quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

Não foge à luta ...

Estava de bobeira numa livraria agora há pouco quando me deparo com um emocionante depoimento da presidente Dilma Roussef sobre as torturas que sofreu durante a Ditadura Militar. Está publicado na contracapa do livro "Não passarás o Jordão", de Luiz Fernando Emediato. Me comovo com relatos sobre a tortura. É algo que nem consigo imaginar acontecendo comigo, pois a dor deve ser indescritível. Não sei se suportaria. Considero cada um que tenha passado por isso e sobreviveu para contar a História de forma lúcida, sem perder a sanindade, um herói. Meu eterno respeito.

Na internet achei o interessante artigo abaixo que contém trechos do depoimento que li na contracapa do livro:

Reportagens publicadas nos jornais "Correio Braziliense" e "Estado de Minas" deste domingo (17) e segunda-feira (18) mostram detalhes de sessões de tortura pelas quais passou a presidente da República, Dilma Rousseff, em Minas Gerais, durante a ditadura militar. Segundo os jornais, os detalhes foram revelados pela presidente em outubro de 2001, durante depoimento ao Conselho Estadual de Direitos Humanos (Conedh-MG), criado para indenizar presos políticos torturados no estado.

Em 2002, ela foi indenizada em R$ 30 mil pela tortura sofrida. Em maio último, foi informado que a presidente seria indenizada também em R$ 20 mil pela tortura sofrida no Rio. A Presidência informou que o valor seria doado ao Grupo Tortura Nunca Mais. Também em maio, a presidente deu posse aos integrantes da Comissão da Verdade, que vai apurar violações aos direitos humanos cometidas entre 1946 e 1988, período que inclui a ditadura militar.

No depoimento dado à comissão mineira, a presidente, que na época era secretária de Minas e Energia no Rio Grande do Sul e filiada ao PDT, contou que levou vários socos no maxilar durante as sessões de tortura em Juiz de Fora no início dos anos 70. Os militares queriam saber detalhes do funcionamento do Comando de Libertação Nacional (Colina), grupo no qual Dilma militava.

"Minha arcada girou para o lado, me causando problemas até hoje, problemas no osso do suporte do dente. Me deram um soco e o dente se deslocou e apodreceu. [...] Só mais tarde, quando voltei para São Paulo, o Albernaz (capitão Alberto Albernaz, do DOI-Codi de São Paulo) completou o serviço com um soco, arrancando o dente", contou Dilma no depoimento.

Àquela epoca, Dilma era conhecida como Estela - ela teve ainda outros codinomes, como Vanda e Luíza. Ela narrou ainda que policiais tinham interesse em saber qual seria o contato dela com Ângelo Pezzuti, dirigente do Colina. "Eu comecei a ser procurada em Minas nos dias seguintes à prisão de Ângelo Pezzuti. Eu morava no Edifício Solar, com meu marido, Cláudio Galeno de Magalhães Linhares, e numa noite, no fim de dezembro de 1968, o apartamento foi cercado e conseguimos fugir, na madrugada. O porteiro disse aos policiais do Dops de Minas que não estávamos em casa. Fugimos pela garagem que dá para a rua do fundo, a Rua Goiás."

"Fui interrogada dentro da Operação Bandeirantes (Oban) por policiais mineiros que interrogavam sobre processo na auditoria de Juiz de Fora e estavam muito interessados em saber meus contatos com Ângelo Pezzuti, que, segundo eles, já preso, mantinha comigo um conjunto de contatos para que eu viabilizasse sua fuga. Eu não tinha a menor ideia do que se tratava, pois tinha saído de BH no início de 69 e isso era no início de 70. Desconhecia as tentativas de fuga de Pezzuti, mas eles supuseram que se tratava de uma mentira. Talvez uma das coisas mais difíceis de você ser no interrogatório é inocente. Você não sabe nem do que se trata", declarou a presidente ao conselho, de acordo com os jornais.

Dilma relatou ainda sessões de tortura com choque. "Não se distinguia se era dia ou noite. O interrogatório começava. Geralmente, o básico era choque. Se o interrogatório é de longa duração, com interrogador ‘experiente’, ele te bota no pau de arara alguns momentos e depois leva para o choque, uma dor que não deixa rastro, só te mina. Muitas vezes também usava palmatória; usava em mim muita palmatória. Em São Paulo usaram pouco esse ‘método’. No fim, quando estava para ir embora, começou uma rotina. No início, não tinha hora. Era de dia e de noite. Emagreci muito, pois não me alimentava direito", relatou.

Em outro momento, ela relata que sofreu hemorragia por conta da tortura. "Quando eu tinha hemorragia, na primeira vez foi na Oban (…) foi uma hemorragia de útero. Me deram uma injeção e disseram para não bater naquele dia. Em Minas, quando comecei a ter hemorragia, chamaram alguém que me deu comprimido e depois injeção. Mas me davam choque elétrico e depois paravam. Acho que tem registros disso no final da minha prisão, pois fiz um tratamento no Hospital das Clínicas."

De acordo com os documentos publicados pelos jornais, a presidente relatou momentos de solidão em que temia a morte. "O estresse é feroz, inimaginável. Descobri, pela primeira vez, que estava sozinha. Encarei a morte e a solidão. Lembro-me do medo quando minha pele tremeu. Tem um lado que marca a gente pelo resto da vida", disse. "Tinha muito esquema de tortura psicológica, ameaças. Eles interrogavam assim: ‘Me dá o contato da organização com a polícia?’ Eles queriam o concreto. ‘Você fica aqui pensando, daqui a pouco eu volto e vamos começar uma sessão de tortura.’ A pior coisa é esperar por tortura."

“Acho que nenhum de nós consegue explicar a sequela: a gente sempre vai ser diferente. No caso específico da época, acho que ajudou o fato de sermos mais novos; agora, ser mais novo tem uma desvantagem: o impacto é muito grande. Mesmo que a gente consiga suportar a vida melhor quando se é jovem, fisicamente, a médio prazo, o efeito na gente é maior por sermos mais jovens. Quando se tem 20 anos o efeito é mais profundo, no entanto, é mais fácil aguentar no imediato.”

"As marcas da tortura sou eu. Fazem parte de mim", relatou a presidente.

g1

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