sábado, 24 de novembro de 2007

RDP em Aracaju



Por Adelvan Kenobi.


Há aproximadamente 13 anos atrás, as ruas de Aracaju foram tomadas por uma turba ensandecida sedenta de vingança. Tratava-se dos indignados potenciais expectadores do show do Ratos de Porão que iria acontecer naquela noite, no Ginásio de Esportes Constancio Vieira, mas que, por conta da quebra de contrato do “produtor” para com a banda (soube-se depois), não aconteceu. O tal “produtor” já tinha aprontado algo parecido com a banda PUS, mas se deu bem, a banda acabou tocando de graça no dia seguinte em respeito a seu publico e ficou tudo por isso mesmo. Só que nessa noite as coisas iriam ser diferentes. Ele tinha uma loja especializada em rock alternativo no centro da cidade, e foi pra lá que a turba se dirigiu. A loja foi completamente destruída e saqueada. O “produtor” sumiu da cidade, reapareceu, para finalmente sumir de uma vez. Fugiu. Desapareceu. Escafedeu-se. E Ratos de Porão em Aracaju virou uma espécie de lenda urbana. Durante esses 13 anos a cidade ficou com o estigma de ser uma das únicas capitais brasileiras nas quais eles nunca se apresentaram.

Pois o tabu está para ser quebrado. O tempo passou, o mundo deu voltas. Os tempos são outros, Aracaju hoje é outra cidade. Novos produtores apareceram, festivais aconteceram, a cena rock underground cresceu, apareceu, voltou a encolher mas permanece, inconstante porém viva. E finalmente o Ratos de Porão vai se apresentar, pra valer, no dia 08 de dezembro de 2007, na ATPN. E vem num excelente momento, divulgando o seu ultimo disco, HOMEM INIMIGO DO HOMEM – um trabalho que resgata as origens “crossover” da banda e é, ouso dizer, é seu melhor disco desde o Brasil, de 1989. É também o 14_ disco de estúdio de uma carreira que começou por volta de 1981, quando João Carlos Molina Esteves, o Jão, resolveu montar uma banda punk/Hardcore com seu primo Roberto Massetti (o Betinho, baterista) e o amigo Jarbas Alves (o Jabá, baixista).

Em 1983, já com Mingau na guitarra, gravaram seu primeiro registro musical na coletânea SUB e participaram do festival O Começo do Fim do Mundo, que reuniu vinte bandas no Sesc Pompéia, em São Paulo, e se tornou um marco do movimento punk no Brasil. Interessante notar que João Gordo, seu célebre (e, mesmo a contragosto, celebridade) vocalista, só entrou na banda neste mesmo ano de 1983 – a tempo de gravar seu primeiro LP , o clássico “Crucificados pelo Sistema”.

