos – de Daminhão Experiença e
Incinerated Clitorial region, passando por Cocteau Twins, Motorhead, Pixies e
muito rock sergipano, cujos integrantes das bandas eram também, rotineiramente,
entrevistados. Durou até 2016, numa trajetória da qual muito me orgulho e que
teve alguns pontos culminantes, como o lançamento ao vivo, com a banda tocando
direto dos estúdios, do então novo LP da karne Krua, seminal banda punk local.
Foi meu momento “peel sessions”.
Há programas
de rádio antológicos dos quais sempre ouvi falar mas nunca tinha ouvido, até o
advento da internet. É o caso do “Garagem”, produzido e apresentado pelos
Andrés Barcinski e Forastieri com Alvaro Pereira Jr. e Paulo Cesar Martin desde
a década de 1990. Sobrevive até hoje em formatos variados, atualmente como
podcast sob o nome ABFP – Amigos, Barcinski, Forasta e Paulão. É dos meus favoritos.
Pela
internet pude acompanhar também os últimos anos da carreira de Kid Vinil,
sempre uma grande referência, como radialista. E também a antológica Ipanema
FM, de Porto Alegre, que tocava “marquee moon” do Television e “Pau no seu cu
menina” dos Devotos de Nossa Senhora Aparecida na programação normal, no meio da
tarde!
Sigo ouvindo
radio até hoje. As “de fora”, como a Kiss de SP e a Saudade FM de Santos, pela
internet. Mas principalmente na madrugada, quando a programação costuma ser
mais musical e menos pasteurizada, em emissoras especificas que tocam musica
que não ofende os ouvidos, como a Fan, Nova Brasil e a Transamérica FM, que
vieram salvar minhas noites insones da falta que me faziam as finadas Atalaia e
Liberdade FM.
A.
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