quarta-feira, 26 de maio de 2010

Artes Plásticas em Sergipe

Teoricamente falando, eu não entendo nada de artes plásticas, mas sei que acho algumas imagens bonitas, ou diferentes, ou surpreendentes, e outras não. Costumava frequentar bastantes as galerias de arte daqui de Aracaju no embalo de meus amigos roqueiros vagabundos que costumavam (alguns continuam por lá) ficar de bobeira ali pelas escadarias da catedral. "Vernissage" era sinônimo de comida e birita de graça, então lá íamos nós. Entre um canapé e outro, já vi muita merda, mas muita coisa boa também, além de ter passado por algumas situações bizarras, como na época em que pessoas vestindo camisetas pretas com estampas de bandas de rock estavam proibidas de entrar na Galeria de Arte Álvaro Santos, que fica próximo à catedral. Até entenderia a proibição, pois a galera escaldava mesmo, assediava o garçon sem dó nem piedade, um verdadeiro vexame, só que proibissem os mal-educados (e eles não são tão difíceis assim de se identificar), e não generalizassem o veto para todos os "roqueiros". Foi ridículo. Outra noite antológica foi a da inauguração da Galeria AMA (Ana Maria Alves), na orla. Era época de eleição e o governador de então, disputando mais um mandato, quis fazer bonito na estréia do espaço que levava o nome de sua filha (mesmo que a mesma, que eu saiba, não tivesse nada a ver com o universo das artes plásticas). Por conta disso, o "buffet" foi nota 10 - muita comida, e muita, muita bebida, tudo do bem e do melhor. Meus amigos "do mal" começaram a dar vexame, pra variar, colocando os copos em cima das obras de arte (reproduções de projetos de Leonardo Da Vinci) e assediando de maneira, digamos, pouco sutil, estrelas da música sergipana, então passaram a ser visados pela segurança e eu saí pela tangente. No dia seguinte, um deles me liga perguntando se tinha sido eu que tinha levado ele em casa, pois tinha amanhecido na porta de sua residencia todo arrebentado e não fazia a menor ideia do que tinha acontecido nem como tinha chegado lá.

Abaixo, uma matéria sobre o panorama (desolador) das artes plásticas locais, e algumas reproduções de obras de artistas sergipanos.

A.

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Artistas plásticos de Sergipe não têm reconhecimento real de suas obras