Em 1986, deixaram de lado o purismo punk e gravaram o primeiro grande disco do estilo “crossover” (misto de punk com metal) no Brasil, “Descanse em Paz”. Com um clima pra lá de sombrio (a começar pela capa, que mostrava a foto de uma senhora morta com a boca cheia de algodão em seu caixão), o álbum tinha nítidas e assumidas influencias de thrash metal e de bandas como Venom e Celtic Frost. Por conta desse “namoro” com o metal acabaram ficando amigos dos componentes do Sepultura, então em plena ascensão no cenário Metálico nacional e internacional. Seu trabalho seguinte, “Cada Dia mais sujo e agressivo”, de 1987, saiu pela mesma gravadora que lançou o Sepultura para o mundo, a Cogumelo Records de Belo Horizonte, e aprofundou ainda mais as influencias do metal, com uma clara e impressionante evolução da banda em termos técnicos e até mesmo a participação, em uma das faixas, do guitarrista Andréas Kisser, do Sepultura, num solo de guitarra. Por conta de “sacrilégios” como estes, passaram a ser eternamente hostilizado pela ala mais sectária do movimento punk. “Traidor” passou a ser uma palavra constantemente associada a Ratos de Porão – chegaram, inclusive, a compor uma musica ironizando o fato. Independente disso, ganharam notoriedade também no exterior e o disco seguinte, “Brasil” (1989), foi lançado pela Roadrunner, mesma gravadora do Sepultura, e gravado em Berlim
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Com “Brasil”, o Ratos de Porão conseguiu aliar finalmente técnica e rapidez num som nitidamente Hardcore, despojado das “gorduras” herdadas do namoro com o metal. É uma verdadeira obra-prima do gênero em todo o mundo. Depois de seu lançamento a banda passou a ter uma carreira internacional, tocando regularmente na Europa e ocasionalmente nos Estados Unidos e alguns pontos obscuros do globo. Ainda pela Roadrunner lançaram os discos ANARKOPHOBIA (1990, retornando ao crossover e às influencias de thrash e até mesmo de rap, em seu maior sucesso, a faixa “Sofrer” – sucesso que os levou a tocar em lugares antes impensáveis como programas populares de auditório na televisão), JUST ANOTHER TIME IN MASSACRELAND (1993, um disco bastante diferente dos padrões da banda, mais melódico e quase que totalmente cantado em inglês) e os dois discos de cover FEIJOADA ACIDENTE (1995), nos quais fazem uma homenagem ás bandas brasileiras e estrangeiras que os influenciaram.
Desfeito o “casamento” com a Roadrunner, lançam em 1997 “Carniceria Tropical”. A partir daí a banda assume uma sonoridade mais diretamente influenciada pelo crustcore europeu, sem contudo abandonar suas características próprias. Foi assim nos discos seguintes, “Guerra Civil Canibal”, “Sistemados pelo Crucifa” (uma regravação do primeiro disco) e “Onisciente coletivo” – este também lançado por outra gravadora estrangeira especializada em metal, a Century Media. Ao longo de sua carreira lançaram ainda os discos “Periferia 1992”, com gravações toscas dos primórdios da banda, 3 discos ao vivo (RDP/Cólera Ao Vivo – 1985, RDP VIVO – 1992, e AO VIVO NO CBGB, de 2003) e uma infinidade de participações em coletâneas ao redor do mundo. A formação da banda manteve-se relativamente estável ao longo do tempo, com uma rotatividade maior entre os baixistas. Atualmente conta com o Gordo nos vocais, Juninho no baixo, Boka na bateria e Jão, o único membro fundador remanescente, na guitarra.

terça-feira, 4 de setembro de 2007

Dicas de Filmes

Uma feliz combinação de bons filmes e preços promocionais no cinema têm feito de mim um freqüentador assíduo das salas escuras. Farei breves comentários a respeito de alguns dos últimos filmes aos quais assisti, espero que sejam úteis.

A CONCEPÇÃO : Fita produzida em Brasília com atores desconhecidos, o único rosto familiar é o de Matheus Nachtergale, excelente como sempre, porém num papel pouco convincente. É um filme pretensioso e bobo, que conta a historia de jovens burgueses intelectualóides brasilienses entediados que caem na lorota de um pseudo-filosófo de botequim fajuto (Matheus) e fundam um tal de movimento concepcionista que prega a Morte ao Ego. Na verdade uma desculpa para praticar sexo grupal e golpes diversos sem sentimento de culpa. Mas a montagem é boa, tem muitas cenas de nu e as atrizes são gostosas. É chato, mas vale uma conferida

O ULTIMO REI DA ESCÓCIA: Excelente interpretação de Forrest Whitaker no papel do megalomaníaco Ditador de Uganda Idi Amin Dada. O filme utiliza-se do conhecido (e sempre bom, quando bem executado) expediente de criar personagens fictícios para romancear fatos reais – no caso, fatos reais E assustadores, como quase tudo o que vem da África, o continente esquecido, aliás. Conta as "aventuras" de um jovem medico escocês (entediado) que resolve partir para o ponto mais remoto que consegue encontrar no globo terrestre a procura de novas experiências e, de quebra, dar algum sentido a sua vida vazia – o famoso "fazer a diferença". Lá se depara por um acaso do destino com o Ditador recém auto-empossado de Uganda, cai em suas graças e passa a ser envolvido numa teia de intrigas políticas e violência. Perde a inocência e cai na real. Por pouco, tarde demais. Excelente fotografia de cores fortes, apropriadas para o cenário.

BORAT: Sensacional, fantástico, excelente. Sacha Baron Cohen é um gênio da comédia. Certamente um dos filmes mais engraçados já feitos – e tirando uma onda braba com a cara dos americanos, o que é melhor. Imperdível, não deixe de ver.

FILHOS DA ESPERANÇA: Esse Filme pode ser visto como uma aventura, e das mais movimentadas. Mas não como uma aventura escapista. O pano de fundo de seu enredo, um suposto futuro onde a humanidade subitamente ficou estéril e, por conta disto, está fadada à extinção e entregue ao fascismo, nos remete imediatamente aos dias em que vivemos, com o mundo caminhando a passos largos para uma espécie de Ditadura econômica corporativa globalizada e aparentemente à beira da extinção (veja UMA VERDADE INCONVENIENTE). Sempre fui fascinado por ficções cientificas pessimistas e essa aqui é de primeira. Não deixe de ver.

PECADOS ÍNTIMOS: Drama sobre o tédio e o aprisionamento involuntário que os casamentos quase sempre provocam e a necessidade que, uma hora ou outra, todos sentem de "pular a cerca" e, quem sabe, se sentir vivo e desejado outra vez. Poderia ser um filme chato, mas não é. Poderia ser pesado, mas também não é. Em vários momentos é leve e divertido, apesar da tensão representada pela iminência da traição permanentemente no ar. É uma espécie de "Desencanto" (filme clássico de tema parecido de David Lean) do século XXI. A Historia paralela do tarado pedófilo é excelente e comovente. Excelentes atuações de todo o elenco. Não deixe de ver.

CARTAS DE IWO-JIMA: Um daqueles "filmes de guerra" históricos impecáveis. A idéia de Clint Eastwood de filmar o outro lado do campo de batalha foi louvável, esperta e muito bem executada. E muito respeitosa também. Em nenhum momento os japoneses são demonizados, muito pelo contrário, o filme passa aquela conhecida sensação de que todos ali, dos dois lados do campo de batalha, são na verdade iguais em sua essência como seres humanos e estão em campos opostos apenas como peões de um complicado jogo de xadrez arquitetado por seus líderes em nome de supostos interesses nacionais. A narrativa é centralizada na figura do General Tadamichi Kuribayashi, comandante da defesa da ilha, mas flash-backs muito bem colocados enfocam a vida dos soldados comuns tolhidos pela espiral do conflito. Excelente.

O LABIRINTO DO FAUNO: o que a princípio era uma promessa (o diretor Guilhermo Del Toro) aqui se torna uma realidade. Esse filme é uma obra-prima. Visualmente impecável e muito, muito criativo. O visual do Fauno e das criaturas que a protagonista encontra pelo caminho (reais ou fruto da imaginação?) são coisa de gênio. Imperdível. Para todos.

PEQUENA MISS SUNSHINE: Tudo o que eu disser aqui vai fazer parecer que esse filme é um apanhado de clichês, e pode ser que seja. Mas a verdade é que é comovente e é muito bom. Todos entregam atuações impecáveis na História da menina feinha e gordinha que sonha em ganhar um concurso de Beleza infantil e da família que embarca em seu delírio para não decepcioná-la. A garotinha que faz a protagonista realmente mereceu a indicação para o Oscar de melhor atriz. Arrasou. E a mãe é Toni Colete, de quem eu sou fã desde o fantástico "cult movie" "O Casamento de Muriel". Além do mais, acho ela muito bonita.

MOTOQUEIRO FANTASMA: para não parecer que eu só assisti filmes bons, teve esse aqui. Fui ver porque curto quadrinhos e o visual apresentado no material promocional era promissor. Mas o filme é ruim que só. Pegaram um anti-herói semi-obscuro e anti-convencional da Marvel dos anos 70 e o transformaram num diversão chicletuda Hollywoodyana da pior espécie. O vilão é inacreditavelmente ridículo. Nicholas Cage é um ator de merda. Só não é um lixo completo porque o visual é realmente muito bom e a mocinha é extremamente gostosa e usa decotes generosos. Fora isso, mantenha distancia.