Cinform, 01/10/2009

“Não existe uma linha de evolução das artes plásticas em Sergipe. Ela é feita de muitos acasos, de uma contrafacção de valores, subestimação da qualidade artística e da ausência de um curso de artes verdadeiro que prepare o aluno”. As palavras do artista plástico Leonardo Alencar, um dos mais respeitáveis de Sergipe, explica e introduz uma problemática existente no Estado: o mercado decadente das artes plásticas, uma das vertentes de artes que tem uma nobre valorização no país inteiro. Mas aqui...
Para Leonardo, o problema aqui precisa começar do zero. E ele tem razão: as obras dos artistas sergipanos quase não têm espaço para ser expostas ao grande público que, por sua vez, não tem conhecimento do real valor delas. Falta galeria que fomente público e artista, e falta público que fomente artes plásticas. É um ciclo vicioso perigoso. “A ideia da valorização da obra de arte não passa pela mente do sergipano. O artista era visto como um marginal, como alguém que estava sempre precisando de dinheiro, um boêmio, um dissoluto”, lamenta Leonardo Alencar. Um solitário.
Para o artista sergipano nascido em Estância, que completa 50 anos de artes plásticas em abril do ano que vem, é preciso força política dentro do mercado das artes em terras sergipanas – mercado este que não existe. “A arte é um ser político. Como não existe apoio, ficamos atrasados. E isso é grave”, explica Leonardo Alencar. Como há pouca cultura na sociedade sergipana no aspecto de compreender a real dimensão da pintura e, também, não há galerias que exponham as peças constantemente, criou-se a prática de vendas em moldurarias que, segundo Alencar, não foi proposital, mas é péssimo. “Os artistas iam colocar moldura nas peças, alguém via, gostava e comprava. O moldureiro acabava sendo o entreposto, mesmo sem querer”, explica Leonardo. Essa prática foi intensificada no Estado na década de 1980 e teve como grande tutor Osvaldo José dos Santos, da Molduraria e, depois também Galeria, José de Dome.
NO PAREDÃO - Seu Osvaldo foi um grande colecionador e quando morreu, há 11 anos, passou o bastão para os filhos. Teodoro Fonseca Santos, 36, é um dos herdeiros que comanda a tradicional Molduraria e Galeria José de Dome que está há 39 anos ativada. Teodoro, assim como Leonardo, não é um otimista deste setor. De acordo com ele, o sergipano valoriza apenas o dinheiro. “Eles procuram os quadros mais baratos e que sejam de artistas que não tenham um grande nome. Não valorizam a arte”, constata Teodoro. Ainda segundo Teodoro Fonseca Santos, o mercado é tão decadente que nem as molduras de qualidade são mais valorizadas, e o que é pior, pelos próprios artistas que, já sabendo como o público sergipano é, não querem encarecer ainda mais a obra. “A nossa moldura é de madeira e dura 100 anos. Mas as pessoas daqui preferem as molduras que vêm de fora e que duram de cinco a seis anos”, explica ele. Uma moldura de qualidade para um quadro que mede 80 cm x 80 cm, por exemplo, custa em média R$ 50. É barata.
Para Leonardo Alencar o problema se origina no berço. O sergipano vive dissociado da cultura e por isso não credita valor à arte. “Vender mais barato ou mais caro é uma questão cultural. Como as pessoas daqui não lêem sobre arte, tornam-se desinformadas e acabam confundindo arte com artesanato. Então vendem a suposta obra de arte como uma mera peça artesanal. E quando é uma arte, o cliente oferece o preço de uma peça de artesanato. Ele não está acostumado a respeitar o critério do mercado”, teoriza Alencar, numa tradução exata da realidade cultural sergipana, excluindo a culpa das moldurarias e dos pintores. Para se ter uma ideia do quanto a mentalidade cultural do sergipano é deficiente nesta área, Alencar exemplifica que suas peças, por exemplo, são vendidas para pessoas de outros Estados que vão até seu atelier porque já ouviram falar em seu nome. “Essas pessoas são as que têm um conhecimento mais descortinado, mais amplo”, justifica Alencar. E são geralmente as que lhe salvam a condição de artista, dando o real valor ao que ele produz.
Pela visão de Alencar, que é um ícone sergipano, um outro problema é a falta de apoio estatal. É aqui onde entram os espaços públicos para recepção da pintura de qualidade. “As galerias não têm verba e por isso não formam acervo para atrair o público. Não compram obra de arte dos artistas daqui. O Governo não tem um programa de aquisição de obra de arte. Por isso Sergipe é um Estado pobre. Se dependesse da aquisição do Governo, não sobreviveríamos. É como se estivéssemos mendigando algo que temos mérito e direitos. É meio humilhante para o artista. Para vender uma arte ao Governo, temos que pagar os 37% de imposto antes. O artista não tem condições disso”, continua Leonardo Alencar.
O médico e escritor Marcelo Ribeiro é um dos poucos sergipanos que sabem dar valor a uma obra de pintura de qualidade. Uma boa parte dos quadros de seu acervo, de mais de 70 peças, foi comprada na mão de particulares em péssimo estado de conservação. Marcelo Ribeiro concorda que os sergipanos de uma maneira geral não costumam valorizar a arte plástica. “Mesmo a classe média, sem generalizar, acha que não há diferença entre um quadro de um grande pintor sergipano e uma gravura”, salienta Ribeiro. Para ele, a iniciativa teria que partir do Governo do Estado para que investisse e conscientizasse o povo do devido valor das artes plásticas.
A Galeria Ana Maria Alves, na Orla de Atalaia, é a que melhor exemplifica o desleixo com esta vertente da cultura em Sergipe. Desde que foi fundada, em junho de 2006, no Governo de João Alves Filho – está aí o motivo pelo qual o espaço ganhou este nome, da filha do político –, a Galeria Ana Maria Alves, uma das maiores do Estado, teve apenas uma exposição, no dia da sua inauguração. “O espaço está sendo usado apenas para eventos. Esta semana, por exemplo, vai acontecer a festa das crianças”, informa o vigilante ‘solitário’ da galeria, Germino Alves Santos, que há dois anos trabalha no local. Para a artista plástica Hortência Barreto, o problema não é tanto dos espaços, são os valores culturais. “O Estado não vê como uma coisa importante. Falta compromisso do povo e das instituições”, opina Hortência.
Outra galeria de artes que caiu no esquecimento do poder público é a J. Inácio, anexa a Biblioteca Pública Epifânio Dória. A galeria, que leva o nome de um grande artista plástico sergipano, falecido em 1º de agosto de 2007, não tem acervo e até agora, faltando menos de três meses para acabar o ano, só fez três exposições em 2009. Será que por falta de artista querendo mostrar seu trabalho aos poucos sergipanos que conhecem e sabem dar o devido valor à arte? Certamente não. Ruteh Gomes Oliveira, funcionária da Galeria J. Inácio desde 1982 e diretora de lá há 11 anos, revela que o problema é a burocracia imposta pelo Estado para viabilizar uma mostra. “O próprio sistema dificulta. O convite, por exemplo, demora muito para ser confeccionado. Só chega em cima da hora. Deveria existir um maior apoio ao artista. Se houvesse incentivo a produção seria mais rica. A vida do artista é muito sofrida”, lamenta Ruteh com autoridade. Ela é filha de J. Inácio – o artista sergipano que insistia em fixar bananeiras e mangueiras em suas telas e que dá nome à galeria – e sabe bem o que está falando.
“A coisa mais triste é viver de arte em Aracaju. Os que conseguem são vitoriosos. Obra de arte é um suplício. Só compra quem tem dinheiro sobrando. Os novos ricos preferem comprar algo, uma gravura, em São Paulo. Uma minoria de sergipanos consome obra de arte”, pontua Ruteh Oliveira, uma outra vertente que impede que as artes plásticas sergipanas ocupem o lugar que merece.
De fato o sergipano não valoriza a cultura local. Mas para reverter esse quadro seria necessário haver vitrine para essa atividade. Sem recursos próprios, as galerias públicas sergipanas não têm poder de fomentar a arte e atrair o público. A Galeria de Artes Álvaro Santos – GAAS –, fundada em 26 de setembro de 1966, na administração do prefeito Godofredo Diniz Gonçalves, é uma das poucas no Estado que expõe constantemente e que oferece ao artista o apoio mínimo necessário. “Dentro do regimento oferecemos o espaço, funcionários para a montagem e para tomar conta das peças, divulgação e cerca de 500 convites”, argumenta Aldeci Lima Freire, secretária da GAAS. Mas isso não é o bastante.
A realidade das artes plásticas no mercado sergipano pode ser comparada a uma tela vazia, sem a vida das cores. Ruteh Oliveira, diretora da J. Inácio, diz que há quatro ou cinco anos o mercado teve uma forte queda e isso prejudicou ainda mais os artistas. “De fato houve uma crise econômica que prejudicou este segmento. Mas em Aracaju também não existe um mercado de colecionadores. As artes plásticas não dão visibilidade para investimentos nem do poder público nem do povo”, argumenta Hortência Barreto, artista plástica há 20 anos.




































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