BABEL: Torci por esse filme no Oscar. Acho que o justo teria sido premiar Scorcese como melhor diretor (mais por uma questão de justiça histórica) e Babel como melhor filme. Mas anyway, nevermind, tanto faz. Não é tão bom quanto AMORES BRUTOS, mas é melhor que 21 GRAMAS. Segue a mesma estrutura (caso se repita mais uma vez no próximo filme, engrossarei o coro dos que acusam o diretor de repetir uma fórmula) de Histórias que se cruzam. Acontece que as Histórias se cruzam MUITO bem. É a Teoria do caos explicada da forma mais simples e didática possível. E tem Brad Pitt né ? Lindo, e excelente ator.

OS INFILTRADOS: É bom, mas não está, de forma alguma, entre os melhores filmes de Scorcese. E é confuso, não entendi muito bem a trama. Preciso ver de novo, quem sabe não melhores se eu encontrar o fio da meada ?






Snooze ao vivo em Aracaju



















Na foto, Snooze ao vivo - mas não em Aracaju.

Aracaju, Sergipe, bandeirolas por toda a parte, clima chuvoso, show da snooze. Tradição no ar. Tradição popular, festejos juninos, tradição “underground” – trata-se de uma das mais antigas bandas de rock ainda em atividade na cidade, 10 anos recém-completados. Mas um elemento novo fez dessa uma noite especial. Como bem lembrou o guitarrista Clinio Jr., esse era, de certa forma, uma espécie de recomeço para eles, tendo em vista que se tratava do primeiro show de sua história sem a presença do baixista e vocalista Fabinho, que foi começar vida nova em Sampa. Um marco zero, e a julgar pelo que vi e ouvi naquela noite, um belo recomeço. O outro guitarrista, Marcelo , assumiu a maior parte dos vocais, e se mostrou um substituto à altura. O mesmo pode ser dito do novo baixista, Duardo – não por acaso, ambos egressos do Vitais, um dos muitos grupos que se formaram nesses dez anos influenciados pelo snooze. Rafael Jr, baterista, único membro remanescente da formação original, deu o tom da festa, apresentando as novas musicas e as novas roupagens para as antigas. O mesmo bom e “velho” guitar sound à la Teenage Fan Club com pitadas de surf music e punk rock executado com maestria e entrega. Mostraram-se bem ensaiados e perfeitamente entrosados, com um repertorio enxuto equilibrando com perfeição todas as fases do grupo – inclusive a novíssima fase, muito bem representadas pelas novas composições, algumas delas assinadas pelo novo vocalista – que já está há algum tempo na banda, como guitarrista. Completando o show, um cover do Guidede By Voices atesta que o lado didático da banda, que sempre apresentou ao publico roqueiro aracajuano o que há de melhor na cena independente mundial, continua intacto. O povo gostou, aplaudiu, urrou e pediu bis. A julgar pela recepção à nova formação, o futuro está garantido. Num mundo tão cheio de mudanças para pior, é bom saber que algumas boas coisas da vida continuam as mesmas. Século 21, aí vamos nós!Completaram a noite uma banda que eu não vi, e a julgar pelas impressões dos presentes não perdi muita coisa, o BRINDE, de Salvador, que faz uma espécie de power pop cantado em português repleto de lugares-comum e clichês de todos os tipos, tudo emoldurando ridículas letras de amor adolescente tardio, e a sensacional PLASTICO LUNAR, que merece alguns comentários à parte: Fazem um som totalmente voltado ao psicodelismo dos anos 60, obviamente influenciados pelos mutantes e tudo o mais que houve de bom por aqueles tempos, mas com uma incrível capacidade técnica e excelentes composições e presença de palco. O único senão, para mim, são as letras que, apesar de estarem perfeitamente inseridas na tradição e no contexto do estilo por eles encampado, me soam um tanto quanto anacrônicas e hippies demais para o meu gosto – frise-se, no caso, o MEU gosto pessoal. Fosse o mundo mais justo, esses caras já teriam um disco lançado pela Baratos Afins (que seria uma espécie de lar natural para eles) e pirateado mundo afora, com turnê marcada pela Europa e pelo Japão e tudo o mais que uma banda cult tem direito. Mas como o mundo é injusto, e nós precisamos nos acostumar com isso, eu fui embora antes do fim do show, pelo simples motivo de que já vi a banda ao vivo milhares de vezes e já conheço o repertório do show de trás para frente.

Terraço do mercado municipal, 29 de maio de 2004

originalmente publicado no site "Dissonancia"

por Adelvan k

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segunda-feira, 25 de junho de 2007

Wander Wildner

Texto feito a pedido dos produtores do show acustico que Wander fez aqui em Aracaju em 2006.
Por Adelvan Kenobi



Poucos artistas podem ser definidos com uma lenda viva do rock no Brasil como Wander Wildner. Até um astro do rock ele pode ser considerado, já que uma musica cantada por ele (surfista calhorda, dos replicantes) tomou de assalto as freqüências moduladas de todo o Brasil nos anos 80 e o tornou referencia do estilo por aqui. Mas um astro, para usar um termo do sul, “chinelão”, boa praça, alternativo, “do bem”. Do rock mesmo, na melhor concepção da palavra.Wander passou um tempo no limbo depois de sua saída dos Replicantes. Parece até que foi de propósito, como que para confirmar a sentença carimbada no titulo do primeiro disco da banda, “O futuro é um vórtex”. Mas eis que um dia, ao trabalhar como operário na iluminação de um espetáculo de teatro, ele se lembrou que seu lugar não precisava ser necessariamente nos bastidores. Voltou pra Porto Alegre e lá começou uma frutífera carreira solo que já dura quatro discos e duas coletâneas, sempre numa temática intimista e etílico/romântica, garajeira e estradeira, atormentada e apaixonada. Temática esta ironicamente batizada em seu inicio de carreira como “punk/brega”. Carreira que começa com “Baladas Sangrentas”, seminal disco de estréia que, a exemplo do primeiro álbum do Cachorro grande, também do Rio Grande do sul, já pode ser considerado um clássico do rock nacional, e desemboca no recente “Paraquedas do coração”. No caminho, atribulado, como toda carreira de artista independente e autentico no Brasil, gravou com a Trama antes da Trama ser A trama e lançou uma coletânea nas bancas de todo o pais encartada na revista outracoisa. Viajou e continua viajando pelo Brasil, fez show no chão, de surpresa, no meio do publico, e também no palco do Abril pro rock e de vários outros festivais por aí afora, trabalhou com alguns dos mais influentes produtores do rock brasileiro, como Tom Capone e Carlos Eduardo Miranda, é freqüentemente ovacionado pela critica especializada e invariavelmente cultuado por pelo menos duas gerações de roqueiros tupiniquins, mas nunca abandonou seu espírito anárquico, livre e underground. Profundamente livre, simples, “desencanado”. Se você estiver numa van com ele a caminho do show e o pneu furar, é possível que ele se ofereça para trocá-lo. Se de passagem para o banheiro no muquifo onde o show ocorre você tiver que pedir licença a ele, o “astro” da noite, ele a dará sem pestanejar. E se o dono do bar onde ele acabou de tocar for gente fina e o tratar bem, é provável que ele o ajude a limpar o recinto e guardar as mesas e cadeiras no final da noite. Esse é Wander Wildner. Um cara do caralho.

quarta-feira, 9 de maio de 2007

Dicas de Cinema Brasileiro




Eu queria muito assitir o BAIXIO DAS BESTAS, o novo filme de Cláudio Assis (Amarelo Manga). Tanto que me sujeitei pacientemente à falta de respeito do Cinemark, que transferiu o Festival CURTA-SE (em cuja programação o filme estava inserido) para uma sala menor por conta da estreia do Homem Aranha, o que resultou num atraso de1 hora e meia ou mais. Depois de uma seqüência de curta-metragens que durou ao todo quase duas horas (seqüência razoável, um tanto quanto irregular mas no geral interessante), eis que chega a hora de anunciar o longa. Antes, uma surpresa (pelo menos para mim, desinformado): o figuraça estava lá em pessoa e ia dizer umas palavras. Mandou o cinemark tomar no cu e se mostrou indignado pelo festival ser segregado a uma sala minúscula por conta da tarântula hollywoodiana. E de quebra reclamou de Lula que obedientemente baixou a cabeça ante à ordem do senhor imperial para que se plante mais cana (Veja aqui: http://www.youtube.com/watch?v=Oh2I1KVgJaE ). Luzes apagadas, começa a sessão. Caralho, que porra é essa ? Tem alguma coisa errada, a imagem aparece distorcida. E os energúmenos que operam o projetor parecem nem notar, só param a exibição diante dos berros do diretor em pessoa. E tome mais uma espera de meia hora. Mas valeu a pena. O filme é cruel e ultra-realista, não faz concessões. Um caldo de cultura resultante da ignorância e da má distribuição de renda resulta numa vida dura, violenta e sem perspectivas para as pessoas de baixa renda da zona da mata pernambucana. Especialmente para as mulheres, ininterruptamente violentadas de todas as formas possíveis, tanto física quanto psicologicamente. Excelentes atuações de atores globais como Caio Blat, Mateus Nachtergale e Dira Paes, mas o destaque vai certamente para a atriz Mariah Teixeira (também presente ao evento), que faz o papel da adolescente explorada sexualmente pelo avô. Meu único senão é que, a meu ver, as cenas de violência poderiam ter sido mais realistas. Há algo de contido nas perfomances dos atores. Talvez seja impressão minha, ou talvez depois de IRREVERSIVEL meu nível de exigência de veracidade em cenas de estupro esteja num patamar mais alto. Mas acho que o filme pedia por isso, as cenas chocantes são importantes para ressaltar a brutalidade da trama. É um “defeito” menor, no entanto – se é que é um defeito, não sei. Vale muito a pena. Parabéns ao Cláudio por mais um filme corajoso. Eis que nasce um novo herói do cinema nacional.

O CHEIRO DO RALO – Sensacional. Diálogos brilhantes, trama inusitada e excelentes atuações – inclusive do autor do livro, Lourenço Mutarelli (por um acaso, o maior autor de quadrinhos brasileiro vivo), aqui fazendo o papel de um segurança. Mas o filme é mesmo de Selton Melo. Esse é O cara.



Ó PAÍ Ó – O povo precisa se ver no cinema, por isso fico feliz quando vejo um filme de inegável apelo popular que é ao mesmo tempo divertido e bem acabado sem subestimar a inteligência do espectador. Críticos intelectualoides têm torcido o nariz para esse filme, mas pau no cu deles. É muito bom. Lázaro Ramos, pra variar, arrasa. As perfomances dos demais atores, do olodum, são um tanto quanto teatrais mas não comprometem o andamento do filme. Aliás esse filme é um dos poucos que vi que parecem uma peça filmada mas que, no final, funciona. Assista sem preconceito e divirta-se. Ou não.



CAIXA DOIS – Já esse aqui é teatro filmado e como de praxe não funciona. Típico filme global, com cara de especial de televisão. Não chega a ser de todo ruim, mas não vale nem o preço de uma locação. Assista quando passar na globo, se não tiver nada melhor para fazer.





2 FILHOS DE FRANCISCO – Esse filme foi quase que uma unanimidade na época de seu lançamento. O povo adorou e a intelectualidade aprovou, louvando o exemplo edificante da busca por um sonho e blah blah blah. Todos insistiam em ressaltar que não era uma reles promoção da dupla sertaneja. Bom, pra mim é. O filme é permeado por canções da dupla. È piegas, choroso e arrastado. Chato até a medula. Filme para comover as massas e faze-las acreditar no sonho da livre iniciativa – a “american dream”. Lixo comercial.